Os bons e os maus
portugueses
in Macau Hoje, 15/6/00
Senhor
Director,
Tenho seguido atentamente pelo seu jornal as reacções de indignação de
portugueses de Macau pela forma discriminatória como o Senhor Cônsul
Geral, Dr. Carlos Frota, tratou a comunidade portuguesa por ocasião das
celebrações do Dia de Portugal.
Como português que em Macau reside e trabalha há anos, não posso deixar
de manifestar também a minha revolta. Esta não resulta tanto do facto de
não ter sido convidado - e entendo que o devia ter sido - mas do
preocupante significado de que a atitude do senhor Cônsul Geral é
portadora.
O último governador de Macau catalogava os portugueses em bons e maus e
agia em conformidade com essa classificação. Bons eram, como se sabe, os
que dependiam das suas prebendas e lhe lambiam as botas; maus eram os
outros, os que, sem lugar à mesa do orçamento, viviam do seu trabalho e
recusavam ser actores da farsa que o general protagonizava. Os bons, quase
sem excepção, deixaram Macau com ele e como ele, pela calada da noite de
20 de Dezembro; os maus, na sua grande maioria, porque foi sempre do seu
trabalho que viveram, continuaram em Macau. Entre estes, com orgulho, me
incluo.
Dos bons, alguns ainda por cá ficaram, outros estão de regresso,
frustrada que foi a hipótese de mais uma sinecura nesse projecto
desinteressado de cooperação que o general iria protagonizar e que, tudo
o indica, já fracassou.
Mas será que o senhor Cônsul Geral, Dr. Carlos Frota, enquanto
representante de um Estado democrático, regido por uma Constituição que
repudia quaisquer formas de discriminação, pode comportar-se como se
general fosse, decidindo quem, de entre a comunidade portuguesa, tem e não
tem dignidade para pisar os jardins da sua mansão? Será que a mansão é
propriedade dele, que é ele que paga a sua manutenção, os croquetes e
as garrafas de vinho com que recebe os seus convidados? E será que,
discriminando assim os portugueses de Macau, terá ele alguma legitimidade
para falar ao seu governo da comunidade portuguesa, dos seus problemas e
anseios?
Neste curto espaço de seis meses, o
senhor Dr. Carlos Frota já demonstrou não ser digno da comunidade
portuguesa de Macau. Que, é bom lembrá-lo, não é a mesma de há seis
meses. Por isso, é bom que se vá embora quanto antes.
Macau, 14 de Junho de 2000
Um militar revoltado
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