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O erro ampliado

Em guarulhos, prédio grande vazio, cor clara rua estreita e comprida, mas movimentada ....Sábado a tarde /barulho de crianças, tudo parece balhurento muita gente na rua...é preciso gritar. Um ônibus passa constantemente..sempre o mesmo ...com letreiros imensos mostrando o destino, quase atropela pessoas, passa a cada 5 minutos.. . Dentro do prédio, homem baixo e com bastante pêlos na orelha, pega ao telefone e liga, o que fala, se junta aos falatórios de fora que se ouvem dentro...ninguém escuta nada, ele diz alguma coisa, que com o barulho parece inaudível,.. até pra alguém que estivesse dentro de sua boca. Depois das expressões de fala, desliga e caminha devagar para o grande pátio interno. Vê uma mulher gorda que estende coisas num varal. De repente todo o barulho para. A mulher é só uma figura que se mexe. A cena é silenciosa.. muito silenciosa...um balde grande.....nele fotos do tamanho real de pessoas mortas, bem mortas, atropeladas e assassinadas sem rosto........grandes fotos recortadas em formato dos corpos das pessoas mortas. São presas pela mulher com pregadores, num grande varal que atravessa o pátio, é uma cena muito louca, a mulher gorda as estende e solfeja salatiel, suas mãos são gordas e os cadáveres em foto são expostos ao sol....é um ritual maluco, muitas fotos, muitos mortos, a mulher já costumada..nem se abala, as vezes, só as vezes..olha mais demoradamente para uma foto, mas.é só...depois continua a tarefa maluca...O tempo passa e o varal já está quase cheio.. até que...... rodas/revolveres /sapatos pretos, gastos só de um lado......um policial.A mulher assusta e lembra se "tudo que vc disser poderá ser usado contra vc" !! ele tem cara de fuinha... conversa com o homem de pêlos nas orelhas, A gorda tem um choque elétrico e pára de estender. O policial, guarda,rato,porco autoridade por alguma razão começa a olhar as fotos no balde, parece que alguém pediu a ele que viesse...a mulher, depois do susto e de observa lo um pouco...não dá mais bola e re-inicia a tarefa ..o policial as vezes faz perguntas , ela com a cabeça, diz que não sabe de nada.. mas os olhos dizem que pode ser. O policial cisma com a foto de um homem morto/fotografado, que insiste em não ficar preso no varal..ele é gordo e pesado..cai toda hora, a mulher sempre volta e recoloca os prendedores..o policial começa a se interessar e diz algumas palavras que ninguém entende...pega uma lupa e começa a tirar a identidade dos dedos da foto, é demorado, pois a foto esta pingando, e é preciso enxugar a lupa, a todo instante. A mulher gorda continua, já esta longe..muitos mortos/fotos estão pendurados... secando, tem-se a impressão, de uma imensa exposição de vanguarda. O policial que disse se chamar Junk fica curioso com uma das impressões e pelo rádio do carro, liga para algum lugar /fala/ desliga e senta no meio-fio.. olha para os cadáveres pendurados ..e pensa ..em quando os mortos ainda não eram fotos...era um tempo de muito trabalho..sentia se o cheiro do morto, e vomitava se muito nas sessões de identificação...mas a fotoptica tinha tido uma boa idéia..nada mais ligth do que lidar com a morte em foto/cópias. É claro que a consternação ainda estava lá..era só ver as caras dos parentes quando viam as fotos de alguém querido, alguns ainda faziam escarcéu..as vezes, até danificavam as cópias. Aquela coisa de seca-las, era muito duro de ver. Mas o que fazer:?? Os tempos são outros..e temos que dançar rap. Mas aquela foto do gordo lhe chamou a atenção ..o olhar brilhante do homem ...não fazia sentido .....mas o que fazer..nem olhando os negativos....fotos são fotos, ele deve ter visto algo que não pôde dizer...havia sido fotografado, antes... Bem, agora é tarde...Não daria para saber. Algumas pessoas/fotos/mortas são pesadas,.. a gorda é forte... Algum tempo depois, chega um carro da Policia..Um homem entendido em homens e crimes que não disse o nome. Ralph, médico com cara de mostro e Donizete um enfermeiro com quatro braços, que carrega sozinho a maca. Eles passam a falar e andar em volta das fotos...uns com luvas outros não, morto é morto, mesmo em fotos/fotos pingando...A mulher já está estendendo as fotos do talvez oitavo balde...depois de um tempo.. pegam a foto de um negro grande !! .parece que ainda, não estava totalmente morto...a foto foi levada pelos homens..Todos os homens incluindo o Homem de pêlos vão embora... Fica só o silêncio..a mulher que pendura..esta bem longe... a foto do gordo já meio torta e rígida parece sofrer. Mas....Pendurada ao lado, uma jovem de mais ou menos 28 anos, fotografada nua. Esta pendurada de cabeça para baixo, não sei se por despeito da gorda, (pois a garota é muito linda) ou por distração, ainda bem que não estava de vestido quando morreu ..pois teria ficado muito encabulada...mas, estava morta, e não teria como ficar, só morta de vergonha.

Beraldo Bicudo
52 anos, de São Paulo - SP. É diretor de filmes de propaganda. nascido em minas, foge de casa aos 12 anos e vive na febem até 18 anos, envolve-se em movimentos estudantis, e vai preso em 1970. Em 71 retoma sua vida e forma se na faculdade Belas Artes SP, atualmente pinta escreve e dirige programas e filmes.
Correio: [email protected]

 

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