Até o Dia Raiar e as Sombras Fugirem

Kaoru-Dono

EPÍLOGO

"Nabiki... Maldito!"

Não adiantou tapar os ouvidos. A frase sibilou enquanto era arremessado, o grito de dor que não saiu dos seus lábios sendo pronunciado pela irmã. Sim, agora ele se lembrava, finalmente. Asuka. As lágrimas encheram seus olhos; desconfiava que tivesse sido tarde demais para se lembrar. Não queria morrer, não era justo morrer justamente naquele dia, e mais do que tudo, era deprimente morrer daquela forma. Ele sabia, e simplesmente não podia evitar... afinal, tinha sido mesmo tarde demais para ele.

Imediatamente, os guerreiros do planeta Riuray saíram das suas naves; eram trinta, quarenta talvez. Com um salto, um deles se lançou a frente de Vejiita, que se esquivou um único movimento. Um olhar indiferente, de desprezo. Eles não eram nada, eram lixo, lixo, apenas isto.

O guerreiro soltou um grito profundo e amedrontado; estava em chamas, queimando de dentro para fora. Ele se retorcia enquanto o calor o consumia, o sangue jorrando dos olhos e da boca aberta. A multidão olhou aturdida e separou-se violentamente, os corpos jogados à esquerda e à direita, sem entender direito o que estava acontecendo. Um deles avançou, rosnando, e teve o mesmo destino do outro, a fumaça cinzenta e o fogo subindo através da penumbra da noite.

A multidão tornou-se histérica e amedrontada, uns avançando para lutar e sendo destruídos, outros se esgueirando pelos cantos como se assim pudessem se esconder e se salvar do misterioso destino dos outros soldados.

Bulma levou um tempo para perceber o que estava acontecendo por trás da simples e absolutamente compenetrada expressão de Vejiita. Era ele que os estava matando, um a um . Não era o fogo que os matava, mas um ataque silencioso e invisível aos órgãos internos. Era como se uma força rasgasse as entranhas frágeis, perfurasse os ossos, lhes esmagasse o cérebro, mas tudo o que se podia ver era o sangue escorrendo pelos olhos, pelos ouvidos, pelo nariz.

Eles corriam em todas as direções, enquanto Vejiita se dirigia cuidadosamente a cada um deles, empurrando-os com uma força invisível; girando-os no ar e ouvindo as entranhas explodirem, fazendo o sangue borbulhar para fora do corpo. Perseguiu metodicamente cada um deles, chutando os corpos para fora do caminho. Era tão fácil que chegava a ser patético, tão simples como pensar.

Matava tão depressa que quase não se conseguia ver os corpos lançados ao ar e caindo no chão, para depois se consumirem em chamas; naquele momento, Vejiita não possuía consciência, nem raciocínio, nem capacidade de sentir pena – sentia apenas a satisfação pura de matar aquelas pessoas sem rosto cujos nomes pouco lhe importavam, o prazer de jogar com eles – perseguí-los, encurralá-los , matá-los.

No meio daquele formigueiro humano de corpos ensangüentados, apenas uma pessoa se mantinha de pé, incólume, pálida, sem um arranhão. A pequena e estranha mulher que Bulma vira abraçar Nabiki, antes da sua morte. E, reparando bem nas suas feições duras, ela se parecia tanto com Vejiita que Bulma chegou a ofegar de surpresa.

Vejiita também se virou para encará-la, dirigindo-lhe a palavra com uma voz tão suave que chegava a ser uma contradição ouvi-lo pronunciando tão calmamente as palavras depois do que havia feito.

- Como Asuka ? Eu vi você morta.

Reencontrá-la depois de tanto tempo trazia-lhe muitas lembranças; desde as mais recentes até as memórias mais tênues, das quais não podia se lembrar com clareza, e isso tornava estranho e desagradável o simples ato de olhar para ela.

- Iie . Você não me viu, Vejiita-sama. Você viu a primeira.

Nani? Então eles já se conhecem?

- O que você quer, afinal ?

Uma breve hesitação. O lugar estava lhe dando enjôos.

- Vamos falar em outro lugar. – pediu ela, e sem esperar pela resposta, ergueu o corpo no ar e se dirigiu rapidamente em direção ao sul. Sem esforço, Vejiita alcançou-a.

* * *

Bulma esfregou o rosto com as mãos molhadas, atirando água nos olhos que ardiam com o sabonete. Ela inspirou ao tentar fingir um ar de indiferença e conteve a raiva a custo ; realmente não esperava que Vejiita fosse simpático, mas largá-la sozinha naquele lugar, sem mais nem menos, já era demais. E da onde aqueles dois se conheciam?

"Por sorte eu sempre carrego um estojo de cápsulas comigo" – pensou, com alívio. E foi uma delas, a capsula avião, que ela usou para sair daquele lugar o mais rápido possível.

Sozinha, o caminho de volta fora deprimente - em parte pela sensação de ser considerada insignificante e em parte porque era frustrante viver anos com uma pessoa e não saber absolutamente nada sobre o seu passado.

Vejiita nunca falava nem ao menos uma palavra, e da única vez em que o fizera, no dia anterior, foi interrompido bruscamente pelos acontecimentos.

Muitos ki , e você só consegue sentir o tremor que eles estão provocando. E um deles me é muito... familiar.

Bulma prendeu a respiração e submergiu na água.

Familiar? Bem, eles se pareciam, até... e ela parecia conhecer Nabiki também... será que era uma saiyajin? Mas se era, o que estava fazendo no planeta Ryurai? E que história era aquela de "primeira"? Como Vejiita já tinha visto aquela mulher morta antes?

Milhares de dúvidas passaram pela sua cabeça, e ela sabia que se dependesse de Vejiita, a chance de elas serem sanadas era praticamente nula.

- Malditos! – ela praguejou, momentaneamente com raiva de ambos, raiva de todos os saiyajins. – Eles podiam ser mais fáceis de se lidar, ah , só mais um pouco!
 
 

* * *
 
 

- Como ambos sabemos, seu pai não gostava de mim. Portanto, não me queria para treinar com você; matar a primeira era uma forma de lhe fazer acreditar que eu estava morta .

- Hai. – respondeu Vejiita taciturno, pensando que era exatamente aquilo o que tinha feito: acreditado, como um baka .

- Há anos eu procuro por Nabiki, meu irmão mais velho, exilado quando eu ainda era criança. E é isso que eu tinha vindo fazer aqui: encontrá-lo, e isto é tudo.

- Trazendo um exército ?

- Talvez tivesse pensado em conquistar este planeta, mas nada foi combinado entre nós. Apenas faria isto se houvesse tempo suficiente e realmente valesse à pena. Mas... – redarguiu ela ironicamente – Gomen ne ... Não sabia que se importava tanto com isto.

- Não me importo.

Asuka franziu a testa em desaprovação.

- Não precisava tê-lo matado, sabia?

Vejiita deu de ombros.

- Ser um lutador medíocre é uma das formas mais eficazes de morrer cedo.

- Nenhum deles era medíocre. – objetou ela - Nabiki tinha pouco treino.

- Bem, se não eram medíocres, também não eram grande coisa. Eu nem ao menos precisei tocar neles. – observou ele com arrogância.- E isto inclui mesmo o seu irmão.

- Vejiita... – murmurou ela – Eu gostaria de ver o quanto o seu poder aumentou durante estes anos.

Ele respondeu rudemente:

- Para quê ?

- Eu o vislumbrei durante o ataque à Nabiki e aos outros... Talvez pudéssemos lutar, como nos velhos tempos.

Ele estreitou os olhos.

- Por que deveria mostrar meu poder para alguém como você ?

Asuka fez um muxoxo de desprezo.

- Você não que mostrar-me nenhum golpe para que eu não aprenda as suas técnicas, como sempre fiz.

* - Olha isso – disse Vejiita saltando para trás e sorrindo orgulhosamente para Asuka, tomando a posição do Big Bang Attack. Um pouco antes de desferir o golpe, se perguntou o porquê dela estar rindo.

Com a velocidade que tinha, não lhe era difícil se esquivar. Subitamente Vejiita sentiu suas mãos formigando; estava lento, sonolento, e só conseguiu se livrar do seu torpor quando percebeu que ela estava sugando seu ki. Parada em frente a ele, ela sorriu maldosamente imitando sua posição de ataque.

- Big Bang Attack!

A quantidade de energia era grande, mas o ataque muito lento. Vejiita conseguiu se desviar sem maiores problemas.

- Como você fez isso, Asuka?

- Já fiz isso muitas vezes – respondeu ela – Posso aprender técnicas só de olhar. E você sabe que eu não tenho ki suficiente para esse ataque...Então usei uma técnica de Nabiki para pegar o seu.

- O que mais você pode fazer?

- O que é que eu não posso fazer?- respondeu ela, rindo quase tão atrevidamente quanto ele.*

Vejiita ergueu uma das sobrancelhas e sorriu de um jeito especialmente cínico.

- Pode copiar isso, Asuka?

Asuka olhou-o de boca aberta – podia sentir todo o ki dele expandir-se e se espalhar pelo corpo como um brilho dourado, uma aura que latejava em volta dele, uma energia incrível... nunca tinha sentido antes poder semelhante. Os cabelos dele mudaram de cor, e os olhos pálidos, antes negros, a encaravam apertados e brilhantes de riso contido.

Ele tinha conseguido – a velha Lenda era verdadeira, e ela nunca imaginou que isso fosse realmente possível. Odiou-o por rir dela daquela maneira. É claro que nunca conseguiria aprender a fazer aquilo de imediato, talvez nunca conseguisse, e ele sabia disso.

- Esta á a transformação do super saiyajin ?

Vejiita mal moveu os lábios para responder.

- Hai.

- Me dê uma demonstração do seu poder lutando comigo.

- Seu irmão e todos os soldados mortos já não são uma demonstração suficiente? – ele estreitou os olhos, encarando-a sem se mover – Quer morrer, Asuka?

Ela riu. Uma risada suave, que logo se transformou em uma gargalhada.

- É claro que não! Mas você não percebe? Nossas habilidades são excepcionais. Unidas, formariam novamente a grande família dos saiyajins, porém muito superior à antiga.

Vejiita sorriu e meneou a cabeça. Absurdo, foi a palavra que lhe veio a mente. Naquele instante, era assim que a idéia lhe parecia. Talvez há poucos anos atrás ela lhe fosse atraente, mas não poderia dizer com certeza.

Imediatamente veio na cabeça de Asuka a imagem da terráquea que ela tinha visto assim que saiu da nave. E novamente as mesmas perguntas: quem era ela, o que estava fazendo ali? Por que o príncipe se permitiu ser tocado por alguém que não conhecia, e nem ao menos era saiyajin, mas uma estúpida terráquea? Significava alguma coisa para ele? Precisava descobrir.

- Por que não a mata logo?

Vejiita encarou-a sem piscar, sondando-a com os olhos. Só podia estar falando de Bulma.

- Ela é minha mulher. – informou-a com ar de indiferença.

Asuka sacudiu os ombros com desprezo, sorrindo por dentro. Conversar com Vejiita poderia ser o mesmo que falar com uma parede de tijolos, mas perguntando as coisas certas, conseguia-se as respostas que queria.

- E daí ?

- E daí que eu não quero matá-la, e pronto. – respondeu, impaciente.

- Feh – exclamou ela desdenhosa – De qualquer forma, você viverá muitos anos a mais que ela.

"Nani!?"

- Mesmo se misturarmos nosso sangue com o dos terráqueos ou com o de qualquer outra raça, logicamente um mestiço saiyajin nunca será tão poderoso quanto um saiyajin de sangue puro. – continuou Asuka, completamente alheia ao efeito provocado em Vejiita com suas palavras anteriores.

Vejiita respondeu maquinalmente.

- Não é verdade.

- Como assim não é verdade? Como você pode saber?

* "Então o filho de Kakarotto tem um poder de luta mais elevado que o de uma criança saiyajin? Isso não pode ser um erro?" Nappa tinha lhe perguntado, anos atrás, quando estavam a caminho para invadir a Terra.

"Não, não é nenhum erro" – afirmou em resposta – " O pirralho causou grandes danos a Raditz com apenas um golpe. Parece que se misturarmos nosso sangue com o terrestre, poderemos criar uma raça realmente poderosa "*

"Ah, mas ela não sabe"- pensou Vejiita – Ela não viu o poder de Trunks, de Gohan e mesmo o de Goten... ela nem mesmo conhece a existência deles!"

- Nós somos os únicos saiyajins adultos que restaram...! Se nos multiplicarmos rapidamente, não será mais um sonho... voltarmos a formar o mundo dos saiyajins.

Eram quase as mesmas palavras ditas por Nappa! E, como da primeira vez que as ouviu, ele não lhe prestou muita atenção. Um momento doloroso e ríspido – ela tentava alcançá-lo e ele se mantinha alheio.

- Poderíamos reconstruir Vejiitasei em outro planeta e então finalmente, estaremos em casa de novo.

Ela seguiu dizendo outras coisas, mas ele pensava em outras completamente diferentes.

Sempre soubera que viveria muitos anos a mais do que qualquer terráqueo, mas se recusou a pensar sobre isso o tempo todo e esse era o seu sofrimento.

Bulma-chan...porque ele se importava tanto? O que ela tinha de tão especial?

"Ah, Vejiita – pensou ele com amargura- Você não é melhor que Kakarotto, com seu sentimentalismo e sonhos tolos "

* * *

Submersa na água quente, Bulma levantou a cabeça quando já não conseguiu mais prender a respiração. Com uma exclamação de surpresa, ela constatou que Vejiita estava sentado em frente a banheira, com as mãos no queixo, observando-a.

- O que aconteceu? – indagou ela.

- Nada.

Bulma inspirou profundamente, tentando manter o ar de calma e indiferença. Para Vejiita, desde que não houvessem maiores consequências e uma luta significativa, o fato não merecia consideração e se resumia a nada. Mas ela não iria desistir tão fácil de saber o que havia acontecido.

- Então, não era a intenção deles ...

- Ao que parece, não. Além disto, eram fracos demais. Até Yamcha conseguiria eliminá-los, embora eu não possa dizer se faria isto com muita facilidade.

Bulma franziu as sobrancelhas diante da menção do nome de Yamcha. Se os inimigos eram tão fracos a ponto de Vejiita, com toda a sua implicância, dizer que ele poderia ser capaz de derrotá-los, então por que os matou até o último? Por que simplesmente não os deixou irem embora? Ela achava que ele o tinha feito porque eles eram uma ameaça para a Terra, mas agora parecia não haver motivo. Mas tinha que haver algum motivo para...

Ele aproximou o rosto do dela, os narizes colados, a respiração acariciando-lhe o rosto. Bulma pestanejou através da sua franja molhada, e desviou o olhar daqueles olhos negros, escuros e vazios que a encaravam.

- Você fica aí parada, tentando compreender os motivos que me fazem ser o que sou, segundo a minha própria ética. Reconheça a verdade: eu não tenho ética nenhuma!

Não importava a dureza da sua ironia, não importava se ele era cínico, obstinado, detestável. Uma grande energia brotava dele, uma paixão irreprimível, e isso a atraiu para ele; a sua personalidade vibrante, ainda que duvidosa.

Ela o abraçou com força; sabia que ele odiava ser abraçado, mas não conseguiu evitar.

* - Se ele faz você lembrar-se de como eu era, por que não gosta dele? Você gostou de mim o suficiente naquela época.

- Eu não sei – Bulma murmurou sorrindo, os lábios macios roçando nos lábios dele - Não faço a mínima idéia...

- Está frio hoje... ...- ela o abraçou com força, sussurrando em seu ouvido : - Ai shiteru, Vejiita-kun...

- E daí que eu não quero matá-la, e pronto. – respondeu, impaciente.

- Feh – exclamou ela desdenhosa – De qualquer forma, você viverá muitos anos a mais que ela.*

Podia sentir os músculos dele se retesando em baixo da pele, e seus braços fortes deslizaram em torno de sua forma leve e suave. Ele a abraçava também, os braços cruzados por trás das costas dela, e Bulma estava demasiadamente surpresa para protestar, ou para deixar que ele se afastasse. Naquele momento, ambos pareciam duas partes de uma coisa só, e existia uma poderosa compreensão entre eles.

Nos braços dela, esquecia a dor provocada pela ausência do amor que nunca conhecera, e conhecia agora. O que ela tinha feito com ele? , pensava Vejiita. Por que o fazia se sentir daquela maneira? E ele nem havia percebido a partir de quando ela passara a ter aquela importância...

* - Poderíamos reconstruir Vejiitasei em outro planeta , e então finalmente, estaremos em casa de novo *

Os lábios de Vejiita se contorceram em um sorriso irônico imaginando a situação, se Asuka o visse naquele instante. Talvez ela fosse encará-lo , genuinamente intrigada. Vejiita não era mais a pessoa que ela conhecera, e ela não saberia dizer se gostava mais dessa última versão. Ele próprio não sabia.

Ele tinha certeza de apenas um único sentimento que fazia parte dele, apesar de ele recusar-se a deixá-lo aflorar, apesar de ele só começar a percebê-lo plenamente naquele momento.

"Asuka ... eu já estou em casa."

Fim

Finalizado em 31/05/02
 



Notas finais : Gostaria de agradecer as pessoas que acompanharam o fanfic, e as que me enviaram seus comentários, sugestões e críticas. Obrigada mesmo, gente ^_^

E desculpas pela demora das atualizações... Além das provas que me atrasavam, eu não tinha uma história pronta na cabeça, portanto deu trabalho fazer as coisas irem se encaixando ao longo da história.... Espero que o final tenha ficado legal, sem nada mal - explicado ... Me escrevam dizendo o que vcs acharam ,ok ? ^_~



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