Esta é uma transcrição literal da matéria

“Carajás: Cara e Força de Jipe”

Publicada na Revista 4 Rodas nº 311 de Junho de 1986, páginas 50 à 55.

 

As tabelas apresentam os resultados do teste da mesma publicação.

 

Obs.: optei por fazer transcrição (ipsis litteris), redigitando o texto, uma vez que estava impossível de ler as páginas escaneadas, pelo tamanho de texto - em quatro colunas por página - da revista.

4Rtitulo

 

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A chave das portas é do caminhão Mercedes, a do contato é do Landau, a do porta-malas é Volkswagen, a do tanque parece Fiat. Motor Santana ou Passat, de câmbio da Kombi, alguns instrumentos da picape Ford F-1000, outros do Gol e do Fiat 147. Quem encontrar tudo isso em um carro só, encontrou o Carajás – a álcool, gasolina ou diesel.

 

O Carajás é um utilitário off-road produzido em pequena série pela Gurgel. Seu construtor, o engenheiro João Augusto Conrado do Amaral Gurgel, diz que é um veículo para fazendeiros, trabalhos em litoral (é todo feito em fibra de vidro), lazer fora de estrada e para acesso a locais difíceis.

Poucos, no Brasil, podem fazer tudo isso: só o Engesa 4 e oToyota (e, em breve, o Javali, da Companhia Brasileira de Tratores – CBT).

Quatro Rodas testou de uma só vez as três versões do Carajás e encontrou poucas diferenças. As versões álcool e a gasolina utilizam o mesmo motor Santana de 1800 cm3; a versão diesel é equipada com motor de 1600 cm3 do Passat de exportação – as soluções construtivas para os 3 motores são praticamente as mesmas.

 

 

As maiores diferenças estão no sistema de alimentação – carburador para álcool e gasolina, bomba injetora para o diesel – e na taxa de compressão. A taxa de compressão cresce de acordo com o motor: 8,3:1 na versão a gasolina, 12,0:1 para o álcool e 23,5:1 para o diesel.

Naturalmente, de acordo com o combustível e seu poder energético, há uma diferença de autonomia e de velocidade máxima. Quem precisa de velocidade em distâncias curtas certamente escolhe a versão a álcool, que pode chegar a 130,317 km/hora mas só pode andar 650 km sem reabastecimento. Com o motor a gasolina, a velocidade máxima é bem próxima da do motor a álcool – 128,113 km/hora – e a autonomia bem maior: cerca de 1.000 km. Quem não tem pressa mas tem muito chão para andar pode escolher a versão diesel: a velocidade máxima é de apenas 110,767 km/hora, mas pode-se rodar tranqüilamente mais de 1.500 km em condições normais.

 

Entre todas essas versões, o diesel parece mais adequada aos trabalhos mais rudes, embora o motor seja muito barulhento. Em qualquer caso, porém, o Carajás é equipado com o sistema Seletraction – equipamento quase indispensável em um fora-de-estrada que não tem tração nas quatro rodas.

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Seletraction: quase tão eficiente como

uma tração nas 4 rodas

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Para o motorista, o Seletraction são duas alavancas próximas ao freio de mão. Essas alavancas freiam separadamente as rodas traseiras: assim, acionando uma das alavancas, freia-se a roda que estiver girando em falso, na lama ou na areia, e o diferencial joga o movimento do motor para a roda que estiver parada , em solo firme e com tração. Utilizando-se alternadamente as duas alavancas, o Carajás sai de praticamente qualquer atoleiro.

Para conseguir a tração traseira, útil e funcional em lama e areia, a Gurgel teve de encontrar uma solução diferente de todos os outros carros de motor dianteiro. Em carros como Opala, Chevette, Alfa Romeo e picapes, o câmbio e a embreagem estão junto com o motor, na frente; a força do motor é transmitida por eixo cardã ao diferencial traseiro. No Carajás, o câmbio está separado do motor e da embreagem, o que equivale a dizer que o câmbio é traseiro, junto com a tração. Para isso, bastou aumentar o eixo primário do câmbio, transformando-o em um eixo tipo cardã, que se estende para a frente até encontrar a embreagem.

Esse sistema foi batizado pela Gurgel de TTS – Tork Tube System, porque o cardã trabalha dentro de um tubo apoiado em mancais de rolamentos. Mas tem um pequeno problema: é que o eixo primário do câmbio prolongado tem maior massa, isto é, torna-se mais pesado.

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Problema: o eixo do câmbio pode

desgastar os anéis sincronizadores

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Exatamente por isso, acaba exigindo mais esforço dos anéis sincronizadores – nas  trocas de marchas, ficam obrigado a frear o tubo inteiro, um peso muito maior que o normal, para fazer seu trabalho, que é igualar as velocidades das engrenagens até o engate da nova marcha.

A fábrica, naturalmente, sabe desse esforço e dá instruções precisas – gravadas no painel – para evitar desgastes prematuros. De acordo com essas instruções, devem-se trocar as marchas com um intervalo de tempo maior entre o desengate de uma marcha e o engate da próxima. Em outras palavras, é preciso ter um pouco de paciência com o câmbio do Carajás, para aproveitar os benefícios do TTS: segundo a Gurgel, o TTS absorve a maior parte das vibrações do motor e do câmbio, vibrações que seriam transmitidas para o compartimento dos passageiros.

Talvez a melhor solução, neste caso, fosse a adaptação ao cardã de um sistema de freio acionado pelo próprio pedal da embreagem. Assim, ao pisar na embreagem, automaticamente o eixo do cardã teria sua velocidade reduzida, facilitando o trabalho dos anéis sincronizadores.

Uma solução como essa, entretanto, certamente iria aumentar o preço do carro. E o preço do Carajás foi feito para se conseguir a maior economia possível na construção – não é a toa que o carro use chaves de outras marcas e tantos instrumentos de outros carros: um projeto específico para estas pequenas necessidades custaria uma fortuna e com certeza iria se refletir no preço final do veículo.

Do jeito que está, o Carajás pode ser vendido a Cz$ 133.816,00 na versão a álcool; Cz$ 131.896,00 a versão a gasolina; e Cz$ 158.952,00 a diesel.

Por esses preços consegue-se um carro parecido com um jipe, com a tração praticamente igual a de um jipe, e com a vantagem de levar bagagem atrás dos bancos traseiros – um total de 496 cm3. No Engesa 4 ou no Toyota, a bagagem sempre toma espaço, já pequeno, de um ou mais passageiros.

Na cabina do Carajás não há esse tipo de problema: há espaço à vontade para motorista e passageiros. Estes, aliás, ficam particularmente bem acomodados, porque além do banco traseiro ser bem largo ainda está em nível mais alto.

O banco do motorista é confortável e proporciona boa regulagem, de distância e de encosto. Falha só na altura: pessoas com menos de 1,70 m sentem dificuldades ao dirigir, porque o pára-brisa fica muito alto. Um problema, de resto, fácil de resolver com uma pequena almofada – ao menos até a fábrica acabar de desenvolver a regulagem de altura.

Ao volante, no início é um pouco difícil acostumar com a aparentemente injustificável presença do pneu sobressalente sobre o capô do motor, bem no campo de visão do motorista, mas acostuma-se.

No painel falta um conta-giros, importante para verificar o regime de giros do motor, principalmente quando o veículo está carregado. Neste caso, o motorista sente-se tentado a exigir sempre um giro muito algo para tentar melhorar o desempenho, o que pode fazer com que passe do limite de giros e, assim, comprometa a durabilidade do motor. Os demais instrumento são corretos.

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Teto duplo, uma solução engenhosa

contra o calor

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Sob o teto, diretamente acima do banco da frente, uma boa solução de engenharia: um teto duplo para evitar o calor. Funciona. Nesse teto há seis entradas de ar, direcionais, alimentadas por uma tomada de ar basculante. Com essas entradas de ar pode-se criar uma boa combinação de circulação do ar dentro do veículo, de modo a combater o calor de acordo com a necessidade do passageiro. O único problema é que esse teto é pintado de preto fosco, cor que absorve mais calor; talvez pudesse ser pintado de uma cor neutra, sem prejuízo da estética.

Esse, porém, é um pequeno detalhe – que não tira nenhuma qualidade do Carajás, um jipe fora-de-estrada, forte e competente.

 

RESULTADOS

DESEMPENHO – Melhor, é claro, no álcool e na gasolina. Com esses dois combustíveis, o veículo acelera de 0 a 100 km/h em 26 segundos, contra 42 no diesel.

CONSUMO – O diesel é muito mais econômico. Na faixa de velocidade constante mais coerente com o Carajás, de 60 km/h, ele conseguiu a brilhante marca de 17,88 km/l contra 11,78 km/l da gasolina e 7,67 do motor a álcool.

MOTOR – Marca VW Santana ou Passat exportação (diesel). O diesel tem cilindrada menor, 1.600 cm3, contra 1.800 cm3 do álcool e gasolina.

TRANSMISSÃO E CÂMBIO – O mesmo utilizado pela Kombi. É preciso ser paciente e trocar as marchas mais lentamente. Caso contrário os sincronizadores podem se desgastar.

FREIOS – Surpreendem pela eficiência, considerando que se trata de um veículo de pequena produção. Mas é preciso ter cuidado nas freadas acima de 100 km/h.

DIREÇÃO – O volante é pequeno e pesado demais para as manobras feitas em baixa velocidade ou com o veículo totalmente parado.

ESTABILIDADE – Em off road é muito boa. No asfalto, em velocidades mais alta, é preciso ter cuidado, pois a carroceria oscila bastante. Até 90 km/h pode ser dirigido por qualquer pessoa, sem susto. Acima disso, precaução.

SUSPENSÃO – Tipo Kombi na frente, molas helicoidais e amortecedores atrás. Alguns vão acha-la dura, porém se fosse mais mole prejudicaria a estabilidade.

ESTILO – Houve um grande trabalho para atenuar suas linhas pesadas. Não é feio nem bonito, talvez apenas estranho. Olhado como um jipe é moderno e funcional.

CONFORTO – Bom principalmente para os passageiros do banco de trás, que ficam em plano mais alto do que o motorista e têm melhor visibilidade.

POSIÇÃO DO MOTORISTA – Um dos problemas mais sérios no Carajás: motoristas com menos de 1,70 m terão de sentar numa almofada para terem boa visibilidade.

INSTRUMENTOS – Positivamente, falta um conta-giros. Com um veículo tão pesado – cerca de 1.300 kg – o motorista tende a ultrapassar o limite de giros para andar mais rápido, prejudicando o motor.

VISIBILIDADE – Ruim principalmente para a frente, agravada pelo banco baixo e pela presença do estepe no campo de visão do pára-brisa dianteiro. A coluna das portas incomoda na hora de olhar para trás.

NÍVEL DE RUÍDO – Como era de se esperar, é um carro barulhento principalmente a diesel.

PORTA-MALAS – Ao contrário dos jipes, o Carajás tem mesmo um porta malas eficiente, onde cabem 496 cm3 de bagagem. Nos jipes, qualquer bagagem acaba ocupando o lugar de um passageiro, sem nenhuma opção.

 

 

O S  N Ú M E R O S    D O   T E S T E

 

MÁXIMA NA PISTA DE TESTES

 

Álcool

Gasolina

Diesel

Média de 4 passageiros

130,317

128,113

110,769

Melhor passagem

131,909

129,469

112,852

 

A C E L E R A Ç Ã O

Variação de Velocidade

Álcool

Gasolina

Diesel

Tempo em segs.

Marchas usadas

Tempo em segs.

Marchas usadas

Tempo em segs.

Marchas usadas

0 – 40

4,23

1a./2a.

4,27

1a./2a.

6,28

1a./2a.

0 – 60

8,13

1a./2a.

8,26

1a./2a.

12,28

1a./2a.

0 – 80

14,35

1a./2a./3a.

14,61

1a./2a./3a.

22,81

1a./2a./3a.

0 – 100

26,34

1a./2a./3a.

26,92

1a./2a./3a.

42,68

1a./2a./3a./4a.

0 – 120

38,14

1a./2a./3a./4a.

38,27

1a./2a./3a./4a.

 

 

 

CONSUMO EM VELOCIDADES CONSTANTES

Velocidade km/h reais

Álcool

Gasolina

Diesel

Consumo em Km/l

Marcha usada

Consumo em Km/l

Marcha usada

Consumo em Km/l

Marcha usada

40

9,70

4a.

14,82

4a.

21,14

4a.

60

7,67

4a.

11,78

4a.

17,88

4a.

80

6,27

4a.

9,94

4a.

13,11

4a.

100

5,05

4a.

7,96

4a.

9,09

4a.

120

3,58

4a.

5,62

4a.

-

-

40

7,62

3ª.

11,72

3ª.

16,57

3ª.

 

C O N S U M O   M É D I O

 

Álcool

Gasolina

Diesel

Na cidade *

4,16*

6,29*

10,79*

Na estrada, a 80 km/h reais, carregado

5,72

8,48

11,17

Na estrada, a 80 km/h reais, vazio

6,83

11,17

13,42

* Situação anormal decorrente de excesso de congestionamentos que hoje enfrentam as grandes cidades brasileiras.

 

NÍVEL DE RUÍDO – dB

Km/h

Marchas usadas

DB A

Álcool

Gasolina

Diesel

0

Ponto morto

56,4

58,4

67,4

20

1ª.

71,0

69,5

73,9

40

2ª.

73,6

74,9

84,5

60

3ª.

74,8

76,5

83,0

60

4ª.

73,0

74,3

78,0

80

4ª.

76,9

78,1

80,1

100

4ª.

80,4

81,3

84,6

120

4ª.

84,2

85,4

-

 

 

 

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