Boletim Mensal * Ano VI * Agosto de 2008 * Número 62

           

COLUNA DOS VINHOS

Ivo Amaral Junior

 

        Compadres:

Meus últimos artigos estavam versando sobre enoturismo e, talvez motivados pelas viagens enológicas que estavam lendo, dois deles me convidaram para fazer uma viagem pelo mundo do vinho. Sem sair do Recife, claro! Não que eles não pudessem, afinal de contas meus amigos, ambos advogados de renome, Eduardo Trindade e Roberto Pimentel, podem muito bem viajar para qualquer lugar do globo em busca do vinho sublime, do néctar dos deuses.

Mas vamos deixar de falar um pouco sobre a capacidade geradora de riquezas de meus amigos e vamos diretamente ao que eles me ofertaram em nome da amizade sincera e verdadeira, descompromissada em qualquer retorno (até porque qualquer retorno que eu pudesse eventualmente dar, certamente não figuraria nos anais das reuniões importantes desses nobres amigos, ante a minha fragilidade econômica em proporcionar iguarias e bebidas do nível que eles podem e merecem desfrutar).

Numa sexta-feira chuvosa, meu amigo Roberto Pimentel e sua esposa Marcinha, gentilmente me convidaram e a Celinha para um jantarzinho “básico” nas palavras dele. Ir para a residência deles não é nenhum sacrifício, mormente quando fui informado que o prato principal seria um cordeiro à moda da casa que ele tinha recebido de um cliente e que tinha sido abatido na própria manhã daquele dia, além de um bacalhau do porto às natas com batatas, azeitonas pretas e cebolas.

Lá chegando fui brindado com a presença de uma figura extraordinária, o Dr. Márcio Menezes, pai da anfitriã, funcionário público da mais alta estirpe, ex-delegado geral da Receita Federal, bom vivant, viajante e proseador de primeiríssima linha. Não preciso nem dizer que quando isso acontece o tempo não passa, ele voa! Nesse interregno de conversas sobre viagens espetaculares, frescuras dos melindrosos, diversão à custa dos outros, risos e gargalhadas, tomamos um bocado de vinho com petiscos (frios, queijos, pastas e amêndoas), antes de adentrarmos nos pratos principais.

Congelem a cena: mesa posta, talheres de prata, pratos de porcelana inglesa, taças do mais fino cristal de Murano e companhia maravilhosa. Precisava mais? Não precisava, mas meus amigos Roberto e Marcinha nos proporcionaram mais uma noite inesquecível; os pratos estavam divinos (descongelem a cena), o bacalhau regado ao azeite com natas douradas e entremeado de batatas, cebolas e azeitonas pretas, o cordeiro (aquele abatido no próprio dia) vinha com a carne atrelada aos ossos que a qualquer movimento mais brusco do garfo simplesmente descolava-se para logo após se desmanchar na boca. Ai, ai, ai!

Mas não é só caros compadres! Inebriado diante da situação, foi-me ofertado, ainda, para acompanhar o cordeiro (guisado num molho especial) um vinho da região de Castilla y Leon, mais precisamente da Ribeira del Duero, um néctar chamado Codice, espanhol legítimo e de ótima qualidade, que simplesmente estava fenomenal. Recomendo para as carnes nobres, pois a harmonização foi perfeita e o preço me parece que é acessível. Para jogar uma pá-de-cal nas minhas pretensões dietéticas, não pude recusar a imposição de provar o bacalhau e mais uma vez prosperou minha fama pantagruélica de só parar quando as travessas estiveram vazias. A cada prato um novo vinho e lá estávamos provando o Duque de Beja, um vinho muito bom, com preço deveras aquém do seu potencial e qualidade, uns 40 reais – sei disso porque esse fui eu quem levou a garrafa, pois minhas economias – se assim posso chamar o cheque especial que cubro mensalmente – só permitem esse tipo de ousadia.

Como disse, o tempo passou ligeiro, a madrugada avançava e quando notei que apesar das seis garrafas sorvidas ainda olhávamos para a adega, ameaçadoramente para os vinhos mais caros, vi que era o momento de ir embora, ates de cometer uma heresia de sorver algo que minhas papilas gustativas não iriam lembrar no dia posterior.

Realmente foi uma viagem enológica que irei guardar para sempre nos anais daqueles momentos especiais. A companhia, a comida, a bebida, a conversa. Tudo!

Acordei sobressaltado com o alarme tocando me avisando de um dia inesperado de labuta, mas com um sorriso escancarado de satisfação e lembrança da noite anterior e, apesar do trabalho, estava pronto para outra. Aí o meu amigo Eduardo Trindade ligou perguntando se eu estava fazendo alguma coisa, pois ele estava voltando de um longo período de convalescença e queria tomar um bom vinho comigo e outros amigos, ou seja, boa companhia, boa bebida, boa comida e boa conversa. Como ninguém é de ferro e precisa disso de vez em quando, não pude resistir ao convite de meu grande e abastado amigo, mas isso é assunto para minha próxima coluna, até lá!

 

 

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