Textos del Cançoner de Barqueiros

Maria Adelaide da Silva Paiva, 1962


1   REIS

  Quem diremos nós que viva ?
Na folhinha de serpol,
o senhor administrador
é tão lindo como o sol.

  CORO
Vamos todos, vamos todos,
vamos todos a Belém
adorar o Deus Menino
que Nossa Senhora tem.

  Quem diremos nós que viva?
Na folhinha da nabiça,
viva lá o senhor abade
no altar a dizer missa.

  Quem diremos nós que viva?
No pelo do cobertor,
viva o nosso barbeiro,
que é um anjo do Senhor.

  Quem diremos nós que viva?
No fundinho da rasa,
viva o senhor professor
que é dono de esta casa.


2   ALELUIA

 Abri a porta
que aí vem Jesus
de braços abertos
pregados na cruz.

 CORO
Aleluia,
aleluia.
Já apareceu o filho
da Virgem Maria.

 Tremeu o sol,
escureceu o céu,
tremeu a terra
e Jesus morreu.

 Quinta-Feira Santa,
Sexta de Paixão
Sábado de Aleluia,
Domingo da ressurreição.


3   MAIO MÔÇO

 Era o Maio Môço,
era "boticairo".
Vendeu a botica
p'ra comprar um saio:
o saio rompeu-se,
botica perdida
vai pela rua abaixo,
vai pela rua arriba.
Ora viva, viva, viva!

 Era Maio Môço,
era celeirão.
Vendeu a botica
ao mata carvão:
o carvão gastou-se,
botica perdida
vai pela rua abaixo,
vai pela rua arriba.
Ora viva, viva, viva!


4  SÃO JOÃO

  Ai óe; meu rico São João,
ó ai ó meu santo marinheiro.
Ó ai, levai-me na vossa barca
ó ai, lá p'ro Rio de Janeiro.

  Ó ai, São João adormeceu
ó ai, no cimo duma ramada,
ó ai, a guardar as uvas
ó ai, para as dar à sua amada.

  Ai São João para ver as moças
ó ai, fez uma fonte de vidro.
Ó ai, as moças já lá não vão,
ó ai, São João vê-se perdido.

  Ai São João adormeceu
ó ai, em cima duma figueira,
ó ai, p'ra guardar os figos lampos
ó ai, e dá-los a uma solteira.


5  CANTILENA DOS PEDREIROS

  Ó pedra, ó!
Esta é a nossa surriba
ó pedra ó,
vai pelo monte arriba.

 Ó pedra, ó!
Gosto deste entremês
ó pedra ó,
rola mais uma vez

  Ó pedra, ó!
Está o trabalho feito.
Anda, vem ao meu mando,
que eu empurro com jeito.


6  SENHOR ARRAIS DO BARCO

  Ó senhor Arrais do barco,
olhe lá a sua barquinha,
olhe lá a sua espadela
que não esbarre na minha.

 Ó senhor Arrais do barco,
Caiu uma rata à panela.
Não me tire cá o caldo
que eu não quero comer dela.

  Ó senhor Arrais do barco,
salte fora e venha ver.
Venha ver a sua filha
que se vai "arreceber".


7  FUI AO DOURO ÀS VINDIMAS

  Fui ao Douroàs vindimas,
não achei que vindimar.
Vindimaram-me as costelas.
Olha o que lá fui ganhar!

  CORO
Retira-te das janelas.
Retira-te do balcão.
Vem comigo p'rás vindimas,
amor do meu coração.

  Não se me dá que vindimem
videirinha que eu podei.
Não se me dá que outros logrem
o que eu por gosto deixei.

  Não se me dá que vindimem
nem também de vindimar.
Só me dá das tristes noites
que se passam no lagar.

  Fui ao Douro às vindimas,
pagaram-me a trinta réis.
Vim pela Feira do Pêso;
empreguei-os em anéis.


8   AMENDOEIRA

  "Assubi" à amendoeira,
corri-a de nó em nó.
Tu falas com quem tu queres,
eu falo contigo só.

  Fui-me deitar a dormir
ao pé da água que corre.
A água me respondeu:
- Quem tem amores não dorme.

  No beiral do meu telhado
está no choco uma andorinha.
Todas as manhãs me pergunta
se ainda estou solteirinha.


9   Ó RAPAZ APERTA A FAIXA

  Eu de Trás-os-Montes sou.
A natureza bravia
em trono me colocou
de serras e penedia.

  CORO
Ó rapaz aperta a faixa.
Ó rapaz aperta bem,
que a faixa bem apertada
o rapaz parece bem.

  Se quiseres que eu te vá ver
além Douro, Margarida,
manda fazer um barquinho
da rosa mais colorida

  Atirei com uma laranja
de Vila Real ao Cais,
para ver se me esquecias;
cada vez me lembras mais.


10   DEITA A BARCA AO RIO

  Água do rio clara
deixa passar a barrenta.
Quem tem o coração duro
cai ao chão e não rebenta.

  CORO
Amor, deita a barca ao rio.
Deita a barca ao rio,
vamos barquear;
ai amor, se a barca tomba,
caio ao rio.
Não sei nadar!

  A água daquele rio
corre que desaparece;
quem tem amor vadio
tanto "alembra" como esquece.

  Minha mãe diz que não quer
ter um filho marinheiro.
Tem medo que lhe morra
nos embalos do Loureiro.


11   FLOR DA MURTA

  Eu hei-de ir e hei-de vir
p´la beirinha do mar.
Hei-de pedir ao barqueiro,
- Ó flor da murta -
ervinhas de namorar.

  CORO
Flor da murta, raminho de freixo,
não chores que eu não te deixo.
Amar-te sim, mas deixar-te não.
Ó flor da murta,
amor do meu coração.

  O meu amor me disse ontem
que eu andava coradinha.
Os anjos do céu me levem
- Ó flor da murta -
se esta cor não era a minha.


12   MORGADINHA

  Atirei com bolas d'oiro
à janela da morgada.
Acertei na morgadinha:
agora vou degredado.

  Agora vou degredado,
agora vou p'ra cadeia.
Acertei na morgadinha
que estava a fazer na meia.

  Que estava a fazer na meia,
estava a acabar um meiote.
Raparigas tende pena
desta minha infeliz sorte.

  Desta minha infeliz sorte
ó que dor do coração.
Dá-me um abraço que eu morro.
Dá-me um aperto de mão.


13   POMBA

  Olha a pomba que fugiu.
Deixou ficar o seu ninho.
Foi à beira do lagar
beber um copo de vinho.

  CORO
A pomba caiu ao mar,
a pomba ao mar caiu.
Nos braços do meu amor
agarrei a pomba e fugiu.

  Olha a pomba que já volta,
do passeio ao lagar,
muito feliz e contente,
toda branquinha no ar.


14   REPALHINHA

  O meu amor é da lua,
ele e meio aluado.
Até no pôr do chapéu
é meio atolambado.

  CORO
Á, á, á,
á, á, á, á, á.
Ò Zé vira-te p'ra mim,
ò Zé vira-te p'ra cá.

  Não me atireis com pedrinhas
que estou a lavar loiça.
Atirai-me com beijinhos
a modo que ninguem oiça.


15   OFTUM !

  Uma velha, muito velha,
mais velha do que o meu chapéu,
falaram-lhe a casamento,
ergueu as mãos para o céu.

  CORO
Oftum, oftum, oftum,
oftum, tá, tá, tá, tá.
Dá cá, toma lá,
toma lá este raminho.
Oh! que bem te ficará.

  Uma velha, muito velha,
mais velha que o meu colete,
falaram-lhe a casamento,
pós-se da cor do verdete.

  Caracol pela parede acima,
caracol pela parede abaixo.
Toma lá cuidadinho
não vás cair abaixo.


16   VENHA CÁ MEU AMORZINHO

  CORO
Venha cá meu amorzinho
que está das bandas d'além.
Venha cá, dê-me um abraço,
que lhe quero tanto bem.

  Eu quero bem ao cigarro
muito mais ao fumador.
Quero bem à minha sogra
que é a mãe do meu amor.

  Muito bem parece o preto,
ao pé do branco lavado.
Muito bem parece a môça,
ao pé do seu namorado.


17   VENHO DA BEIRA DO RIO

  Venho da beira do rio
de regar o meu nabal.
Trago aquí uma folha
no laço do avental.

  No laço do avental
vai o meu amor p'ra guerra.
Se ele for e não voltar
fecha-se aquela janela.

  Fecha-se aquela janela,
fecha-se aquele postigo.
Se ele for e não voltar
já não tenho mais marido.

  Já não tenho mais marido.
Jesus, que será de mim!
Já não tenho quem me regue
as plantas do meu jardim.

  Já não rego o meu jardim.
Já não rego o meu canteiro.
Roubaram-me o meu amor,
lá p'ró Rio de Janeiro.

  Lá p'ó Rio de Janeiro,
o tanque da água fria
onde o meu amor se lava
pela manhã ao ser dia.

  Pela manhã ao ser dia
roubaram-me o meu amor.
E eu cá fiquei sozinha,
valha-me Nosso Senhor!


18   MALHÃO

  Ó Malhão, triste Malhão,
ò Malhão, triste coitado.
Por causa de ti Malhão
ando triste, apaixonado.

  O Malhão quando morreu
deixou dito ao loureiro
que lhe forrasse o caixão
com folhas de castanheiro.

  Ó Malhão, triste Malhão,
ó Malhão que o não és.
Ó Malhão que te viraste
com a cabeça p'rós pés.


19   RAMALDEIRA

  Ó gira o fado
lá p'rós lados da Alagoa.
Minha filha já namora
com um soldado de Lisboa.

  Com um soldado de Lisboa.
Eu não quero furriel.
Não quero a minha filha
de sentinela ao quartel.


20   REGADINHO

  Ó meu rico regadinho,
que levas na tua mão?,
Um cacho de uvas do Douro
que consola o coração.

  CORO
Água leva o regadinho,
água leva o regador.
Enquanto leva e não leva
vou falar ao meu amor.

  Ó meu rico regadinho,
que levas no regador?
Levo-o cheio de vinho
para dar ao meu amor.

  Debaixo desta ramada
cheira a cravos que rescende.
Diga-me, ó minha menina,
se esta uva se vende.


21   CHULA RABELA

  Aqui têem meus senhores,
- Ouves, ó lindinha? -
a chula de Barqueiros!
São todos rapazes novos,
- Ouves, ó lindinha? -
arrais e marinheiros.

  Ó chula rabela, ó chula.
- Ouves, ó lindinha? -
Eu não te digo que não!
São rapazes de calça branca,
- Ouves, ó lindinha? -
e castanheta na mão.

  Dizeis que viva Barqueiros.
- Ouves, ó lindinha?
Por ter a frente caiada,
eu também digo que viva
- Ouves, ó lindinha? -
a bela rapaziada!

  Vou dar a despedida.
- Ouves, ó lindinha? -
Vou dé-la e vou-me embora.
São horas de "recolher",
- Ouves, ó lindinha? -
o canário à gaiola.


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