ENCONTRO INTERINSTITUCIONAL DE FILOSOFIA

ENCONTRO INTERINSTITUCIONAL DE FILOSOFIA

UFPE/UFPB/UFRN

 

“CRÍTICA E REFLEXÃO: A PERMANÊNCIA DA FILOSOFIA”

 

MESA REDONDA ENSINO DA FILOSOFIA                                   JOÃO PESSOA, 13 DE MAIO DE 2004

 

 

Prof. Markus Figueira

UFRN

 

 

profª. Elizabeth Maia da Nóbrega

UFPB

 

 

Prof. José Flávio Silva

UFPB

 

 

Hélcia Macedo de Carvalho Diniz e Silva

MESTRANDA/UFPB

 

 

 

 

O ENSINO DA FILOSOFIA NA LDB

POR: Hélcia Macedo de Carvalho Diniz e Silva[1]

 

 

 

APRESENTAÇÃO

               

Desde o término da graduação, em outubro de 2003, que considero interessante socializar nosso trabalho de conclusão de curso com especialistas no assunto. Uma contribuição didático-pedagógica do Ensino de Filosofia no Ensino Médio, este é o título da monografia que conta com cento e seis páginas.Um material desenvolvido com muito cuidado e dedicação, carregado de reflexões filosóficas.

É chegado o momento, ao lado de pessoas a quem muito estimo e admiro, sinto-me honrada de fazer parte desta Mesa Redonda. Na impossibilidade de abordar todo conteúdo, decidi destacar a lei que está subjacente ao ensino de filosofia. Portanto, o foco está sobre a LDB - Lei de Diretrizes e Bases, nos seus Artigos 35, inciso III e 36, § 1º, inciso III.

É trabalhando a temática da legislação que regulamenta o ensino de filosofia, discutindo sua importância, explicitando a compreensão crítica da LDB, que produzi esta comunicação, pensando e repensando a prática e a vivência pessoal. Isto porque a leitura da palavra é sempre precedida da leitura do mundo. Fundamental a urgência numa reavaliação de educadores e educandos, no que diz respeito ao posicionamento crítico da prática educacional. No sentido de poder superar a atual prática, negando a neutralidade da educação.

 

 

1.      UMA FORMAÇÃO CIDADÃ DO INDIVÍDUO

 

Partimos do estudo da Lei de Diretrizes e Bases nº 9.394 – LDB – Lei do Senador Darcy Ribeiro, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo então Presidente da República, Sr. Fernando Henrique Cardoso em 20 de dezembro de 1996. Ao exigir  formação cidadã do indivíduo, a lei aponta necessariamente para o ensino de filosofia. Portanto, deixa explícito que através da filosofia pode-se trabalhar a formação intelectual do educando. Possibilitando a este, maior capacidade para enfrentar o mundo, isto é, mercado de trabalho, família e sociedade. A atitude do homem é diferenciada ao deparar-se com os problemas cotidianos. E mais, tais problemáticas podem reaparecer no decorrer dos tempos com novas roupagens, e a cada dificuldade o homem age distintamente, respondendo de acordo com o contexto em que está inserido.

 Essa realidade acarretou mudanças nos pontos de vista das pessoas responsáveis pela educação. Elas entenderam que a educação tecnicista não atende as necessidades do homem contemporâneo. Concluíram que a formação escolar, além de prezar pelo conteúdo pragmático tem de proporcionar o senso crítico e a percepção racional do indivíduo. Essa exigência do processo educacional encaminhou-se para o retorno dos conteúdos filosóficos. Observamos brevemente o percurso do ensino  da filosofia na história da educação brasileira mostra momentos do ensino de filosofia: às vezes presentes e outras ausentes dos currículos.

2.      UM BREVE HISTÓRICO DO ENSINO DE FILOSOFIA

 

Durante o Império: neste período a filosofia estava presente através de matérias isoladas no Liceu da Paraíba. Não se estudava qualquer filosofia, mas aquela que interessava aos projetos dos cursos preparatórios para o ingresso nas faculdades de Direito em Recife.

Da República até o golpe de 64: a despeito do novo Estado o país passou por profundas reestruturações nas instâncias de poder. Neste período, houve momentos que a influência positivista retirou a filosofia dos currículos escolares, sob a alegação de que não figurava como matéria doutrinal.

Durante o regime militar: depois do golpe ditatorial, vinte e um anos marcados pela perseguição, de expulsão, de tortura e de morte dos estudantes, professores, artistas, políticos, sindicalistas e religiosos, a filosofia foi ocultada dos currículos escolares. ALVES (2002) destaca este período com relação ao ensino de filosofia dizendo:

 

a filosofia, disciplina naturalmente voltada para a discussão de idéias, sistema, teorias etc., logo ganha antipatia dos ideólogos do poder constituído, e sua retirada do currículo passa então a ser cogitada como uma necessidade, em nome da Segurança Nacional”.[2]  

 

Dos anos de 1974 até a publicação da LDB em 1996: ocorre grande mobilização em prol ao retorno da filosofia no ensino médio, de certa forma tem-se sucesso, mas a presença da filosofia se dá de modo controlado. Que parecia ter solução após a promulgação da “nova LDB”.

No esforço de oferecer uma educação mais humanizada, a lei entra em vigor com a reforma dos parâmetros de diretrizes e bases para a educação de todo território nacional. No entanto, é sabido que, uma imposição legal pode ser perigosa. O estudante do ensino médio é o alvo a ser atingido. Portanto, é para ele que a filosofia deve ser importante, nos leciona o professor doutor Silvio Gallo[3] “A presença da filosofia na escola precisa ser uma presença significativa para os jovens estudantes do ensino médio, ou é melhor mesmo que ela aí não esteja”.

 

3.      A FILOSOFIA NA LDB

 

A LDB 9.394/96 reconhece a educação nos âmbitos familiar, convivência humana, trabalho, instituições de ensino e pesquisa, movimentos sociais e manifestações culturais. Determina uma educação que deve está vinculada à prática social, isto é, deve-se educar não apenas para formar profissionais, técnicos, e sim para formar cidadãos, pessoas que pensam (refletem) sobre as suas práticas. A despeito da filosofia e seu ensino a lei trata no artigo abaixo:

“Do Ensino Médio[4]

          Art. 35. O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, terá como finalidades:

          I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

          II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo;

          III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico.

 

Determinando, assim, que é inquestionável para a formação do educando um arcabouço teórico, cujo fundamento filosófico é essencial. Expressando no Art. 36. § 1º. Inciso III: - “domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania”.

De forma que a preparação básica para o trabalho caminha ao lado da formação para a cidadania do indivíduo em sua fase escolar. Dessa forma, o indivíduo torna-se capaz de estar sempre aprendendo e sempre aberto às novas condições de ocupação ou aperfeiçoamentos posteriores.

Diante disto entendemos claramente que o ensino tecnicista é ineficaz na formação educacional. Torna-se explícito a decadência do positivismo apregoado por Auguste Comte (1798-1857). Na teoria comteana o conhecimento científico limitava-se ao sensível, à experiência imediata, às leis da natureza, no qual sobressai uma formação tecnicista. Esta prática acarretou num currículo centrado na empiria e nas ciências naturais.

Nesse sentido, não resta dúvidas de que a importância dada à filosofia pela LDB se equipara a dada as demais disciplinas, o que parece ser um argumento favorável a sua inclusão em toda rede de ensino. Sem dúvida a contribuição da filosofia para o alcance da finalidade da lei é inquestionável, haja vista que, como diz nos PCNEMs, ela busca “o Verdadeiro” (teoria do conhecimento), “o Belo” (estética), “o Bom” (ética).

Desta forma, busca-se preparar o educando para o exercício da cidadania e capacitação para o trabalho. Para isso, o Estado tem o dever de oferecer gratuitamente (garantir a comunidade) os ensinos fundamental, médio e para o aluno especial. Deve atender tanto aos que estão em idade regular quanto aos que não o estão. Quanto à família, cabe o dever de matricular e acompanhar os seus filhos menores, e ainda, orientar os adultos.

Ressaltamos ainda a importância do docente, este deve conferir a formação filosófica. Como nos leciona a Declaração De Paris Para A Filosofia - UNESCO - 1995 (In MOURA: 2003: 59): “o ensino filosófico deve ser ministrado por professores competentes, especialmente formados para este efeito, e não pode estar subordinado a nenhum imperativo econômico, técnico, religioso, político ou ideológico”.

           A LDB (Leis de Diretrizes e Bases), a lei 9.394/96, oferece à educação uma reviravolta no agir, põe em evidência uma formação educacional que prima formar cidadãos. Em seus diversos artigos demonstra as múltiplas facetas do que deve ser, realmente, a educação. Mas, essa é uma lei ideologicamente completa, e como tal há dificuldade na sua plena realização. Tanto é que encontramos facilmente sua desobediência no que diz respeito ao ensino de filosofia.

A problemática do ensino médio em relação à sua utilidade na vida do indivíduo é vista, de acordo com a LDB, como meio para se alcançar uma consciência crítica acerca dos problemas sócio-econômico-cultural, e ao mesmo tempo uma capacitação profissional para a inserção deste indivíduo no mercado de trabalho. Tal problemática foi muito discutida no Brasil e é uma questão fremente. Porém pouco progresso se ver encaminhado, atribuímos o descaso com essa questão parte aos governantes (talvez porque essa causa não gere votos imediatos), e parte aos cidadãos esclarecidos, que se esquivam dos seus deveres.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), no subtítulo “Conhecimentos de filosofia” da “Parte IV – Ciências Humanas e suas Tecnologias”, reforçam a posição adotada na LDB afirmando que:

 a nova legislação educacional brasileira parece reconhecer afinal, o próprio sentido histórico da atividade filosófica e, por esse motivo, enfatiza a competência da filosofia para promover, sistematicamente, condições indispensáveis para a formação da cidadania plena” (p. 89).

Novamente parece não haver dúvida de que os conteúdos filosóficos são imprescindíveis para a formação humanística. No entanto, o ensino de tais conteúdos é feito sem que a grade curricular o obrigue? Por isso, acreditamos que a inclusão da filosofia no ensino médio não contribui apenas para o fortalecimento da filosofia, o que já é muito bom, mas também para a garantia de um ensino mais completo, o que é ainda melhor. Um ensino comprometido com a formação humanística.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Este estudo tem o intuito de compreender melhor a aplicação da LDB nº. 9.394/96, no Artigo 35, inciso III e Artigo 36, §1º, inciso III. Que trata do ensino de filosofia. Tais artigos são indispensáveis para a discussão do ensino da filosofia.

Atender a sugestão da LDB/96, no que diz respeito ao ensino de filosofia como pré-requisito para a formação do educando no ensino médio parece-nos um bom caminho para melhorar o nível da educação. Temos exemplos no Brasil inteiro, como nos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal, e mais recentemente Minas Gerais, onde a filosofia é tida como disciplina em nível médio, fazendo parte da grade curricular obrigatória. No Estado do Rio Grande do Norte o ensino de filosofia não é componente obrigatório na grade curricular, no entanto tem filosofia nas escolas estaduais, e esse conhecimento é repassado à clientela como complemento de sua formação plena.

Serve-nos como exemplo os municípios de Uberlândia e Londrina, onde a filosofia é adotada nos seus programas curriculares e de vestibular. Humberto Aparecido de Oliveira Guido[5], nos leciona: “a inclusão da filosofia nas provas de vestibular tem contribuído também, segundo a Comissão Permanente do Vestibular da Universidade Federal de Uberlândia, para a melhoria da qualidade das provas discursivas das outras disciplinas”.

Notifiquemos o Estado da Paraíba, que além de ser comtemplada com a LDB, obviamente, tem a Lei Estadual nº. 7.302 de 07 de janeiro de 2003, que determina a obrigatoriedade da disciplina Filosofia nas Escolas Públicas. No entanto, na prática a disciplina não foi implantada.

Não é simples fechar definitivamente este assunto. Consideramos levantar alguns questionamentos importantes, muitas vezes debatidos no grupo Padre-Mestre João do Rego Moura (JRMoura)[6], para nossa reflexão: se há uma lei federal que sugere conhecimentos filosóficos ao término do ensino médio, por que só alguns estados aderiram a essa prática?  Se a educação tecnicista não atende mais a formação do indivíduo, por que a resistência? Sendo a filosofia importante para a formação do cidadão, por que a LDB não detalhou a sua prática? E se tivesse determinado a obrigatoriedade do ensino de filosofia no ensino médio, esta determinação legal seria suficiente para por em prática o ensino da filosofia? Qual o futuro da cidadania se a educação continuar extremamente pragmática? Neste contexto não nos cabe prever um futuro imaginário ou mesmo, criar um ensino utópico de filosofia. Temos que trabalhar diante da doída realidade. Teremos, pelos menos, questões ainda não respondidas, a serem refletidas e repensadas. Tudo isso, porque a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) apenas sugere a filosofia como conteúdo, fazendo-a cair na transversalidade e interdisciplinaridade. Por fim, relembramos o título deste encontro: “Crítica e reflexão: a permanência da filosofia”. Entendemos que talvez seja necessário que a filosofia faça parte dos currículos escolares, como foi no início da nossa história, para permanecer. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

ALVES, Dalton José. A filosofia no ensino médio: ambigüidades e contradições na LDB. São Paulo: Autores Associados, 2002.

BRASIL, Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnologia. Parâmetros curriculares nacionais: ensino médio / Ministério da Educação. Secretaria da Educação, 1999.

BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação: lei 9.394/96. Apresentação Carlos Roberto Jamil Cury. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

FREIRE, P. L. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

GUIDO DE OLIVEIRA, Humberto Aparecido de,. A Filosofia no Ensino Médio: uma disciplina necessária. In: GALLO, Sílvio; KOHAN, Walter Omar. (Orgs). Filosofia no Ensino Médio. Petrópolis: Vozes, 2000, v. VI, p. 81-93.

MATOS, J. C. Em toda parte e em nenhum lugar: a formação pedagógica do professor de filosofia. Tese de Doutorado em Educação. Campinas: PUCCAMP, 1999.

PIMENTA, Selma Garrido. O estágio na Formação de professores: unidade teoria e prática? São Paulo: Cortez, 2002.

SILVA, José Flávio (1993), “Filosofia na Paraíba”, Correio das Artes, Jornal de Domingo, 10/01/93.

TEIXEIRA, Anísio. Pequena introdução à filosofia da educação. Rio de Janeiro: Ed. DP&A, , 2000.

VIEIRA, Antonio Rufino. A licenciatura em filosofia: a filosofia no Ensino Médio na Paraíba, In MOURA, W. L. A crítica da religião na obra “Diferença da filosofia de Demócrito e de Epicuro” de Karl Marx.   João Pessoa: Fundação Ulisses Guimarães, 2003, p. 51-57.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



[1]Formação filosófica e aluna da Pós-Graduação da UFPB, Hélcia Macedo considera fundamental o ensino de filosofia no Ensino Médio, no sentido de formar no jovem a capacidade de ação que gere a reação da transformação da realidade atual, formando-os em cidadãos pensantes e críticos da mesma. O ensino de filosofia pode se iniciar na infância, e por que não? Obviamente, em cada nível deve-se usar a pedagogia, a linguagem e a didática adequadas.

 

[2] Dalton José Alves. A filosofia no ensino médio: ambigüidades e contradições na LDB. p.38.

[3] no prefácio do livro A filosofia no Ensino médio: ambigüidades e contradições na LDB de Dalton José Alves. p. xv.

[4] BRASIL. Lei de diretrizes e bases da educação: lei 9.394/96. Apresentação Carlos Roberto Jamil Cury. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

 

[5]Humberto Aparecido de Oliveira Guido. Filosofia no ensino médio. 2000. p. 92.

[6] JRMoura – grupo de professores estudantes, tem como objetivo principal a luta pelo retorno da filosofia no ensino médio na Paraíba.

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