Análises de textos
de Felipe César Dias Diógenes
texto do trabalho Modernismo
Pré-Modernismo
Oswald de Andrade
Erro de Português
Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português.
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Interpretação:
Neste poema de Oswald de Andrade observamos seu humor e também suas
brincadeiras com a história, notadas também em Senhor Feudal:
"Se Dom Pedro II
vier aqui com história
eu boto ele na cadeia"
O poema Erro de Portugues também fala da questão do índio, discutida
por Oswald e usada para ilustrar muitos pensamentos seus. Ele o coloca
como representante do Brasil "Tupy or not Tupy".
Primeira Fase
Manuel Bandeira
Vou-me Embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que eu nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei -
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
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Interpretação:
Neste texto de Bandeira ele relata a sua Pasárgada(que significa campo
dos persas), uma utopia inventada por ele para fugir de sua dura realidade
de tuberculoso. Nela, ele teria família ( todos os seus parentes morreram),
faria exercícios físicos (coisa impensável devido a sua tuberculose),
teria mulheres( que mulher quer um doente?), teria alcalóide à vontade(
alcalóide é um remédio contra a tuberculose), poderia fazer sexo despreocupadamente
( tem um processo seguro / pra impedir a concepção) e ele seria amigo
do Rei, assim só trabalharia se quisesse.
Além disso Pasárgada incorporaria alguns aspectos do seu tempo de infância
que influenciou bastante sua obra : "Mando chamar a mãe-d'água/Pra
me contar as histórias/Que no tempo de eu menino/Rosa vinha me contar/Vou-me
embora pra Pasárgada." Bandeira uma vez falou: "Comparando
4 anos de minha meninice com 4 anos da minha fase adulta fico abismado
com o vazio destes em relação àqueles".
Em relação à forma identificamos forma livre e construções sintéticas,
com pouca adjetivação.
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Manuel Bandeira
Poética
Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo
e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho
vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar
com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar às mulheres,
etc
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare
Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
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Explicação:
Esse poema de Manuel bandeira prega o uso da forma livre e novamente
faz críticas a qualquer norma na poesia. "De todo o lirismo que
capitula ao que quer que seja". Nele, ele lança demonstra claramente
as características modernistas.
Ironia e sátira: " O lirismo dos clowns de Shakespeare"
Irracionalismo, que ocorria em algumas vanguardas: " Quero antes
o lirismo dos loucos"
Verso livre: "Todos os ritmos, sobretudo os inumeráveis"
Emprego de uma língua mais "brasileira": "Estou farto
do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo
de um vocábulo" e "Todas as construções, sobretudo os barbarismos
universais"
Escrita sobre temas mais profundos: "Estou farto do lirismo bem
comportado" e "Lirismo difícil e pungente dos bêbados",
pois estes dizem o que querem.
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Manuel Bandeira
Os Sapos
Enfunando os papos,
Saem da penumbra
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos!
O meu verso é bom
Frumento sem joio
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinqüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A formas a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas . . ."
Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei" - "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!"
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- "A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo."
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;
Lá, fugindo ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio
1918
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Interpretação
Nesse poema de Bandeira ele demonstra seu desprezo pelos parnasianos
satirizando-os na figura do sapo-tanoeiro (tanoeiro significa a pessoa
que conserta cubas, pipas e barris, profissão considerada vulgar). No
trecho em que a saparia fala que "não há mais poesia, mas há artes
poéticas" ele nos diz que a arte parnasiana não contem poesia,
ou o conteúdo belo, apenas mantem a forma de poesia, que pode ser chamada
a arte de poetizar. No trecho em que o parnasiano nos fala "Reduzi
sem danos a formas a forma" ele se defende porém é colocado de
forma irônica por Bandeira, pois o sapo-tanoeiro reduziu a forma de
escrever poesia (sonetos, por exemplo) a moldes, estruturas rígidas
e muito "amarradas".
O sapo-boi no caso representa classe dominante literária e social,
do alto da sua importância, que não pede, manda, como é observado nas
suas falas. "o sapo-boi berra", "urra o sapo boi".
O sapo-cururu no caso é o próprio Bandeira, solitário e recluso, o
sapo feio, inglório, sem esperança.
Este poema foi declamado no segundo dia da semana de arte moderna sob
grande alaridoe gritos da platéia, tendo contribuído bastante para a
afirmação das propostas modernistas e detrimento das parnasianas.
Segundo Momento - Poesia
Carlos Drummond de Andrade
José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você consasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?
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Interpretação:
Carlos Drummond de andrade faz parte da segunda geração modernista,
cuja a poesia é caracterizada pela sensação de estar-no-mundo. Esse
texto representa a ausência de saída à qual José é submetido. Pode ser
demonstrado pelo fim da vida ou pela incapacidade do homem de mudar,
sob o peso de suas responsabilidades.
Repare nas construções sintéticas com pouca adjetivação, com versos
simples mas que no conjunto formam a beleza. Observe que o poema tem
uma certa musicalidade e ritmo embora sem rima e métrica pouco definida
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Vinícius De Moraes
Soneto da Fidelidade
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
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Interpretação:
Esse poema já faz parte da segunda fase de Vinícius, ligada a temas
mais materias, como mulher e causas sociais. Repare que ele utiliza
sonetos e vocabulário rico podendo assim dizer que ele é um neo-camoniano.
Nele ele faz uma apologia a fidelidade e a viver cada amor com todas
as suas forças, até que ele acabe. Essa necessidade amar ao máximo em
cada momento pode ser relacionada com o Carpe-Diem de escolas passadas.
Sendo assim um resgate das escolas passadas.
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Vinícius De Moraes
O Dia da Criação
Macho e fêmea os criou.
Gênese, 1, 27
I
Hoje é sábado, amanhã é domingo
A vida vem em ondas, como o mar
Os bondes andam em cima dos trilhos
E Nosso Senhor Jesus Cristo morreu na cruz para nos salvar.
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Não há nada como o tempo para passar
Foi muita bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo
Mas por via das dúvidas livrai-nos meu Deus de todo mal.
Hoje é sábado, amanhã é domingo
Amanhã não gosta de ver ninguém bem
Hoje é que é o dia do presente
O dia é sábado.
Impossível fugir a essa dura realidade
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios
Todos os namorados estão de mãos entrelaçadas
Todos os maridos estão funcionando regularmente
Todas as mulheres estão atentas
Porque hoje é sábado.
II
Neste momento há um casamento
Porque hoje é sábado
Hoje há um divórcio e um violamento
Porque hoje é sábado
Há um rico que se mata
Porque hoje é sábado
Há um incesto e uma regata
Porque hoje é sábado
Há um espetáculo de gala
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que apanha e cala
Porque hoje é sábado
Há um renovar-se de esperanças
Porque hoje é sábado
Há uma profunda discordância
Porque hoje é sábado
Há um sedutor que tomba morto
Porque hoje é sábado
Há um grande espírito-de-porco
Porque hoje é sábado
Há uma mulher que vira homem
Porque hoje é sábado
Há criançinhas que não comem
Porque hoje é sábado
Há um piquenique de políticos
Porque hoje é sábado
Há um grande acréscimo de sífilis
Porque hoje é sábado
Há um ariano e uma mulata
Porque hoje é sábado
Há uma tensão inusitada
Porque hoje é sábado
Há adolescências seminuas
Porque hoje é sábado
Há um vampiro pelas ruas
Porque hoje é sábado
Há um grande aumento no consumo
Porque hoje é sábado
Há um noivo louco de ciúmes
Porque hoje é sábado
Há um garden-party na cadeia
Porque hoje é sábado
Há uma impassível lua cheia
Porque hoje é sábado
Há damas de todas as classes
Porque hoje é sábado
Umas difíceis, outras fáceis
Porque hoje é sábado
Há um beber e um dar sem conta
Porque hoje é sábado
Há uma infeliz que vai de tonta
Porque hoje é sábado
Há um padre passeando à paisana
Porque hoje é sábado
Há um frenesi de dar banana
Porque hoje é sábado
Há a sensação angustiante
Porque hoje é sábado
De uma mulher dentro de um homem
Porque hoje é sábado
Há uma comemoração fantástica
Porque hoje é sábado
Da primeira cirurgia plástica
Porque hoje é sábado
E dando os trâmites por findos
Porque hoje é sábado
Há a perspectiva do domingo
Porque hoje é sábado
III
Por todas essas razões deverias ter sido riscado do Livro das Origens,
ó Sexto Dia da Criação.
De fato, depois da Ouverture do Fiat e da divisão de luzes e trevas
E depois, da separação das águas, e depois, da fecundação da terra
E depois, da gênese dos peixes e das aves e dos animais da terra
Melhor fora que o Senhor das Esferas tivesse descansado.
Na verdade, o homem não era necessário
Nem tu, mulher, ser vegetal, dona do abismo, que queres como
as plantas, imovelmente e nunca saciada
Tu que carregas no meio de ti o vórtice supremo da paixão.
Mal procedeu o Senhor em não descansar durante os dois últimos dias
Trinta séculos lutou a humanidade pela semana inglesa
Descansasse o Senhor e simplesmente não existiríamos
Seríamos talvez pólos infinitamente pequenos de partículas cósmicas
em queda invisível na
terra.
Não viveríamos da degola dos animais e da asfixia dos peixes
Não seríamos paridos em dor nem suaríamos o pão nosso de cada dia
Não sofreríamos males de amor nem desejaríamos a mulher do próximo
Não teríamos escola, serviço militar, casamento civil, imposto sobre
a renda
e missa de
sétimo dia.
Seria a indizível beleza e harmonia do plano verde das terras e das
águas em núpcias
A paz e o poder maior das plantas e dos astros em colóquio
A pureza maior do instinto dos peixes, das aves e dos animais em cópula.
Ao revés, precisamos ser lógicos, freqüentemente dogmáticos
Precisamos encarar o problema das colocações morais e estéticas
Ser sociais, cultivar hábitos, rir sem vontade e até praticar amor
sem vontade
Tudo isso porque o Senhor cismou em não descansar no Sexto Dia e sim
no Sétimo
E para não ficar com as vastas mãos abanando
Resolveu fazer o homem à sua imagem e semelhança
Possivelmente, isto é, muito provavelmente
Porque era sábado.
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Interpretação:
Este poema representa a primeira fase de Vinícius, mais espiritualista
e religiosa com certo apego as normas ( ou ausência de normas) da primeira
fase. Nele, questiona se Deus houvesse descansado no sábado, a humanidade
não existiria e questiona também o próprio mérito ou necessidade de
existência da mesma.
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