A Universidade de Coimbra

 
 
História da Universidade de Coimbra 
 
Fundação por D. Dinis
 
A Universidade que hoje existe em Coimbra foi fundada, ou ratificada, em 1290 pelo rei D. Dinis, começando a funcionar em Lisboa. É de 1 de Março desse ano o diploma régio que anuncia a criação desta primeira escola universitária portuguesa, que é, por outro lado, uma das mais antigas da Península Ibérica. A confirmação papal é ainda de 1290, de 9 de Agosto, sendo Sumo Pontífice Nicolau IV. Segundo essa bula, poderiam ser ensinadas todas as faculdades "lícitas", com excepção da Teologia. As primeiras a constituírem-se foram, pois, as faculdades de Artes, de Leis, de Cânones e de Medicina.

A fundação do "Estudo Geral" resulta de um condicionalismo específico do País nos finais do século XIII. As novas tarefas administrativas do Poder Político e da Igreja, bem como a acção pastoral desta, requeriam uma formação adequada, cada vez mais exigente. Essa formação não era, porém, compatível com a frequência de escolas distantes (Paris, Bolonha e outras), nem convinha que se fizesse na vizinha Salamanca, dado que Portugal lutava ainda pela definição e estabilização da sua identidade.
 
A criação da Universidade em Lisboa deu, assim, à burguesia e ao clero a possibilidade de obterem de maneira mais adequada a preparação indispensável ao desempenho das suas funções. Constituída no âmbito da consolidação política de Portugal, contribuiu, nomeadamente, para a formação do importante grupo dos "letrados", que tanta influência teve nesse processo.

 

1ª - Transferência para Coimbra

Mas a Universidade não se manteve por muito tempo em Lisboa. Em 1308 transfere-se para Coimbra, cidade já com velhas tradições escolares, pois aí funcionava desde há muito a brilhante escola do mosteiro de Santa Cruz. Vai instalar-se então no lugar designado por "estudos velhos", que ficava sensivelmente onde se encontra agora a Biblioteca Geral. 

Só então, por carta régia de 1309, a Universidade passou a gozar do estatuto de verdadeira corporação, com autonomia e privilégios especiais. Todavia, embora mantendo sempre a sua autonomia, foi perdendo alguns dos seus privilégios e, à medida que a centralização do poder ia avançando, o Estado ia interferindo nela cada vez mais.

1ª -Transferência  para Lisboa


O "Estudo Geral" não devia, porém, permanecer em Coimbra por muito tempo. Em 1338, no reinado de D. Afonso IV, transferiu-se outra vez para Lisboa. 

2ª -Transferência  para Coimbra

Mas logo em 1354 voltou de novo para Coimbra, instalando-se desta vez na parte baixa da cidade por onde o burgo se começava a estender.

 2ª - Transferência  para Lisboa

 Em 1377, no reinado de D. Fernando, muda-se mais uma vez para Lisboa, onde agora vai permanecer por mais de um século e meio. Deve andar sensivelmente por esta altura - à roda de 1380 - a autorização para a formação da Faculdade de Teologia.

 

 
Durante os largos anos em que se manteve em Lisboa, a Universidade não alterou essencialmente a sua estrutura escolar, interessando-se particularmente pela Teologia, pelo Direito Canónico e pelo Direito Civil e só muito superficialmente se sentindo nela os resultados do progresso científico, para o qual contribuíram os Descobrimentos em que Portugal teve um papel importante, e do desenvolvimento humanístico do Renascimento. 
 
Há, no entanto, que destacar a acção desempenhada pelo Infante D. Henrique (1394-1460), enquanto "protector" da Universidade, e a reforma operada em 1503, quando reinava D. Manuel, ambas no sentido de uma certa actualização do seu ensino.
 
 
3ª e última transferência para Coimbra
 
Em 1537, no reinado de D. João III, dá-se a transferência definitiva para Coimbra e para o velho Paço da Alcáçova, acompanhada da reforma dos estudos e do ingresso de novos docentes, não só portugueses como estrangeiros. Data também desta altura a fundação de uma rede de colégios, muitos deles ligados às ordens religiosas, que tinham funções de pensionato, assistência e ensino, dos quais se encontram ainda alguns vestígios arquitectónicos na "Alta" e na Rua da Sofia.
 
O mais importante destes colégios - com uma estrutura diferente de todos os outros - é o Colégio das Artes, que começou a funcionar em princípios de 1548. 
 
Em termos de orgânica pedagógica, ele significava um centro de ensino preparatório para a entrada nas faculdades, com funcionamento independente da Universidade, embora a ela acabasse por se ligar, e significava também que Portugal se colocava ao lado de outros países da Europa no campo do ensino das humanidades, pois o Colégio das Artes, delineado segundo os princípios do Humanismo Cristão, adquiriu algum relevo. 
 
André de Gouveia, que orientou colégios em Paris e Bordéus e que Montaigne haveria de elogiar, foi quem primeiro o dirigiu e nele leccionaram então mestres ilustres.Mas foi efémero o sentido renovador que a Universidade e o Colégio das Artes chegaram a alcançar. 
 
A Contra-Reforma, sentida em Portugal com particular ressonância, acabou por determinar uma viragem em direcção à defesa dos valores considerados "ortodoxos", atacando assim as tentativas de inovação.
 
 Desta forma, após ainda um momento brilhante no âmbito dos estudos teológico-filosóficos de sentido tomista, assinalado pela formação de um escol conhecido pelo nome de "conimbricenses" e, depois, durante o domínio filipino, pelo magistério de alguns espanhóis famosos, entre os quais se destaca o nome de Francisco Suárez, que aqui publicou alguns dos seus escritos mais notáveis, a Universidade de Coimbra, esgotadas as potencialidades escolásticas, vai entrar numa longa crise cultural.
 

 

A Reforma de Pombal

Só no século XVIII, no reinado de D. José, é que se dá nova reforma profunda da Universidade. Certos sectores mais cultos da burguesia, que ia adquirindo consciência da sua importância, do clero e da aristocracia mais evoluída, iam contactando com os novos métodos e as novas matérias científicas. 

E esse conhecimento era mais vivo nos "estrangeirados", portugueses que, por virtude das suas viagens, contactaram directamente com a cultura de outros países da Europa. 

Eles não podiam deixar de sentir o atraso do nosso ensino universitário, como se pode provar através das reflexões e críticas de Luís António Verney ou António Ribeiro Sanches.

 

 
Mas, se no tempo de D. João V (1707-1750) - em cujo reinado se deu a fundação da notável Biblioteca da Universidade - já se sentia a necessidade de reformas, também é verdade que elas só poderiam ser feitas por uma elite de poder, representante dos estratos sociais culturalmente mais evoluídos, que se impusesse à reacção conservadora e que fosse capaz de controlar uma instituição com a força da Universidade. Essa situação surgiu, pois, no tempo de D. José - corporiza-a o ministério do Marquês de Pombal.
 
A reforma do ensino começou pelos "estudos menores" para os quais foi criado um corpo de "professores régios", em substituição dos mestres predominantemente eclesiásticos e em muitos casos jesuítas (expulsos do País em 1759). Mais tarde passou-se à reforma do "Estudo Geral" de Coimbra. 
 
Os novos estatutos, corroborados pelo rei em 28 de Agosto de 1772 e elaborados com base no parecer da Junta de Providência Literária, que havia sido nomeada para estudar a situação da Universidade e propor soluções de reforma, foram entregues solenemente em Coimbra pelo próprio Marquês em 29 de Setembro. Mas só as vontades inabaláveis de Pombal, nomeado "Visitador" da Universidade, e do Reitor-Reformador,
D. Francisco de Lemos, puderam superar as dificuldades que surgiram e, assim, pôr em prática, e não totalmente, esses Estatutos.

A reforma pombalina manifestava sobretudo interesse pelas ciências da natureza e pelas ciências de rigor, que tão afastadas se encontravam do ensino universitário, embora incidisse também sobre as faculdades jurídicas e de Teologia. Assim, salientou-se a reforma da Faculdade de Medicina, que procurou seguir as sugestões feitas por Ribeiro Sanches sobre a necessidade de uma investigação experimental, e a criação de duas novas faculdades, a de Matemática e a de Filosofia. Esta última concedia um lugar particular (que depois se tornou exclusivo) à Filosofia Natural.
 
Com o reinado de D. Maria I não se destruiu a reforma de 1772, mas houve, ao princípio, pelo menos uma certa reacção contra os seus mentores. Além disso, não se tomaram medidas eficazes de molde a provocar a revivificação do espírito da reforma do Marquês, adaptando-a ao renovado condicionalismo cultural.

No entanto, a Rainha e D. João VI, que lhe sucedeu como regente e depois como rei, procediam à criação, em Lisboa e no Porto, de novas escolas "médio-superiores" à margem da Universidade, na continuação de uma política de ensino já iniciada com o Marquês de Pombal e que será, de resto, continuada com o liberalismo, ao mesmo tempo que a única instituição universitária existente no País, apesar de não se renovar estruturalmente, ia ganhando força. 
 
Inclusivamente coube-lhe, a partir de 1794, através da Directoria Geral dos Estudos e Escolas do Reino, então criada, a incumbência de fiscalizar a instrução pública. Esse reforço de poder veio mesmo a dificultar a introdução de novas reformas que se lhe procuraram inocular, após o advento do liberalismo, a partir dos órgãos centrais do Estado.

Assim, pode dizer-se que a Universidade, onde obviamente se fizeram sentir os conflitos que atravessaram o País, manteve durante o período liberal a sua estrutura pombalina e quaisquer projectos de reforma profunda não passaram por isso da intenção. Das poucas alterações institucionais que sofreu destaque-se, todavia, pelo seu significado, a fusão das Faculdades de Leis e de Cânones na Faculdade de Direito, levada a efeito, em 1837, pelo governo setembrista de Passos Manuel. 
 
Porém, se institucionalmente a Universidade não sofreu modificações essenciais - o Estado preferiu, como se disse, criar à sua margem novas escolas, apontadas para outras concepções pedagógicas, técnicas e científicas (Escolas Politécnicas, Escolas Médico-Cirúrgicas, Curso Superior de Letras, etc.) - também é certo que foi teatro das grandes polémicas político-culturais do tempo.

No decorrer dos últimos anos do século XIX e dos primeiros do século XX, ia crescendo a consciência dos ideais republicanos e da necessidade de reestruturar a Universidade e o ensino em geral. Para tal apontavam mesmo alguns mestres, fazendo críticas ao ensino vigente e acentuando a necessidade da sua reforma segundo novos métodos. 
 
A República e a Reestruturação do Ensino
 
Foi isso que se procurou levar a efeito após a proclamação da República em Outubro de 1910 e, assim, legislação diversa foi surgindo com o objectivo de reestruturar o ensino. 
 
Nesta situação a Universidade de Coimbra, com a criação das Universidades de Lisboa e do Porto, deixou de ser a única do País, e certos privilégios tão contestados que de certa forma sobreviviam, como o foro académico, foram abolidos. Quanto à sua estrutura escolar, para além das já existentes Faculdades de Direito e Medicina, e da anexa Escola de Farmácia, foi criada a Faculdade de Letras que herdou as instalações da extinta Faculdade de Teologia, ao passo que as Faculdades de Filosofia e de Matemática eram convertidas na Faculdade de Ciências, sendo ainda instituída a Escola Normal Superior, anexa às Faculdades de Letras e de Ciências, que procurava dar aos futuros professores uma formação pedagógico-didáctica.
 
A Universidade e o Estado Novo
 
À medida que a República se ia desmoronando, iam morrendo os sonhos de revolução cultural e em breve o regime democrático fundado em 1910 dava lugar à Ditadura, que surgiu após o movimento de 28 de Maio de 1926, e depois ao "Estado Novo". No Governo de Salazar, que fora catedrático em Coimbra, procurou-se criar condições para transformar, até certo ponto, a Universidade num aparelho do regime. Mas não era fácil que tal se verificasse, devido às dificuldades criadas por uma instituição ciosa da sua autonomia. 
 
Por outro lado, foram surgindo nos meios académicos, designadamente estudantis, focos antigovernamentais. A Associação Académica de Coimbra, antiga instituição escolar fundada em 1887 e que possuía uma orgânica democrática, foi um dos principais meios de difusão de tais ideias, e daí a repressão que sofreu. Os movimentos académicos de 1962 e 1969 - este já durante o governo de Marcello Caetano - são símbolos da luta dos estudantes contra o regime.

Outro aspecto que interessa destacar durante o governo salazarista é a alteração arquitectónica da cidade universitária, que terá sido, ao nível das obras públicas, uma das suas medidas mais discutíveis. Foi destruída grande parte da "alta" coimbrã com as suas antigas ruas e edifícios de valor histórico e artístico, entre os quais se destacavam vários colégios universitários, para aí se traçarem novas artérias e se erguerem novos prédios de gosto duvidoso e alguns até sem funcionalidade. 
 
Surgiram, desta forma, as actuais instalações da Faculdade de Letras, da Biblioteca Geral e Arquivo, da Faculdade de Medicina e da Faculdade de Ciências.

 
Depois do 25 de Abril
 
Com o 25 de Abril de 1974 inicia-se um novo período da vida portuguesa e, portanto, também da Universidade, que tem sido alvo de várias reformas que acompanharam as fases da nova dinâmica política e pedagógico-cultural e as contradições do processo histórico português dos últimos anos.
Hoje, a Universidade de Coimbra, com as suas oito Faculdades (Letras, Direito, Medicina, Ciências e Tecnologia, Farmácia, Economia, Psicologia e Ciências da Educação, Ciências do Desporto e Educação Física), e os seus cerca de 21.000 alunos, goza do regime de autonomia consagrado na Lei n.º 108/88, de 24 de Setembro, e possui uma estrutura democrática, reforçada com a promulgação, em 28 de Agosto de 1989, dos seus Estatutos, aprovados em Assembleia constituída por representantes de todos os corpos da comunidade universitária.

Nestes Estatutos definem-se, designadamente, a missão, natureza e fins da Universidade, os princípios orientadores da sua autonomia, as suas funções primordiais, a sua estrutura orgânica e os seus órgãos de governo. Com a eleição do Reitor, da Assembleia e do Senado e com a consagração da autonomia das suas Faculdades, a Universidade de Coimbra possui já uma estrutura bem diferente da tradicional instituição de ensino, embora se mantenham ainda vivas algumas das suas tradições académicas.
 
 
 
( Condensado da Informação na Net da História da Universidade de Coimbra - Nota Histórica do Prof. Doutor Luís Reis Torgal )

 
 
 
 
 
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