Um Olhar Sobre a Formação Psi1

Idilene da Silva Cardoso2

 

 

AGRADECIMENTOS.

Agradeço a meus familiares por terem me ajudado a realizar este sonho e agüentado minhas brigas, mau-humor, mutismo e ausências.

A Psicóloga Liane Pessin pelo apoio e por ter acreditado no meu trabalho, mas principalmente por ter se tornado uma amiga, além de orientadora.

Ao meu namorado, Hugo Brum, pelo carinho e compreensão da falta de tempo e atenção, pelo choro e lamentações a que tem sido vítima nestes últimos meses, mas principalmente, por estar do meu lado neste momento e me fazer sentir segura e me dar forças para seguir adiante.

A Psicóloga Simone Faoro Bertoni, por ser responsável por muitas das aprendizagens que fiz neste último ano e auxiliado na formação do muito o que me tornei como pessoa e futura profissional

 

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO

PSICOLOGIA NO BRASIL

2. CONCEITOS ESTRUTURANTES DESSA FORMAÇÃO

2.1 Identidade
2.2 Personalidade
2.3 Maturidade
2.4 Auto-Conhecimento
2.5 Tratamento Psicológico

 

3. IMPLICAÇÕES DESSA FORMAÇÃO NA PRÁTICA PSICOLÓGICA

CONCLUSÃO

BIBLIOGRAFIA


INTRODUÇÃO

Quando se inicia um curso de graduação se tem muitas expectativas em relação ao que vai se aprender, mas principalmente em relação a prática, o momento do primeiro contato com essa prática, então, é consequentemente muito esperado.

Penso que, de maneira geral, os cursos de formação de psicólogos deslocam a prática da teoria, uma vez que primeiro se preocupam em passar o apanhado teórico sobre funcionamento psíquico, entre outros conceitos técnicos, algumas vezes direcionado a prática da Psicologia a prática clínica, deixando de dar um suporte maior para as demais áreas de atuação, o que o aluno acaba percebendo nos estágios. Isso se deve muito ao tipo de prática existente no período em que o curso foi criado, quando a Psicologia era muito associada a intervenções individuais, mas principalmente em função da sociedade da época, considerada mais conservadora e interessada em explicar o porquê de determinados funcionamentos .

Hoje, o contexto social e cultural opera de forma bastante dinâmica, exigindo soluções rápidas, além de instaurar uma esperança em relação ao futuro, principalmente no que se refere a questões materiais. As relações sociais e familiares também se configuram de maneira distinta: as mulheres estão ampliando cada vez mais o mercado de trabalho, a família nuclear já não é a mesma, aumento da violência...., o que mostra um crescimento das relações interpessoais e sociais.

Qual o lugar do psicólogo frente a tudo isso? A Psicologia precisa e deve estar inserida nesse contexto, pois exerce grande função social. Esse lugar, de que falamos deve ser primordialmente apresentado durante a formação do profissional "psicólogo", até porque é nesse campo que relatamos que ele irá atuar e não no contexto em que o curso foi pensado.

Pensando assim , o presente trabalho pretende fazer uma reflexão sobre como se deu a formação do curso de Psicologia no Brasil, assim como os conceitos que o fundamentaram, para posteriormente podermos discutir suas implicações dentro da prática atual em Psicologia, tendo como base o depoimento dessa autora frente sua formação acadêmica, incluindo as experiências de estágio.


1.A PSICOLOGIA NO BRASIL.

A Psicologia, enquanto área de conhecimento, se afirma no Brasil desde o início do século XX, através de uma atuação voltada a intervenções inicialmente no meio pedagógico, e posteriormente a nível empresarial e de consultórios particulares, caracterizando uma intervenção mais individualizada.

Em 27 de agosto de 1962, com a lei 4.119, a Psicologia como profissão passa a ser regulamentada. Dentre as atribuições conferidas aos psicólogos pela referida lei, podemos citar: o diagnóstico psicológico, a orientação e seleção profissional, a orientação psicopedagógica e a solução de problemas referentes a ajustamento e adequação.

Com base nas atribuições citadas, e nas práticas vigentes no país até o momento, o Conselho Federal de Educação estabelece um currículo mínimo para os cursos de formação de psicólogos, com as seguintes disciplinas obrigatórias: Fisiologia, Estatística, Psicologia Geral e Experimental, Psicologia do Desenvolvimento, Psicologia da Personalidade, Psicologia Social, Psicopatologia Geral, Técnicas de Exame e Aconselhamento Psicológico, Ética Profissional; e três disciplinas das seguintes: Psicologia do Excepcional, Dinâmica de Grupo e Relações Humanas, Psicologia Terapêutica, Psicologia Escolar e Problemas de Aprendizagem, Teorias e Técnicas Psicoterápicas, Seleção e Orientação Profissional e Psicologia da Indústria.

Nesse sentido, a formação do psicólogo, recebe uma base extremamente tecnicista, voltada ao trabalho técnico para solução de problemas psicológicos, e aproximando-se um pouco do modelo médico, quanto ao seu espírito normativo. Isso se deve também ao fato de a formação em Psicologia, estar voltada para o patológico e calcada na crença de que o indivíduo possui possibilidades de sozinho responsabilizar-se pelo seu processo de individuação, como se tivesse livre arbítrio.

No entanto, essa Psicologia, tem nas mãos o homem concreto, um homem que está para além das técnicas de ajustamento e que se constitui enquanto sujeito no campo social.

A formação do psicólogo tem descolado o homem desse contexto que o determina, estudando-o de forma isolada. Com esse procedimento, o psiquismo acaba sendo tomado como algo já existente no homem, que se realiza, desabrocha, atualiza-se; o psiquismo é tomado como um a prior no homem. A realidade social aparece apenas como um "canteiro", onde a semente de homem, com sua natureza psíquica, pode se desenvolver. As condições materiais de vida não são tomadas como constitutivas do indivíduo.

O fenômeno psicológico tem sido visto de forma abstrata3, na formação. Ora como manifestação de processos internos, ora como produto de vivências externas, ora como conteúdo do mundo interno, ora como processo, mas sempre visto de forma abstrata. O fenômeno é visto como característico do homem e universal da espécie, sendo definido por um número enorme de palavras e expressões: manifestações do aparelho psíquico, subjetividade, consciência, inconsciente, engrenagens de emoções, conflitos pulsionais, psique, pensamento.

Tais expressões ligam a Psicologia quase que exclusivamente ao referencial clínico individualista. Os próprios pacientes trazem algumas vezes visões interessantes do funcionamento psíquico e explicações para as "personalidades": as chamadas doenças dos nervos, pancada na cabeça, convulsão quando criança, desgosto pelo filho ingrato e veio na hora certa; marido violento; vizinha invejosa. Segundo Jurandir Freire Costa4, essas "razões oferecidas por estes clientes como causa dos sintomas não são nem mais nem menos profundas que razões do tipo sou assim ou isso me acontece porque meu pai ou minha mãe agiram, sentiram e pensaram desta ou daquela maneira", que vem do referencial clínico individualista.

Há pouco consenso sobre o fenômeno psicológico entre os psicólogos, mas alguns elementos aparecem na maior parte das concepções: um fenômeno interior ao homem, que possui vários componentes e recebe influências do meio físico e social em seu desenvolvimento. A interação com o meio é portanto fator de desenvolvimento. Há nele algo de biológico e algo de social; algo de consciente e algo de inconsciente. É um fenômeno que se desestrutura, se desequilibra, se desorganiza, se reorganiza e o psicólogo parece ter os instrumentos adequados para lidar com ele.

Esta visão do fenômeno psicológico, o pensa como algo descolado, independente do indivíduo. Ele está transformado, no discurso dos psicólogos em um entidade que atormenta, restringe, possibilita, enriquece, movimenta-se, desenvolve-se; uma entidade que tem vocação, destino, percurso, uma realização a cumprir. Mecanismos universais caracterizam assim esse fenômeno.

Outro aspecto que chama a atenção na visão de homem é a existência de um "eu verdadeiro" que habita o indivíduo; um "eu" cheio de potencialidades, de habilidades, que com certeza estão referenciadas na idéia de natureza humana, e que não se manifestam de imediato. Esse "eu" deverá, no decorrer da vida, dependendo das experiências vividas, realizar-se, presentificar-se, atualizar-se. As condições sociais são aqui impeditivas dessa tarefa.

O sujeito social é uma relação praticamente inexistente. As relações apontadas como necessárias e importantes para o desenvolvimento do homem dizem respeito, fundamentalmente, às relações com os outros homens. Não são, no entanto, relações situadas no tempo histórico, em condições determinadas de vida, permeadas de significações e linguagens específicas, com condições de trabalho e formas de sobrevivência. Não há a visão de um conjunto de homens compartilhando esses elementos históricos e sendo determinados por esses elementos. O termo social parece se referir apenas à existência de outros homens.

A prática profissional, conseqüência destas concepções, é vista como uma prática técnica, isto é, uma prática que contém um saber (métodos, técnicas e teorias) que auxilia o desenvolvimento do homem. Auxilia a retomada de um "caminho desviado", auxiliam a resolução do sofrimento, o autoconhecimento necessário para o equilíbrio e a adaptação ao meio social. O trabalho busca esclarecer a escuta, conhecimento de aspectos desconhecidos, explicitar aspectos do indivíduo que ele desconhece etc. Não se coloca uma finalidade social ou política para essa prática. As finalidades estão ligadas apenas ao indivíduo e a um movimento que lhe é próprio, natural, que deve ser conservado ou reconduzido.

A prática muitas vezes, parece também associada à idéia de ajuda ao outro, de auxilio, de compreensão absoluta, busca de felicidade e equilíbrio, evidenciando uma onipotência da profissão. Nesse sentido, assume como chama Nietzsche5, uma "moral escrava", que considera como bom, o sujeito compassivo, humilde, que renuncia à raiva, a vingança, negando a si mesmo. O profissional parece ter em suas mãos à possibilidade de fazer do outro um homem feliz, colocá-lo em movimento, estimulá-lo, acompanhar seu destino, converter percepções em consciência, estruturar, transformar, humanizar, enfim, acredita que muito pode ser feito e muitas mudanças podem ser operadas com a ajuda do psicólogo, enquanto portador de um conhecimento e enquanto ser humano dotado de intuição.


2.CONCEITOS ESTRURANTES DESSA FORMAÇÃO

Como vimos até aqui, existe uma visão tecnicista que norteia a formação em Psicologia, que veio principalmente numa prática existente, mas também de alguns conceitos que validam essa visão como ciência e como prática, dos quais veremos alguns a seguir:

 

2.1 Identidade

O termo identidade é utilizado de várias maneiras dentro da formação em Psicologia podendo algumas vezes ser confundido com personalidade. Identidade serve para designar caracteres próprios e exclusivos de uma pessoa com a intenção de identificação dessa perante as demais em relação a sua profissão, sexo, estado ou comportamento. A denominação da identidade segue alguns regulamentos e códigos pré-fixados socialmente e que dão sentido, referencia e sentimento de identidade. Assim, podemos pensar que a identidade deva possibilitar a organização do campo social quanto a produção de vida coletiva, laboral e respeito mútuo, além de ser primordialmente estruturante e fundadora do ego. Mas será que este conceito, possui esta conotação ou todo esse "poder"?

"É exatamente esse tipo de problema que, para mim, fica mal colocado quando pensado nesses termos - nos termos de uma identidade, nos termos do poder que o ego tem de controlar as forças pulsionais do inconsciente, sob o domínio do superego, da lei, enfim de todos os sistemas de controle social. Penso que, ao contrário, a maneira como o ego, os indivíduos, os grupos sociais são modelados pelos sistemas capitalísticos contemporâneos é muito mais portadora de desordem e de entropia do que de sistemas de sensibilidade- aquilo que eu chamo de modos de semiotização pré-pessoais- sistemas que podem se desenvolver à revelia da dominação pelas estruturas de identidade."(Guattari, Félix & Rolnik, Suely. 2000, p. 66)


Considerando o que esse autor nos diz, podemos perceber que o que ocorre seria um associação dos modelos identitários apresentados pelo social com as estruturas psíquicas existentes em cada pessoa, a forma que cada uma tem de ver aquilo que se apresenta. Como se incorpora, cada característica como sendo sua, como fazendo parte de sua identificação, e esta como um modelo de identidade.

 

2.2 Personalidade

Este termo, tem sofrido grande variação em seu significado. Mas se pesquisarmos nos dicionários de Psicologia existentes veremos que a personalidade representa, essencialmente, a unidade integrativa de um ser humano, incluindo suas características diferenciais permanentes6 e seu modo peculiar comportamental, ou seja, a organização de aspectos afetivos, cognitivos, culturais, físicos e morfológicos. Podemos pensar a personalidade ainda a partir da origem da palavra, personalidade, vem da palavra latina persona que significa máscara, que por sua vez seria um objeto para resguardar o rosto de algo e simular outra, talvez como um disfarce, e podendo ter várias faces, fisionomias, não necessariamente humanas. Assim, segundo Alfredo Naffah Neto7, a personalidade pode ser vista como um "conjunto de qualidades ou características singulares que definem a esfera das máscaras", e a considerarmos pela forma humana, visto que o termo personalidade é aplicado à forma humana, "ela designa, pois, na sua dimensão múltipla e mutante, a realidade sensível do humano, na medida em que, por detrás das máscaras, não há qualquer outra realidade; apenas os campos de forças, nos acoplamentos, lutas, formando circuitos de produção."

O que é visível através do que a máscara apresenta é apenas o que pode ser codificado, existem aspectos marginais que escapam a codificação e são encobertos pela máscara, mas que nem por isso deixam de fazer parte da personalidade e dos circuitos que a formam. Pelo contrário, é através de sua liberação que a personalidade pode recuperar seu potencial construtivo e criador. Tendo em vista esse campo de forças em constante luta e conflito, podemos pensar que não há como definir a personalidade como uma totalidade, pois nada se integra, já que os circuitos se articularam pela diferença existente entre eles.

 

2.3 Maturidade

Podemos pensar a maturidade como um processo natural de amadurecimento, o ser humano nasce com o "destino" de ser homem, assim como uma fruta nasce para ser fruta, o que nos leva a crer que existe uma essência primordial a se desenvolver, a adquirir conhecimento. Vendo por esse lado, não há como vislumbrar mudanças significativas na estrutura psíquica, somente novas maneiras de ver com mais informação, mas com o mesmo principio. A maturidade pode ainda ser vista como um estado geral a ser alcançado de completude, estabilidade e integração física, mental e psíquica, de acordo com as vivências e exigências de vida de cada indivíduo. Considerando dessa maneira, a maturidade tende a vir como aumento da idade e no decorrer das fases psíquicas do desenvolvimento e indica que se está pronto para a vida na comunidade e para o convívio social.

" A maturidade psíquica caracteriza-se nas mulheres aos 17 anos e nos rapazes aos 18 anos pelo fato de que as aspirações e a vontade alcançaram uma forma estável e duradoura, e a busca de um motivo na vida chegou ao fim.

A maturidade social chega aos 22 anos para as mulheres jovens, e aos 24 para os homens. Caracteriza-se pelo aparecimento do impulso criador positivo e pelo reconhecimento dos aspectos supra- individuais da vida sociopolítica, a que se pode acrescentar o equipamento final para uma meta e a fusão de sexo e eros." (Arnold, W, Eysenck, L.1982 p.385)

Desse ponto de vista, há graus e ideais de maturidade a serem alcançados, um ponto a partir do qual não se precisa de "motivos para viver" e de onde não há mais o que desenvolver, e motivo para superação.

 

2.4 Auto-Conhecimento

O termo seria uma linguagem filosófico para expressar a compreensão do "eu" por si mesmo. Teoricamente, a formação em Psicologia não prevê exercício do auto-conhecimento, no entanto, preocupa-se com a compreensão do outro enquanto sujeito, partindo do pressuposto de que para analisar ou tratar desse outro deve-se primeiro submeter-se a uma auto análise, uma vez que o auto-conhecimento, implica em conhecer também as disposições individuais, capacidades, erros, fraquezas, convicções e reações, justificando que a falta da análise possa produzir erros de avaliação do outro (paciente).

 

2.5 Tratamento Psicológico

A palavra tratamento, é termo vindo da medicina, usado para designar o processo que levaria a cura do paciente, em Psicologia, o tratamento clínico, seria o processo que levaria o paciente ao auto-conhecimento e a dissolução de seus problemas psicológicos ou extinção dos sintomas que levaram o paciente a tratar-se. Atualmente esse termo encontra-se em desuso, sendo substituído por psicoterapia que segundo W. Arnold8 "refere-se a uma variedade de meios psicológicos usados para remediar os distúrbios mentais, emocionais e comportamentais." A psicoterapia se daria através de encontros entre o psicólogo/terapeuta e paciente, durante os quais, através do discurso do paciente se pesquisaria aspectos que levem a compreensão do paciente e de seu funcionamento.


3. IMPLICAÇÕES DESSA FORMAÇÃO NA PRÁTICA PSICOLÓGICA

De acordo com o que vimos até aqui, a formação do psicólogo tem estudado o homem de forma técnica, considerando a espécie humana, conseguindo assim ver o homem de forma genérica e abstrata, ao mesmo tempo que direciona a Psicologia para a prática individual e clínica, na tentativa de diminuir o mal estar psicológico do homem.

" O mundo e o desejo das pessoas sempre buscam a harmonia possível entre as demandas das pulsões e a afetividade de sua satisfação. Entre natureza e liberdade, o conflito continua a desestabilizar o sujeito, que busca uma harmonia ideal e um equilíbrio possível, para afastar, custe o que custar, o desamparo produzido por esse conflito. Além disso, para dominar o mal-estar produzido pelo desamparo." ( Birman, J. 1999, p.144)


Nesse sentido, podemos entender que na cultura contemporânea, há uma necessidade de rapidez nas diversas situações cotidianas, o que gera angústia crescente pela busca de soluções e respostas para dúvidas e incertezas, próprias da vida. Este momento estimula um continum do Ideal Platônico surgido na Grécia Clássica. Este ideal, traz a idéia de um homem ideal e perfeito e num sentido moral, sustentado pelo cristianismo, exigindo do homem a busca constante da perfeição- modelo dado. Esta idéia desqualifica o próprio homem e o denomina como sendo imperfeito.

A formação atual em Psicologia, através de conceito como maturidade, identidade e auto-conhecimento, se aproxima do Ideal Platônico, uma vez que existe um determinado nível de maturidade, um equilíbrio homeostático a ser alcançado, uma identificação a se ter. Mas que na verdade dificilmente é alcançado, o que existe são cópias que se aproximam mais ou menos do modelo colocado. Isso nos leva a pensar numa lógica da re-apresentação, os modelos são percebidos, transformados em imagem, e são nomeados a partir da representação, para somente então serem re-apresentados e classificados de acordo com as semelhanças.

Dentro dessa perspectiva, não se tem conseguido dar as respostas que as pessoas procuram e pedem quando chegam a um psicólogo, uma vez que este continua alimentando a lógica do sujeito e ao seu discurso, fica tentando interpretar e classificar em que nível de maturidade a pessoa se encontra, que modelo de funcionamento segue, ou seja, a profissional usa os conhecimentos que adquiriu durante a formação, tentando com isso encontrar a técnica de tratamento adequada aquele padrão de funcionamento, desconsiderando algumas vezes, os aspectos individuais que dizem respeito àquela respectiva pessoa, como modos de pensar e sentir o mundo, habilidades, potencialidades.

" Se procurarmos avaliar criticamente a função social preponderante que a Psicologia tem desempenhado, podemos reconhecer que, na maioria das vezes, tem se mostrado como guardiã da moral vigente, ocupando um lugar de docilização e domestificação dos homens, criando-lhes modelos refletidos em identidades mergulhadas no fundo negro do poço de supostas verdades, que não passam, aliás, de formatos humanos calcados na hemiplegia e na amputação da unicidade dos sujeitos." ( Fonseca,1999, p.61)


Essa forma de atuação, alimenta a associação cultural que se faz entre Psicologia e doença, ligando ainda mais a Psicologia ao modelo médico- paciente, o psicólogo é colocado no lugar de alguém que tem a capacidade de ajudar ao outro no sentido de faze-lo uma pessoa feliz, coloca-lo em movimento, converter percepções de consciência, promover mudanças no homem, principalmente por ser dotado de intuição.

O profissional fica descolado do campo social, que atualmente, encontra-se marcado por um campo de fluxos, em função do tempo e das relações que se estabelecem. Torna-se cada vez mais difícil estabelecer uma linearidade, o que por sua vez impede que se siga fases específicas de desenvolvimento, ou um padrão de funcionamento.

Com essa atuação a Psicologia, por vezes, deixa de desenvolver seu papel social, de promoção de saúde, de reflexão política e crítica, se prendendo a moral e a técnica.

Para que se possa sair desse lugar, é preciso que na formação, haja uma redefinição da identidade do profissional psicólogo frente a esse contemporâneo.


CONCLUSÃO

Por um longo tempo os psicólogos estão sendo formados, na perspectiva do individualismo, da naturalização do homem e do fenômeno psíquico.

A Psicologia no Brasil surge como uma visão técnica de intervenção, que influenciou a criação e fundamentação dos cursos de formação e na regulamentação da profissão. Essa visão, de certa forma, conseguia dar suporte e responder as necessidades culturais e sociais da época em que se constituiu. Porém, atualmente, se configura um outro mundo, com outros padrões de vida.

Frente a esse novo contemporâneo, o Psicólogo precisou redefinir seu campo de atuação, revendo sua identidade profissional. Isso implicou em um desapego dos padrões morais e técnicos, incorporados a profissão durante a formação acadêmica, em prol de uma atitude mais ética, estética e política, que desse conta do social e respondesse a demanda de trabalho atual. Além disso, se fez necessário a interseção de outros saberes, como forma de ampliação dos conhecimentos e compreensão mais global do homem.

Contudo, é fundamental que a formação acadêmica possa acompanhar todas essas mudanças no campo de trabalho do profissional em Psicologia, para que o aluno possa ser melhor inserido em sua área. Para isso, defende-se que uma formação mais pluralista e sólida que possa romper alguns conceitos limitados sobre a prática psicológica, trazida pela antiga visão social da profissão, e que encontram-se incorporadas nos alunos de inicio de curso. Essa formação deve ser mais generalista, no sentido de possibilitar uma atuação interpessoal, não limitada a prática clínica, mas que possa situar o aluno em outras áreas de atuação do psicólogo.

O ensino das técnicas deve ser entendido como elemento da praxis. As técnicas não podem ser ensinadas como elementos fechados em si, mas como instrumentos a serviço de uma finalidade, possibilitando que o aluno possa desenvolver em cima delas novas possibilidades de intervenção.

É interessante ressaltar ainda a importância de uma visão interdisciplinar, que amplie a visão do homem e a compreensão do fenômeno psíquico. Até por que a Psicologia não tem como dar conta da complexidade humana sozinha, na verdade ela pode e deve contar com outras áreas que possibilitam, troca de conhecimentos, informações e possibilitam um maior aproveitamento do trabalho a ser realizado.

A pesquisa deve ter lugar de destaque, construindo uma nova postura nos profissionais, de permanente curiosidade, crítica, insatisfação e busca do novo. Além de possibilitar uma constante visualização do contexto social, e consequentemente, um maior acompanhamento das demandas sociais.


BIBLIOGRAFIA

1. ARNOLD, W; EYSENCK,H.J; MEILI, B.R Dicionário de Psicologia. São Paulo: Edições Loyola. ,1982.

2. BÉRMUDEZ, José L. O paradoxo da autoconsciência. Lisboa: Instituto Piaget., 1998.

3. BIRMAN, Joel. Mal-Estar na Atualidade: A Psicanálise e as novas formas de subjetivação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1999.

4. BOCK, Ana Mercês B. Formação do Psicólogo: Um Debate a Partir do Significado do Fenômeno Psíquico. In: Psicologia Ciência e Profissão.1997.

5. COSTA, Jurandir F. Psicanálise e Contexto Cultural: Imaginário Psicanalítico, Grupos e Psicoterapia. Editora Campus.

6. CZERMAK, Rejane. Corpo e Sentido. In: Corpo e Psicanálise. São Leopoldo: Editora Unisinos,1998.

7. FONSECA, Tania Mara. A Invenção de Novos Mundos...Como Está a Psicologia no Final do Milênio? In: Educação, Subjetividade e Poder. Porto Alegre. v6, n6: p.57-62. Agosto 1999.

8. FREITAS, Maria de Fátima Q. Psicologia na Comunidade, Psicologia da Comunidade e Psicologia (Social) Comunitária- Práticas da psicologia em comunidade nas décadas de 60 a 90, no Brasil. Texto

9. GIACOIA, Oswaldo J. Nietzsche como Psicólogo. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2001.

10. GUATTARI, Félix & ROLNIK, Suely. Micropolítica: Cartografias do Desejo. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2000.

11. NETO, Alfredo N. Nietzsche. A Vida como Valor Maior. Editora FTD,1996. São Paulo.

12. NETO, Alfredo N. A Psicoterapia em Busca de Dionisio: Nietzsche Visita Freud. Editora Escuta e Educ. São Paulo,1994.

13. NETO, Alfredo N. O Inconsciente como Potência Subversiva. São Paulo: Escuta,1992.

14. NIETZSCHE, Friedrich. Genealogia da Moral: Uma Polêmica. Companhia da Letras. São Paulo,1999.

 

Notas

1 - Formanda em Psicologia pela UNISINOS (Universidade do Vale do Rio dos Sinos). E-mail: [email protected]

2 - Produção publicada no site Instituinte em 20 de maio de 2002. Esse texto é o trabalho de conclusão do curso em Psicologia na UNISINOS em São Leopoldo, novembro de 2001. Orientadora: Prof. Mestre Liane Pessin.

3 - Abstrato no sentido de abstraído, a característica vista separada do objeto a que pertence- o sujeito específico.

4 - COSTA, Jurandir F. Psicanálise e Contexto Cultural. Imaginário Psicanalítico, Grupos e Psicoterapias. Editora Campus.

5 - NIETZSCHE, Friedrich. Genealogia da Moral: Uma Polêmica. Companhia das Letras, São Paulo,1999.

6 - Atributos, constituição, temperamento, inteligência, caráter.

7 - NETO, Alfredo Naffah. A Psicoterapia em Busca de Dionísio: Nietzsche Visita Freud. Editora Escuta e Educ, São Paulo,1994.

8 - ARNOLD, W; EYSENCK,H.J; MEILI, B.R Dicionário de Psicologia. Edições Loyola. São Paulo,1982.


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