A Implantação da Informática no Espaço Escolar: Questões Emergentes ao Longo do Processo
 
Fernanda Maria Pereira Freire ([email protected])
Maria Elisabette Brisola Brito Prado ([email protected])
Maria Cecília Martins ([email protected])
Odete Sidericoudes ([email protected])
Todas do Núcleo de Informática Aplicada à Educação - NIED da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
 
RESUMO
Este artigo analisa dificuldades que freqüentemente surgem no processo de implantação da informática na educação, a partir da apresentação de experiências de três escolas. As histórias mostram que o trabalho pedagógico baseado no uso do computador desenvolve-se de acordo com as necessidades e possibilidades de cada comunidade escolar, exigindo uma série de reflexões sobre o papel da escola, do professor, a função do currículo escolar e, principalmente, sobre a prática pedagógica vigente em sala de aula. Diferentes soluções são construídas coletivamente, mas é evidente a importância do professor, que acredita na proposta do trabalho e se propõe a vencer os desafios que aparecem durante o processo.
 
SUMMARY
This article analyzes difficulties that frequently appear when computers are introduced in the educational process. It is based on the experience in three schools. The results show that pedagogical work based on the use of  the computer develops according to the needs and possibilities of each school community, suggesting that some study is needed relating to the roles of the school and the teacher, the function of the school curriculum and especially the pedagogical practices in the classroom. Different solutions are constructed collectively. But the importance of the teacher who believes the proposal will work and decides to face the challenges that appear during the process is most evident.
Palavras-chave: Implantação da Informática na Educação, comunidade escolar, prática pedagógica.
 
Introdução
A chegada dos computadores em uma instituição de ensino, coloca a comunidade escolar frente a frente com o desafio de iniciar o trabalho de "Informática na Educação". As idéias finalmente passam a ter uma existência concreta e há muito o que fazer. A união de toda a comunidade para implantar um trabalho, em conformidade com seus objetivos e expectativas, é fundamental; sem a integração de pessoas e metas, o processo pode tornar-se muito árduo. Ao mesmo tempo, esse processo de implantação da Informática na Educação, exige que cada professor invista em seu próprio desenvolvimento para que a sua prática pedagógica possa se beneficiar dessa ferramenta tecnológica.
Após a instalação do laboratório, as pessoas começam a tomar consciência de que para "habitá-lo" é preciso muito mais do que máquinas: são necessárias idéias e ações que efetivamente possam colaborar para a melhoria do processo de ensino-aprendizagem. Os professores representam o elemento-chave para que o trabalho possa decolar e atingir os seus objetivos. Inicia-se assim, um processo contínuo de formação dos professores, que abrange conhecimentos específicos sobre Informática - os aspectos técnicos para manipulação do computador - e sobre o processo de ensino-aprendizagem - as teorias que subsidiam a escolha de diferentes ferramentas computacionais e suportam a aplicação educacional das mesmas.
Os cursos de formação têm a função de organizar, de um certo modo, informações que são úteis ao professor para a sua prática pedagógica, usando o computador. O aprendizado não se dá integralmente durante o período do curso. O professor, para aprender aquelas informações, precisa aplicá-las em um determinado contexto de uso para então poder reelaborá-las e modificá-las de acordo com suas necessidades. Isso quer dizer que, mesmo o professor com oportunidade de freqüentar um curso de formação em Informática na Educação, precisa dedicar-se em um outro momento à efetiva aprendizagem daquilo que foi abordado durante o curso. Nesse sentido, exige-se muito de "auto-formação": horas de uso do computador, planejamento de atividades pedagógicas, reflexão sobre as atividades desenvolvidas com alunos.
A inclusão da Informática na Educação passa por uma série de escolhas da comunidade escolar. Uma delas diz respeito ao modo como ela será institucionalmente incorporada como: uma atividade extracurricular, parte da grade curricular - uma disciplina específica e paralela às demais, uma ferramenta que pode ser utilizada pelos professores de todas as disciplinas e/ou, ainda, como uma ferramenta usada por um grupo de professores que desenvolve um tema gerador comum. O modo como o trabalho com o computador é encarado pela comunidade escolar determina, em grande parte, o desenvolvimento do trabalho na escola. Entretanto, essa escolha pode ser modificada ao longo do tempo, sendo muitas vezes difícil determinar a priori como o desenvolvimento da cultura tecnológica acontecerá. Novas descobertas vão sendo feitas e o uso do computador, ampliado e modificado. A Informática na Educação possibilita um trabalho dinâmico, passível de transformações ao longo do processo de apropriação e compreensão do potencial das ferramentas computacionais utilizadas.
A formação do professor e o modo como o computador será integrado aos demais trabalhos escolares, são alguns dos aspectos importantes envolvidos na implantação da Informática na Educação, mas há muitos outros fatores que concorrem para a realização do trabalho. A Informática na Educação tem uma história que pode ser analisada criticamente por aqueles que nela vislumbram uma possibilidade de incrementar as atividades pedagógicas em sala de aula.
Neste artigo relatamos algumas experiências em escolas que implantaram a Informática na Educação com o objetivo de apresentar e analisar alguns problemas que ocorrem durante esse processo.
 
Sobre as Experiências nas Escolas
Nos últimos anos houve um crescente interesse pelo trabalho na área de Informática na Educação, impulsionado pelo barateamento dos microcomputadores pessoais, hoje utilizado por boa parte da classe média brasileira, aliado a fatores como: necessidade de modernização da escola, formação de profissionais com um perfil condizente com as necessidades de uma sociedade ágil e em constante modificação. As escolas procuram instituições que possam colaborar nessa empreitada: muitas terceirizam essa iniciativa e outras optam por uma parceria que tanto pode significar uma assessoria para compra de equipamentos e escolha de software, quanto um acompanhamento pedagógico detalhado.
Há alguns anos, as escolas não sabiam ao certo o que desejavam. Sabiam que precisavam iniciar um trabalho, usando computadores por uma demanda da própria comunidade escolar (principalmente alunos e pais de alunos), mas não tinham esclarecimento a respeito das diferentes formas de implantar o computador no meio educacional (Valente,1993a). Esse quadro vem se modificando nos últimos anos, devido ao "know-how" acumulado por pesquisadores, professores e demais profissionais envolvidos com a Informática na Educação. Hoje, as unidades escolares interessadas em investir nessa área, discutem as diferentes maneiras de se conceber o computador na educação e começam a se posicionar diante das mesmas com base naquilo que propõem enquanto instituições educacionais. Ainda assim, percebemos na parceria que realizamos com algumas escolas, que o desenvolvimento do trabalho usando o computador, desencadeia uma série de reflexões sobre o papel da escola, o papel do professor, a função do currículo escolar e, principalmente, sobre a prática pedagógica vigente em sala de aula. No escopo daquilo que vimos realizando, não se trata simplesmente de anexar o laboratório de computadores às dependências da escola, mas, principalmente, de refletir sobre o papel que essa tecnologia pode desempenhar no processo de aprendizagem dos alunos e na prática pedagógica dos professores em cada uma das comunidades escolares com as quais trabalhamos de forma sistemática.
Escolhemos três experiências que têm características específicas, com o intuito de apresentar um leque de possibilidades de problemas e soluções que mostram como as escolas têm resolvido algumas questões decorrentes da implantação do computador em suas atividades. As experiências apontam para a importância do professor que acredita na proposta da Informática na Educação e que se propõe a vencer as dificuldades que aparecem ao longo do desenvolvimento do trabalho.
O primeiro relato apresenta um trabalho experimental desenvolvido ao longo de mais de dez anos, iniciado quando a Informática na Educação era praticamente desconhecida no Brasil, que sofreu o impacto das transformações tecnológicas ocorridas nos últimos anos. O segundo, conta a história de uma escola relativamente pequena que, ao longo de um ano, tentou abraçar a proposta construcionista de Informática na Educação sem conseguir alcançar seu objetivo inicial. O último, apresenta uma história em pleno desenvolvimento e que tem nos ensinado muito sobre como uma comunidade unida pode dar conta de contornar os diversos problemas que surgem no decorrer da implantação de uma nova proposta de trabalho. Naturalmente, os relatos se atém a certas peculiaridades de cada história.

Da sala de aula para o laboratório - do laboratório para a sala de aula O início da história da Informática na Educação no Brasil foi marcado pelo Projeto EDUCOM (Andrade, 1993a, 1993b). Esse Projeto, desenvolvido a nível nacional por cinco universidades de todo o país, tinha como objetivo pesquisar o papel do computador no processo de ensino-aprendizagem. Cada universidade apresentou uma proposta sobre como viabilizar essa pesquisa. A Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), através do Núcleo de Informática Aplicada à Educação (NIED), começou o trabalho em meados de 1984 com duas escolas de 1º e 2º graus da rede estadual de ensino, com o intuito de desenvolver uma metodologia sobre o uso integrado do computador nas atividades escolares (Valente, 1993b).
Naquela época, os pesquisadores da área de Informática na Educação, não tinham conhecimento prático sobre como utilizar o computador com finalidades educacionais, tampouco sobre como preparar os professores para integrá-lo ao trabalho de sala de aula. A partir de muitas hipóteses teóricas, teve início o trabalho de preparação dos dez professores de cada escola convidados a participar dessa experiência inovadora . Os professores participaram de um curso sobre programação Logo e os pressupostos educacionais subjacentes, com duração de 120hs. e ministrado aos sábados (Gagliardo, 1985). Os laboratórios de microcomputadores foram montados e um longo caminho começou a ser percorrido pelas pessoas envolvidas: professores, diretores, supervisores de ensino, orientadores pedagógicos, alunos, pais e pesquisadores.
A equipe diretamente envolvida no projeto - pesquisadores e professores das escolas - reunia-se semanalmente para discutir o desenvolvimento do projeto: planejamento, execução e avaliação das atividades com os alunos usando o computador, dúvidas sobre programação Logo, elaboração de relatórios, divisão do horário dos professores para ocupação do laboratório de informática etc... As dificuldades eram inúmeras. O acesso ao computador era extremamente restrito. Poucos setores da sociedade eram informatizados e essa era a primeira vez que os professores trabalhariam com um computador.
Por se tratar de uma pesquisa que contava com o apoio do Ministério da Educação, os professores dedicavam um certo número de horas semanais para as atividades do Projeto de Pesquisa. Muitas discussões antecederam o início do trabalho com os alunos. Essa implantação foi gradativa: uma classe de cada escola foi escolhida para dar início ao Projeto. Entretanto, o trabalho rapidamente expandiu-se devido ao apoio dos diretores das escolas e entusiasmo dos alunos, que pressionavam os professores para que outras classes participassem da experiência.
Na fase inicial dos trabalhos, os professores não sabiam ao certo o que podiam fazer com o computador. Os laboratórios das escolas foram equipados com computadores da linha Itautec I-7000 Jr e usava-se basicamente a linguagem Logo e o processador de textos da Itautec. O uso do computador era visto como um complicador para o cumprimento das atividades curriculares. A proposta dos professores de uma das escolas foi a de usar o laboratório como uma atividade extracurricular, isto é, fora da grade curricular e do horário regular de aula. O corpo docente, embora convencido do potencial do uso do computador na educação, não sabia como transformá-lo em atividades pedagógicas que se revertessem em benefício da aprendizagem dos alunos. Os professores revezavam-se no atendimento dos diversos alunos no laboratório que permanecia aberto em horário integral; para que os alunos dos dois períodos - manhã e tarde - pudessem freqüentá-lo. O professor que permanecia no laboratório durante um determinado período semanal, tinha dificuldade para acompanhar os projetos computacionais dos alunos, porque muitas vezes os mesmos não tinham relação com sua disciplina, ou não haviam sido propostos por ele. Por outro lado, esse acompanhamento permitia-lhe detectar as dificuldades apresentadas pelos alunos em conteúdos de sua disciplina, bem como diagnosticar as suas próprias dificuldades em relação à linguagem de programação e à forma de intervir junto ao aluno. Essa fase inicial foi fundamental para que os professores adquirissem experiência, segurança e retirassem do uso do computador com os alunos aquilo que lhes parecia útil do ponto de vista da aprendizagem.
Algum tempo depois, os professores começaram a ministrar as suas próprias aulas usando o laboratório de informática. Era a primeira aproximação entre currículo, giz, lousa e a tecnologia. O laboratório ainda permanecia aberto aos alunos em outros horários, mas o seu espaço era agora ocupado durante os horários regulares de aula. Entretanto, as aulas ministradas no laboratório de informática restringiam-se ao ensino da linguagem Logo que passou a ser visto como um pré-requisito: os professores de uma das escolas não percebiam que a introdução de um novo recurso da linguagem, ou de um novo conceito de programação, poderia ser feita durante a resolução de um determinado problema que estava sendo resolvido pelos alunos e depois retomado isoladamente ou em outros contextos de uso. Ainda era necessário ensinar primeiro o Logo, para depois usá-lo na resolução de problemas diversos. A abordagem pedagógica habitualmente empregada em sala de aula foi levada para o laboratório: apresentava-se um novo comando do Logo, sua sintaxe e uma lista de exercícios que contemplavam seu uso.
Paralelamente ao desenvolvimento dessa prática educacional baseada no uso do computador, a tecnologia começou a avançar, gerando novas mudanças. Os computadores Itautec foram substituídos pelos "modernos" computadores da linha MSX, compatíveis com um software Logo, muito mais atraente do ponto de vista educacional: recursos de animação, várias tartarugas e cores variadas.
A mudança de software era um novo desafio para os professores que iniciaram o aprendizado das novidades disponíveis.  Os professores progrediam muito e os primeiros frutos do trabalho já podiam ser sentidos. Alguns alunos destacavam-se no uso da tecnologia e auxiliavam os docentes nas atividades do  laboratório. Hoje, alguns desses alunos, são professores em cursos de nível técnico na área de Processamento de Dados.
Novas experiências foram iniciadas na escola, visando expandir o potencial do computador: o trabalho com robótica, usando o LEGO-Logo para integrar as disciplinas de Matemática e Física (Sidericoudes, 1996) e a aplicação de um plotter mecânico nas disciplinas de Ciências e Matemática (D'Abreu, 1994).
A consolidação do trabalho de Informática na Educação ocorreu quando os professores começaram a criar situações-problema que prescindiam do uso do computador para serem solucionadas. A partir de um problema concreto, os alunos aprendiam sobre os recursos computacionais e sobre os conteúdos curriculares envolvidos nas diferentes possibilidades de resolução do mesmo.
A abordagem construcionista (Papert,1994; Valente, 1993c) começava a dar sinais de ter sido compreendida pelos professores. Em uma das escolas, por exemplo, os professores do curso de Magistério começaram a discutir com os alunos os pressupostos psicológicos e educacionais da Informática na Educação: o trabalho com o Logo possibilitou a reflexão sobre o processo de ensino e aprendizagem e sobre o papel do professor nesse processo (Prado, 1996). Os pré-requisitos deixaram de ser vistos como condição necessária para o desenvolvimento de um certo conteúdo que, muitas vezes, ultrapassava os limites de tempo em que se achavam confinados em uma determinada série.
Nesse momento, os professores analisavam o conteúdo programático que precisavam cumprir e diagnosticavam em quais momentos o computador seria uma ferramenta auxiliar no entendimento dos mesmos. Gradativamente, esse modo de conceber a aprendizagem ultrapassou os limites do laboratório de informática. As atividades de sala de aula eram uma continuação do trabalho desenvolvido no laboratório e vice-versa. A compreensão em outros moldes do processo de ensino-aprendizagem possibilitou a alguns professores a inclusão de outros espaços da escola nas suas atividades pedagógicas: laboratórios de química, física, videoteca, biblioteca, foram revisitados e incluídos como alternativas importantes para a aprendizagem dos alunos.
Durante esse longo processo de construção de uma metodologia de trabalho pedagógico, muitas exposições foram organizadas para que toda a comunidade escolar e das cidades em que se localizavam essas escolas pudessem conhecer o trabalho dos alunos e professores. Esses eventos tinham um impacto extremamente positivo para professores e alunos: era o momento de refletir sobre a realização de todo o trabalho e retirar implicações para a continuidade do mesmo. A equipe de professores do Projeto EDUCOM/Unicamp produziu uma série de artigos sobre o uso do computador em diversas disciplinas que foram apresentados em Congressos da área de Informática na Educação, alguns publicados em livros, que servem de referência para escolas que estão implementando esse tipo de trabalho Mais algum tempo e os computadores MSX deixaram de existir. O Projeto EDUCOM havia chegado ao fim e novas propostas tiveram que ser apresentadas para que os laboratórios fossem equipados com outros computadores. A realidade havia mudado muito: computadores potentes, novas versões da linguagem Logo, plataforma Windows, novos aplicativos, multimídia, software educativos disponíveis comercialmente, CD-ROM, Internet. Nova avalanche de informações a serem digeridas pelos professores. Cerca de 14 anos se passaram. As escolas, os professores e os pesquisadores aprenderam muito. Estamos recomeçando de outra forma: muitos professores se aposentaram, outros mudaram de escola... Novos desafios surgirão, mas a consolidação da abordagem construcionista representa um lastro poderoso que, certamente, norteará os rumos dos trabalhos nessas comunidades escolares.

A Informática sobrepõe-se à Educação...
A experiência adquirida pelos pesquisadores do NIED ao longo da realização do Projeto EDUCOM, possibilitou o acompanhamento do trabalho de Informática na Educação em outras escolas com realidades diferentes. Uma dessas escolas recebe alunos de uma classe social relativamente privilegiada da pré-escola à 8º série do 1º grau. Há algum tempo tinha montado um laboratório pequeno de microcomputadores para a disciplina de Informática, ministrada por um professor para as classes de 5º à 8º séries. Nessa disciplina, os alunos aprendiam conceitos básicos de Informática e o uso de alguns aplicativos, CD-ROMs etc.. Muitos dos alunos já tinham contato com o computador em casa e, por essa razão, havia uma certa pressão dos pais dos mesmos para que o  trabalho de Informática fosse ampliado.
A diretora da escola, compromissada com o seu papel de educadora, estava consciente da necessidade de implantar a Informática na Educação em novos moldes. Ela sabia a diferença entre o ensino de Informática e ensino através da Informática e queria que os alunos se beneficiassem de um trabalho que integrasse os conteúdos e os recursos pedagógicos disponíveis na escola. A meta da diretora, no entanto, ainda estava um tanto distante dos anseios dos professores. A escola como um todo estava buscando uma identidade educacional que apoiasse a prática pedagógica dos professores. A diretora tentou envolver os professores nessa empreitada, disposta a investir na formação do corpo docente para iniciar o trabalho de Informática na Educação. Feito o contato com o NIED, iniciamos um trabalho de assessoria para implantar a abordagem construcionista de uso do computador.
nicialmente realizamos um curso de programação Logo de 20 horas para cerca de 20 professores, coordenadores, diretora, bibliotecária e pessoal administrativo. O professor de Informática participou desse curso e mostrou-se bastante cooperador, tendo inclusive oferecido um curso para os demais professores aprenderem a usar o processador de texto. Embora esse professor tivesse uma formação estritamente técnica, havia desenvolvido na sua vivência com adolescentes uma postura bastante adequada em relação à aprendizagem. Sua participação no curso e, depois, como suporte para o desenvolvimento de seus colegas foi muito positiva.
Após esse primeiro contato com o computador, alguns professores passaram a acompanhar o trabalho de um aluno usando a linguagem Logo . Nem todos os professores envolvidos no curso puderam participar dessa experiência, tendo em vista o envolvimento com outras instituições educacionais que não lhes permitia muito tempo de dedicação, além dos horários para os quais eram contratados. Essa primeira experiência de usar o Logo com finalidade educacional suscitou uma série de questionamentos e reflexões por parte dos professores que dela participaram. O denominador comum entre eles era a insegurança em iniciar um trabalho de integração tendo pouco conhecimento sobre a ferramenta computacional. Em resposta à demanda dessa comunidade, realizamos um novo curso de programação Logo, considerando os aspectos pedagógicos subjacentes à sua prática educacional. Os cursos eram ministrados em períodos noturnos ou em finais de semana, para que um maior número de profissionais pudesse participar. Pouco a pouco ficava claro que o "vai e vem" entre uma escola e outra impedia que o professor mergulhasse no novo projeto pedagógico.
Cada professor envolvido no processo de formação delineou um plano pedagógico, baseado no uso do computador para aplicar em sua classe. Mas os professores não tinham domínio da máquina e essa falta de independência era um empecilho para o prosseguimento do trabalho prático. O professor de Informática empenhava-se em apoiar os colegas na aplicação de certos conceitos desenvolvidos ao longo do curso introdutório. A sua presença na escola tranqüilizava os professores que podiam então pedir auxílio quando fosse necessário. Infelizmente, o professor de Informática saiu da escola porque resolveu dedicar-se integralmente a outra atividade que desenvolvia paralelamente.
Ao mesmo tempo, um novo laboratório de computadores - mais amplo e mais moderno - foi entregue à comunidade da escola e os professores viam-se cada vez mais comprometidos com um trabalho para o qual não se sentiam preparados. A implementação do trabalho precisava ser rápida aos olhos da administração da escola, mas efetivamente era lenta devido ao tempo restrito que os professores podiam dedicar-se a ela. Outros professores saíram da escola e novos - sem nenhuma experiência na área de Informática na Educação - passaram a fazer parte do corpo docente. Não havia nenhum mecanismo dentro da própria escola que permitisse que os professores já iniciados pudessem preparar os ingressantes.
A diretora compreendia as dificuldades do processo e buscava alguma alternativa. Ela angustiava-se ao constatar que a escola havia investido na formação de alguns professores que já não faziam mais parte daquela comunidade. Parecia um processo sem fim que não atingia uma estabilidade, mesmo que temporária, devido à rotatividade do quadro docente. A solução que a direção da escola adotou para oferecer segurança aos professores que estavam realizando o trabalho prático com seus alunos, foi a de contratar um novo professor de Informática que pudesse dar-lhes apoio técnico.
A experiência com o professor anterior havia sido tão positiva, que a comunidade não se deu conta do duplo papel que o novo assumiria: o trabalho através da Informática e o ensino de Informática. Durante os encontros que promovíamos com os professores em formação, tentamos envolver o novo professor de Informática com o objetivo de oferecer-lhe alguns subsídios que pudessem apoiá-lo no trabalho de suporte técnico que desenvolveria junto aos demais. No entanto, seu perfil estritamente técnico, impedia-o de compreender a forma de atuar dos demais. Ele sabia muito bem "fazer", mas não tinha nenhuma paciência para "orientar" a aprendizagem do outro. Assim, os professores tinham como parceiro uma pessoa que "fazia por eles", mas que não lhes ensinava "como fazer". Ao invés de adquirirem maior independência, viam-se cada vez mais atrelados à figura do professor de Informática.
A rotatividade e a limitação de tempo dos professores, a falta de uma pessoa da comunidade que pudesse apoiá-los nas dúvidas iniciais e a não clareza da proposta de trabalho de Informática na Educação, foram alguns dos aspectos que contribuíram para que os professores fossem desistindo da idéia de se envolver pessoalmente com a proposta construcionista de uso do computador. Pareceu-lhes mais prático, rápido e natural que o professor de Informática abraçasse integralmente a proposta e se responsabilizasse pelo laboratório. Nosso papel nesse período foi o de orientar, indicando alternativas de como contornar os problemas. Entretanto, as soluções, necessariamente, precisavam emergir da própria comunidade escolar. Alguns meses mais tarde a escola optou pela terceirização da Informática na Educação: professores da escola de Informática contratada usavam vários software educacionais com os alunos independentemente do trabalho realizado em sala de aula. A idéia de integrar o computador às demais atividades pedagógicas e de promover a construção do conhecimento de forma individualizada através do computador, havia sido abandonada...

Um empurrão e a escola vai embora...
O acompanhamento realizado pelo NIED em diversas instituições escolares e a reflexão dos pesquisadores sobre os resultados desses trabalhos, contribuíram para a elaboração de um plano de formação que vimos realizando e modificando ao longo de nossa atuação. Esse plano favorece a emergência da construção da abordagem construcionista através da seleção de atividades reflexivas, que contemplam os seguintes aspectos: contextualização da Informática na Educação, aprendizagem da linguagem de programação Logo, aplicação da linguagem Logo com alunos, aprofundamento em programação Logo, utilização da linguagem Logo no contexto de sala de aula (Freire e Prado, 1996). Essa proposta original é constantemente reajustada de acordo com as necessidades de cada instituição, em maior ou menor grau, dependendo das características da escola. Isso aconteceu no trabalho em parceria que realizamos com uma escola que investiu na implantação da Informática na Educação desde a educação infantil até o Curso de Magistério e 2º grau regular.
A instituição em questão possui uma determinada filosofia educacional que afina-se com os pressupostos construcionistas da Informática na Educação que realizamos. Apresentamos o nosso plano de implantação e demos início ao trabalho através de um curso de programação Logo com duração de 40 horas, envolvendo cerca de 40 profissionais entre professores, orientadores pedagógicos, coordenadores de área e diretora da escola. Os profissionais estavam muito motivados para o trabalho, embora muitos estivessem também assustados e desorientados, pois não tinham idéia do que poderia acontecer.
O desempenho dos profissionais durante o curso em termos de compreensão da proposta pedagógica subjacente à linguagem de programação Logo e em termos da atividade de programação propriamente dita foi muito variado, como geralmente acontece. Muitas pessoas têm uma afinidade quase que imediata com a atividade de programação e outros levam um tempo maior para entender a lógica que está por trás desse tipo de atividade reflexiva. Da mesma forma, muitos profissionais conseguem depreender facilmente conceitos, estratégias de resolução de problemas e conteúdos disciplinares que interessa-lhes do ponto de vista educacional. Outros, ao contrário, perguntam-se o que a atividade de programação Logo tem a ver com a prática que desenvolvem em sala de aula. Foi nesse clima de sentimentos confusos que a primeira etapa do trabalho terminou.
Nossa experiência até então tinha nos mostrado que a maior parte dos professores sente-se bastante insegura para iniciar a qualquer atividade prática no laboratório envolvendo os alunos. Parece fazer parte do perfil do professor ter uma responsabilidade profissional tão acirrada que ele não se permite "tentar" ou "errar" na sua prática. Por essa razão, esperávamos que os profissionais criassem grupos de estudo, fortalecessem seus conhecimentos para então darmos continuidade ao nosso plano, que previa que cada professor escolhesse um ou dois alunos para acompanhar os trabalhos por eles desenvolvidos no laboratório, usando a linguagem Logo. Ficamos realmente surpresos quando tivemos a notícia de que os professores, por iniciativa própria, estavam usando o laboratório de computadores com as suas classes.
Teve início, assim, uma nova fase do processo de implantação do computador na escola, caracterizada pela reflexão na ação (Prado, 1996): o professor planejava uma atividade relativamente simples, tentando articular algum conteúdo da sua própria disciplina e instigava os alunos a usarem o Logo como uma ferramenta auxiliar ao entendimento daquele determinado conteúdo. Como resultado dessa reflexão na ação, alguns professores organizaram pequenos grupos de estudo com o objetivo de compartilhar dúvidas e
aprofundar os conhecimentos sobre programação Logo.
Obviamente surgiram inúmeras dificuldades. O professor não conhecia suficientemente bem a linguagem de programação para encaminhar as atividades dos alunos de forma individualizada, a partir das muitas hipóteses que surgiam durante a atividade. Os alunos, na grande maioria, nada conheciam do computador e questionavam quais comandos usar, que teclas apertar, onde estava o programa etc.. Como orientar o trabalho de tantos alunos ao mesmo tempo? Como introduzir um novo conceito do Logo ou da disciplina? Como avaliar os resultados da experiência? O que fazer na sala de aula e o que fazer no laboratório? Como aprender mais? A ansiedade nesse momento é muito grande e absolutamente natural.
O fato da escola estar em uma outra cidade, não nos permitia um acompanhamento mais sistemático. Foram muitas horas de conversa ao telefone, algumas reuniões pontuais e muitos, muitos relatórios e disquetes de alunos via correio para que pudéssemos acompanhar o processo que se desenrolava na escola. Foi extremamente importante a disposição dos professores em relatar por escrito suas experiências. Além de servir para nós como fonte de informação, representou um exercício reflexivo muito importante do professor sobre a sua prática pedagógica. O resultado dessas reflexões não foi imediato, ele surgiu aos poucos e pôde ser apreciado através do amadurecimento na condução do próprio trabalho. Mas isso só aconteceu muito tempo depois. Antes, era preciso consolidar o trabalho dentro daquela comunidade.
Por detrás desse envolvimento surpreendente, estava a figura de uma professora jovem e muito curiosa a respeito do computador. Ela dedicava-se ao trabalho de Informática na Educação integralmente e assessorava os demais professores no âmbito do laboratório. Dessa forma os problemas técnicos tão freqüentes puderam se minimizados. Ela aprendia muito e rapidamente e compartilhava com outros professores suas descobertas. Essa professora tornou-se em pouco tempo o elemento crucial do sucesso do trabalho na escola em relação ao uso do computador. Esse sucesso foi coroado com o desenvolvimento de um projeto computacional de caráter interdisciplinar desenvolvido por três alunas do Magistério sob sua orientação. O resultado desse projeto pedagógico teve um impacto tremendo sobre toda a comunidade escolar, mostrando que a Informática na Educação era absolutamente possível e poderia ser conquistada pelos demais professores que ainda estavam indecisos ou inseguros.
Findo o primeiro ano do trabalho na escola, as classes de pré-escola, de 1º à 4º série e o Magistério estavam totalmente envolvidas no trabalho com o Logo. As salas de 5º à 8º séries tinham muitos problemas específicos que dificultavam o desenvolvimento do trabalho: os professores dedicam-se a outras escolas, tinham poucos horários em comum e quase não dispunham de tempo livre para investir nos estudos pessoais ou em grupo. Nessas séries, as experiências foram isoladas e sobreviveram graças ao interesse exclusivo dos professores que encontraram algum meio de se dedicar ao trabalho, usando o computador.
Também por essa ocasião, soubemos que a professora que havia se dedicado ao trabalho com tanto afinco deixaria de atuar na escola. A notícia rapidamente se espalhou e toda a comunidade ficou preocupada com os rumos do trabalho. Quem assumiria seu lugar? Quem poderia auxiliar os professores com tanto preparo e dedicação? Durante algum tempo a escola ficou desamparada, sem saber ao certo o que fazer. Do nosso lado sabíamos que a solução teria que partir da própria escola e tentamos auxiliá-los no sentido de não desanimarem e reformularem o trabalho com base na nova realidade. Esse fato foi muito curioso, porque mostrou como a presença de uma pessoa de destaque em um trabalho novo na escola tem um duplo papel. Ao mesmo tempo em que ela representava segurança, representava também um limite: era um modelo difícil de ser atingido. O projeto pedagógico desenvolvido pelas alunas do Magistério e orientado por ela serviu de modelo para os demais professores: uma forma de integrar o computador as outras atividades desenvolvidas em sala de aula. Por um período isso foi muito importante por duas razões: serviu de referência para aquele professor que ainda não sabia como fazer a integração do computador e possibilitou a divulgação do trabalho em Informática na Educação no ambiente da escola de maneira incrível.
A saída da professora da escola proporcionou um profundo amadurecimento nos demais professores. Eles haviam perdido uma parceria importante, mas tiveram profissionalismo suficiente para assumir coletivamente as conseqüências dessa perda e distribuir a responsabilidade referente ao trabalho de Informática na Educação. A colaboração entre professores, coordenadores, orientadores pedagógicos e direção garantiu a retomada do trabalho com afinco.
A análise minuciosa dos trabalhos desenvolvidos no computador ao longo desse primeiro ano, revelou que a escola desenvolveu um padrão de uso do computador, isto é, um modo único de integrar o computador às demais atividades pedagógicas baseado no projeto desenvolvido pelas alunas do Magistério. A concepção geral subjacente ao uso do computador era interessante: os professores planejavam desenvolver certos conteúdos curriculares a partir de um tema, os alunos faziam pesquisas usando a biblioteca, entrevistas, fontes diversas de informação e depois elaboravam uma apresentação sobre o assunto, usando a linguagem Logo. Basicamente os programas computacionais encadeavam telas de desenhos e de texto escrito sobre algum assunto. O resultado final parecia bastante satisfatório, mas a análise cuidadosa mostrou os limites desse tipo de uso do computador: o tema era excessivamente abrangente, obrigando os alunos a subdividirem-no, retornando à eterna fragmentação do conhecimento. Os alunos certamente aprendiam muito sobre o que faziam e pouco podia ser avaliado sobre o que haviam aprendido a partir do trabalho dos colegas. Além disso, os professores não dispunham de tempo para analisarem junto com os alunos os programas computacionais propriamente ditos, perdendo-se assim a oportunidade de formalizar certos conceitos matemáticos e de programação surgidos de forma quase imperceptível, mas muito significativa nos diferentes programas computacionais dos alunos. Os textos escritos eram simplificados, visto que o Logo não é a ferramenta mais adequada para a produção de texto escrito.
As oficinas de trabalho realizadas com os professores a partir dessas constatações, garantiram a reflexão sobre a integração do computador nas atividades curriculares. Estamos exatamente nesse processo: depurar aquilo que já foi conquistado e rever o papel do computador nos diferentes momentos do processo de aprendizagem. Os professores têm escolhido temas geradores menos extensos e têm elaborado atividades onde o computador realmente contribui de forma significativa para a aprendizagem dos alunos. A introdução de novos conceitos computacionais, a formalização de conhecimentos explorados a partir das atividades desenvolvidas no laboratório estão sendo a tônica dessa etapa: é preciso restabelecer a importância da descrição - reflexão - depuração para que o aluno possa efetivamente se engajar em uma atividade reflexiva do ponto de vista educacional. Os professores estão depurando a prática pedagógica e o uso do computador para muitos deles não representa mais "uma outra atividade", mas a continuidade de um trabalho educacional que faz sentido para eles e para os alunos.
No atual estágio em que nos encontramos, a contribuição da rede de computadores tem sido surpreendente. A distância geográfica que nos separa (escola - NIED) deixou de ser intransponível (Valente, 1997). Hoje, a qualquer hora, podemos receber e enviar mensagens aos professores. O relatório dos professores e os trabalhos dos alunos não são mais enviados somente ao final de um determinado planejamento executado. Os professores podem analisar mais localmente suas dificuldades e enviar dúvidas específicas sobre o encaminhamento do trabalho. As facilidades da comunicação à distância para o trabalho pedagógico começam a fazer sentido para essa comunidade...

Analisando as Experiências...
As três experiências brevemente relatadas, mostram como a implantação da Informática na Educação tem relação com as características de cada instituição escolar e com o momento histórico em que se dá essa implementação. Obviamente há fenômenos comuns, como as dificuldades causadas pela rotatividade de professores, mas fica evidente que o trabalho pedagógico baseado no uso do computador, desenvolve-se de acordo com as necessidades de cada instituição.
O Projeto EDUCOM, no seu tempo, representou um grande avanço. As escolas envolvidas tiveram a oportunidade de realizar um trabalho pioneiro, inovador. A proposta do Projeto EDUCOM garantiu durante um longo período uma formação, em serviço, aos professores. A adesão dos mesmos ao Projeto foi espontânea: participavam os que "queriam mais", que estavam desejando "algo diferente". Havia um comprometimento institucional - por parte da escola e da universidade - e pessoal - por parte de cada professor. Essa aliança foi responsável pelo funcionamento do Projeto durante anos. Por se tratar de um projeto de pesquisa, o professor tinha mais confiança para ousar e testar suas hipóteses. A parceria com os especialistas foi extremamente importante, porque proporcionava uma avaliação contínua dos resultados do trabalho e reformulações do mesmo, de acordo com as hipóteses do grupo.
O professor era parte de um grupo dentro da escola que permitia trocas, perguntas, reflexões, mudanças. Refletir sobre a ação pedagógica foi um passo decisivo para o professor analisar seu papel no processo de ensino e analisar o modo como os alunos aprendem. A compreensão do processo de ensino e aprendizagem favoreceu uma mudança de metodologia de trabalho em sala de aula, influenciada pelas observações e análises que o professor fazia ao atuar no laboratório. Por outro lado, os docentes envolvidos no Projeto, formavam um grupo diferenciado aos olhos dos demais professores das escolas. Ao mesmo tempo em que eles realizavam um trabalho respeitado pela comunidade, os outros professores pareciam não se sentir à vontade para ingressar no grupo. A cultura do computador permaneceu restrita ao grupo, até porque a proposta original do Projeto EDUCOM não contemplava essa expansão, não contando, inclusive, com equipamento suficiente para suportá-la.
No início do Projeto EDUCOM, a Informática na Educação girava em torno de duas propostas educacionais opostas: o uso do Logo de acordo com os pressupostos construcionistas e o uso de CAIs que "computadorizavam" aquilo que tradicionalmente o professor já fazia em sala de aula. De lá para cá, com o avanço tecnológico, muitas outras ferramentas computacionais
interessantes surgiram. O Projeto EDUCOM não existe mais, alguns professores
não pertencem mais aquelas escolas e há muita novidade no mercado. Os
professores querem diversificar as ferramentas que utilizam, mas não sabem
muito como fazê-lo. O EDUCOM possibilitou aprofundamento pedagógico, mas não
acompanhou os avanços tecnológicos. Os professores estão tentando se adaptar às mudanças tecnológicas, analisando-as sob a ótica das conquistas pedagógicas que alcançaram.
Já, a segunda experiência, mostra uma escola de pequeno porte, pressionada pela urgência de se "modernizar", vendo na Informática uma solução. Optar pelo uso do computador, entretanto, não pode se plantar exclusivamente nesse tipo de argumento. Não resta dúvida de que a tecnologia está diretamente relacionada ao que é moderno, mas isso é muito pouco para sustentar uma proposta que necessita de tempo, compreensão, envolvimento e muito trabalho.
Os profissionais envolvidos na implantação da Informática na Educação, não conseguiram formar um grupo coeso com objetivos comuns. Os papéis desempenhados por eles eram muitas vezes ambíguos, dificultando o estabelecimento de diretrizes que pudessem organizar a implantação do trabalho: a diretora oscilava entre o papel de educadora e o de administradora da escola; a maioria dos professores dividia-se entre escolas com propostas pedagógicas divergentes; o professor de informática ensinava informática para alunos e dava apoio técnico aos outros professores.
Essa ambigüidade de papéis talvez tenha suas raízes na precocidade da proposta naquela comunidade escolar. Uma proposta pedagógica nova passa por um período de gestação onde os professores são mobilizados, os alunos e pais preparados para um período de espera. Esse tempo é absolutamente necessário para que os professores se organizem e tenham tranqüilidade para aprender os conhecimentos mínimos que permitirão transformar as idéias em ações pedagógicas significativas. Houve um descompasso entre o tempo necessário para preparar os professores e o tempo que a escola podia esperar para dar um retorno aos pais e alunos. As mudanças tecnológicas ocorrem rapidamente, mas o processo de formação de professores não acompanha a mesma velocidade, mesmo porque, a formação não se limita ao domínio técnico de ferramentas computacionais.
A terceirização foi a solução emergencial encontrada pela escola naquele momento específico. Contribuíram para essa decisão outros fatores não menos importantes. Um deles é a coexistência do Ensino de Informática e da Informática na Educação. Não que seja impossível, mas exige muita clareza dos objetivos pedagógicos norteadores de cada uma dessas propostas. Outro fator, refere-se ao perfil do profissional que tem como incumbência dar suporte técnico aos demais professores. É uma opção muitas vezes positiva, mas a seleção desse profissional não deve se ater somente à competência técnica. Era esperado que esse profissional pudesse pouco a pouco distanciar-se dessa função, à medida que os outros professores adquirissem confiança e conhecimento técnico. Saber fazer bem, não implica saber como ensinar alguém. O excesso de competência acabou gerando uma dose extra de insegurança.
O último dos relatos mostra um trabalho em pleno desenvolvimento. As dificuldades de percurso foram ultrapassadas, graças ao envolvimento efetivo da direção da escola e à maturidade e estabilidade de um corpo docente comprometido com o prosseguimento do trabalho. O conhecimento mútuo entre professores e direção da escola assegura que as pessoas certas sejam convocadas para que exerçam determinados papéis nos momentos adequados.
Embora a escola seja muito respeitada pela qualidade de ensino que oferece durante muitos anos em sua cidade, ela não se manteve imune aos efeitos da implantação da Informática na Educação. A escola passou por momentos de profundo desequilíbrio e "desorganização" mas a sua solidez filosófica e pedagógica permitiu aos profissionais compreenderem e resolverem os problemas.
As intervenções realizadas junto ao grupo são rapidamente analisadas e implementadas devido ao engajamento e abertura de todo o grupo. A inclusão do uso da rede de computadores nessa comunidade tem sido um forte aliado. O acompanhamento à distância compatibiliza-se com o perfil dos profissionais que têm iniciativa e ousadia para investir no trabalho cada vez com mais afinco.
A fase atual é de aprofundamento pedagógico, de revisão e reformulação da metodologia de trabalho como um todo. O passo imediatamente seguinte certamente será o de introduzir e integrar outras ferramentas computacionais que possam ser aplicadas de acordo com os objetivos pedagógicos traçados.

Trocando em miúdos...
O sucesso da implantação do uso do computador nos moldes construcionistas como pretendemos depende, em grande parte, de um trabalho colaborativo, envolvendo principalmente a direção da escola e seu corpo docente. O comprometimento entre as duas partes, a cumplicidade na elaboração e execução de um plano que abarque objetivos comuns é fundamental para que o apoio mútuo se estabeleça. Surgem problemas de natureza diversa que precisam ser resolvidos em comum acordo. Mudanças estruturais e pedagógicas só poderão vir a acontecer se a comunidade escolar estiver coesa e receptiva para compreender suas implicações. Direção e corpo docente constituem peças fundamentais de uma mesma engrenagem. Quando uma pára, a outra sofre os efeitos e vice-versa. Esse funcionamento sincronizado, no entanto, garante que o trabalho possa ser da escola e ao mesmo tempo de cada professor. Não se trata de um projeto unilateral.
É absolutamente necessário que a administração da escola tenha flexibilidade e tolerância para abraçar um novo projeto pedagógico que certamente provocará um período de instabilidade. Serão necessários ajustes de todo tipo: grade curricular, horário de aulas, planejamento, reuniões, uso do laboratório em horários extra-classe etc.. A viabilização do trabalho de Informática na Educação requer um bom planejamento organizacional adequado às necessidades e às condições da instituição, onde questões como manutenção dos equipamentos e compra de materiais de consumo para o laboratório precisam estar previstas para que não se transformem em empecilhos para a prática do mesmo. A direção pode ser um articulador importante entre a escola e outras instituições que mantêm um trabalho semelhante, ou entre a escola e especialistas da área que constituem interlocutores preciosos para orientar e discutir os rumos do trabalho. A promoção de eventos internos e externos como feiras, mostras, relatos de experiência, deve ser estimulada.
Esses encontros constituem um momento importante para a análise e revisão do trabalho. O mesmo acontece quando o corpo docente e discente têm a oportunidade de participar de congressos e seminários. Mais do que tudo, no entanto, a direção precisa expressar seu apoio aos professores, colaborando para que eles possam se sentir parte de um "time" que busca alternativas inovadoras e significativas para os problemas educacionais que enfrentam. A valorização e o respeito ao trabalho de cada docente é de suma importância para que o professor prossiga, engajando-se cada vez mais em um projeto que dever ser, ao mesmo tempo, coletivo e individual. A constituição de um grupo de trabalho é possível graças ao entendimento entre direção e professores. Os relatos mostraram, por exemplo, a importância de um líder natural para o encaminhamento do trabalho. Sua atuação, muitas vezes, apóia a atuação dos demais membros da equipe. Entretanto, é preciso compartilhar responsabilidades e tarefas para que o seu papel não seja super-dimensionado a ponto de essa pessoa "ser" o projeto de Informática na escola. Outra questão preocupante refere-se à rotatividade de professores. A formação interna, possibilitada pelo trabalho colaborativo entre professores e apoiada pela direção, visando à expansão da cultura do computador dentro da escola pode ser uma solução para a questão.
O professor representa a base de todo o trabalho. Sem o seu envolvimento, pouco se pode realizar. É preciso estudar, ter iniciativa, aprender-executar-refletir sobre o aprendido. Modificar o que for necessário. Exige-se nesse processo abertura, ousadia, colaboração e dedicação. Talvez o mais difícil para o professor seja conviver com uma situação onde ele não tem muito controle. Durante o processo de aprender uma nova ferramenta, por exemplo, o professor pode se sentir pouco confortável para usá-la com seus alunos. Mas o uso com os alunos provoca a vontade de se aprimorar e pode desencadear um ciclo sem fim. Estamos habituados a ter no professor "a fonte" da informação, mas esse quadro, hoje, tende a se modificar enormemente. Isso não significa que o professor perdeu o seu lugar, ao contrário, ele está deixando de ser o "detentor" do conhecimento, para ser o mediador de um conhecimento culturalmente construído e compartilhado. É ele quem orienta as investigações dos alunos, incentiva o prazer pelo saber, observa e aproveita o modo como cada aluno constrói seu próprio conhecimento. O conhecimento não está mais centrado exclusivamente em sua figura, mas pode ser acessado de diversas maneiras: através de revistas, jornais, livros, software, vídeo. Mas sem dúvida, é o professor quem tem condições de criar situações de aprendizagem nas quais esse conhecimento assume forma e sentido. Há portanto, uma inversão na maneira de organizar as atividades pedagógicas. O professor apresenta um problema que leva os alunos a usarem um conhecimento que, fora de qualquer contexto, é como se não existisse. O conhecimento adquire características definidas pelo seu contexto de uso. A multiplicidade de situações de aprendizagem envolvendo um mesmo assunto, leva o aluno a refletir sobre o sentido daquele conhecimento e a considerar a relatividade que o mesmo assume em cada situação. O "ponto" ou a "teoria" deixam de ser "dados" antes de serem significativamente usados. O uso passa a preceder a formalização. O desenvolvimento de uma metodologia de trabalho assim idealizada, requer que o professor tenha domínio da sua disciplina, observe cuidadosamente o modo como seus alunos aprendem e conheça a ferramenta computacional que pretende utilizar com eles. Quanto mais sabemos sobre um assunto, seja uma teoria, um software, um ofício, mais temos condições de explorá-lo, a fim de atingir as nossas metas. O computador é uma ferramenta que amplifica, acrescenta, modifica, transforma, representa um determinado conteúdo ou conceito de uma outra maneira. Em alguns casos ele será a ferramenta mais relevante, em outros uma ferramenta auxiliar e em outros ainda, será uma ferramenta de apoio. Discriminar entre essas situações implica analisar o conteúdo programático à luz das possibilidades oferecidas por essa tecnologia. Isso, no entanto, não ocorre de uma hora para outra, há de se vivenciar um longo processo, até que essa maturidade seja alcançada.
Durante algum tempo, o professor terá que conviver com a duplicidade de papéis: o de aprendiz - em relação à Informática na Educação - e o de professor - ao atuar com seus alunos. Quantos de nós não se lembra quando aprendeu alguma coisa nova e que parecia tão importante e difícil? Aprender a conviver com a fragilidade do conhecimento que está sendo gradativamente construído, é parte do próprio processo de aprendizagem, especialmente no caso de adultos, já profissionais, que não esperam reviver esses sentimentos conturbados. Entretanto, por mais que se diga, parece que o equilíbrio interno somente retorna quando pouco a pouco aprendemos mais e conseguimos organizar o nosso conhecimento sobre o novo. Aí então, olhar para trás é muito importante para tomarmos consciência de que o investimento e a dedicação são partes de um processo maior, que permite que atinjamos um novo período de estabilidade e nos preparemos para novas descobertas.
O professor envolve-se em um processo que mobiliza-o internamente: aprender uma coisa nova leva-o a instaurar um diálogo consigo mesmo. Aprender, atuar com os alunos, analisar sua ação pedagógica e modificá-la, permite-lhe, com o passsar do tempo, desenvolver uma metodologia de trabalho própria constantemente aberta a novas reformulações. Entretanto, os professores precisam estar atentos à necessidade de expandir esse trabalho dentro da própria escola, para que o mesmo não fique restrito a algumas classes e/ou a um pequeno grupo de professores. É necessário que se crie estratégias de disseminação dessa metodologia de modo a envolver outras classes e novos professores. A atuação do professor na escola, requer um processo de aprendizagem individualizado que precisa ser compartilhado com os colegas.
Essa troca de experiências tem duas funções principais: assegura a expansão da cultura do computador na escola e permite ao professor aprofundar seus conhecimentos na medida em que se abre para o confronto de idéias. A convivência com opiniões divergentes - em se tratando de um grupo coeso - contribui para a instauração do debate entre os integrantes do grupo, provocando um refinamento dos conhecimentos.
É natural que o professor, no início de seu trabalho na área de Informática na Educação, eleja algumas ferramentas computacionais para ele mais adequadas e/ou mais amigáveis. Para alguns professores, o aprendizado de algumas ferramentas pode parecer custoso, à princípio. Aos poucos, começa a compreender o funcionamento da mesma e atinge um momento de estabilidade que lhe permite usá-la cada vez com mais desembaraço. Esse momento é absolutamente necessário, pois não se pode aprender tudo de uma vez e usar tudo com os alunos sem uma avaliação cuidadosa. O aprimoramento atingido pelo professor em relação à sua prática pedagógica, permite que ele avalie a pertinência do uso de outras ferramentas e isso deve impulsioná-lo a aprender lidar com outros recursos tecnológicos que colaborem para a consolidação do seu trabalho com os alunos. A escolha de novas ferramentas não será apenas uma necessidade de atualização tecnológica por si só, mas será orientada pelas necessidades pedagógicas daquele professor. O uso integrado de várias ferramentas computacionais combinado com objetivos educacionais claramente estabelecidos, colaboram para o fortalecimento, na escola, do trabalho de Informática na Educação.
O desenvolvimento de uma metodologia de trabalho pedagógico e a atualização tecnológica são aspectos cruciais no trabalho de Informática na Educação. Ao mesmo tempo que o professor desenvolve uma metodologia de trabalho particular, deve estar atento à necessidade de compartilhá-la com outros professores e recontextualizá-la com outros alunos; também quando ele adquire domínio de uma determinada ferramenta computacional, deve estar atento às novas possibilidades tecnológicas que possam contribuir para o aprimoramento de sua prática pedagógica. É como se diz popularmente: é preciso manter "um olho no gato e um outro no peixe". 
Agradecimentos
Agradecemos de modo especial à Profº Dra. Heloísa V. da Rocha e Profº Dra. Maria Cecília C. Baranauskas pela cuidadosa leitura e sugestões feitas.
Também agradecemos aos professores e alunos das escolas cujas histórias relatamos no artigo, pelo envolvimento e trabalho que realizam.
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Este artigo foi publicado na Revista Brasileira de Informática na Educação nº 03 de setembro/1998 Florianópolis, SC (páginas: 45 a 62)
http://janus.inf.ufsc.br/sbc-ie/revista/
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