O Brasil de D. Joao VI

Condensado de texto de Vera Lúcia Bottrel Tostes 

 

 

D. João VI

 

 

Um Arsenal ao seviço do Rei
 
A vinda da Corte portuguesa para o Brasil, em 1808, representou o início da formação de uma nova nação. A abertura dos portos, o livre comércio, a introdução de hábitos culturais e industriais e a elevação à condição de Reino Unido contribuíram para que novas forças sociais fossem incorporadas, modificando o perfil do país-colónia e dos habitantes, especialmente sentida na cidade do Rio de Janeiro.
 
 
As instituições criadas e estabelecidas, como a Biblioteca Real, o Banco do Brasil, a Praça do Comércio, o Jardim Botânico, a Imprensa Régia, as Academias de Belas Artes, Naval e Militar entre outras redefiniram o papel da cidade e do país, confirmando a citação de Oliveira Lima "o regente e rei D. João VI veio criar e realmente fundou na América, um império..."
 
 
 
As instituições académicas estabelecidas a partir de 1810 representaram o esforço da administração portuguesa para dar condições ao funcionamento do Estado português na colónia americana. As já existentes em Portugal foram recriadas, como o Arquivo Real, a Real Biblioteca, o Erário Público e a Academia da Marinha, dentre outras, acrescidas da Real Academia de Pintura, Desenho, Escultura e Arquitectura Civil, resultante da Missão Francesa, que chegou em 1816, e do Museu Real, em 1818.
 
O conjunto arquitectónico onde se localiza o Museu Histórico Nacional, quando do estabelecimento da Corte na cidade, era composto de três edificações: a Fortaleza de Santiago, que cedeu lugar à Bateria de Santiago criada em 1567, construída numa ponta de terra que avançava sobre o mar, com a finalidade de defender a cidade contra a invasão estrangeira.
 
A Casa do Trem, erigida em 1762, por Gomes Freire de Andrade, conde de Bobadela, destinada à guarda dos armamentos das tropas portuguesas para reforçar a protecção contra os corsários em busca do ouro vindo de Minas Gerais; e o Arsenal de Guerra, edificado, em 1764, pelo vice-rei D. António Alvares da Cunha, conde da Cunha, no terreno entre a Fortaleza e a Casa do Trem, para o reparo das armas, fabricação de munição de artilharia, lâminas de espadas, armas de fogo e fundição.
 
A fundição aliava à fabricação bélica a de peças artísticas como as primeiras esculturas fundidas em bronze, na América, em 1783, as figuras de Eco e Narciso entre outras de Valentim da Fonseca e Silva, dito Mestre Valentim (c. 1750) que adornaram jardins e praças, hoje preservadas nos museus da cidade.
 
Antes da chegada da Corte, o Arsenal tinha seu funcionamento restrito em comparação aos europeus, visando evitar concorrência com a Metrópole. Esse panorama só se modificou com a presença de D. João VI, quando o Arsenal do Trem (como também era denominado), passou a ter uma organização semelhante ao de Lisboa. O Alvará de 1 de Março de 1811 criou a Real Junta dos Arsenais do Exército, Fábricas e Fundição.
 
A Casa do Trem que havia sido construída para funcionar como quartel de artilharia, devido às pequenas dimensões, nunca teve esta função. Foi, no entanto, aproveitada para instalação da Academia Militar, provavelmente a primeira instituição de ensino superior não religiosa do Brasil. Essa Academia era o desdobramento da "Aula de Fortificações", estabelecida em 1801, atribuída ao conde de Resende, sem carácter académico e que se limitava às aulas de Desenho de Fortificações e Arquitectura Civil.
 
O brigadeiro Carlos António Napion foi nomeado para o cargo de inspector de Artilharia, Fábrica, Fundição e Arsenais abrangendo todos os serviços da Junta e a direcção do Arsenal, denominado então de Arsenal Real do Exército. O brigadeiro italiano, com vários anos de serviço ao governo português, era um erudito com formação em ciência. Mandou adquirir na Europa séries de amostras classificadas de minerais, segundo o sistema Werner. Estas colecções destinavam-se aos alunos da Academia Militar e constituíram uma das primeiras matrizes dos museus brasileiros.
 
   
 
 

Transformado em centro de um conjunto com funções específicas e de local de produção de equipamento militar, o Arsenal atendia à necessidade do Reino de disponibilidade de munições, uma vez que a Metrópole estava sem condições de suprir as tropas, desfrutando de um período de grande progresso. No entanto, por impossibilidade financeira e falta de pessoas qualificadas para exercer as funções de artífices as instalações não foram ampliadas. Obras nas edificações viriam acontecer somente a partir de 1835.

 

A Academia Militar foi instalada provisoriamente na Casa do Trem ou Real Trem, em 1811. No entanto, sem condições adequadas quanto ao número de salas, no ano seguinte, transferiu-se para o local definitivo, no Largo de São Francisco, em edificação que vinha sendo preparada desde 1739, sem conclusão. A Casa do Trem, hoje, é um importante marco histórico, uma das mais antigas edificações brasileiras preservadas no complexo do Museu Histórico Nacional guardando em suas paredes vestígios das diferentes épocas Colonial, Imperial e Republicana.

A partir de 1922, no âmbito das Comemorações do Centenário da Independência, o complexo arquitectónico passou a abrigar o Museu Histórico Nacional, criado como local de memória nacional, de construção da identidade colectiva através do universo material e simbólico de suas colecções onde se destacam os objectos relativos a D. João VI.

 

Ao celebrar os 500 Anos da chegada de Pedro Álvares Cabral ao Brasil, nada mais apropriado que levar ao público português e brasileiro esta Exposição resgatando a imagem do rei pouco conhecido de uns e mal compreendido por outros. A análise e a reflexão sobre a formação da Nação não pode menosprezar a presença portuguesa nos diferentes séculos de história comum, que tem no estabelecimento da corte portuguesa no Rio de Janeiro um dos momentos mais simbólicos.

A fala do marquês de Caravelas, no Senado, já em 1826, lembrando o período de D. João VI reflecte o sentimento que devemos recordar: "[...]nós todos que aqui estamos, temos muitas razões para nos lembrarmos da memória do Sr. D. João VI, todos lhe devemos ser gratos, pelos benefícios que nos fez: elevou o Brasil a reino, procurou por todos o seu bem, tratou-nos sempre com muito carinho e todos os brasileiros lhe são obrigados".

A selecção de objectos iconográficos, comemorativos, documentais e pessoais das colecções dos museus Histórico Nacional e Nacional de Belas Artes, teve por critério exibir o testemunho material dos temas analisados pela Professora Doutora Maria Beatriz Nizza da Silva, como: a chegada da Corte e a expansão urbana do Rio de Janeiro; as festas; a música sagrada e profana; os espectáculos teatrais; a mudança nos hábitos dos cariocas; os artistas e naturalistas europeus; a efervescência política e a partida do rei para Portugal.

É com muita satisfação que mais uma vez o Museu Histórico Nacional, do Rio de Janeiro se une à Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses para realizar no âmbito das Comemorações dos 500 Anos do Brasil a Exposição D. João VI no Brasil: Um Rei Aclamado na América.

 
 
 

Home
   
1