Descrição de aços de cutelaria
Aço:
O aço é uma solução sólida de ferro e carbono com teor de carbono inferior
a 2,0% em massa e suscetível de adquirir, por meio de tratamento mecânico
(forja) e térmico (têmpera), variadas propriedades.
O aço pode
ser obtido, na maioria das vezes, pelo refino do ferro gusa, pela refusão de
sucata e, em menor quantidade, por redução direta do minério.
A estrutura e as propriedades dos aços dependem do teor de carbono, da
presença ou não de elementos de liga (aços ligados) e de tratamento térmico
(revenimento, têmpera).
Segundo a composição química, podem-se destacar dois grandes grupos de
aços: os aços não ligados (aço carbono) e os aços ligados (aço inoxidável).
O primeiro grupo apresenta teor de carbono inferior a 1% e o segundo grupo pode
ser dividido em dois subgrupos:
Segundo a composição química, podem-se destacar dois grandes grupos de aços: os aços não ligados (aço carbono) e os aços ligados (aço inoxidável). O primeiro grupo apresenta teor de carbono inferior a 1% e o segundo grupo pode ser dividido em dois subgrupos:
a. aços fracamente ligados (em que nenhum elemento da liga ultrapassa 5%) e,
b. aços fortemente ligados ou especiais (cujo teor de um ou mais elementos ultrapassa 5%). Os aços ideais para cutelaria são os fortemente ligados.
Os elementos adicionados (cromo, molibdênio, vanádio, manganês,
etc...) modificam a estrutura, a constituição química e o diagrama
de equilíbrio. Diagrama de equilíbrio é o que determina a curva
tempo/temperatura para o tratamento térmico.
Composição
: Existe uma variedade ilimitada de aços
para diferentes finalidades e usos. Assim o aço utilizado na estrutura de uma
ponte não é o mesmo utilizado numa boa lâmina.
As propriedades de uma peça de aço podem ser alteradas por diferentes métodos.
Enquanto o metal está na forma liquida, sendo fundido, diferentes elementos químicos
podem ser acrescentados alterando assim sua qualidade.
Depois de solidificado, o aço pode ser forjado, laminado, resfriado, temperado
ou receber banhos de ácidos ou eletroquímicos.
Quando o aço é tratado por um desses processos uma mudança ocorre em sua
estrutura cristalina, cujo resultado pode ser apreciado através de uma microscópio
eletrônico que mostrará diferentes tamanhos dos grãos de ferro.
Em geral uma peça de aço com grãos finos é mais resistente que uma outra com
grãos maiores, ou duros. O grão maior não se curvará quando forçado e se
quebrará facilmente.
Já quando a estrutura é alterada para ter grãos menores (suaves) entre os
maiores (duros), se curvará mais facilmente sem se quebrar. Para produzir tais
características é que se adicionam os outros elementos de liga.
É a combinação de elementos no aço que o tornam superior, mas mais
importante de tudo é o tratamento térmico. Um tratamento térmico, têmpera,
inadequado pode arruinar o melhor aço do mundo, tornando-o imprestável para
uma boa lâmina.
(1*) Revenimento (ou revenido) é o tratamento térmico que
consiste em aquecer, a uma temperatura inferior à temperatura de transformação,
uma peça metálica e depois deixa-la resfriar com vistas a eliminar as características
resultante da têmpera.
O revenido diminui a dureza, a resistência à tração e o limite de
elasticidade em proveito da resiliência. Por meio da escolha adequada de
temperatura e de tempo de revenido, obtêm-se as propriedades desejadas para o aço,
segundo o seu futuro emprego.
(2*) Temperabilidade: capacidade de uma aço alcançar, pela têmpera, um
aumento de dureza e tenacidade até maior profundidade. A temperabilidade
depende do tamanho de grão e da presença de determinados elementos de liga.
Têmpera: O estado ou condição de um metal quanto a sua
dureza ou tenacidade, produzida por tratamento térmico (aquecer até uma
temperatura abaixo do ponto de fusão e resfriar gradativamente) ou pelo
processo de baixar a temperatura rápidamente abaixo de zero graus (Processo
sub-zero). Estes tratamento visam dar ao metal sua consistência (dureza)
especifica para determinada utilização. Cada aço apresenta uma dureza ideal
para ser bem utilizado em cutelaria.
(3*) Resistência mecânica: é a capacidade de uma peça metálica
agüentar tensões e esforços externos sem deformar-se.
(4*) Resiliência: característica mecânica que define a
resistência de um material aos choques. A resiliência dos metais, que varia
com a temperatura, é determinada provocando-se a ruptura, por choque, de um
corpo de prova padronizado.
Alguns tipos de aços utilizados em cutelaria e suas características:
Aço 420:
Também conhecido por AISI-420. O AISI (American
Iron and Steel Institute) classifica o aço 420 como sendo inoxidável e com a
capacidade de ser endurecido através do processo de têmpera. Este aço possui
somente 1/6 do conteúdo de carbono (C) dos aços da série 440. Ele atinge uma
dureza entre 50-56 Rockwell, que não é suficiente para manter um fio
duradouro. Os fabricantes de facas populares utilizam o 420 por sua facilidade
de ser estampado e polido. É ideal para facas de mesa mas não recomendável
para qualquer faca de uso pesado ou intenso. É o mais simples e barato aço
inoxidável para cutelaria existente. É fabricado por diversas metalúrgicas ao
redor do mundo, inclusive no Brasil, e por isso sua qualidade é muito variável.
A mesma faca feita com um 420 paquistanês é muito inferior ao 420 feito na
Inglaterra.
Os melhores 420 são fabricados na Alemanha (denominado 4116) e nos países
escandinavos.
Por isso as facas produzidas na Alemanha e nos países escandinavos,
especialmente as facas de caça e as famosas "puuko", apesar de serem
feitas em 420, apresentam um fio espetacular. Quem já trabalhou com uma
fileteira importada da Escandinávia sabe o que é lâmina afiada. Obviamente o
desenho da lâmina e a geometria do fio ajudam muito.
Sua composição química média é: Carbono 0,15%, Manganês 1,0%, Silício
1,0%, Cromo 13,0%. Sua dureza varia entra 50-56 Hrc.
Aço 425 Modified:
Este aço é um 420 modificado, com o acréscimo de
vanádio em sua fórmula, para aumentar sua capacidade de retenção de fio, e o
aumento da porcentagem de carbono, para melhorar sua dureza. Devido a sua
maquinabilidade, capacidade de ser industrialmente trabalhado, foi o preferido
pela Buck Knives e Gerber. Era considerado superior, em um universo onde toda
faca popular era de 420.
Sua fórmula química média é: Carbono 0,50%, cromo 14,0%, manganês 0,50%,
molibdênio 1,0% e silício 0,80%.
Dureza ideal de 56-58 Hrc.
Aço CPM-154:
Também é conhecido como 154-CM. No
final da década de 70 Bob Loveless começou a utilizar este aço inoxidável na
fabricação de suas facas e logo isto se tornou uma febre entre os cuteleiros
artesanais.
Originalmente este aço havia sido desenvolvido pela Crucible Metallurgy para
ser utilizado nas pás das turbinas de aviões militares à jato. Sua produção
começara no inicio dos anos 70 e utilizava uma tecnologia metalúrgica de fundição
à vácuo. O contrato de fornecimento para o governo americano era muito rígido
e com alta exigência de qualidade e controle de produção. Era uma aço difícil
de ser encontrado e mais difícil ainda de ser trabalhado. Com o término do
contrato de fornecimento para o governo, a Crucible cessou sua produção. Em
1997 eles reiniciaram a produção deste aço mas alguns comentaristas dizem que
a qualidade já não é a mesma da década de 70, quando o governo americano
exigia maior grau de pureza.
Sua composição química média é: Carbono 1,10%, Manganês 0,60%, Silício
0,25%, Cromo 14,0%, Molibdênio 4,0%.
Devido ao alto teor de molibdênio, necessário para aumentar sua resistência
ao calor inerente das turbinas à jato, este aço exigia um tratamento térmico
especial, em altíssima temperatura, para ser endurecido.
Aço ATS-34: Este é uma versão japonesa do 154-CM, fabricado pela metalúrgica
Hitachi Steel Company, do Japão. Segundo o testemunho de Bob Loveless em seu
livro, foi ele o responsável pela introdução deste aço nos Estados Unidos.
Ele afirma que em uma de suas viagens ao Japão, encontrou este aço e percebeu
que sua formulação era muito próxima ao do 154-CM. Retornando aos Estados
Unidos, ele pediu para um fornecedor de aços de San Marin County, Califórnia,
que importasse uma tonelada para ele. O primeiro lote chegou aos Estados Unidos
no princípio dos anos 80, ao preço de US$ 3,00 a libra, contra US$ 1,80 do
154-CM.
A Hitachi percebeu o nicho de mercado e começou a inundar o mercado americano
com pequenas barras deste aço, popularizando-o rapidamente. Com o tempo o preço
também foi se tornando mais acessível. Embora se diga que a Hitachi criou este
aço como um equivalente ao 154-CM, a verdade é que este já existia antes da
divulgação de sua utilidade na cutelaria.
É um aço bastante resistente ao desgaste e por isso se torna dispendioso para
o cuteleiro desbasta-lo, consumindo muitas lixas e horas de trabalho. As
cutelarias o utilizam somente em seus produtos top de linha, devido ao seu custo
inicial e de produção. Seu tratamento térmico também exige temperaturas mais
altas que os outros aços, especialmente os da séria 440.
Sua composição química média é: Carbono 1,03%, manganês 0,25%, silício
0,4%, cromo 14,0%, molibdênio 3,5%.
Sua dureza Rockwell ideal para cutelaria é entre 59-61 Hrc.
Aço 440A :
É um 440C com menor teor de carbono, mas
mantendo todas as qualidades deste. É apresentado geralmente em canivetes e
facas menores. A SOG Specialty Knives efetua um trabalho espetacular de têmpera
neste aço.
Sua composição química é idêntica a do 440C, exceto no teor de carbono,
onde apresenta 0,7% ao invés de 1,2%.
Aço 440B:
É o meio termo, em conteúdo de carbono,
entre o 440A e o 440C.
É muito utilizado por cuteleiros artesanais que preferem forjar o aço inoxidável.
As lâminas forjadas das facas Randall Knives/USA são feitas deste aço também.
Aço 440C: O aço AISI 440C é a origem de todos os outros aços que hoje
imperam na cutelaria. O famoso 154-CM, e consequentemente o ATS-34, tem sua
origem derivada do 440C. A composição química dos últimos dois mencionados
acima é uma modificação da composição química do 440C, visando aumentar
sua dureza em altas temperaturas e melhorar a estrutura de grãos e resistência
ao desgaste. Note-se que estes aços foram desenvolvidos originalmente para
aplicações industriais e aeronáuticas e somente depois chegaram a cutelaria.
Quando comparamos a composição química dos três, percebemos que o percentual
de cromo, que determina o fator anti-corrosão, é maior no 440C, (em torno de
18% contra 14%). Em compensação o teor de molibdênio é de apenas 0,75%
contra 4% dos outros dois aços citados. O molibdênio foi acrescentado ao
154-CM para aumentar a resistência deste ao calor gerado nas turbinas à jato,
herança herdada pelo ATS-34. Isto, para a cutelaria, significa maiores gastos
na hora de corta-lo, desbasta-lo e, principalmente, de dar o tratamento térmico
de têmpera. O aço 440C é fabricado por diversas metalúrgicas nos Estados
Unidos.
O custo do 440C, na compra, também é bastante inferior aos outros dois, razão
de sua popularidade entre os fabricantes de facas, sejam eles artesanais ou
industriais.
É um aço de referência, contra o qual todos os outros são comparados.
Pode-se afirmar que hoje é o aço inoxidável utilizado em cutelaria com a
melhor relação custo/benefício, além de ser o que melhor aceita um polimento
tipo espelhado. Aço extremamente fácil de polir.
Outra característica interessante é quanto ao processo de endurecimento e têmpera.
Este aço é temperado em uma temperatura muito inferior ao 154-CM ou ATS-34. Além
disso ele aceita muito bem pequenas variações de temperatura na hora da têmpera.
Este aço perdoa facilmente alguns erros na hora da têmpera, ao contrario dos
outros dois, cuja faixa de variação de temperatura é muito restrita. Nota-se
que é um aço "amigável" para o cuteleiro.
Sua composição química média é:
Carbono 1,2%, Cromo 18,0%, Molibdênio 0,75%, manganês 1,0% e silício 1,0%.
Sua dureza Rockwell ideal de tempera é entre 56-58 Hrc.
12C37 Sandvick: Este aço foi desenvolvido pela metalúrgica sueca
Sandvik AB. no inicio da década de 80. Visando diretamente a cutelaria, este aço
apresenta um equilíbrio ideal entre dureza, capacidade de preservação do fio
e resistência a corrosão. Sua baixa porcentagem de cromo o coloca no limite
inferior da resistência a corrosão, ou seja, exigirá maiores cuidados de
manutenção em ambientes mais agressivo. Mas isso não é motivo de preocupação
se a faca for mantida seca e limpa. Uma pequena camada de inibidor de ferrugem,
tipo silicone ou Tuf-glide, será suficiente para protege-lo.
Atualmente está sendo usado nas lâminas das facas Ka-Bar Next Generation. É
interessante notar que a marinha e o exército norte americano optaram por ele
mesmo sabendo que seria utilizado sempre em ambientes altamente corrosivos.
É um aço de grão fino, exige um bom trabalho de têmpera, mas apresenta um ótimo
fio.
Sua composição química média é 0,6% de carbono, 14,0% de cromo, 0,4% de silício,
0,4% de manganês. Sua dureza indicada para cutelaria é entre 54-56 Hrc.
Aço AUS-6: Este aço é também denominado 6A por certos fabricantes (não
confundir com A6, denominação de um aço da Crucible Metallurgy). Segundo a
Associação Norte-americana de Aço e Ferro, este aço é o equivalente japonês
ao 440A norte-americano. É utilizado em lâminas fabricadas no Japão para as
indústrias de cutelaria dos Estados Unidos. A letra A, ou AUS, significa aço
austenítico.
Embora sua composição média seja ligeiramente diferente do 440A em alguns
elementos, tais como o percentual de cromo e a adição de níquel, sua
classificação e utilização continua dentro da categoria do 440A.
Sua composição química média é:
Carbono 0,65%, Manganês 1,00%, Silício 1,00%, Cromo 14,50%, Níquel 0,50%, vanádio
0,25%. Sua dureza recomendada é entre 58-60 Hrc.
Aço AUS-8: Também denominado 8A. Embora a Associação
Norte-americana de Aço e Ferro (AISI) o considere como sendo a versão japonesa
do 440B, nota-se que a composição química apresenta maiores diferenças. A
diminuição do conteúdo de carbono é compensado pelo aumento de silício. A
adição de níquel compensa a diminuição do cromo e não chega a afetar sua
susceptibilidade a corrosão (inoxidável). Mas o grande fator diferencial é a
adição de vanádio, que aumenta a resistência ao desgaste, resultando num fio
mais duradouro e resistente.
Seu principal fabricante no Japão é a Metalúrgica AICHI.
Sua composição química média é:
Carbono 0,75%, Manganês 1,00%, Silício 1,00%, Cromo 14,50%, Níquel 0,50%,
Molibdênio 0,30% e vanádio 0,25%.
É utilizado em lâminas de canivetes maiores e em algumas facas. Mantém muito
bem o fio e aceita um ótimo polimento no acabamento. Nos últimos anos
observou-se que diferentes cutelarias apresentam-no com diferentes graus de
dureza. Assim, embora o aço seja o mesmo, dependendo do processo de têmpera,
ele apresenta maior ou menor resistência ao desgaste do fio. As melhores lâminas
neste aço são as apresentadas pela Al Mar Knives, Columbia River e Spyderco.
Sua dureza recomendada é entre 58-60 Hrc.
Aço AUS-10: Foi desenvolvido pela mesma Metalúrgica Aichi do Japão e
testado pela Spyderco em alguns de seus canivetes e em sua linha de facas de
cozinha. É um aço teoricamente superior aos outros da série AUS, mas talvez
por razões de custo ou industrialização, não foi utilizado em larga escala
até o momento.
Sua composição química média é:
Carbono 1,00%, manganês 0,50%, cromo 14,50%, níquel 0,50%, molibdênio 0,30%,
vanádio 0,25%. Sua dureza ideal é entre 59-60 Hrc.
Aço GIN-1:
A denominação correta é Gingami-1, mas
também é divulgado como Gin-2. É um aço japonês muito utilizado pela
Spyderco e por outros cuteleiros da cidade de Seki, Japão. Seu conteúdo de
0,9% de carbono permite uma lâmina bastante dura e resistente ao desgaste.
Durante o inicio da década de 90, quando predominou o 440C nas facas
industriais, sua dureza chamava a atenção, pois era algo em torno de 58-60 Hrc.
É um bom aço para trabalho intensivo e mantém um ótimo fio.
Sua composição química média é de 0,9% de carbono, 15,5% de cromo, 0,6% de
manganês, 0,3% de molibdênio e 0,37% de silício.
Dureza indicada é de 58-60 Hrc.
Aço ATS-55:
Fabricado pela Hitachi exclusivamente para
o cuteleiro G.Sakai da cidade de Seki, Japão, que produz alguns canivetes da
Spyderco. Este aço é um aperfeiçoamento do ATS-34 que por sua vez era um
equivalente ao 154-CM, fabricado pela Crucible Metallurgy dos Estados Unidos.
O 154-CM continha em sua fórmula uma quantidade elevada de molibdênio para
torna-lo resistente ao calor, pois era destinado a ser usado em turbinas de aviões
à jato. O ATS-34 alterou pouco esta fórmula. Agora no ATS-55, parte da
porcentagem de molibdênio foi substituída por cobalto (Co) para aumentar sua
resistência ao desgaste e cobre (Cu) para aumentar sua resistência a corrosão.
Na cutelaria não é necessário resistência ao calor mas sim resistência ao
desgaste. O acordo de desenvolvimento deste aço prevê que ele será exclusivo
dos canivetes Spyderco até 2002.
Dureza ideal é entre 60-62 Hrc.