Violência no Jardim - primeira parte
VIOLÊNCIA NO JARDIM *


Por Polly Peachum
Tradução por Vanderdecken
Adaptação para português brasileiro por rose



O locus da fantasia dum homem com sorte não contém robôs; duma mulher com sorte, não contém predadores; chegam à idade adulta sem violência no jardim
Naomi Wolf


Temos um gato doméstico, e por isso todas as manhãs, a título de mimo especial, carrego nos braços o nosso tigrezinho cinzento enquanto passeio pela selva caótica a que os nossos vizinhos erroneamente chamam o seu jardim. Enquanto levo no colo o meu gato ao longo de um trilho rodeado com flores quase trinta centímetros mais altas do que eu, passando por uma massa escura de pinheiros, e para trás à roda da magnólia e dum canteiro de tomates que faz por sobreviver, me pego muitas vezes a devanear sobre quem ou o quê poderá estar escondido na vegetação, a olhar para mim com olhos esfomeados. Na minha imaginação “sem sorte”, o jardim sombrio e fértil está povoado de predadores. Por trás de cada arbusto, esgueirando-se fora de vista, dentro das sombras, está alguém mais forte e mais brutal do que eu, alguém que me quer subjugar e curvar-me à sua vontade, alguém que quer torturar-me ou humilhar-me cruelmente só para me ver corar, choramingar ou gritar de dor.
É um devaneio maravilhoso, arrebatador, e eu vivo uma versão dele, menos feroz, na minha vida quotidiana. Vivo a minha vida como uma escrava a tempo integral no contexto duma relação sadomasoquista heterossexual. Sei que para muitas pessoas isto pode fazer-me parecer uma vítima auto-destrutiva, viciada em abuso. Esta perspectiva não é correta nem justa. Os meus devaneios da selva (e a minha realidade concreta) representam a realização de desejos sexuais que são para mim de longe mais positivos - embora radicalmente diferentes – do que àqueles que a maior parte das pessoas considera saudável ou mesmo são de espírito.

Não estou sozinha em ter esta espécie de sonhos. De acordo com um estudo mencionado por Naomi Wolf em The Beauty Myth, o Dr. E. Hariton conclui que 49% das mulheres americanas estudadas têm fantasias de submissão. Como eu, sonham ser capturadas, batidas, chicoteadas, controladas e usadas como um brinquedo. Mas como a dominação sexual, a submissão e o sadomasoquismo em geral são olhados com horror e repulsa pela sociedade convencional, muitas pessoas com fantasias de submissão, mulheres ou homens, ficam apenas na fantasia. Eu, porém, fiz a escolha de tornar as minhas fantasias realidade, e ao fazê-lo realizei os sonhos que mais acalentava. Acredito que sou uma das pessoas mais felizes e realizadas que conheço. Tenho a certeza que devo a minha felicidade a um simples fato: prossegui e abracei os meus desejos mais profundos em vez de os ignorar. Transformei-me na pessoa que acredito que estive sempre destinada a ser, na pessoa que tinha necessidade de ser. Sou razoavelmente livre de conflitos internos, estou razoavelmente em paz comigo própria, e sinto-me vibrantemente viva. Aceitei a minha paixão pela submissão como a escolha saudável, afirmativa e maravilhosa que ela é para mim. Nos seis anos durante os quais tenho vivido este sonho, não lamentei uma única vez a minha escolha nem amaldiçoei os meus desejos perversos. De fato, considero-me uma das pessoas mais afortunadas que existem.

Suspeito que muitas mulheres me encaram como uma pessoa oprimida e manipulada, enganada por um homem para fazer o que as mulheres têm feito pelos homens desde tempos imemoriais na maior parte das culturas: servir, obedecer, estar à sua disposição sexualmente. Eu me vejo, em contrapartida, como um ser humano consciente, inteligente e intrépido que ousou fazer o que poucas mulheres tentam: corri um risco enorme, rejeitei quase tudo o que a sociedade me dizia que tinha que aceitar para ser feliz, e prossegui deliberadamente naquilo que eu sabia no íntimo que me faria mais feliz. E tive êxito.

O meu êxito foi conseguido com dificuldade e isso o torna ainda mais precioso para mim. Nenhuma mulher nesta cultura é educada com os outros lhe dizendo que ser escrava é uma coisa boa. Nenhuma é encorajada a tornar-se empregada doméstica ou elogiada pela sua subserviência. Se formos uma criança com desejos destes, aprendemos a escondê-los dos nossos pais. Quando crescemos, aprendemos a escondê-los dos nossos companheiros de brincadeira. E se atingimos a puberdade, como eu a atingi, num tempo de crescimento da consciência feminista, até podemos aprender a escondê-los de nós próprias. Mas no cômputo final, uma pessoa esconder de si própria os seus verdadeiros desejos sexuais nunca funciona. Como no provérbio que diz que algo ruim sempre voltará a aparecer, a nossa sexualidade regressa sempre de qualquer terra remota para onde a tenhamos banido e tem, mais cedo ou mais tarde, que ser tida em conta e resolvida, mesmo que a decisão resultante deste processo seja ter consciência do que nos motiva mas não agir de acordo com isso.

Muitas mulheres que, como eu, passaram para lá das fantasias e são submissas ativas debatem-se com a contradição aparente entre estes desejos e o que a sociedade em geral - incluindo algumas feministas doutrinárias - nos diz que é bom para a nossa saúde mental e emocional. Resolver esta contradição é essencial para o nosso sentido de dignidade e de humanidade. O que os sadomasoquistas fazem, pensam e desejam será tão errado como tantos exigem que seja? E se assim é, porque é que o desejamos tão intensamente?

Os conflitos emocionais e intelectuais que uma submissa tem que resolver enquanto aprende a aceitar-se como tal envolvem uma gama de temas que vão além da pergunta “estarei doente?” Há perguntas como “tenho que reprimir parte da minha personalidade para ser uma submissa?” “Tenho alguma vez o direito de me zangar?” “Como posso orgulhar-me de mim própria enquanto mulher e feminista se estou sempre às ordens do meu Dono?” “Estarei, no meu desejo de gratificação sexual, perpetuando a violência contra as mulheres?” “O que acontece se me for ordenado que faça alguma coisa que verdadeiramente tema ou odeie e seja incapaz de fazer?” “Posso acreditar que os meus desejos estão certos, mas como posso eu viver com o ódio de outras mulheres pelo que eu represento ou - ainda pior - com o seu dó de mim?”

A realidade da minha vida é profundamente chocante para a maior parte das pessoas. Entre as submissas ativas, pertenço ao raro subgrupo que vive o sonho 24 horas por dia, absolutamente e completamente, sem intervalos, momentos de descanso ou tempo para respirar. Na subcultura sadomasoquista, esta opção é chamada “lifestyle submission“. Desde o momento em que me entreguei a outra pessoa, tomei a minha escravidão muito a sério. Ela é tão real para mim como se tivesse cobertura legal, talvez mais real, porque nas sociedades em que a escravatura é ou foi legal houve sempre escravos que se recusaram a considerar-se propriedade de outrem. Embora não exista nenhum tribunal que sancione o direito de propriedade que o meu Senhor tem sobre mim, considero a nossa relação Senhor-escrava muito mais vinculativa do que qualquer documento, porque decidimos os dois que assim o seria. Quando me dei ao meu Senhor, foi com o entendimento explícito que eu não teria o direito de terminar a relação por mais que no futuro desejasse fazê-lo. No nosso acordo, só Ele é quem tem o direito de dissolver o vínculo de propriedade, e isto continuará assim não importa o quão infeliz a relação possa me tornar. Nunca em seis anos me senti infeliz a ponto de querer terminar. Porém, se alguma vez no futuro me sentir assim, o meu Senhor me prometeu que observará cuidadosamente a mim e à nossa relação e que tentará por um longo período resolver as dificuldades a fim de determinar se eu ir embora é realmente a melhor solução para mim. Se, depois de muitos meses de observação cuidadosa, Ele estiver convencido que a minha infelicidade com Ele ou com a relação é uma condição permanente que não pode ser remediada por nenhum dos dois, me concederá a liberdade. Mas não me libertará imediatamente da minha escravidão em relação a Ele só por eu ter formulado esse desejo. Não posso ir simplesmente embora: se o fizesse, tanto eu como Ele sabemos que Ele teria o todo o direito de ir me buscar por quaisquer meios que entendesse, uma vez que eu Lhe pertenço realmente e absolutamente, e não apenas quando é conveniente para mim pertencer-Lhe.

Embora relacionamentos como o meu não sejam incomuns, em muitas outras relações de poder que observei o casal não leva este aspecto da propriedade ao extremo a que nós o levamos. O conceito nestes relacionamentos é que a escrava está continuamente a dar a sua escravidão ao Senhor. Esta “dádiva” é constantemente renovada em cada momento e pode ser cancelada a qualquer momento se ela assim quiser. Este ato significaria provavelmente o fim do relacionamento, mas finalmente ambos os intervenientes querem que a escrava tenha a palavra final, o veto final e, em última análise, o poder absoluto. Para mim, um relacionamento como este seria uma fraude, do mesmo modo que o jogo infantil de “brincar de casinha” é uma imitação irreal e inconseqüente duma família verdadeira com as suas responsabilidades morais e obrigações legais. Eu nunca consentiria numa falsa escravidão como esta. Sim, certamente, nada me impede de pegar no nosso gatinho, entrar no carro e ir embora para nunca mais regressar voluntariamente, mas a verdade é que nunca, em caso nenhum, farei isto. Me comprometi a ser a escrava deste homem por tanto tempo quanto ele queira, e este compromisso, esta decisão de me dar, é sagrado para mim. Numa cultura em que os casamentos, o sacerdócio e outros compromissos supostamente permanentes e sagrados são quebrados com a mesma facilidade com que mudamos de idéias sobre a roupa que vamos vestir para ir trabalhar, muitas pessoas acham difícil compreender ou acreditar neste conceito de dedicação absoluta; não acreditam que ele possa realmente funcionar. Mas eu sei que sou uma pessoa capaz de ser fiel a tal compromisso, e o meu Senhor também sabe, e isto é o que interessa. As opiniões dos outros sobre a realidade da minha escravidão têm tanto efeito nela como um enxame de mosquitos suicidas tem na capacidade de uma fogueira se manter acesa. O efeito dos mosquitos, se têm algum, é - numa medida muito pequena - alimentar as chamas da minha dedicação.

Meu Senhor controla totalmente minha vida. Tenho que tentar obedecer a cada ordem que me seja dada, e nas raras vezes em que desobedeço sou severamente punida. As minhas ações não me pertencem, a não ser nas poucas ocasiões em que o meu Proprietário me permite agir livremente (por exemplo, foi ele que me deu a permissão para escrever para esta publicação; se não me tivesse dado vocês não leriam isto). Os meus sonhos não me pertencem, nem os meus pensamentos: tenho que revelá-los ao meu Senhor quando ele o solicita.

Todo o dinheiro que ganho é imediatamente entregue ao meu Senhor, e é ele quem decide como e quando ele é gasto. Do mesmo modo, todo o meu antigo patrimônio, tudo o que eu antes chamava meu, pertence agora a Ele. Tenho que obter autorização para todas as ações importantes e para muitas ações menores. Por exemplo, se quiser comprar uma roupa nova ou assinar um novo contrato de trabalho (como consultora de alta tecnologia possuo vários clientes), tenho que obter a sua permissão. Em casa, e muitas vezes noutros lugares, se quiser usar a toalete tenho mais uma vez que pedir autorização. Não me é permitido sair da cama sem autorização; de fato, sou amarrada à cama todas as noites por uma corda presa a uma coleira. Se for convidada para jantar ou para uma bebida por alguém com quem trabalho, tenho que pedir permissão, e muitas vezes são-me dadas ordens sobre o tipo e quantidade de comida e bebida que posso consumir. O meu Proprietário exige que eu faça a maior parte do trabalho doméstico, que faça exercícios regularmente, e que venha imediatamente quando ele me chama, esteja eu envolvida no que estiver. Palmadas, açoites e outras formas de “abuso” físico são um elemento recorrente da minha vida.

Embora esteja vinculada pelas muitas regras que governam o meu comportamento, a minha vida cotidiana aparentemente é semelhante à da maior parte das pessoas. Mantenho a minha sexualidade completamente escondida no trabalho, e embora um colega mais perspicaz possa por vezes dar-se conta de que o meu parceiro é “controlador” isto é o máximo a que as coisas chegam. Só nos assumimos como Senhor e escrava perante outros sadomasoquistas ou perante os poucos amigos em quem confiamos. Embora meu Senhor não veja dessa forma, descobri que as únicas pessoas com quem quero realmente fazer amizade são, cada vez mais, as que partilham de meus gostos sexuais. A submissão é uma parte tão importante da minha vida que as amizades em que esse aspecto tem que ser escondido me parecem incompletas, quase desonestas. O meu Senhor assume perante os membros mais próximos de sua família suas preferências pela Dominação; eu não me assumo perante os da minha, principalmente porque estou afastada deles e não tenho confiança neles. Deixei para trás a minha família e os meus amigos quando me mudei de um extremo para o outro do país para viver com o meu Senhor, e desde então, infelizmente, adquiri muitos conhecidos mas poucos amigos íntimos (é difícil que se chegue a encontrar bons amigos quando temos toda a humanidade para escolher; mas ao mesmo tempo, quando temos apenas uma pequena fração dela, a procura de pessoas simpáticas demora muito mais). Embora esteja ativamente à procura de novos amigos, já me resignei à idéia que isto vai levar anos, senão décadas.

Apesar de estar à procura de amigos entre outros sadomasoquistas, suspeito que por fim que as amizades que eu vier a formar serão com pessoas sexualmente convencionais, que tenham a compreensão e a compaixão necessárias para me aceitarem tal como sou. As pessoas mais fora do convencional que encontro, são muitas vezes uma desilusão, porque acabamos por verificar que a única coisa que temos em comum é o que fazemos para obter excitação erótica, e isto é muito pouco para formar a base duma amizade.

O relacionamento que tenho com o meu Dono tem a capacidade de compensar de muitas maneiras a minha falta de amigos íntimos. Ao contrário das rotinas frias e rígidas que são tantas vezes o destino das escravas na literatura erótica, a nossa vida quotidiana é cheia de rituais íntimos, plenos de amor, combinados com um pouco de sadismo para manter as coisas interessantes. Numa manhã normal sou acordada pelo meu Senhor à hora que ele entende que me devo levantar, geralmente entre as 5:30 e às 6:30, mesmo nos fins de semana. Conto-lhe os sonhos que tive durante a noite, e, como geralmente ainda estou meio sonolenta depois deste recital, ele me deixa “flutuar” por uns minutos antes de me desamarrar e de me mandar para o banheiro. O nosso despertar inclui várias outras atividades que fazemos puramente por prazer: uma luta corpo-a-corpo na cama, uma canção matinal, umas palmadas para acordar ou umas cambalhotas. Depois vou preparar o café da manhã, recolher os jornais e levo o gato para o seu passeio no jardim. Depois do café da manhã sem pressa, lavo a louça e trato de algumas outras tarefas domésticas. Com essas concluídas, o meu Senhor tem uma pequena conferência comigo para discutir o que pretende de mim nesse dia. Durante estas conferências com o meu Dono, tal como acontece com todas as nossas conversas, sou autorizada - de fato sou encorajada - a fazer todos os comentários e sugestões que desejar, mas a decisão final sobre as minhas atividades nesse dia compete a Ele. Se estou trabalhando num contrato, me visto para encontrar o cliente ou então vou para o nosso escritório de casa para começar o meu trabalho. Se não trabalhar nesse dia, o que faço depende do que o meu Senhor quer que seja feito e também do que eu gostaria de fazer. Posso ir às compras, posso limpar a casa, posso enviar e-mails aos meus correspondentes eletrônicos, ou posso simplesmente sentar-me no sofá com um livro. Tal como os casais convencionais, viajamos em férias para a montanha ou praia. A diferença crucial entre o que eu faço num dia normal e o que uma pessoa convencional faz não está no gênero de atividades, mas no fato de que qualquer que seja a atividade a ser realizada, eu necessito obter primeiro, autorização do meu Senhor. Outra diferença é que quando estou em casa, seja trabalhando, seja me divertindo, o meu Senhor me interrompe muitas vezes durante o dia com ordens: servir o almoço, ir buscar alguma coisa para Ele em outro lugar, ouvi-Lo ler uma notícia, ter outra conferência de planejamento, curvar-me para ser açoitada etc. Pode ser qualquer coisa. À noite, depois de as coisas do jantar estarem arrumadas e de eu terminar as minhas tarefas domésticas, fazemos muitas vezes qualquer coisa juntos antes de ir para a cama, tal como ver televisão ou jogar um jogo de cartas ou gamão - ou alguma coisa mais intensamente sadomasoquista. Quando é hora de ir para a cama, participo noutra série de rituais lúdicos. Antes de meu Dono apagar a luz sou amarrada à cama e vendada. Geralmente estou dormindo profundamente ao fim de dez minutos.

A minha vida, estritamente estruturada com a sua pesada carga de trabalho, e a necessidade sem fim de obedecer, pode parecer intolerável para a maior parte das pessoas, mas eu colho dela muitas recompensas. Estou loucamente apaixonada pelo meu Dono e ele por mim: ele compreende as minhas necessidades especiais e as preenche à perfeição. Neste relacionamento há um nível de intimidade que nunca experimentei em mais nenhum. É tão reconfortante podermos dizer - de fato, sermos obrigados a dizer - os nossos segredos mais íntimos a outra pessoa; outra pessoa saber tudo sobre nós; não estou sozinha. O meu Senhor é um Dominante terno e compassivo, e há um forte componente terapêutico no nosso relacionamento. Ele me apóia, me auxilia a crescer, faz eu me sentir bem comigo mesma, e nunca me mente. Tenho confiança absoluta Nele. Estou descobrindo que quanto mais tempo vivo com Ele e quanto melhor O conheço, mais tempo quero passar com Ele.

Independentemente de quão benigno seja este Domínio, independentemente de quão erotizada seja a dor física, permanece a questão, contudo, de saber porque é que alguém se sujeita a violações ultrajantes da sua liberdade pessoal. Parte da explicação é sexual: ao ceder o controle, ao não ter uma palavra sobre decisões importantes ou triviais que me afetam, sinto continuadamente uma excitação erótica de baixa intensidade. Estou ligeiramente excitada o tempo todo. Para além disso, muitos submissos “life-style”, incluída eu, têm uma componente na sua personalidade a que eu dou o nome de “ética de serviço”. Eu desejo profundamente servir. Adoro dar prazer ao meu Dono fazendo o que Ele manda. Não houve fase nenhuma da minha vida em que eu não tivesse consciência dessa ética de serviço. Para nós, submissas mulheres, a alegria de servir é tão importante como a intimidade: experimentar extremos de dor ou humilhação às mãos do nosso Dominante é algo que cria um laço de intensa intimidade. Esta pessoa pode me fazer seja o que for. Não tenho absolutamente defesas alguma contra ele. A minha alma está nua e em exibição diante dele. Esta intimidade é assustadora na sua intensidade. O grau de confiança necessário para a experimentar é prodigioso. Mas qualquer submissa que a tenha sentido num contexto de impotência total a descreve em termos extáticos, quase místicos. Para nós, o preço de admissão em vulnerabilidade e medo, vale a pena ser pago. em troca de um bilhete para o céu na Terra.

Estas são algumas características da submissão a que eu e outras submissas damos valor. Mas o que uma submissa sente, o que a excita, surpreende muitas pessoas. A entediante resposta convencional, muitas vezes expressa com escárnio, é “chicotes e correntes”, mas para mim as sensações, fantasias e impressões ricamente idiossincráticas que excitam a minha imaginação erótica e trazem ao primeiro plano o meu caráter submisso, são praticamente infindáveis na sua variedade. Incluem o cheiro intoxicante do couro novo; a visão de alguém vestido todo de negro; o toque arrepiante do aço frio na minha pele; ver um par de luvas serem calçadas devagar; o sabor pungente e humilhante dos meus próprios sucos num par de dedos que me entram à força na boca; sons duros e agudos, como um taco de golfe a bater na bola, que me lembram do som que a madeira ou o couro fazem ao atingir um corpo; a sensação aterradora de um fio de sangue a escorrer pela parte de trás da minha perna; a visão de um homem a bater ritmicamente uma chibata contra a palma da mão; o sabor ácido do medo acompanhado de uma louca sensação de sobressalto no estômago; o olhar atento, de águia, que se pode ver na face de certos Dominantes; uma bofetada na cara; uma mão na minha garganta, apertando um pouco, ameaçando; a visão de uma agulha quando passa através da pele; a sensação única de estar deitada no chão com uma bota a pressionar a minha cabeça; uma consciência intensa, embaraçosa, arrepiante da minha nudez em frente de um grupo de pessoas completamente vestidas; ser forçada a ajoelhar, engatinhar ou me prostrar; ser forçada a assumir a posição clássica de cabeça contra o chão, com quadril erguido para expor as nádegas e os órgãos genitais para diversão do meu Dominante; a incapacidade de tomar fôlego e a dor na minha boca que vêm de dar prazer oral forçado; o som do riso do meu amado em resposta aos meus gritos de agonia; o abraço apertado duma coleira de aço que se fecha em volta do meu pescoço; o sabor de um chicote de couro que é forçado contra os meus lábios para ser beijado ou lambido. A vida de uma submissa “life-style” é um delírio de baixa intensidade - e muitas vezes não tão baixa - de estimulação erótica, intimidade profunda, e uma consciência intensa de que somos especiais.



* Título original: Violence in the Garden, publicado no site www.submissivewomenspeak.net


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