Introdução:
A lesão medular por trauma, é uma das mais catastróficas que pode
acometer um indivíduo. Muitos sobreviventes sofrem inaptidão permanente.
Ocorre incapacidade motora, reflexa e sensitiva abaixo do nível
da lesão e podem acarretar complicações clínicas sérias.
Nas lesões incompletas há preservação da sensibilidade e da motricidade,
podendo restabelecer-se completamente. O grau de lesão medular
é geralmente, determinado apenas 72 horas após a injúria, quando
algumas funções motoras e sensitivas que não estavam presentes,
reaparecem ao exame físico.
O nível da lesão é determinado pelo exame neurológico e não pelo
nível da fratura vertebral. O trauma causa freqüentemente rompimento
das funções medulares, apesar de anatomicamente não estar secionada.
Há produção de vasoconstritores, resultando na diminuição do fluxo
sangüíneo, isquemia e necrose neuronal. A hipotensão pode ocorrer
devido a disautonomia e a perda da auto-regulação.
Evitar agravamento das lesões depende do resgate adequado. O ferido
deve ser imobilizado precocemente, ventilado adequadamente e iniciada
corticóideterapia até 8 horas após o trauma raquimedular com o
objetivo de reduzir a cascata bioquímica, melhorar o fluxo sangüíneo
e assim, evitar lesão secundária ao sistema nervoso central.
Faixa Etária e Percentual
A maioria se encontra no início da vida profissional produtiva,
com grande prejuízo para o paciente e para a nação.
Ocorrência
Pontos mais suscetíveis são C5-C6, T6-T7 e T12-L1.
As lesões podem ser causadas por fratura ou luxação ao qual pode
ocasionar compressão medular. Ocorre nos diversos movimentos de
flexão/ extensão, associados ou não à rotação. A coluna cervical
é comumente a mais afetada pela sua mobilidade.
As conseqüências no quadro motor encontradas são:
- Na fase aguda, haverá paralisia flácida e ausência de reflexos
tendinosos, que dura de 2 a 6 semanas;
- Na fase crônica, haverá paralisia espasmódica e reflexo tendinosos
presentes.
Deve-se lembrar que, o estado neurológico leva de 12 a 18 meses
para se restaurar após o trauma. A estabilização da coluna pode
ser feita por colete gessado ou colete articulado (tratamento
conservador) com um tempo de permanência de 8 a 12 semanas. Nos
casos de tratamento cirúrgico, será realizada osteossíntese ou
artrodese através de fios, placa metálica ou óssea. A mobilização
do paciente fica liberada no dia seguinte a cirurgia.
2) Principais Complicações Sistêmicas
e a Intervenção da Fisioterapia
Acima da quinta vértebra torácica os pacientes cursam com hipertensão
inicial seguida da fase de choque por queda do tônus simpático.
Ocorre diminuição da resistência vascular sistêmica, aumento da
capacidade venosa ao qual leva a hipotensão, bradicardia, diminuição
da função ventricular e necessidade de aminas vasoativas
A intervenção fisioterápica consistirá em :
- Verticalizar regularmente a cabeceira;
- Fazer indicação do uso de meias elásticas 7/8 de média compressão,
para iniciar a reeducação vasculo-cerebral , reduzindo a incidência
de lipotímia, muito comum em pacientes que permanecem por algumas
semanas em decúbito.
As lesões de tecidos que, ocorrem em 90% em regiões pélvicas e
nos membros inferiores, provocadas pelas úlceras de pressão, podem
ser evitadas auxiliando a equipe de enfermagem na inspeção constante
e na mudança de decúbito a cada 2 horas ou conforme fragilidade
cutânea. A utilização de crioterapia nos casos de hiperemia estará
indicada para bloquear a atividade flogística.
Pode realizar estimulação elétrica neuromuscular para manter trofismo
e estimular neoformação vascular. O protocolo sugerido por Fosernier
e colaboradores consiste em utilizar corrente alternada 20-60
Hz, intensidade de 140 miliampéres, pulso de 0,3 à 0,5 milisegundos.
Associados aos cuidados de enfermagem e da nutrição.
Lesões articulares como luxações e bloqueios articulares devem
ser evitadas através cinesioterapia ativa para as funções musculares
intactas e mobilização passiva para os segmentos sem resposta
motora. Porém, esta última deve ser bastante cuidadosa, com intuito
de evitar posição de "stresse' articular.
3) Complicações Respiratórias
A insuficiência respiratória é a principal "causa mortis"
na fase aguda, segundo Cheshire (1964) e Bellami (1973).
Acima da quarta vértebra cervical, o paciente tem grave restrição,
por perda, parcial ou total dos nervos frênicos, podendo atingir
os músculos acessórios. O paciente necessitará de suporte ventilatório
por 24 horas diariamente para sobreviver.
Abaixo da quarta cervical, o nervo frênico estará intacto. Há
perda dos intercostais e abdominais. Edema pulmonar neurogênico
pode ocorrer. A tosse estará prejudicada e haverá retenção de
secreções e por conseguinte atelectasias. A intervenção fisioterápica
para a desobstrução pulmonar é de fundamental importância e consiste
na realização de manobras sobre o tórax ou abdome. A tosse tende
a ser sempre assistida pois a musculatura abdominal estará inapta.
Segundo a literatura, após as dificuldades ventilatórias na fase
aguda, muitos pacientes desenvolvem força muscular suficiente
para respirar independentemente dentro de 1 a 3 meses após o trauma.
CLASSE
|
DIAFRAGMA
|
ACESSÓRIOS
|
INTERCOSTAIS
|
ABDOMINAIS
|
1-C2
|
0
|
0
|
0
|
0
|
2-C4
|
+/-
|
+
|
0
|
0
|
3-C6
|
+
|
+
|
0
|
0
|
4-T4
|
+
|
+
|
+/-
|
0
|
5-T10
|
+
|
+
|
+
|
+/-
|
6-T12
|
+
|
+
|
+
|
+
|
Classificação das lesões vertebrais.
Parâmetros Alterados Após o Trauma Acima de T4
- Diminuição da capacidade residual funcional,
- Diminuição da capacidade vital forçada,
- Diminuição da complacência,
- Diminuição da Pi máx e Pe máx.
- Hipoventilação com hipercabia e hipoxemia
O trabalho pneumofuncional tende a ser regular
consistindo em:
- Incremento do trabalho diafragmático,
- Uso de ventilação com pressão positiva,
- Nebulização regular,
- Posturas de drenagem pulmonar,
- Utilização de cinta elástica quando sentados para manter a justaposição
e facilitar a mecânica diafragmática,
- Avaliação regular dos parâmetros abaixo :
PARÂMETROS
|
NORMAL
|
VALOR CRÍTICO
|
Capacidade Vital
|
40-70
|
15 ml/Kg
|
Pi máx
|
-140 / -70
|
-25 cmH2O
|
Pe Mín
|
>200/ >140
|
40 cmH2O
|
I. Fadiga (ti/t Tot)
|
> 0,2
|
> 0,4 seg
|
I R S (Tobin)
|
< 105
|
120
|
No trauma requimedular os parâmetros para retirada
de prótese ventilatória ficam comprometidos, ainda não existindo
rotinas definidas para o desmame, devem prevalecer a melhora dos
índices avaliados.
As estratégias para o desmame serão estabelecidas conforme a resposta
diafragmática à eletroneuromiografia, sempre que possível, ou avaliação
palpatória e ectoscopia. A eletroneuromiografia permite o conhecimento
da função diafragmática e se há integridade dos nervos frênicos.
Segue abaixo duas propostas para auxiliar no desmame
ventilatório :
4) Estabelecendo os Protocolos
Estimulação Diafragmática Elétrica Transcutânea (EDET)
Histórico:
Estudada desde o século XVIII. Foi utilizada por Ziemssen1857,
na insuficiência respiratória por doença neuromuscular 6,7. Na
década de 80 tornou-se uma promissora prática terapêutica, sendo
ainda de uso limitado. 1977 - Carlos Castro e Nivaldo Parizzoto
utilizaram laboratorialmente na ventilação de animais. 1978 -
foi aplicada em pacientes críticos na UTI , com objetivo de prevenir
o desuso funcional do diafragma.
Através do FRENICS, hoje temos correntes elétricas mais adequadas,
com estímulos elétricos de frequência segura e sem causar fadiga
ou desconforto cutâneo. A proposta da EDET é efetivar o desmame
da prótese ventilatória dos pacientes com disfunção do diafragma,
cujo o nervo frênico esteja íntegro. A estimulação minimiza a
hipotrofia das fibras diafragmáticas podendo até recrutar mais
unidades motoras 10,11, 12, 13.
Método/ protocolo:
Estimulação transcutânea com eletrodos de superfície, siliconizados
e auto-aderentes, ou através caneta apropriada. Durante a ventilação
mecânica no período insuflatório, buscando cinesia diafragmática.
Os pontos de estimulação foram estabelecidos através de pesquisa
em humanos iniciadas por Anne Mier8, em Londres e Cuello, na Argentina
:
- superfície lateral do pescoço;
- nível paraxifoideo;
- linha axilar média do 60 ao 80 espaço intercostal;
- formas conjugadas.
Padrão para estimulação:
Primeira semana
- intensidade mínima para produzir contração;
- rampa de 1 segundo;
- freqüência de pulso 20 - 30 Hz
- contração menor que 1 segundo;
- relaxamento de 2 segundos;
- quatro vezes ao dia;
- tempo de estimulação de 10 -20 minutos;
- pode ser realizada unilateralmente, 3 tempos de cada lado
- pode ser associado ao biofeedback.
Segunda semana
- três vezes ao dia;
- tempo de 20 - 30 minutos bilateralmente.
Avaliar ganho diafragmático através da eletroneuromiografia. Se
o resultado for positivo pode-se manter o treinamento para o desmame
somente com o biofeedback.
Biofeedback Respiratório:
Baseado em Crimer e col.(1993) é um processo de retroalimentação
para encorajar o paciente no controle das respostas fisiológicas
utilizando técnicas de relaxamento, monitorização de sinais auditivos
e visuais para atingir metas de treinamento. Isto pode ser feito
através do monitor de mecânica ventilatória específico (Ventrak)
ou simplesmente com o uso de telas de monitorização ventilatória
presentes nos respiradores microprocessados. Nestas telas, pode-se
verificar gráficos de volume corrente.
Trabalhos como de Corson e col. enfoca o biofeedback no desmame
da ventilação mecânica por determinar o treinamento de endurance
dos músculos ventilatórios.
O protocolo consiste em iniciar a ventilação mecânica com modo
espontâneo, assim que o paciente sai da fase crítica de disautonomia.
O paciente é colocado em Ventilação Assistida ( que tem como vantagem
backup para modo controlado) ou quando o déficit é pouco significativo,
a opção é o Pressão Suporte Ventilatório (PSV) de imediato.
O treinamento consiste em o paciente reproduzir uma ventilação
voluntária máxima ( volume corrente em torno de 7ml/kg) adaptado
ao ventilador em PSV 8 - 6 cmH2O. Isto será incrementado com visualização
por parte do paciente da curva de volume/tempo, associado ao incentivo
auditivo dado pelo fisioterapeuta para manutenção da ventilação
com o volume determinado. O trabalho deve ser realizado em intervalos
de tempo crescentes, iniciando com 5 minutos e aumentando sem
que haja sinais de fadiga.
A tolerância é avaliada pela freqüência respiratória de repouso
e atividade da musculatura acessória palpando o esternocleidomastoideo.
Quando alcançado 2 horas em PSV de 6 cmH2O , o paciente poderá
ser extubado ou mantido fora de prótese se traqueostomizado.