... pecador...

Umi no Kitsune
 
 

"Aya-kun..."

Aya podia sentir a raiva percorrendo com destreza os caminhos de seus pensamentos assim como seu próprio sangue percorria habilmente suas veias. Suas mãos corriam na pele macia como quem já conhecesse todas as curvas e entradas daquele corpo jovem.

E ele o penetrou com o mesmo carinho e cuidado de sempre. Mesmo enraivecido, mesmo com ânsias de esmagar o fino pescoço em suas mãos fazendo com que até mesmo os ossos se misturassem de forma graciosa ao sangue e músculos retorcidos criando uma massa única e morta.

Mesmo machucado, triste e com lágrimas virtuais correndo livres em seu pensamento, Aya amou novamente o frágil, mas mortal, jovem assassino.

"Aya-kun..."

Não poderia explicar como tudo começara, nem mesmo entendia como uma seqüência simples de acontecimentos fez com que ele e Omi se tornassem amantes. Mas entendia que estava preso a esse menino, preso ao corpo dele, ao amor dele.

Omi o amava.

Sim... tinha certeza disso. Não era apenas uma paixão adolescente. Ele não era um simples namorado. Era um amante. Eles se amavam... se amavam em um sentido totalmente destituído de fatores físicos e sexuais, mas ao mesmo tempo envolto persistentemente por esses mesmos fatores os quais Aya não se incomodava nem em manter nem em se desfazer. Apenas tirar prazer.

Omi fazia o mesmo. De uma forma encantadora, vale ressaltar. E é por esses motivos que Aya não conseguia vingar-se de seu delicado amante da forma que mais lhe convinha. Sua vingança consistia em tomar o corpo alvo pra si, fazer a pequena boca em forma de rosa gemer e implorar por mais, controlar as mãos ansiosas deixando claro o quanto ele era importante. Ele...

"Aya-kun!"

... sempre fazia Omi entender que a relação existente entre os dois não significava em apenas um prazer solitário e individual. O amor que existia entre eles era mais! Era a comunhão de dois corpos em movimentos contínuos e sincronizados, com o prazer individual conquistado através do prazer do outro, com a realização conjunta de calor, em fricção constante, ruidosa, ofegante, onde a respiração se torna um suspiro, as palavras são meros sussurros e os gemidos são murmúrios de contentamento.

E isso era somente a parte supérflua de fatores físicos e sexuais que transbordavam a linha racional do ser, invadindo o subconsciente iluminado com idéias luxuriosas sobre a pessoa amada.
 
 
 
 
 
 

Omi encolheu os ombros, um pouco desapontado, um pouco contente, pela onda de prazer que acabara de percorrer tão rapidamente seu corpo, deixando uma sensação fria de felicidade. Mas o frio se foi no momento em que Aya deitou-se sobre ele, com beijos preguiçosos acariciando seu rosto rosado e suado.

Ficaram deitados, abraçados um ao outro, o calor de seus corpos mais eficiente que a manta sobre eles, aproveitando o momento, estendendo-o até o sono clamar e facilmente guiar os dois amantes pra o mundo dos sonhos.
 
 
 
 
 
 

Aya acordou assustado, sentando-se num ímpeto, segurando sua cabeça que parecia gritar de tanta dor. Alguém o bateu com força um pouco acima da nuca... O que, olhando agora, seria impossível. Aya estava deitado de costas quando sentiu a dor, tornando pouco lógica a possibilidade de alguém conseguir ultrapassar a estrutura de ferro da cama, o colchão e o travesseiro para aplicar-lhe um golpe. Mas como explicar a dor que sentiu então?

Seus olhos se estreitaram, porém, quando notou a figura calma e quase angelical de Omi deitada ao seu lado. O cabelo fino e loiro sobre seu rosto e travesseiro estava espalhado em uma inconstância infantil e apelativa. Apelativo e angelical demais.

Agarrou o loirinho adormecido e o sacudiu quase que freneticamente, contemplando o modo como a cabeça ia para frente e para trás como uma boneca de pano, "Você!", ele grunhiu.

Omi, apesar do ocorrido, não acordou imediatamente, ao contrário, teve um pequeno momento de abrupto despertar que transformou-se em tontura imediata, quase fazendo-o desmaiar pela força com que seu corpo era sacudido.

Quando parou, Aya aproximou o rosto e olhou furioso dentro das órbitas azuis e límpidas, revestidas por uma expressão palpável de espanto, "Você é o culpado disso tudo!", ele sacudiu Omi novamente dando ênfase desnecessária às suas palavras, "Como se atreve?".

Espantado e assustado demais para falar qualquer coisa, Omi apenas permitiu que seu corpo fosse jogado brutalmente para fora da cama, rolando até bater contra o armário na parede oposta. De repente, talvez pelo olhar feroz que lhe era dirigido, Omi sentiu-se envergonhado de sua nudez e encolheu suas pernas contra o peito, tremendo levemente quando Aya levantou-se.

Aproximando-se lentamente do pequeno assassino, o ruivo se abaixou apenas até suas mãos tocarem os fios loiros de Omi. Fazendo um cafuné e desarrumando o cabelo, ele recebeu um olhar confuso, e sorriu maldosamente em resposta, segurando com força os fios e forçando Omi a ficar em pé, nas pontas dos pés até que vários fios começassem a se desprender de seu couro cabeludo.

Como ornamento, ele conseguiu que algumas lágrimas escorressem pelo rosto adolescente. Apelativo e angelical, agora úmido de lágrimas e retorcido em uma careta de dor, "Como uma obra demoníaca...", Aya pensou alto enquanto observava impassivelmente. Ele abriu sua mão, deixando o resto de cabelo escapar de sua palma e Omi cair ruidosamente no chão.

"Aya-kun...", o garoto chorava e soluçava, "Por que...?"

"Por que?", Aya repetiu, cuspindo as palavras em indignação, "Você não se lembra mais do que fez?"

"Eu... pensei..."

"Pensou que podia ser fudido por tudo e por todos e depois voltar?", ele agarrou o menino novamente, pelos ombros, fincando suas unhas na carne nua.

Omi balançou a cabeça em negativa, "Pensei que... tivesse me perdoado...", ele respondeu com os olhos fechados, mas que mesmo assim, soltavam lágrimas espessas.

Aya sentiu-se com vontade de rir, "Perdoar?", mas a raiva era muito maior que qualquer ironia, "Perdoar? Você? Quem você pensa que é para merecer perdão?", ele bateu o corpo mole contra a parede, recebendo um gemido de dor como recompensa por sua brutalidade.

Sem mais poder se controlar, Omi chorou copiosamente, soluçando como uma criança perdida que ele sempre negou em ser, "Não está certo!", ele disse entre soluços, "Não era pra você ficar assim...".

Uma lágrima escorreu cheia e brilhante pela face vermelha de Omi, mas ao invés de cair de seu queixo para seu peito, ela fez o contorno de sua bochecha, caindo na mão de Aya, que tremeu diante do toque molhado e quente, facilmente confundível com o toque macio dos lábios jovens. Nervoso com sua própria reação, Aya apertou com sua outra mão o pescoço de Omi, enquanto afastou e observou, em meio a uma perplexidade, na mão benzida, a pequena gota salgada queimando sua pele alva.

Mesmo com o sucessivamente mais firme aperto em seu pescoço, Omi ergueu seus braços, alcançando os ombros de Aya. Seus esguios e hábeis dedos foram percorrendo, pela ponta de suas unhas, a curva do pescoço de Aya, até chegar à sua nuca.

O ruivo prendeu a respiração, repentinamente, sem saber o que fazer.

A tentação de fechar os olhos e deixar-se levar para o mundo do inconsciente era enorme, mas Omi abriu mais os olhos azuis e levantou o olhar doloroso em direção ao seu amante, "Aya-kun... me perdoe... eu não queria... que você... também... também se machucasse.", sua voz saiu fraca e rouca, mas firme o suficiente para se fazer entender.

Aya fechou os olhos com força e, com a mão molhada pela lágrima, ele esmurrou seu punho contra o queixo de Omi, que caiu no chão, escapando até de seu aperto no pescoço, com a força do golpe.

A porta do quarto escancarou-se permitindo que Youji e Ken entrassem no quarto, ofegantes de um certo modo, "Omi!", os dois exclamaram ao mesmo tempo, temporariamente petrificados de espanto pela cena.

Mesmo com o corpo dolorido, com o fino e rubro sangue escorrendo pelo seus lábios, Omi virou-se para os dois intrusos, abraçando-se enquanto juntava forças para gritar enraivecido, "Saiam daqui!"

Ken, que estava se aproximando dele, e Youji, que se preparava para atacar Aya, pararam surpresos.

"Saiam daqui!", Omi repetiu, olhando para os dois homens, que agora carregavam uma expressão mista de dor, arrependimento e confusão. Suspirando, Omi virou o rosto na direção contrária dos três companheiros, desistindo de encará-los. O movimento brusco fez com que algumas poucas gotas de sangue respingassem no carpete. "Me desculpe...", seu sussurro foi fraco, pois o choro já tomava conta dele novamente.

Como que saindo de um transe, Aya observou seu jovem amante encolhido próximo à janela, ferido, chorando, por culpa dele, "Omi..."

O loirinho levantou o rosto para a voz carregada de culpa, "Aya-kun... me desculpe...", não apenas sua voz, mas seus olhos e todo o seu corpo imploravam perdão, "Eu não queria te machucar... me desculpe, me desculpe..."

Os quatro assassinos ficaram parados por um breve tempo, cada qual com seu pensamento, com sua culpa e arrependimento.

Passos quebraram o silêncio, assustando Omi, que mesmo não olhando, podia perceber que estavam se aproximando e não se afastando. Como um rato, ele se encolheu mais contra seu próprio corpo, "Por favor, me deixem sozinho... me desculpem... me deixem sozinho..."

Os passos cessaram. Mais alguns segundos de puro silêncio contemplativo e passos novamente se fizeram soar, só que dessa vez afastando-se.

"Aya-kun, Youji-kun, Ken-kun...", Omi sussurrou, não se importando em se fazer ouvido, "Me perdoem...", quando o som da porta sendo fechada encerrou o som de passos, Omi levantou-se lentamente.
 
 
 
 
 
 
 
 

Depois de vários minutos, o loiro, jovem assassino, estava vestido e bem agasalhado. Ele parou em frente ao espelho e passou os dedos pelos fios desarrumados, lembrando-se de como Aya gostava de ser o autor dessa desordem.

"Omi-kun?"

Omi virou-se para as duas novas figuras sentadas na janela. Mordendo o lábio trêmulo, ele caminhou até seu um dos novos visitantes, abraçando-o com força, sentindo o alívio de ser amado novamente.

"Você o ama?", a pergunta soou quieta e calculada demais, mas Omi não deu atenção.

"Nagi-kun?"

"Não. Esse eu já sei que você ama.", Omi deixou que seu cabelo fosse novamente bagunçado, "Eu vi com meus próprios olhos. Quero saber do ruivo... você o ama?"

"Você já não leu a minha mente para tentar saber?", ele perguntou desconfiado.

"Claro. Mas seus pensamentos estão tão confusos, que eu não sei se é amor o que eu vi."

Omi deixou que a voz intrusa na sua mente saísse por completo. Então ele se virou para aquele que o abraçava, olhando-o nos olhos, "Sim. Eu amo Aya-kun... mas esse meu novo amor...", Nagi sorriu ao perceber que voltaram a falar dele, "Esse meu novo amor é mais forte..."

Os dois adolescentes se beijaram como se fosse a primeira vez, mesmo que seus lábios fossem familiares há algum tempo. Os sentimentos transformados em ações, que eram traduzidas em mãos curiosas e línguas saudosas.

Ao lado do casal, Schudich sorriu. Não um sorriso maníaco, muito menos um de felicidade, mas um sorriso triste, um sorriso que previa tristezas.
 
 

Continua...



Capítulo 4
Weiss
 
 
 
 
 
 
 
 
Hosted by www.Geocities.ws

1