[Lorena Bezerra] [Autores] [Esquina da Literatura]

CRÍTICA LITERÁRIA - DOM CASMURRO - MACHADO DE ASSIS
de: Profa. Lorena Bezerra

Um delicioso desafio a ser conquistado
( Artigo Publicado pelo Jornal Diário de Pernambuco - Recife -PE)

Caro leitor você seria capaz de escrever uma história na qual o narrador não conseguisse convencer seu leitor de sua própria opinião? Não só nós, meros mortais, duvidamos da narrativa de Bento Santiago, como nem ele mesmo consegue chegar a uma conclusão do que realmente aconteceu, por isso reatar as duas pontas da vida: reviver na velhice, através da memória, a juventude. Este estado de ambigüidade é o ponto máximo do livro.

Através da linguagem unilateral, refletindo apenas o ponto de vista de Bentinho, é que a trama da obra se constrói. Deixando no final uma incógnita "eterna", pois até hoje só há indícios de um adultério, mas nunca comprovação do mesmo.

Talvez você imagine que isso é até razoavelmente fácil,  estamos convidando-o a tentar. No entanto  se imagine nascido em 1839, no Morro do Livramento, Rio de Janeiro. Mestiço, filho de Maria Leopoldina  Machado, lavadeira portuguesa da Ilha de São Miguel, e de Francisco de Assis, mulato carioca, pintor de móveis. Pobre, feio e órfão, perdeu primeiro a mãe e aos doze anos o pai. Além de gago e epiléptico, sendo criado pela madrasta não teve tempo de freqüentar a escola, pois necessitava vender doces na Central do Brasil para ajudá-la na despesas. Mesmo não sendo religioso foi sacristão, pois na Igreja podia se alimentar e ler, sua grande paixão.

Não pense que isso é fábula da carochinha, esta vida que aparentemente tinha tudo para dar errado, foi a trajetória de Machado de Assis. Haverá, certamente, o questionamento: ele era um gênio; mas quando se descobriu isso? Muito tempo depois, antes de adquirir respeito ele teve de batalhar muito, em todos os sentidos, é o que se percebe na evolução de sua obra.

A técnica perfeita não aparece ainda nos seus primeiros trabalhos, a despeito do valor que já possuíam, dê-se como exemplo: Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878).

Só depois de algum tempo que ele chega a Dom Casmurro (1899), obra que nos presenteia com uma das mais belas e perfeitas personagens femininas da Literatura Brasileira: CAPITU.

Inteligente, astuta, determinada, sagaz, mais acima de tudo uma mulher forte, muito forte. Contrapondo-se a fragilidade e a insegurança de Bentinho, ela com seus olhos de "ressaca" nos envolve, como aos personagens do livro e nos traga para as profundezas de seus domínios. Ainda com seus olhos de "cigana oblíqua e dissimulada", ela não revela nada que não queira ver revelado, porque tem completo domínio das situações e das pessoas que a cercam.

Se houve ou não traição, isso é de menor importância, já que este não é apenas mais um livro sobre adultério. É uma obra que através do jogo de insinuações, da linguagem dúbia e das personagens ambíguas, nos leva até a duvidar do narrador.

E você, leitor, deseja um desafio mais delicioso que este? Impossível. Então corra até a banca mais próxima e se delicie com a leitura impagável da obra machadiana. Identifique-se com as  personagens, questione-as e apaixone-se.

 

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