ACCA - ASSOCIAÇÃO CULTURAL DE CAPOEIRA ABOLIÇÃO Mestre Urso http://www.abolicaocapoeira.hpg.com.br/capoer.htm A CAPOEIRA Dos nossos estudos temos que a palavra capoeira não é africana. Ela vem do tupi kapu’era e possui dois significados. Designa tanto mato ralo ou roçado, como a gaiola onde eram transportados pequenos animais. Vale lembrar que a capoeira era praticada como luta por negros escravos em busca da liberdade e não se pode deixar de observar que o jogo da capoeira não existe e nem é praticada em terras africanas. É comum dividir a história em três períodos: escravidão, marginalidade e ensino nas academias. Escravidão: a capoeira, uma forma de luta teria se disfarçado em dança para iludir e contornar a proibição de sua prática por parte de brancos feitores e senhores de engenho. Marginalidade: após a abolição da escravatura, em 1888, ex-escravos capoeiristas não teriam encontrado lugar na sociedade e caíram na marginalidade, levando consigo a capoeira que acabou proibida por lei. Ensino nas academias: na década de trinta foi revogada a lei que proibia a prática e abriram-se as primeiras academias em Salvador: a capoeira saiu das ruas - e da marginalidade - e começou a ser ensinada e praticada em recintos fechados. A capoeira é uma luta atlética, de destreza, baseada em esquivas (aos lutadores é vedado segurar ou bloquear qualquer golpe), cuja finalidade é derrubar o adversário pelo desequilíbrio. Surgiu no Brasil presumivelmente no século XVI, entre os descendentes de escravos bantos procedentes de Angola. O acompanhamento musical, usado ainda hoje na capoeira, teria servido para mascarar as verdadeiras intenções dos escravos: exercitar-se para enfrentar, em época oportuna, o braço armado do branco. Alvo de constantes perseguições policiais por todo o país até as primeiras décadas do século XX, a capoeira sobreviveu a todas as restrições e passou a despertar progressivo interesse de instituições esportivas e de aficionados de todas as classes sociais. Em 1973 institucionalizou-se como prática desportiva regulamentada. As competições de capoeira se realizam em quatro modalidades: individual, duplas, conjunto e equipes. Os golpes desferidos pelos lutadores, também ditos jogadores ou atletas, se classificam em três grupos: os livremente permitidos, os permitidos sob controle e os proibidos. A luta tem início quando a bateria, como são chamados aqueles que tocam os instrumentos, assim o sinaliza. O som de instrumentos de percussão, entre os quais predomina o berimbau, e das palmas ritmadas dos circunstantes pontua ritmicamente toda a luta. Para o bom desenvolvimento do atleta e a correta prática do esporte é essencial: a técnica, a defesa, a eficiência, a objetividade, a resistência, a aplicação de golpes, a vestimenta, o ritual, o ritmo, os toques e cânticos. Suas variáveis são: a angola e a regional. CAPOEIRA ANGOLA A capoeira de angola nasceu na senzala, nasceu do desejo de liberdade e da consciência de que manter o corpo forte ajudaria a manter a mente sã. Nasceu mesclada ao candomblé e como ele, desde cedo, foi cercada de segredo. O segredo não existe para, depois da revelação, se reduzir a um conteúdo de informação. O segredo é a dinâmica de comunicação, de redistribuição de axé, de existência e vigor das regras do jogo. A luta não é a violência ou a força que entram em jogo, mas as artimanhas, a astúcia, a coragem e o poder de realização (axé) implicados. Na capoeira angola o ritual do batismo é muito importante, pois marca o momento em que o aluno passa a ser “integrante do grupo”. Adquire assim, o dever de proteger o grupo e direito de ser protegidos por ele. Na angola, todos são irmãos e não se admite sentimentos de inveja ou de depreciação. O atleta mais fraco fica feliz de saber que terá a seu lado alguém mais forte e capaz, pois significa proteção. Por outro, o mais forte é imbuído de sentimentos protecionistas para com os outros e considera sua responsabilidade ensinar e auxiliar os demais membros da comunidade. As brigas e rusgas entre jogadores são rápidas e superficiais e invariavelmente terminam em risadas e gozações. O batismo é dividido em duas partes: secreta e pública. A secreta acontece, normalmente dentro da academia, sem a presença de público. Participam somente aqueles que serão batizados. A parte pública acontece com a presença do público em geral. Nela o aluno joga com um mestre convidado que será seu padrinho. Ele tem o objetivo de derrubar o atleta no chão. Assim que isto acontece, o padrinho o puxa o afilhado pela mão colocando-o rapidamente em pé (em uma alusão de que a partir daquele momento o grupo sempre o levantará), coloca em sua cintura o cordel e diz a todos o seu “apelido” (alcunha pela qual passará a ser reconhecido a partir daquele momento). Este apelido é escolhido anteriormente e leva em consideração características pessoais do atleta. Na angola, os capoeiras se vestem de branco (o abada), resquício da época onde o capoeira para provar ser bom, entrava e saía da roda com a roupa impecavelmente limpa. O jogo é rasteiro, lento mas não menos preciso ou mortal. Os atletas ficam agachados, quietos, esperando sua vez de jogar. “O segredo da capoeira morre comigo e com muitos outros mestres” - dizia Mestre Pastinha, que foi o maior nome da capoeira angola, somente igualado por Mestre Besouro, figura mito da capoeira de angola, morto aos vinte e sete anos de idade e cantado até hoje em rodas de todo o Brasil. “Nossos movimentos não tem pressa de chegar, mas quando chegam é de forma harmoniosa. É um diálogo de corpos. Eu venço quando meu parceiro não tem mais respostas para minhas perguntas” - Mestre Pastinha. O maior nome da capoeira angola é Vicente Ferreira Pastinha, o Mestre Pastinha, que nasceu no dia 05/04/1899 em Salvador e faleceu no Pelourinho em 1981. MESTRE JOÃO GRANDE E MESTRE JOÃO PEQUENO, GUARDIÕES OFICIAIS DA CAPOEIRA ANGOLA CAPOEIRA REGIONAL A capoeira regional é uma roda alegre onde os capoeiras aguardam sua vez de jogar batendo palmas ao ritmo da música. Os regionais mantêm o corpo mais ereto e desferem golpes mais velozes e com maior quantidade de saltos. Sua origem é diversa da de angola. A história da capoeira regional é a história de como o crime se tornou esporte. De 1890 a 1937, a capoeira foi considerada crime previsto pelo Código Penal da República. Simples exercícios na rua davam até 6 meses de prisão. Diziam que um dos castigos que davam a capoeiristas que fossem pegos brigando era amarrar um dos punhos num rabo de cavalo e outro em outro cavalo. Os dois eram soltos e postos para correm em disparada até o quartel, sendo que isso já havia causado algumas mortes. A situação de perseguição dura até a década de trinta, quando começa a ser ensinada em academias. Foi para reverter esse quadro que o baiano Manoel dos Reis Machado, um angoleiro forte e valente conhecido como Mestre Bimba, inventou uma nova capoeira. Teve o cuidado de tirar a palavra do nome da academia que fundou em 1932 em Salvador, o “Centro de Cultura Física e Luta Regional”. Filho de um campeão de batuque, uma espécie de luta-livre comum na Bahia do século XIX, juntou técnicas de boxe e do jiu-jitsu e criou um método de ensino. Para fugir de qualquer pista que lembrasse a origem marginalizada da capoeira, mudou alguns movimentos, eliminou a malícia da postura do capoeirista, colocando-o de pé. Criou um código de ética rígido que exigia até higiene. Estabeleceu uniforme branco e se meteu até na vida privada de seus alunos. “Para treinar com meu pai era preciso provar que estava trabalhando ou mostrar o boletim do colégio” - conta Demerval dos Santos Machado, conhecido como “Formiga” nas rodas de capoeira e organizador da “Fundação Mestre Bimba” ao lado do irmão, Mestre Neneu. Até hoje, angoleiros e regionais se criticam mutuamente, embora se respeitem. O maior mérito de Mestre Bimba foi o de transformar a capoeira, antes instrumento de ataque e defesa marginalizado, em esporte que granjeou muitos adeptos com a inclusão de novos golpes e mulheres - até então excluídas das rodas. O que caracteriza a capoeira regional é sua “seqüência de ensino”, uma série de exercícios físicos completos e organizados em um número de lições práticas e eficientes, a fim de que o atleta obtivesse, dentro do menor espaço de tempo possível, o valor da luta como um sistema de ataque e defesa. Este método proporciona um rápido aprendizado de golpes, esquivas e quedas. O atleta torna-se, rapidamente, eficaz na arte da luta mas torna-se carente no preceito e na tradição, na concepção da honra, lealdade, humildade e companheirismo. O batizado na regional tem por objetivo testar os conhecimentos de quem está sendo batizado e a iniciação do aluno. O ritual foi inventado por Mestre Bimba, que na época e entregava um lenço de seda ao discípulo, baseado no costume dos antigos valentões de Salvador de protegerem o pescoço com um pedaço de seda para que a navalha do inimigo escorregasse. Este costume, influenciado pelas faixas coloridas das artes marciais orientais, inspirou os cordões da capoeira. “O capoeira nunca joga um contra o outro, mas com o outro. Assim, ele se prepara para enfrentara vida lá fora” - Mestre Bimba. O maior nome da capoeira regional Manoel dos Reis Machado, o Mestre Bimba, que nasceu dia 23/11/1900 em Salvador e faleceu no dia 10/02/1974 em Goiânia.