O Hóspede Maldito: Medusa

Prólogo - Código: Medusa


Ilha Colosso. Grécia. Ao sul de Náxos e a nordeste de Thíra.

Uma pequena ilha sozinha e afastada das demais ilhas Cyclades. Pequena, porém próspera. Desde a implantação de um campus de pesquisa da Corporação Umbrella a cidade de pescadores presenciou um generoso desenvolvimento. A necessidade de se criar estrutura para suportar o grande fluxo de cientistas fez brotar o comércio e a hotelaria.

O campus Colosso faz parte da Divisão de Farmacologia Imunológica da Umbrella. Uma área construída de dez mil metros quadrados abriga laboratórios de manipulação de medicamentos e aplicações em cobaias animais. Também serve de tampa para a mega estrutura construída no subsolo no campus, todo montado sobre um enorme cânion, que agora abriga setenta andares abaixo do solo, dezenas de laboratórios e uma rede ferroviária que leva os funcionário das instalações subterrâneas até a estação construída na superfície, longe dos olhares dos nativos e de acesso restrito.

A cerca de cem metros abaixo da superfície, no departamento de Virologia, os primeiros cientistas começavam a chegar para um novo dia de expediente.

Após passar pela câmara de descontaminação, uma mulher adentra um dos laboratórios, devidamente trajada com as grossas roupas de plástico, luvas de borracha, máscara e protetores para os olhos. A presença de qualquer patógeno no ar é zero. Mas se qualquer vazamento ocorresse, por mínimo que fosse, ela não queria estar sem toda a proteção.

- Ed? - admira-se a mulher ao encontrar seu colega já no laboratório - Já tão cedo?

- Bom dia Anne!

A mulher inclinou-se sobre o balcão de seu colega para ver com o que ele estava trabalhando. Dentro de uma câmara hermética o cientista mexia, através de luvas grossas que privavam do contato direto entre o interior da câmara e o exterior, com algumas cobaias.

- O que tem aí? - perguntou a mulher.

- Inofensivos ratinhos brancos. - respondeu o homem. A mulher sorriu por debaixo da máscara branca.

- O que eles têm?

- T-Medusa. - respondeu o homem. No mesmo instante a mulher deu um salto para trás.

- Acalme-se... Estão sedados...

- Conseguiu sedá-los? - indagou impressionada a mulher.

- Sim. Tratei-os com T-Medusa ontem, antes de ir embora. Programei a estufa para liberar sedativo gasoso assim que ela fizesse efeito.

- E qual o tempo dessa vez?

O homem buscou dados em um papel.

- Dezessete minutos. - respondeu ele - Menos da metade do T-Vírus.

- Hmmm... Você viu os efeitos se manifestando? - perguntou a mulher.

- Não. Programei para liberar o sedativo quando a temperatura corporal das cobaias baixasse.

A mulher inclinou-se sobre o balcão novamente.

- Ed, qual a temperatura mínima que os ratos atingiram? - indagou ela, mais séria.

- Qual a preocupação Anne? Está tudo sob controle!

- Verifique a temperatura.

O homem pegou os papéis. Folheou até encontrar os gráficos de temperatura.

- Hmmm... Vejamos. Apliquei às 22:00hs. Às 22:17hs começou a fazer efeito... A temperatura caiu até...

Os dois pararam atônitos.

-Como você não parou para ver isso? - indagou Anne.

- Eu... Como aconteceu? Já estava tarde! Deixei o computador analisar o resto!

A curva da temperatura corporal da cobaia descia de forma uniforme nos primeiros minutos, depois assumiu um comportamento arrítmico até descrever uma queda brusca e então, depois de cinco minutos, a curva estabilizou-se. A temperatura da cobaia se equivaleu à do ambiente. A cobaia, fisiologicamente, morrera.

- Esse comportamento se assemelha...

- Ao T-Vírus, G-Vírus e T-Veronica. - completou Anne. - Ed, tenha cuidado. Já viu o que esses vírus fizeram com as cobaias? Os ratos sofriam de morte cerebral e depois voltavam a reagir a estímulos, mesmo depois de mortos. Era horrível.

- Mas o objetivo foi alcançado. Reanimar células mortas.

- De que adiantava se elas entravam em decomposição?- retrucou a cientista.

- O T-Medusa é diferente. As células são reanimadas ainda mais fortes que antes... Você verá!

- Sei... - desconfiou Anne.

A cientista foi preparar um material no balcão ao lado. Então algo no cofre, uma caixa de vidro hermeticamente fechada e com temperatura controlada onde se guardavam amostras, a chamou atenção. Havia cinco presilhas, quatro delas continham tubos cilíndricos com um líquido avermelhado. Todos eles rotulados: T-Medusa. Havia uma presilha vazia.

- Ed... Quantas doses você usou ontem?

- Uma só. - respondeu o cientista, ainda manipulando as cobaias.

- E por que não a repôs no cofre?

O cientista virou-se assustado. Estava certo que não tinha ouvido direito.

- Como é?

Anne engoliu em seco, percebendo o temor de Ed.

- Só tem quatro frascos no cofre, Ed. Você repôs o que você usou?

O pesquisador voou sobre o cofre e pregou o rosto sobre o vidro. Contava e recontava inúmeras vezes. E então fixou o olhar na presilha vazia.

Seu olhar desesperado virou-se lentamente para de encontro ao da sua colega.

- Anne... Está faltando uma amostra.

A Colméia Colosso, como era chamada a base da Umbrella naquela ilha, tinha seu próprio cérebro eletrônico: a Rainha Vermelha, um programa de inteligência artificial usado nas instalações de segurança da Umbrella que verifica todas as variáveis ambientais e toma medidas para que elas se mantenham estáveis. Ela tem o controle dos elevadores, portas, alarmes, reguladores climáticos, controla também todo o tráfego dos dois trens que se comunicam com a superfície. Enfim, ela de fato é a colméia. Neste momento, no mainframe da Rainha uma luz pisca incessantemente em um de seus inúmeros painéis.

::Grau de contaminação detectado::

::Modo Segurança - ATIVADO::

:: Prioridade - ISOLAMENTO::

Os trens iam e vinham alternadamente. Eram dois, enquanto um subia o outro descia. E sempre se encontravam no meio do trajeto. A viagem entre subsolo e superfície demorava cerca de cinco minutos. Portanto, a cada dois minutos e meio um dos trens parava em uma estação.

Uma cientista, quase dormindo, encostava-se para trás, no banco de um trem que subia. Fizera plantão na noite anterior e só agora voltava para casa. Tinha cabelos ruivos, lisos, até o ombro e olhos castanhos que a toda hora se fechavam. Acordou definitivamente de seus rápidos cochilos quando o trem parou no meio do trajeto.

- Nossa... O que aconteceu?

Alguns metros à frente o trem que descia também estava parado. Depois de alguns segundos os dois trens começaram a subir. Estacionaram na estação da superfície e desligaram-se. Em seguidas desceram grossas barras de metal, obstruindo a entrada do túnel que descia à colméia.

Todos os ocupantes e os que esperavam na estação se perguntavam o que estava acontecendo. O único acesso convencional ao subsolo estava impedido.

Na superfície começaram a tocar alarmes de evacuação. Uma voz gravada pedia para que todos os funcionários evacuassem a base de superfície imediatamente.

No subsolo todos os laboratórios herméticos começaram a se trancar. E os cientistas que estavam dentro deles se viram presos.

- O que é isso?

-Treinamento? - perguntavam-se os cientistas presos.

- “Medidas de contenção” - era tudo que a Rainha Vermelha respondia quando questionada através dos terminais.

Os que estavam na estação subsolo se assustaram quando viram descer grades de ferro obstruindo a passagem do túnel. Alguns se arriscaram a descer ao fosso dos trilhos e forçar a grade. Esforço em vão.

O sistema de circulação de ar se desligou. As entradas e saídas de ar na superfície se fecharam. As linhas de telefone externas pararam de funcionar. A Internet também se desligou. Todo e qualquer conato com a superfície fora cortado.

- Alguém abra isso aqui! - gritava Ed enquanto batia com força na porta trancada do laboratório.

- A Rainha surtou! - exclamou Anne fazendo gestos para a câmera de segurança.

::ISOLAMENTO - Efetivado::

:: Nova prioridade - EXECUÇÃO::

:: Alvo - Potenciais Hospedeiros::

Os springlers de incêndio se ligaram em todos os laboratórios herméticos.

- Ei! - berrou Ed - Não há incêndio aqui! - dirigiu-se para câmera - Desligue isso!

- Meu Deus! - exclamou Anne - Trancaram o laboratório e ligaram o springlers. Isso aqui vai inundar!

Fora dos laboratórios os demais funcionários começavam a se desesperar.

No departamento de administração um homem gritava ao telefone em sua sala. Sobre sua mesa lia-se em uma placa: Tomas Hilton - Diretor Executivo.

- Sem comunicação? Tente enviar um sinal externo! Como não? Tente uma linha alternativa! Santo Deus... Aguarde, já te retorno.

Desligou o telefone, mudou a linha e atendeu novamente.

- Conseguiram? - perguntou ele ao departamento de informática - Como assim trancou o acesso ao Mainframe? Tentaram acessar de um terminal remoto? Bloqueado?! Impossível!

O homem bateu o telefone no gancho com força no gancho.

- Maldição! - Baixou a cabeça na mesa e alisou seus cabelos suspirando longamente, ignorando as dezenas de luzes que piscavam em seu aparelho de telefone. Cada uma delas indicava alguém tentando lhe falar.

- O que a Rainha está fazendo?

Os funcionários de andares mais inferiores se amontoavam nos elevadores.

- Ei amigo, está lotado! - disse o último passageiro a um outro funcionário que ficou de fora. O elevador estava lotado. As portas se fecharam e ele se movimentou. O homem do lado de fora ficou resmungando e esperou o próximo.

- Será que não está muito cheio? - questionou alguém dentro do elevador apertado.

- Que nada! Se estivesse muito pesado a Rainha não deixaria o elevador sair.

- Não sei... Tenho um pouco de receio quanto a este programa de computador...

- Não seja bobo. A Rainha faz tudo para manter este campus seguro.

Então o elevador parou. Todos eles ao mesmo tempo. Os ocupantes exclamaram assustados.

- Estamos seguros, certo? - indagou alguém.

Todos permaneceram em silêncio, escutando os rangidos do metal acima deles.

De súbito os cabos dos elevadores se rompem. Todas as máquinas descem em queda livre pelo fosso, chocando-se aleatoriamente contra a parede. A velocidade aumentando indefinidamente. Os gritos desesperados dos ocupantes desciam pelo fosso ecoando até pararem repentinamente.

O aparelho atingira o chão.

As estruturas mais inferiores do campus foram acometidas por repentino tremor. E uma fumaça acinzentada subiu pelo fosso e dissipou-se pelas portas, agora todas abertas para o escuro vazio, onde deviam haver elevadores.

O pânico tomava conta dos funcionários no subsolo da colméia.

Na superfície o alarme de evacuação continuava. Alguns saíram rapidamente do prédio, outros insistiram em ficar para tentar descer ao subsolo.

Juli, a cientista ruiva, saiu assim que pôde. Estava no estacionamento, ligando seu carro quando viu algo bizarro acontecer. Desceram pesadas portas de metal com rebites enormes sobre todas entrada e saídas do campus. As janelas foram obstruídas por placas de metal que as trancaram completamente. Os canos de exaustão e captação de ar também se fecharam. Em segundos toda a colméia se fechou, trancando lá dentro qualquer um que tenha ficado para trás.

- Cruzes... O que está havendo?

Todo o campus de pesquisa Colosso se trancou. Nada saía, nada entrava. A colméia tornou-se uma verdadeira fortaleza impenetrável.

- Isso é palhaçada! - esbravejava Ed, preso no laboratório via a água bater em sua cintura. E o nível continuava a subir.

- Tente isso! - Anne trouxe-lhe um machado de incêndio.

Ed empunhou-o com as duas mãos. Mirou no vidro da porta e desceu a arma com toda sua força. A cabeça do machado bateu contra o vidro e recebeu todo o impacto de volta, sendo jogado para trás e escapando das mãos do cientista. O vidro parecia intacto.

- Ah, qual é!

- Olhe! - Anne apontou para o que parecia ser uma fenda no vidro - Parece que rachou...

Os dois se aproximaram e constataram aterrorizados. Não era uma fenda no vidro, e sim uma lasca que se partira do machado.

Os desespero era total na colméia. Cientistas, técnicos e todos os funcionários corriam desesperados em busca de uma saída. Mas não havia saídas. Não havia escapatória. Todos que ficaram presos já estavam condenados à morte. E a Rainha Vermelha sabia disso.

Tomas Hilton debruçava-se em sua mesa, preso em sua sala. Seus cabelos desgrenhados e seu olhar perdido denunciavam seu desespero frente à situação. Inúmeras luzes piscavam em seu telefone, todos os ramais o chamavam, pedindo uma solução. A resposta ele não quer dar. Sabia o que acontecera. A Rainha estava fazendo o que devia ser feito. Tomas fora instruído que isso um dia poderia acontecer. Mas jamais imaginou que seria justo com ele.

E o que vem a seguir é o que ele mais temia.

Ouviu-se um baque geral. As luzes se apagaram e acenderam-se as de bateria. Todos os equipamentos pararam. As luzes do telefone se apagaram e veio o silêncio. As trancas eletrônicas que isolavam as alas se abriram.

Tomas cobriu a cabeças com as mãos e esperou que o fim chegasse.

O único som era o de um gemido gutural acompanhado de passos arrastados ecoando pelo corredor fracamente iluminado.

::Procedimentos::

_Isolamento...CONCLUÍDO

_Execução...CONCLUÍDO

_Contenção Viral...CONCLUÍDO

::Prioridade - MANTER ISOLAMENTO::

:: Pedido de SOS__Enviado::

::Modo de Segurança Armas Letais - ATIVADO::

...

...aguardando...


Capítulo 1

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