II GUERRA

 

Fim de semana. Zafira na estrada. Zafira não. Caravela como a chamo carinhosamente nesses dias em demanda a Praia do Forte.
De repente, uma placa a beira da estrada: BARRA DO RIO POJUCA - RESTAURANTE MANGUEZAL. Mais que de repente abriu-se em minha mente o "mapa do tempo" aquele mesmo que o velho Rosa ensinava: "é preciso ter sempre consigo o mapa do tempo; ter um ponto de referência; saber se situar no espaço e no tempo. Na vida. Ter uma âncora".
Aí me lembrei do "horizonte do evento" onde as minhas energias em suas múltiplas formas encontram as paredes do meu ser para se refletirem em um caminho sem limites. Pobre de mim. Por mais que queira me livrar das recordações elas me acompanham. Parece que a Caravela tão grande para mim e Dete, somente foi feita para carregá-las. Deixa pra lá. Para minha sorte elas, as recordações, me fazem feliz.
São 11 horas. Ainda é cedo para almoçar. Mas hora certa para o uisquinho preliminar e visitar o pedaço terminal do rio Pojuca meu velho conhecido apenas no trecho em que banha a sede do município. Deslumbramento! Depois de andar sobre um deck de madeira entalhada por exímio carpinteiro, com certeza, com uma extensão aproximada de 50 ms., fundado sobre o manguezal por onde caranguejos cumprindo coreografia de uma dança ditada pela natureza, perfeita, linda, correm lateralmente, cavam buracos, se enterram e surgem adiante em outros buracos antecedidos de borbulhos que refletem a luz do sol com cores do arco iris.
Finalmente cheguei ao cais flutuante onde está assentado o restaurante. Ambiente rústico. Cardápio francês. Fino. Primeiro gole, olhar na paisagem. O garçon, sergipano de origem, criado no local, responde a minha curiosidade: o proprietário, jovem bahiano, nascido de pais judeus, viveu um bom tempo em Israel, onde estudou, serviu ao exército, trabalhou, ganhou dinheiro, e retornou a terra onde nasceu para investir no negócio. Dificuldades burocráticas. Ibama e outras siglas. Vitorioso como Davi, sábio com sua cultura de 5000 anos tornou-se guardião da ecologia local.
Vale a pena visitar a Barra do rio Pojuca. Segundo gole, o rio me cobra atenção. Águas verde claras, fundo de areia branca, largo, correndo entre o verde escuro do manguezal, em ondas miudinhas geradas pela brisa morna que chega do oceano através sua foz. E o SUBMARINO? Pergunta inserida no "mapa do tempo" aberto sobre a mesa. Já falei sobre isto. Consta na história da família, que tio Totonho - irmão de minha avó Hermelina, mãe de meu pai, e avô do meu primo Ardson, amigo dos mais queridos, companheiro nos jogos de basquete, nas farras e nas cajuínas em a Fazenda Buril - escrevera à Getúlio Vargas, então presidente da república denunciando a presença de submarinos alemãs no rio Pojuca em plena II Guerra, pelo que era tido como louco e gozado as escondidas pelos familiares mais jovens. Daí a citação ao "horizonte do evento" no início destas linhas. Foi preciso viver 65 anos para que as palavras de tio Totonho chegassem aos meus ouvidos como verdade.
Apaixonado pela prática da pescaria em fins de semana ele viu, quando realizava uma delas, um submarino no local, em ancoradouro seguro em rio largo, tranqüilo, que sem o assoreamento dos dias atuais, dava calado aos pequenos e mortíferos vasos de guerra camuflados pelo manguezal. Desculpe-me tio. Com certeza o local poderia abrigar não somente um submarino, mas para servir de base a toda frota de submarinos em ação na nossa costa.
Neste momento pareço ouvir meu pai: "É moreno, você matou a charada! Também não se pode brincar. Você leva tudo a sério. Ah, Ah, Ah." É verdade. Este defeito juntamente com outros seguem como bagagem na Caravela. Adiante.

Luiz Carlos Outubro de 2007.

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