Reencarnações

Hakura Kusanagi
 
 

Capítulo 5

Acho que já se foram sete meses deste maldito ano, um ano que começou horrível e não tem maneiras de terminar melhor, acho que já vai ser extremamente bom se Shuuichi terminar o ano letivo e passar para uma faculdade, mas me contento com o término do ano. Meu irmão demorou muito para aceitar a mote de Shiori, os primeiros meses foram os piores, foi difícil para mim mais ainda, que tive que ser o mais forte de todos para que não piorasse, sem me abater na sua presença.

As lágrimas secaram, meus dias de lamento se foram e passei somente a fazer isso durante a noite. É realmente quando a tristeza bate e eu choro como nunca, desejando poder ver meus amores novamente; ouvir suas vozes, seus carinhos... tudo! Mas isso é impossível, o que me resta agora é ir vivendo a vida que este maldito deus me deu.

Shuuichi foi superando aos poucos com ajuda de meus amigos e de mim. Eles sempre saem com ele quando é possível ou vêm aqui. Eles ajudam em praticamente tudo! No meu serviço que acabei dando parte da empresa para Keyko cuidar junto com Kuwabara; já que eles são empresários, enquanto Yusuke fica com a parte do Makai, o controle de missões e pesquisas ao lado de Yomi e sua banca. Assim eles vão me ajudando no comando do Makai e Ningenkai.

Bom, como eu estou com isso? É difícil dizer, ás vezes ajo como um robô, apenas fazendo as coisas do cotidiano... apenas fazendo... pois minha cabeça está em outro lugar. Pensando em como isso foi acontecer, como num dia está tudo bem e no outro tudo na minha vida acabou? Os momentos de alegria se tornaram pequenos perto do que passo hoje, tem horas que me perco sentado em um jardim qualquer, sozinho, e então o coração aperta, o peito se espreme e quando noto, as lágrimas estão novamente tomando conta do meu rosto, e trazendo aquela dor de volta.

Tenho que agradecer por meu irmão estar aqui, assim tenho algo que ocupe minha mente nos tempos vazios, me trazendo até períodos de felicidade que já tinha me esquecido como eram. Juro que não sei por quanto tempo vou agüentar isso. Mas estou sendo forte... como hoje que resolvi arrumar o armário de kaasan e jogar fora seus pertences.

A dor que sinto ao lembrar de pequenos momentos que não existiam quando era youko, quando não me preocupava com nada nesse mundo e a solidão era minha companheira de todos os dias... e de repente quando me encontro com tais sentimentos e aprendo a viver ao lado deles; é tudo arrancado de mim como forma de punição por algo que talvez nunca venha a lembrar. Isso só me faz perceber que aquilo era bom... ser um ladrão, um assassino... tudo certo e perfeito...

Mas amar é bem melhor, esplêndido, era o que faltava na minha vida como youko para substituir o vazio que ocupava meu coração ... e a sensação de que acabou é bem pior do que a de não ter nada. Não sei nada desse assunto, como posso me portar para isso desaparecer, como posso reagir para tudo ir embora ... nada! Pareço Hiei ... sem saber nada de nada... não aprendi a reagir a isso.

Não sei me portar como aquele youko que é insensível a tudo e a todos... e não posso voltar a ser ele. Era mentira!

- Preciso parar de pensar nisso.... tenho que arrumar o resto das coisas que faltam .... – falo para mim mesmo, puxando do armário uma caixa que mamãe guardava com carinho.

- Ah?! O que é isso ?.... Não... não... pode ser!!!

A caixa caiu no chão com o susto de Kurama e algo lá de dentro acabou soltando-se: uma pequena rosa negra que caiu do bolso de um terno. Era um conjunto de casamento, a roupa que Hiei usara no dia que os dois finalmente se uniram, para o que pensavam ser a eternidade.

Assim que Kurama viu aquilo sua mente voou para o passado.

* * * *

Estava numa linda amanhã de primavera no Makai, o único local em toda aquelas trevas que estava florido e perfumado, repleto de alegria. Como era bonito ver seu lindo koorime de fogo vestindo o fraque que sua mãe lhe deu; ele tinha um descontraído sorriso na face, seus olhos vermelhos nem sabiam como reagir a um ser belo como estava Kurama a sua frente. Sua única vontade era de beijá-lo ali mesmo na cerimônia antes mesmo do "sim".

Aquela felicidade que se espalhava pelos seus amigos e nele mesmo era puro sonho ...

Em segundos a realidade o tocou e foi como um espelho tivesse quebrado em diversos pedaços. E esses eram seu coração, suas lembranças, seus sonhos, os tempos bons com seu koibito depois do casamento... em casa abraçados... juntos debaixo das cobertas... arquejando de prazer com seus beijos... recordações... Só isso restava, só o passado... sem qualquer perspectiva para o futuro... que não existia...

Kurama caiu ajoelhado quando toda aquela saudade o tocou como um raio e as lágrimas voltaram ao seu rosto pálido, uma a uma. Seus braços envolveram-se nas pernas junto com o tecido da roupa de seu koorime e ele ficou se esfregando como se fosse o próprio.

Neste momento, ele só conseguiu almejar por sua vida ali ao seu lado e agora as lágrimas não desciam mais, seus amigos estavam vindo nesse exato momento para ajudá-lo.

Yusuke, Keiko, Kuwabara, Shizuka, Yukina e Botan... eles entraram na casa procurando por seu amigo, mas nada de resposta, já começavam a ficar preocupados quando Botan ouviu uns soluços vindos do segundo do segundo andar.

- Vocês estão ouvindo? Vem lá de cima!

- O que foi, Botan? – perguntou Yusuke.

- Acho que ouvi seus soluços daqui de cima, parece que vem do quarto de Shiori. Esperem só um pouquinho que vou verificar! – Botan saiu correndo pelas escadas enquanto os outros ficaram a esperar, até que ela retornou, assustada com algo que viu e falando desesperada.

- O... o ... Shuuichi.... o.... Kurama.... lá... no quarto...

- Calma, Botan. Fale devagar, nós não estamos entendendo nada! – disse Kuwabara.

- Você está com uma cara horrível! Aconteceu algo com Kurama? Ele está passando mal? – perguntou Yukina.

- Doente? Desmaiou? – perguntou já em desespero como todos, Yusuke.

- Não ... não ... eu não sei!

- Como não, Botan?! – falou assustada Shizuka.

- É ... que ele está ajoelhado e encolhido no meio do quarto de Shiori, sem se mover, chorando! Venham aqui em cima logo, por favor!

Todos subiram correndo até o quarto de Shiori e paralisaram ao ver que Kurama não se mexia, envolvendo o casaco de Hiei em seus braços e chorando sem parar. Nem se quer podia-se ver seu rosto, coberto por suas mechas ruivas e pelos soluços.

- Kurama! Kurama! – gritou Yusuke e Keiko.

- Minamino! O que houve, você está bem? – perguntou, assustada, Shizuka.

- Por favor, responda! – gritaram as últimas pessoas.

Mas Kurama não respondeu, apenas continuou a chorar e sussurrar o nome de seu marido. Eles tiveram que se aproximar e abaixar para poderem ouvir o que tanto sussurrava.

- Hiei... – ele soluçava baixinho - ... Hiei... okaasan ... eu estou sentindo falta ....

- Kurama?! – falou Botan – Por favor acalme-se, seus amigos estão aqui, você não está sozinho.

- Isso mesmo, não precisa ficar chorando sem ninguém. – disse Keiko.

- Eu... eu... não consigo... não... param... – ele gaguejou, agarrando aquele pedaço de pano com mais força.

- Então chore, Kurama. Mas ao nosso lado, abraçado àqueles que te amam e que te querem bem. Me abrace, não a uma recordação de meu irmão.

Yukina segurou os braços da raposa e os afastou daquela lembrança, fazendo com que ele se envolvesse em seu peito. Ela começou a acariciar delicadamente seus cabelos e dando beijos em sua testa, enquanto todos o envolveram num forte abraço para que ele finalmente se acalmasse.

- Você está melhor, Kurama? – perguntou Yukina , colocando-o calmamente na cama.

- Huh.. huh... – ele sacudiu a cabeça como sim e Shizuka veio com um copo d’água e umas bolinhas de remédio e estendeu para que tomasse.

- Toma Kurama-Kun. Isto aí vai te fazer sentir melhor, descansar um pouco como a muito tempo não tem feito.

- Nós cuidamos da arrumação para você, agora vai para a sua cama e durma um pouco. Sabemos o que isto significa para você, não desabou por causa do seu irmão e agora esta saudade te pegou, mas não se preocupe... vai passar...- Urameshi falou.

- Não sei... estou cansado... cansado de lutar... era tudo mais fácil... – ele suspirou fundo e abaixou a cabeça, procurando com as mãos conter uma teimosa lágrima de descer. Os olhos piscavam continuamente e o corpo amolecia. Kurama logo, logo dormiria ali mesmo se não o levassem para seu quarto.

As meninas ficaram encarregadas de Shuuichi, trocaram suas roupas e assim que elas foram arrumar o resto do quarto, ele deitou afundando o rosto nos travesseiros e o abraçou, fechou os olhos, encolheu um pouco as pernas e adormeceu...

Quando as garotas o viram trataram de aconchegá-lo nas cobertas.

- O remédio deve ter feito efeito, graças a Deus! – falou feliz Shizuka.

- Ah... como tenho pena de Kurama-San , ele perdeu toda a sua vida em menos de dois anos, viu sua felicidade desmoronar na sua frente sem poder fazer nada. Ele era tão apegado aos laços humanos que agora não sabe o que fazer.

- Sabe, amigas? Meu irmão era minha família, meu sangue, mas antes de conhecê-lo vocês eram minha única família e com quem pude contar. É triste ser sem ninguém, Hiei-San quando morreu me fez sofrer também, mas imagino que minhas lágrimas não foram nem um terço das de Kurama. Meu oniichan escondeu isso de mim, por tempo suficiente para que nossos laços fossem menores, ele queria que sofresse menos com sua morte, parece que já sabia o que ia acontecer. Infelizmente, não fez isso por seu amor e se entregou de corpo e alma. Esse youko/humano foi tudo que lhe restou de alegria e nesse caso não houve mentiras ou medidas. Foi de forma extrema e se um morresse o outro iria junto, carregando seu coração. - terminou espantando uma lágrimma a garota de gelo.

- Concordo, mesmo com toda a força que esse youko tem, ele não conseguiu agüentar a perda das duas pessoas que mudaram sua vida e nem ao menos teve tempo de agradecê-las... isso é triste... – falou Keiko, enquanto afastava uns fios vermelhos da face da raposa para poder dar um beijo de boa noite.

- É melhor deixarmos Kurama dormir em paz. Eu queria poder ajudá-lo, mas não sei onde possa estar o espírito de Hiei, não cuido dessa parte para onde ele foi destinado a ir. - disse Botan fungando, acertando seus cobertores na cama.

- Tudo bem, não há nada o que se fazer, o melhor agora é animá-lo e seu irmão. Vamos, meninas. Temos que terminar de arrumar a casa e arranjar algo para que ele coma quando acordar. – disse Shizuka, seguindo o caminho da porta.

* * * *

Algumas horas se passaram até os rapazes terminarem de separar todos os pertences de Shiori e Hiei, colocando numa enorme caixa. Eles também arrumaram a casa toda e limparam. As garotas organizaram o jantar.

Com tudo pronto era só chamar o youko/humano.

- Kurama... hora de acordar... – ela se aproximou da cama e com uma leve balançada de suas mãos em seu ombro tentava acordá-lo.

Ele mexeu um pouco o corpo nos cobertores, moveu a cabeça nos travesseiros e sussurrou meio sonolento.

- Kaasan ... é você?

- Não , Kurama-San ... infelizmente não. Sou eu, Botan, está na hora de acordar para comer algo. Vamos, venha...

Ela acariciou a face do youko/humano que se mexeu mais um pouco, abrindo os olhos como se estivesse embriagado pelo sono; então suspirou:

- Botan?! ... Não estou com vontade ... de comer... quero ... dormir ...

- Chega de dormir, agora vai comer. Se quiser, mais tarde pode voltar a dormir. Venha, querido.

Botan puxou suas cobertas e o puxou com carinho para fora. Ele se apoiou nela e forçou a acordar o corpo e fazer o que lhe mandava.

Na cozinha cumprimentou a todos e se sentou para comer o maravilhoso jantar que haviam preparado para ele.

- Está bom, Kurama-San? – perguntou Yukina.

- Está sim... delicioso...

- Não parece. Você não está comendo nada. – argumentou Yusuke.

- Não há nada de errado Urameshi, ele ainda deve estar com sono, não é mesmo, Kurama?

- Isso mesmo... Keiko... – ele falou colocando a mão noa boca , contendo um bocejo - Gomen nasai.... estou cansado...

- Tudo bem, Mino. Desde que coma direto. Aproveitando a brecha, quero dizer que já arrumamos tudo para você. Está tudo empacotado. Deixamos algumas coisas para você fazer, pois não sabíamos onde pôr ou o quê fazer com elas. Fizemos o nosso máximo.

- Arigatou ... minna ... eu não teria a mínima condição de mexer nisso. Eu ... eu ... ainda não sei ... como desfazer de minha ... vida assim ... – ele parou de falar e se pôs a soluçar sem que as lágrimas descessem .

- Kurama, o que houve? – perguntou horrorizado Kuwabara.

- Não sei... dói... maldito deus! Quer me privar até dessas lágrimas ... eu o odeio!!! Quer que eu sofra mais? É isso?! Me deixe em paz! Me deixe chorar por eles!!!!

Kurama abaixou a cabeça e as gotas d’ água caíram por seu rosto, manchando-o de mais dor. Seus amigos se levantaram e o abraçaram como para confortá-lo de tanta agonia.

- Perdoe Deus e a nós. Ás vezes tudo devia acontecer, o destino já está traçado e não há nada que possamos fazer para mudá-lo, a não ser lutar para viver. – falou Botan.

- Amigo, não fique assim. Se esforce para vencer esta tristeza, mesmo que chore um dia, tente no outro se alegrar e despontar um sorriso. – estimulou Kuwabara.

- Não se preocupe! Estaremos sempre aqui para o que necessitar, seremos sua família se quiser ! – animaram Shizuka e Keiko.

- Basta pedir ! – completou Yukina.

- Arigatou, amigos ... – ele sussurrou entre o seu choro.
 
 
 
 

* * * *

Finalmente meu irmão está fora de casa, meus amigos saíram com ele em um passeio maravilhoso de uma semana, aproveitando o feriado. Bom para eles, assim distraem a cabeça dele. Tentaram me convencer a ir também, mas preferi ficar aqui mesmo fazendo meus serviços.

Não estou servindo como companhia para ninguém, não tenho mais aquele humor de antes, os sorrisos praticamente desapareceram. Então forço tudo com o meu clássico fingimento. Faço o possível para que Shuuichi não note o desespero que minha alma está caindo aos poucos, acredito que minha solidão não se tornou maior por estar cercado de amigos que querem apenas que eu volte a sorrir.

Tenho me saído bem por enquanto, tento me confortar com o trabalho, fazendo o meu máximo. Assim as noites de insônia vão se indo como dias. Tento fazer o Ningenkai se aproximar cada vez mais do Makai e suas ligações se tornarem sólidas. Vivo para isto, para que meu oniisan continue estudado e se forme, tenha uma família e seja muito mais feliz do que eu.

Cada um deles tenta dividir seu tempo comigo, seu amor... Ahhh... amor... uma palavra a tanto tempo esquecida por mim ... só tenho a minha solidão, nada mais.

Como agora... estou no meu quarto, sentado na escrivaninha em frente aos milhares de papéis e livros como nos velhos tempos; a mão que apoia a cabeça aproveita para massageá-la, amenizando a dor. A luz fraca da luminária traz um tom sombrio às fotos antigas de pessoas queridas como se fosse a própria morte que as levou.

As cortinas balançam suavemente com a brisa lá fora, é tudo semelhante há anos atrás, quando Hiei ainda entrava pela janela e ficava no parapeito me observando, com seus lindos e fugazes rubis... Era tão bom... os velhos tempos eram tão cheios de esperança... e agora só tenho a sombra da morte ao meu lado... nem sequer minhas rosas conseguem florir como antes... meu ki não tem mais vontade de dar vida a nada... como meu coração...

Eu deslizo os dedos pelas mechas ruivas embaraçadas e depois com um passar de mão apago a luminária e depois com um puxão fecho a cortina, em segundos escorrego pelos lençóis, procurando o calor das cobertas para substituir o de meu fogo.

Por quê tirou todos de mim ? Por quê apagou a luz das minhas manhãs?

Fecho os olhos e minutos depois estou sonhando ...
 
 

- Hiei!! Hiei!! Onde você está? Me abrace... onegai, eu... preciso de seu calor!!!

Acordo gritando seu nome pelo quarto, procurando por ele nos lençóis... em toda casa... um vulto rápido de olhos vermelhos sorrindo para mim...

- HIEI!! Meu itoshii, você está aí?

A luz se desfaz, é só mais um sonho acordado...

Eu suspiro fortemente, soltando o ar pelos lábios, o som é tão atordoante quanto meu próprio coração batendo... a casa vazia...

Esfrego os olhos que agora ardem... a boca com gosto salgado de algo que não consigo evitar mais... as mãos se agarrando nas mechas ruivas com força e a dor na cabeça que não pára!

Nada pára! As dores pelo corpo... em cada canto, de forma que não consigo levantar sequer para tomar um remédio. Como se isso fosse resolver... Nenhum deles vai curar o que está se passando aqui dentro do meu peito... nenhum.

Estou morto por dentro, percebo isso quando passo os dedos pelo cordão pendurado no meu pescoço. O pingente com sua gota de cristal em seu dragão... eu o beijo como se pudesse senti-lo. Mas só me resta lençóis frios e sem vida.

- Como eu te queria aqui... koibito...

Eu sussurro com uma fungadela e volto a me deitar, puxando mais as cobertas para abafar esse estranho frio que sinto dentro de mim, abraçando os travesseiros e deixo o sono me pegar novamente, dessa vez um sem sonhos.

* * * *

" Kurama! Kurama-Sama! Você está aí? Tem alguém em casa? Sou eu, Shura? "

Eu procuro o telefone com as mãos, ainda meio sonolento e atendo.

- Moshi- moshi?!

" Até que em fim, Kurama-Sama! Já estava desistindo de te procurar por telefone e iria optar por uma ida ao Ningenkai. Pô, três dias é tempo demais sem atender essa porcaria! Que coisa! Estávamos ficando preocupados!"

- Gomen nasai, Shura-San. Acho que peguei no sono e não ouvi o aparelho tocar.

" Pôxa, mas três dias direto ?!"

- Estava com trabalho atolado e aproveitei o pouco tempo que me sobrou para colocar em dia, acabei me cansando e adormeci. Acho que passei dos limites, né?! - eu contenho um bocejo.

" Se é assim, tudo bem, "Pa" pediu para ligar enquanto está viajando, para ter certeza que tudo tá ok."

- Ah... só podia ser coisa do Yomi mesmo, como sempre me tratando como se fosse uma kitsune adolescente ... humph! Mande ele não se preocupar, estou ótimo!

" Tem certeza mesmo? Está com uma voz horrível, se quiser posso dar uma passadinha aí?"

- Shura não se preocupe... eu estou muito bem sozinho, mas o que quer mesmo é vir aqui, né?!

" Hummm ... bem .. eu só não acho legal ficar aí sozinho numa casa como essa."

- Estou certo não estou?!

" Humph! Droga você me pegou, meu pai queria que fosse para aí ou viesse para cá."

- Sabia! Conheço vocês, avise a ele que já estou crescidinho e posso me virar muito bem sozinho. Agora me deixe em paz, tenho serviços para terminar. Da próxima vez me ligue por algo sério, ok?!

" Tá bom, não ligo mais, já vi que está bem até demais! Hñ!"

- Ótimo! Sayonara!

" Sayonara, Kurama-Sama e boa tarde."

Ele desligou ... que bom ... estava ficando cansado de ter que fingir. Andei dormindo direto por cinco dias e nem me dei conta disso. Meu corpo anda sem forças até para levantar, não tenho tido vontade de comer e pesadelos aparecem vez ou outra.

Viro nas cobertas e as agarro, fechando os olhos para que possa apagar um pouco da realidade fria em que vivo.

- Não quero ... levantar .. não tenho vontade ... alguma de fazer algo....

Eu sussurro e minutos depois caio num sono onde a tristeza me leva á alguns momentos de alegria .

* * * *

Yusuke, Kuwabara e Shuuichi, adentraram felizes gritando por Kurama pela casa toda. Acabando de chegar da viagem e queriam fazer uma surpresa para ele, chegando um dia antes para seu aniversário.

O rapaz de cabelos castanhos saiu correndo pelas escadas, gritando o nome do irmão e subindo diretamente para o seu quarto.

Yusuke foi o primeiro a notar as diferenças, pois nada na cozinha havia sido tocado a algum tempo e o mesmo para seu escritório.

- Yusuke tem algo de errado por aqui, não acha? Kurama era para estar a essa hora em casa e nem mesmo dormindo poderia ser, acho pouco provável ... é hora do almoço.

- Sei lá, não faço a mínima idéia do que possa estar a acontecer. Será que saiu em uma missão do Makai?

- Mas justo no aniversário dele? Pelo menos poderia ter nos avisado ou a Koenma... ou a qualquer outro daqueles chefões... hipótese descartada!

Até que eles ouviram o chamado de Shuuichi e por parecer preocupado os fez correr ao andar do quarto da raposa.

- O que foi Shuuichi-San? O que aconteceu?

- Isto tios, olhe só para meu irmão.

Eles o fizeram e viram a raposa adormecida profundamente em suas cobertas, seu rosto sendo tocado apenas por uma provável luz que vinha do sol espantado pelo vento através das cortinas fechadas.

O rapaz entrou calmamente pelo quarto e se aproximou do corpo do youko/humano, apenas para notar como o seu suspiro era forte e seus lábios formulavam os nomes de seus dois amores, conforme uma sutil gota descia por suas bochechas.

Quando ele tocou sua face, foi sua vez de deixar lágrimas correrem, os outros se aproximaram e com um forte apoio em seus ombros falaram.

- Não fique assim, seu irmão vai ficar bem... – disse Yusuke.

- Não, ele não está bem. Ninguém dorme por tantos dias. Meu oniisan continua chorando só que escondido de mim.

- Por favor, não deve ser nada disso rapaz, imagina só essa raposa forte do jeito que é, dormindo por tanto tempo?! O que é isto, ele apenas está cansado pelo excesso de trabalho. E hoje passou da hora . – confirmou Kuwabara .

- Olhe, provavelmente está tendo um daqueles sonhos tristes. Não se preocupe, agora enxugue essas lágrimas, pois Kurama não gostaria de vê-lo assim. Temos que preparar sua festa surpresa!

- É mesmo, tio Yusuke. Agora vai ser melhor quando meu oniichan acordar vai ter a surpresa de cara, com seus amigos todos aqui! – ele enxugou a cara e sorriu.

Assim eles desceram em seguida deixando Kurama dormindo.

Cada um deles mentia para si mesmo, acreditando que realmente a raposa estava bem e superando tudo aquilo, agora eles só queriam deixá-lo feliz. Uma festa linda para comemorar seus vinte e cinco anos, algo que o animasse muito e o fizesse esquecer de tudo o que vem passando.

As horas foram indo e quando era tarde da noite, seus amigos tinham arrumado tudo e se preparavam para receber os convidados e acordar a raposa com um belo feliz aniversário.

- FELIZ ANIVERSÁRIO, MINAMINO SHUUICHI!!!!!!!!

- Ah?! O quê?!

Ele olhou assustado, ainda esfregando os olhos com sono mas quando se deu conta estavam todos abraçados a ele, quase sufocando-o na cama de tantos beijos.

- Hummm.... parem com isso!! Chega! Querem sair de cima de mim? Estão me esmagando! – a raposa protestou assim que todos saíram de cima dele e começavam a rir as custas de sua face ruborizada.

- Que tal, oniichan, gostou da surpresa?

- Hum... claro! Apesar que vocês quase me mataram do coração com esse susto! – ele reclamou abraçando o garoto e sorrindo.

- Vai me dizer que iríamos esquecer de seu aniversário, Kurama? Claro que não! – disse Shizuka acendendo um cigarro.

- Bom, mas é melhor sairmos logo daqui, temos que deixá-lo se arrumar para os convidados da festa. - disse Keiko.

- Convidados?! – Kurama franziu a testa com um ponto de interrogação.

- Isto mesmo, raposa dorminhoca, fizemos uma festança lá em baixo e você nem acordou, tem convidados esperando-o para dar os parabéns. – deu um belo sorriso Urameshi.

- Ah, deus! Não acredito que dormi tanto assim? – a raposa pôs as mãos na testa e sacudiu a cabeça.

- Exatamente! Agora nós vamos embora! – falou Kuwabara.

- E você se arruma! – completou Yukina.

- Bye bye!

Se despediram todos, e logo depois Kurama estava arrumado e curtindo a festa.

* * * *

É bom alguém feliz nessa casa, trouxe um pouco de vida a este lugar. Infelizmente não tenho muita sorte. Engraçado, nunca vi o aniversariante fugir da festa, mas aqui nesse jardim encontro um pouco de consolo que estou precisando.

Procuro por cada canto até achá-la, quase morta e esquecida num canto.

- Então, está aí. Me desculpe por ter te abandonado, minha linda rosa negra. Não quero que aconteça o mesmo que com meu amor.

Aproximo-me dela e ajoelho, levando minhas mãos até uma de suas pétalas e dou um pouco de youki e logo ela reage, ganhando um brilho espetacular e uma vida que queria poder ter dado aos meus amores. Plantei-a para poder lembrar dele quando estivesse aqui, mas agora o propósito é outro, a saudade bate no cantinho do meu coração e fico aqui, quietinho num canto isolado de todos.

* * * *

- Kurama-Sama !!! Kurama-Sama! Você está aí?

A voz de Yukina ressoa pelo jardim até me atingir.... aquele tom... Ela provavelmente está me procurando.

Eu respiro fundo e depois respondo.

- Kurama?! Até que em fim apareceu, pensei que estivesse ... – ela para um pouco para pensar no que vai falar e continua como se quisesse me analisar com aqueles olhos – Eu fiquei perdida nesse jardim. É tão grande...

- Me desculpe, Yukina, eu resolvi sair um pouco para olhar minhas plantas que a tanto tempo andam esquecidas e acabei perdendo a hora.

- Tá bom, agora venha! Tem presentes para você!

- Presentes?! E do Makai?!?

- Isto mesmo. Agora venha!

Ela me pega pelas mãos e voltamos para dentro da casa e os presentes estão lá me esperando mesmo: um de Yomi e outro de Mukuro. Uma túnica completa e uma flor das trevas que Hiei sempre gostou. Na verdade, tem seu cheiro. É, eu gostei de cada um deles e espero usá-los logo.

* * * *

A festa correu e quando a bagunça terminou seus amigos foram foçados a arrumar tudo .

- Ei Yusuke, viu o Shuuichi por aí?

- Não, acho que ele foi posto na cama pelo irmão!

- Não seu estúpido, eu estou justamente falando do seu irmão! – respondeu Yusuke.

- Ah... sim ... bem, acho que está no quarto. Não se preocupe, Yukina-Chan foi vê-lo. O que acho é que Kurama ficou bem feliz com isso.

- Claro! Ele até mandou que arrumássemos essa bagunça toda antes da manhã de amanhã!

- Rá! Rá! A nossa raposa voltou ao normal! – ele riu feliz acompanhado de Kuwabara.

* * * *

Enquanto isto, Yukina estava abrindo a porta do quarto de Kurama e o encontrou sentado na bancada da janela, olhando para o amuleto de prata em suas mãos de forma cálida. A suave brisa noturna trazia as pétalas de cerejeira aos seus cabelos, envolvendo-os como se fossem dedos humanos.

A visão da garota de gelo era maravilhosa, de raios meio avermelhados alcançando aquela túnica semi aberta que ganhara de Yomi, ela não se conteve e lançou um comentário.

- Você está lindo Kurama-Kun! Muito lindo mesmo! – ela deu um belo sorriso se aproximando e o youko a recebeu com youki ameno como o perfume daquelas flores.

- Arigatou, Yukina-San, o que deseja?

- Vim apenas ver se estava tudo bem com você. Sabe, este colar é muito lindo, pensei que o tivesse guardado, pois nunca mais o vi.

- Não, eu nunca iria colocá-lo numa gaveta e esquecê-lo. Este presente foi de Hiei e, como ele, jamais esquecerei de sua linda gema de lágrima. Apenas estava escondido no meu peito ao lado do mesmo lugar onde está meu koorime. – Kurama retornou o colar ao pescoço e desceu, voltando-o às lindas pétalas que caiam.

- Isto é maravilhoso, coisa assim são tão raras de acontecer no Makai. Você nasceu num mês bonito como você. Ele é alegre, bonito e perfumado! – ela se exaltou com um sorriso.

- Arigatou novamente, vocês hoje resolveram me paparicar! Agora me perdoe, eu tenho que fazer algo antes do nascer do sol.

- Ah?! Tudo bem, então é melhor se apressar porque faltam apenas alguns minutos.

- Pode deixar, até mais, Yukina.

Kurama saltou da janela e em segundos estava na sua foram youkai, correndo pelas copas das árvores, até atingir o local que tanto queria. Uma praia.

* * * *
 
 

Finalmente aqui! Há quanto tempo! Tantos anos, mas que só de tocar nessa areia, sentir esse aroma e ouvir o barulho do mar, me fazem recordar de tudo.

"Era aqui que eu e Hiei namorávamos, levei-o um dia a esta praia e o apresentei ao meu local preferido para os dias ruins ou quando estava afim de pensar. A praia sempre me acalmou, a simples visão do mar tocando suavemente na areia, fazendo pequenas mudanças na sua estrutura, o som das ondas chocando contra as pedras, é tudo extremamente perfeito. A visão perfeita da natureza, as rajadas vermelhas do sol nascendo e invadindo toda a imensidão das águas, cada qual lutando por seu privilégio, mas no final se unem para formar a mais linda pintura – Esplêndido!

O trouxe aqui, apresentei a coisa mais perfeita nesse mundo de imperfeições, foi nesse lugar que nos beijamos loucamente, que nos amamos de forma insana.... e aqui ele deixou a mais pura frase já saída de seus lábios...

" Quer se casar comigo, Kurama? Para podermos ser eternamente um do outro, para que eu possa te chamar de minha raposa e só minha e de mais ninguém? Conceda-me o desejo que todos querem – o de Ter o único youko / humano de todo o Ningenkai e Makai?"

Eu disse sim a seu pedido ... foi aqui ... aqui que selamos nosso amor através da aliança que recebeu a benção do Sol e da Lua. O mar foi o testemunho de como entregamos nossas almas um ao outro ... aqui na frente do mar e do céu juntos ... cada um iria carregar um parte sua no peito, no dedo e no coração..."

E hoje eu volto aqui, cumpro a minha promessa de ser só dele por toda eternidade.

- E neste momento eu atiro a minha aliança e entrego a você, "senhor das águas", e a você, "senhor dos céus". Os dois abençoaram o nosso pedido e estão cientes de que minha vida morreu quando minha alma se foi.

Então, eu peço a vocês, aceitem este presente. - Kurama segurou a aliança entre os dedos e caminhou alguns passos até encostar com os pés na água e prosseguiu sua fala voltando os olhos para aquela faixa de luz.

- Isto significou a minha vida e agora é minha esperança... onde toda a vida começou neste mundo... onde quero que termine minha tristeza...

- Entrego-a para que um dia o traga de volta a mim.

Youko lançou o objeto ao longe, e o pequeno anel refletiu seu dourado no brilho daquela ponta de sol e chafurdou no mar, desaparecendo.

- Aí está ela, como tudo que vai para o mar um dia volta, eu quero que traga com ele meu dragãozinho de fogo, espero todo o tempo do mundo por isto, as vidas que existirem para mim, estarei sempre a procura do meu único amor. Esperando que você o traga para mim...

- Escute, Hiei, meu itoshii, aguarde ... aguarde o tempo que for necessário... um dia nós nos reencontraremos de novo...
 
 

E assim, Kurama deu aos céus sua última esperança de ver seu koibito, entregou a ele suas lágrimas de sangue e continuou a olhar para o sol que começava a nascer para um novo dia.

Continua...



Capítulo 6
Reencarnações
Yuyu Hakusho
 
 
 
 
 
 
 
 
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