LIVRE-ARBÍTRIO
Você já ouviu, alguma vez, falar de livre-arbítrio?
Livre-arbítrio quer dizer livre escolha, livre opção.
Em todas as situações da vida, sempre temos duas ou mais possibilidades para escolher.
E a cada momento a vida nos exige decisão.
Sempre temos que optar entre uma ou outra atitude.
Desde que abrimos os olhos, pela manhã, estamos optando entre uma atitude ou outra.
Ao ouvir o despertador podemos escolher entre abrir a boca para lamentar por não ser nosso dia de folga ou para agradecer a Deus por mais um dia de oportunidades.
Ao encontrarmos o nosso familiar que acaba de se levantar, podemos escolher entre resmungar qualquer coisa, ficar calado, ou desejar, do fundo da alma, um bom dia.
Quando chegamos ao local de trabalho, podemos optar entre ficar de bem com todos ou buscar o isolamento, ou, ainda, contaminar o ambiente com mau humor.
Conta
um médico que trata de pacientes com câncer, que as atitudes das pessoas
variam muito, mesmo em situações parecidas.
Diz ele que duas de suas pacientes, quase da mesma idade, tiveram que tirar um
seio por causa da doença. Uma delas ficou feliz por continuar viva e poder
brincar com os netos, a outra optou por lamentar pelo seio que havia perdido,
embora também tivesse os netos para curtir.
Quando alguém o ofende, você pode escolher entre revidar, calar-se ou oferecer o tratamento oposto. A decisão sempre é sua.
O que vale ressaltar é que todas as ações terão uma reação correspondente, como conseqüência.
E essa reação é de nossa total responsabilidade.
E isso deve ser ensinado aos filhos desde cedo.
Caso a criança escolha agredir seu colega e leve uns arranhões, deverá saber que isso é resultado da sua ação e, por conseguinte, de sua inteira responsabilidade.
Tudo
na vida está sujeito a lei de causa e efeito, para uma ação positiva, um
efeito positivo, para uma ação infeliz, o resultado correspondente.
Se você chega no trabalho bem humorado, alegre, radiante, encontra seu colega
de mau humor, você pode decidir entre sintonizar na faixa dele ou fazer com que
ele se sintonize na sua. Você tem ainda outra possibilidade e escolha: ficar na
sua.
Todavia, da sua escolha dependerá o resto do dia.
E os resultados lhe pertencem.
Jesus ensinou que a semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória.
Pois bem, nós estamos semeando e colhendo o tempo todo.
Se semeamos sementes de flores, colheremos flores, se plantarmos espinheiros, colheremos espinhos.
Não há outra saída.
Mas o que importa, mesmo, é saber que a opção é nossa. Somos livres para escolher, antes de semear. Aí é que está a justiça Divina.
Mesmo as semeaduras que demoram bastante tempo para germinar, um dia darão seus frutos. São aqueles atos praticados no anonimato, na surdina, que aparentemente ficam impunes. Um dia, eles aparecerão e reclamarão colheita.
Igualmente os atos de renúncia, de tolerância, de benevolência, que tantas vezes parecem não dar resultados, um dia florescerão e darão bons frutos e perfume.
É só deixar nas mãos do jardineiro Divino, a quem chamamos de Criador.
Pense nisso!
E que seu dia seja muito feliz!
Ao
tratar das leis morais, que abrangem tanto a vida do Espírito no corpo quanto
no estado livre, "O Livro dos Espíritos" lança luz sobre uma das
mais tormentosas questões filosóficas de todos os tempos.
Realmente,
as mais antigas filosofias, assim como as religiões tradicionais do Oriente e
do Ocidente sempre encontraram dificuldades na formulação de suas doutrinas,
no que concerne ao entendimento da maneira de agir do homem.
A
liberdade, esse bem precioso de que goza o homem, pode ser tomada em seu sentido
absoluto?
Mas,
as circunstâncias da vida não estão a demonstrar que, em inúmeros casos,
parece imperar não a liberdade individual de decidir, mas um fatalismo
evidente, inamovível?
O
certo é que as escolas filosóficas e religiosas se perderam e se confundiram
em seus conceitos.
Era
necessária a vinda do Consolador para esclarecer aparentes contradições da
lei natural, que deve ser entendida como um todo homogêneo, perfeito, só
perceptível pelo homem quando conhecidas suas partes componentes tais como as
vidas sucessivas, o princípio da responsabilidade, a destinação do Espírito
imortal, a evolução dos seres e as demais leis morais. A individualidade,
criada simples e ignorante, goza do livre-arbítrio desde sua criação. Mas sua
liberdade encontra limitações na sua própria ignorância das leis da vida.
A
expansão de sua liberdade e da sua consciência vai ocorrendo paulatinamente,
na medida em que vai progredindo em conhecimento e em aquisições morais.
Desse
princípio resulta que o ser será tanto mais livre quanto mais sábio, mais
moralizado, mais evoluído.
Os
mais brutalizados são também os mais sujeitos ao cativeiro da ignorância.
A
liberdade do homem é, pois, limitada pela sua própria condição, sendo que
"no pensamento goza o homem de ilimitada liberdade, pois não há como pôr-lhe
peias. Pode-se-lhe deter o vôo, porém, não aniquilá-lo", ("O Livro
dos Espíritos", q. 833).
Há
que se entender, entretanto, que a liberdade de pensar é limitada pelo maior ou
menor conhecimento e moralidade de cada ser.
Da
liberdade de pensamento e de consciência resulta a liberdade de agir. O
livre-arbítrio, dom natural da alma desde sua criação, vai-se expandindo com
a evolução anímica.
No
estado de encarnado é evidente que a matéria exerce influência sobre o Espírito,
mas essa influência não é absoluta. A responsabilidade final é sempre do Espírito,
esteja ele livre ou sob a influência material.
As
inclinações para todas as modalidades de crimes e transgressões são, pois,
da alma e não do corpo, é manifestação da vontade individual, mesmo que sob
influência de outrem.
Esse
esclarecimento da Doutrina Espírita contraria frontalmente a teoria lombrosiana
do criminoso nato, pelos característicos físicos de seu organismo, hoje
felizmente abandonada pelas modernas teorias criminais.
Há
que se considerar ainda, em mundos materiais atrasados como o nosso, as diversas
aberrações das faculdades normais do homem, tais como a loucura, as obsessões,
o uso de drogas diversas, a embriaguez, os constrangimentos como a escravidão e
outros.
Aquele
que se acha turbado por uma causa que influi poderosamente sobre sua vontade,
evidentemente que já não goza de plena liberdade de decidir.
Mas
a lei divina, justa e abrangente, distinguirá cada situação, suas causas, os
compromissos abraçados anteriormente, as circunstâncias ocorrentes, para que
nunca haja injustiças.
É
comum, por exemplo, lançar-se à criatura ao uso de drogas e entorpecentes,
para que se encoraje na prática de crimes e transgressões morais. A turbação
da inteligência e dos sentidos não tira a responsabilidade de quem assim
procede, cuja decisão foi anterior ao uso das drogas.
Outras
situações peculiares são a da loucura, ou a da fascinação, em que o Espírito
está subjugado, sem noção clara do que pratica. Essas circunstâncias merecem
tratamento diferenciado na lei divina para a determinação da responsabilidade.
No
estado de selvageria, como no estado de infância, há que se considerar a
liberdade de agir com o instinto, que acompanha o Espírito como conquista
anterior ao seu estado atual.
A
lei natural considera as necessidades, a inteligência e o instinto na determinação
das responsabilidades, em cada hipótese.
A
posição do indivíduo no meio social, as exigências da civilização, as
imposições das legislações humanas são outros fatores que influem sobre a
liberdade de agir do ser humano.
Em
compensação, a lei divina, na sua amplitude e sabedoria, leva em conta todas
as circunstâncias ocorrentes e ainda o esforço individual para se ajustar a
ela.
O
homem forja, pelo livre-arbítrio, os efeitos das causas que ele mesmo prepara.
Ele
tem liberdade para escolher o caminho do bem ou as realizações do mal.
No
imo de sua consciência ele sabe distinguir o bem e o mal.
Por isso, sua liberdade de escolha acarreta-lhe a responsabilidade das conseqüências.
Esse
princípio, que o Espiritismo tornou claro, além de profundamente justo,
derroga inúmeros ensinamentos equivocados das religiões tradicionais e dogmáticas,
mostrando-nos a justiça, a grandeza e a beleza das leis de Deus, a Inteligência
Suprema, o Criador de todas as coisas.
Em
suma, o livre-arbítrio, dom divino do Criador, permite ao ser consciente e
responsável edificar seu destino, escolhendo os caminhos de sua ascensão, até
que, conhecendo a Verdade, estará integrado nela e liberto das inferioridades.
Nas
leis divinas, o livre-arbítrio conjuga-se harmoniosamente com o determinismo.
Num
e noutro sobrepões-se a lei do Amor para todo o Universo.
O
Amor Soberano é, pois, determinismo universal, abrangendo toda a criação.
Todas
as leis morais que a Doutrina Espírita resume na Parte Terceira de "O
Livro dos Espíritos" são determinismos da Providência Divina.
Tornando-se cada vez mais livre à medida que mais evolui, é lógico deduzir-se
que nos primeiros estágios de evolução, quando o Espírito ainda é atrasado,
mau ou ignorante, predomina aí o determinismo em sua existência.
Todavia,
torna-se necessário distinguir a subordinação da criatura no que concerne ao
mundo físico, aos fatos materiais, ao cumprimento de provas, conservando-se
livre no que diz respeito ao moral e às influências espirituais. No campo
moral predomina a liberdade de escolha.
O
determinismo divino é sempre o Bem. O mal é oriundo das ações humanas e dos
Espíritos que contrariam essa lei.
A
harmonização consiste no retorno à normalidade do Bem, através das retificações
dos desvios, que denominamos resgates.
Animais
e homens em grau extremo de atraso, de selvageria, são seres que, na Terra,
agem sob o império do instinto, e, conseqüentemente, do determinismo, diante
da carência de liberdade.
O
determinismo aparentemente inexplicável de certas expiações e resgates na
vida corporal - doenças incuráveis, deformidades genéticas, paralisias
cerebrais, síndrome de Down, cegueira, surdez congênita e outros males que
atingem milhões de seres - torna-se perfeitamente compreensível quando
conjugado com o livre-arbítrio do próprio Espírito que escolheu o resgate
doloroso, embora extremamente útil para ele, antes da reencarnação.
Aí
temos exemplo claro de que se torna impraticável o entendimento do determinismo
e do livre-arbítrio sem o conhecimento de outros aspectos das leis divinas,
como a doutrina das vidas sucessivas, os dispositivos da lei de causa e efeito,
a lei do progresso, a lei de liberdade com responsabilidade.
No vasto campo de experiências e de provações da Terra, seus habitantes estão
sujeitos a erros, por mais inteligentes e evoluídos que sejam. O importante,
para cada um, é a corrigenda, tão logo se dê conta do desvio.
O
procedimento daquele que erra, voluntária ou involuntariamente, enquadra-se nas
regras do determinismo divino e do determinismo humano.
A vida na Terra é transitória, embora repetida pela reencarnação. Ela
termina pelo fenômeno da transição, a que denominamos morte.
A morte não representa o fim do ser, mas apenas do corpo. A morte do corpo é,
pois, um determinismo da lei, que tem um momento para acontecer.
Esse momento pode ser antecipado pela vontade do ser (uso de sua liberdade),
através do suicídio direto ou indireto.
Em casos especiais, quando há interesse e proveito para o próprio Espírito, a
lei permite a modificação do momento do retorno, sob medida que escapa ao
nosso atual entendimento. São as prorrogações da vida carnal. Há, na vida de
todos que habitam este orbe, fatos e acontecimentos predeterminados que não
podem ser evitados.
Antes
da reencarnação o próprio Espírito optou por eles, em seu proveito e usando
de seu livre-arbítrio. É o determinismo conjugado à liberdade de escolha.
Entretanto,
o fatalismo absoluto, segundo o qual o homem não pode nada mudar, sendo simples
autômato, é que é mera ilusão, sem fundamento na lei natural.
Não
se pode, pois, confundir determinismo com fatalismo. A liberdade individual é
perfeitamente conciliável com a predeterminação de acontecimentos futuros,
com ou sem a cooperação do próprio ser.
Certas
doutrinas religiosas, sem fundamentação na realidade, favorecem a crença na
fatalidade, no "tudo está escrito", na espera dos acontecimentos. É
erro grave que o Espiritismo previne e retifica com as revelações novas.
Predestinação absoluta baseada em causa sobrenatural na fixação do destino, bem assim a doutrina da graça divina em favor de determinadas almas escolhidas são criações do homem que o reduzem a autômatos e rebaixam a idéia do Deus infinitamente bom e justo.
Livre
Arbítrio, Determinismo e Fatalismo
Autor:
JUVANIR BORGES DE SOUZA - Fonte: Revista "Reformador", Julho/1999