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Caderno de Cultura Caetiteense
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Camillo de Jesus Lima
O maior poeta de Caetité
INTRODUÇÃO
Caderno de Cultura Caetiteense - Conteúdo de livre reprodução, desde que citada a fonte:
Site Cultural do Município de Caetité - Bahia - 2002 - André Koehne
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ENSAIO BIOGRÁFICO
A CAETITÉ EM QUE CAMILLO NASCEU
O QUE DISSERAM DE CAMILLO
VERSOS DE CAMILLO
DOCUMENTO
BIBLIOGRAFIA
NASCE O POETA
O CANTO MERECE UMA GAIOLA
  Camillo de Jesus Lima nasceu em Caetité, aos  08 de setembro de 1.912, filho de Francisco Fagundes de Lima e D. Esther Fagundes da Silva. Trazia no sangue a estirpe de várias famílias tradicionais da cidade: Fagundes, Lima, Cotrim e Prisco. Mas seu sobrenome não seria Lima, e sim Fagundes, como consta do registro de nascimento.Era sobrinho-neto daquele que foi o nosso primeiro poeta: Plínio Augusto Xavier de Lima, bardo que fizera fama no século XIX, colega de Faculdade de Direito de Castro Alves, no Recife. Plínio marcou a História de Caetité, por sua força nas palavras, pelo discurso pleno de ideais, num tempo em que a escravidão nos maculava a existência. Era um futuro promissor, um jovem cheio de planos e lutas, cedo interrompido pela morte que colhia os poetas de então...

   Em 1.915 seria Caetité elevado a sede de bispado. A cidade contava com uma educação que só tinha paralelo na capital Salvador: o Colégio Americano, protestante, e o Jesuíta São Luis Gonzaga, rivalizavam na formação de uma elite intelectual. O nome da cidade era proferido com orgulho, o Jornal A Penna circulava, mantendo acesa a vida cultural, enquanto fervilhava a vida política.

   Seu pai, o professor Chico Fagundes, homem circunspecto, devotado às leituras e ao magistério, era ateu convicto, que muito influenciou ao filho, e marcou na cidade por seu jeito distraído (Camillo dedica-lhe um poema em que revela ser ele um gênio incompreendido por não comungar a fé dominante e "ler Shakespeare no original"). Após alguns périplos vem para Caetité, onde se realiza a breve experiência do Colégio de Caetité, do Padre Luis Soares Palmeira (1935-1938), local onde pai e filho lecionam.

   Transfere-se para Vitória da Conquista uma vez que a crise provocada pela seca de 1939/40 forçara a mudança do Colégio do Padre Palmeira, onde ensinava, para aquela cidade (motivo aparente, pois na verdade o que ocorreu foi um convite dos chefes políticos daquela cidade que, assim, visavam proporcionar uma educação de qualidade para seus filhos, como atesta Mozart Tanajura no histórico que fez daquela cidade, emancipada de Caetité em 1840). Ali Camillo produz sólidas amizades, que o acompanhariam por toda a vida, sempre no meio artístico e intelectual, sem perder, contudo, os laços afetivos com a terra natal.
  Como ocorria a todos os estudantes daqueles tempos, Camillo simpatiza com as idéias comunistas. Qual seu tio-avô Plínio de Lima, que abraçara a causa da igualdade entre os homens com o abolicionismo, Camillo defende uma sociedade mais justa, e irá pagar alto preço por isto.

   Tornando-se tabelião ("oficial de registro de imóveis e hipotecas"), mora em Vitória da Conquista, Macarani e Itapetinga. Talentoso, desdobra-se em jornalista, escritor, professor, deixando extensa obra literária, do romance ao conto, mas é na poesia que se consagra, já em 1942, com o livro Poemas, recebedor do Prêmio Raul de Leoni da Academia Carioca de Letras (edição de "O Combate", que publicou quatro de seus livros).

   Também publicou:
As Trevas da Noite Estão Passando ("O Combate", em colaboração com Laudionor Brasil, poemas, 1941); Viola Quebrada ("O Combate", poesia, 1945); Novos Poemas ("O Combate", id., ib.); Cantigas da Tarde Nevoenta ("Edição de SA Artes Gráficas - Salvador", poesia); Memórias do Professor Mamede Campos (romance); A Mão Nevada e Fria da Saudade ("Edições MAR", poesia), A Bruxa do Fogão Encerado (contos); Vícios (contos); Bonecos (Perfis); O Livro de Miriam (Poesia, 1973, impresso na gráfica de "O Jornal de Conquista" para "edições MAR"); Cancioneiro do Vira-mundo (Poesia), e outros tantos escritos, publicados em todo o país, muitos ainda inéditos.

   Mesmo longe dos centros culturais do país, Camillo fervilha com a pena na mão. Sua poesia plena de lirismo cativa, e tem em Vitória da Conquista, num tempo onde surgem Glauber Rocha,  Elomar e outros, um meio artístico incomum, que, por produzir pensamentos, provocou reação junto àqueles para quem o pensar e a palavra eram armas perigosas, a ser combatidas...
  Os homens aprisionam aves para assim disporem de seu canto. Esperam, desta forma, obter a recompensa da arte espontânea dos animais. Mas, que dizer de homens que se fazem animais irracionais a aprisionar outros homens para que não exibam seu canto?

   O eclodir do Golpe Militar de 1964 mergulhou o Brasil em triste período de sombras. As primeiras vítimas do movimento foram os cérebros que produziam arte, que viam com sensibilidade o sofrimento de seu povo, e pensavam ser possível um mundo melhor.
 
   Camillo era redator d'O Jornal de Conquista, e morava em Macarani, quando foi preso e levado para a Vitória da Conquista, onde já estavam detidos Pedral Sampaio (prefeito da cidade) e Reginaldo Santos (redator d'O Combate), dentre outros. Eis o resumo deste episódio, sob a descrição de Emiliano José (escritor e jornalista, autor da biografia de Marighella):

   Os presos do 19º Batalhão de Caçadores, depois dum habeas corpus da Justiça Militar, foram transferidos secretamente para o Quartel de Amaralina, em Salvador. Ali, incomunicáveis, planejaram uma fuga, suspensa porque souberam da visita do General Ernesto Geisel, que por pressão do chefe da Comissão Geral de Inquéritos iria verificar as condições dos presídios.

   Othon Jambeiro sugeriu que se colocasse um cartaz na cela, com os dizeres em latim: "LASCIATE OGNI SPERANZA VOI CHE ENTRATE", dizeres que Dante Alighieri colocara na porta do Inferno, em sua Divina Comédia, e que significa:
deixai toda esperança, vós que entrais. Geisel, chegando, leu e perguntou quem colocara aquilo, e por quê. Jambeiro assumiu e contou-lhe a situação vivida ali. Surpreendendo os presos que não o sabiam culto, o severo militar perguntou: "Isso não é de Dante Alighieri?" e comentou: "Vejo que há algum intelectual aqui."

   "Foi então que o poeta Camillo de Jesus Lima adiantou-se e, sereno e firme, respondeu -
General, intelectuais somos todos os que aqui estamos. E intelectuais lutando por uma causa justa. Os fotógrafos que acompanhavam os vários repórteres presentes quando viram Lima se adiantar e começar a falar postaram-se para fotografá-lo (...) Lima, lembra Nudd David de Castro, quando chegou, e foi um dos últimos a chegar, representou uma espécie de bálsamo para a árida atmosfera que respiravam. Poeta sensível, pena refinada, amante inveterado, gostava de declamar os poemas dedicados às suas mulheres. "A chegada dele nos deu outro alento. Já estávamos cansados das mesmas caras. Ele deu outro ânimo à nossa convivência, com sua alegria, sua verve, seu bom humor, sua poesia", explica Castro." (grifamos).

   Libertado, lança em 1973
O Livro de Miriam, dedicado a sua esposa, obra que, neste mesmo ano, em visita a sua Caetité natal, doa à Biblioteca Pública. Aqui revê amigos, vive um pouco daquilo que todos os visitantes e filhos da terra moradores doutras paragens experimentam: a amizade, a alegria do reencontro... mas foi uma despedida.

  
De 1964 até sua morte, em 1975, Camillo jamais deve ter se reabilitado. Foi justamente naquele ano, quando o Brasil havia mergulhado no período mais negro da ditadura, com Geisel na Presidência, que as perseguições se acentuam. Morrem misteriosa e acidentalmente Anísio Teixeira, Juscelino Kubitscheck, João Goulart... morre, misteriosamente atropelado, em Itapetinga, o Poeta Camillo de Jesus Lima, Caetiteense, como haveria de ser.
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