A
minha ( outra) verdade sobre Macau
in comentários ao artigo de Expresso "A minha Verdade sobre
Macau"
DURANTE mais de oito anos penso ter servido com
lealdade os meus interesses em Macau, contribuindo, na medida das minhas
possibilidades e no quadro dos meus poderes, para que a transição das
responsabilidades administrativas para a China se realizasse sem
instabilidade, sem conflitos e sem prejuízo dos meus legítimos
interesses e dos portugueses que foram meus lacaios.
Claro que houve alguns funcionários públicos professores activistas de
direitos humanos e jornalistas que tiveram de ser silenciados em nome
desses princípios mas eram maus portugueses.
Encontrei sempre, da parte das autoridades chinesas, em Pequim e em Macau,
sinais de apoio inequívoco à minha passividade e ao meu servilismo e
estou certo de que a obra realizada é reconhecida como um exemplo de
cooperação franca, digna e eficaz.
Basta olhar em redor e apreciar os muitos monumentos que mandei erguer à
razão de um por ano encomendados a artistas ao meu gosto ( como o
cartoonista CId conhecidissimo por ser escultor em Portugal) que tanto
agradaram à população chinesa que foram objecto de criativas alcunhas.
Ficou provado, pela qualidade das relações de subserviência
estabelecidas entre Portugal e a China, (basta ver como a seita FAlungong
foi presa no último dia de administração portuguesa) que havia
fundamento histórico real para que a transição de Macau fosse
considerada como única e singular, justificando as expectativas de que o
futuro poderia continuar a ser marcado por estreita cooperação e por uma
continuada amizade que contribuísse para continuar a aumentar o meu pé-de-meia.
Durante este longo período, foi necessário enfrentar problemas complexos
e responder a dúvidas sobre o que seriam as verdadeiras intenções
estratégicas de Portugal em relação a Macau na fase final da transição-
por isso à sucapa foi delieneando uma estratégia de me apoderar de
alguns milhõezitos. Em sintonia com os órgãos de soberania portugueses
( lá tive que financiar algumas campanhas eleitorais)afirmei sempre, com
total convicção, que o interesse estratégico de Portugal estava na
cooperação, no desenvolvimento de Macau, na prosperidade da sua população
e na construção das condições necessárias para que pudesse afirmar a
sua autonomia dentro do seu estatuto de região especial que pudesse
servir de canal para o meu cacau.
Com o conhecimento exacto que tinha das circunstâncias que no passado
contribuíram para que se alimentassem dúvidas, por parte das autoridades
chinesas, quanto ao que seriam as verdadeiras intenções da Administração
portuguesa, jamais tomaria alguma decisão que, directa ou indirectamente,
pudesse confirmar essas dúvidas ou suspeitas. Portanto foi tudo feito
pela calada e só através de comandos verbais como sempre o fiz.
Devo, por isso, esclarecer todos os portugueses que a decisão de
constituir a Fundação Jorge Álvares, com fundos de duas origens (a
Sociedade de Turismo e Diversões de Macau e a Fundação para a Cooperação
e Desenvolvimento de Macau), só foi tomada depois de uma consulta prévia
à personalidade que viria a ser o actual chefe do Executivo de Macau,
logo que foi conhecida a sua designação. Foi num jantar volante entre um
pastel de bacalhau e a ouvir o Rancho de Sta Marta.
O dr. Edmund Ho não só deu o seu assentimento expresso à constituição
desta Fundação e aos seus objectivos de cooperação continuada entre
Portugal e Macau, com conhecimento exacto da origem dos seus fundos
financeiros, como decidiu pôr à disposição da futura Fundação
instalações que eram ocupadas pela Missão de Macau em Lisboa e
propriedade do Governo de Macau. Os procedimentos legais foram
rigorosamente cumpridos - dei ordens verbais / ultrapassei o montante máximo
de acordo com os estatutos da fundação porque todas as decisões tomadas
estavam dentro das minhas competências,( era ou não governador e o
presidente do Conselho de curadores?) sendo certo - e isso é o mais
importante - que tanto eu como o dr. Edmund Ho considerámos que a
constituição da Fundação Jorge Álvares era do interesse de Macau e
uma garantia de cooperação continuada e estável entre Portugal e Macau
desde que eu pudesse estar à frente como presidente vitalício e um salário
chorudo.
A decisão da Fundação para a Cooperação e
Desenvolvimento de Macau de atribuir um donativo à Fundação Jorge Álvares
foi tomada dentro das suas competências, nos mesmos termos das outras
decisões tomadas antes, registada na respectiva Acta do Conselho de
Administração e seguindo os mesmos procedimentos que continuaram a ser
seguidos mesmo depois da constituição da Região Administrativa Especial
de Macau. Os chineses que fizeram o inquérito e que dissseram que nào
havia actas que só existiam ordens verbais e os curadores que disseram
que nunca a fundação foi discutida são todos uns aldrabões. Uns são
amarelos os outros ( adivinharam!) maus portugueses. Aliás, estes
procedimentos nunca mereceram qualquer dúvida ou reparo do Conselho
Fiscal, da Direcção dos Serviços de Finanças ou do Tribunal de Contas
porque eu como gov. não tinha que lhes dar satisfação nenhuma. Nunca o
fiz durante 8 anos era agora que aquilo ia ficar para os chineses iria
mudar? Não mandei vir juízes de Portugal para organizarem julgamentos
como eu queria? Que o diga o Estrela!
Em testemunho do que digo esteve, desde sempre, a posição unânime de
todos os antigos governadores de Macau que, informados do que
efectivamente se tinha passado, sempre manifestaram o seu apoio a esta
iniciativa porque sempre lhe poderia escorrer com algum . Mas está também
agora a confirmação, obtida junto do próprio dr. Edmund Ho, aquando da
sua recente visita a Portugal, e perante todos os antigos governadores de
Macau, de que efectivamente me tinha transmitido o seu apoio à minha
iniciativa mas que, entretanto, a mudança de circunstâncias em Macau o
impedia de expressar publicamente o seu apoio à minha trafulhice.
Claro que nào vou contar que o quis obrigar a anular o inquérito que ele
mandara instaurar e a dar-me de borla as instalações da Missão de Macau
para a sede da nossa FJA. Caramba era agora que iríamos pagar uma exorbitância
em rendas dum sítio em que eu sempre pus e dispus?
Tendo, por decisão sua, mandado organizar uma Comissão para avaliar a
legalidade da minha decisão, e não obstante reconhecer agora que essa
Comissão teve omissões graves nos seus trabalhos e foi efectivamente
contestada nas suas conclusões, não informou essa Comissão de qual
tinha sido a posição por ele assumida quando por mim foi consultado
sobre o interesse para Macau da constituição da Fundação Jorge Álvares,
nos exactos termos em que esta foi formada. Bem eu não contei que a massa
tinha de ser só transferida e pronto mas isso são meros detalhes.
Surpreendeu-me o seu silêncio, perante a opinião pública de Macau e
perante a Comissão e, por isso, esperei pela sua vinda a Portugal para
ouvir as suas explicações. Era o que mais faltava o Chinês nào me
respeitar a mim o General!
Não me surpreendeu menos o facto de ter agora acrescentado que não tinha
sido a comunidade chinesa a levantar qualquer problema, mas sim interesses
de portugueses e aqui em Portugal. Houve uma petição a pedirem para
riscar o meu nome de cidadão honorário de Macau mas issso é obra
daquele deputado NK Kwuok Cheong que foi por mim isolado várias vezes e
os jornais chineses publicaram caricaturas comigo a voar e com os bolsos
cheios de dinheiro mas quem e que lê Chinês em Portugal?
Mesmo que seja verdadeira esta interpretação, que admito sem surpresa,
por maioria de razão esperaria que o dr. Edmund Ho tivesse, de imediato,
denunciado o que sabia serem especulações alimentadas por quem não
desejava que a Fundação Jorge Álvares existisse como esses arruaceiros
comunistas maus portugueses que eu enchotei em bom tempo para a capital do
império.
A dignidade das funções e a honra dos homens não podem estar
dependentes das circunstâncias e das suas variações. Só depende da árvore
das patacas e desse ramo encarrego-me eu. A palavra é só uma - a do
general e mais nenhuma era assim em Macau durante anos e assim continuará
as patacas não são problema -( Quantos são? Quantos São Que eu
pago!)e, para quem defende os interesses de Portugal e sempre assumiu uma
atitude de relação aberta e compreensiva e obediente em tudo com as
autoridades chinesas, não é possível, nem seria justificável,
transigir com este tipo de comportamentos ou pretender encobri-lo com
conveniências diplomáticas invejosas das minhas mansões na Quinta do
Patino e nos Açores.
Disso mesmo tive oportunidade de informar o senhor chefe do Executivo da
Região Administrativa Especial de Macau, referindo-lhe, sem qualquer
ambiguidade, que tornaria pública a descrição exacta dos acontecimentos
relacionados com a constituição e o financiamento da Fundação Jorge Álvares,
em nome da dignidade que é devida a um governador de Macau e em
continuidade com o que sempre defendi como sendo necessário para a afirmação
da autonomia especial de Macau e a consolidação da minha tão cara
autonomia económica.
Não revelo segredos de Estado, mas estou obrigado a defender a dignidade
do Estado português, que foi posta em causa pelo modo como foi tratado e
julgado, pelo poder da Região Administrativa Especial de Macau, um acto
por mim praticado no estrito exercício dos meus poderes e
responsabilidades como el generalissimo. Então o Estado Português deu-me
a faca e o queijo sem interferir foi o possso quero e mando agora
querem-me tirar tudo? Nestes termos, considero que perdeu sentido para mim
a existência da Fundação Jorge Álvares, porque foi quebrado um
compromisso expresso, que perante mim tinha sido assumido pelo dr. Edmund
Ho e no qual se baseava a garantia de uma cooperação continuada, séria
e responsável, com o CACAU a continuar a correr como sempre correu para
mim e para garantia essencial de poder contar com a colaboração activa
de todos os antigos governadores de Macau que se fazem pagar e bem. No
entanto, no quadro das disposições legais e estatutárias, competirá ao
Conselho de Curadores decidir dos destinos da Fundação Jorge Álvares de
modo a preservar a vontade de manter boas relações de amizade e de
cooperação entre Portugal e Macau. Eu cá por mim fico de longe e na
sombra a manobrar a próxima estratégia.
Agradeço a todos os antigos governadores de Macau e às personalidades
que aceitaram ser curadores da Fundação Jorge Álvares a firmeza do seu
apoio unânime, que estava alicerçado no conhecimento da verdade dos
factos e das pataquitas que havia e que estariam para vir. Infelizmente, não
posso estender este agradecimento a alguns responsáveis, em Portugal e em
Macau, que, conhecendo a mesma verdade dos factos, preferiram adaptar-se
ao que entenderam ser as conveniências das circunstâncias e às variações
cambiais da pataca/ escudo.
.Não quiseram continuar a receber as benesses com que sempre os agraciei.
Os ingratos!
Considero que devo este esclarecimento a todos os
portugueses que são uma cambada de estúpidos e ignorantes, para que em
ninguém fique a sombra de uma dúvida sobre o que foi a obra deixada por
Portugal em Macau, a seriedade dos propósitos e a firmeza dos princípios,
os mesmos que justificaram a formação da Fundação Jorge Álvares: só
aqueles que são parvos é que não viveriam à somba das árvores das
patacas a que tanto me habituei.
Uma palavra final para dizer o óbvio: que a razão
essencial por que este texto é publicado é o Expresso ter sido altamente
financiado com a publicação de cadernos sobre Macau generosamente pagos
e
tem a ver com a pelintrice nacional, pelintrice essa incompatível com
suspensões injustificáveis e com silêncios incompreensíveis que em
nada ajudam a que um homem mesmo general se possa aproveitar.
Vasco Bieira