O Adeus à Esquerda

 Condensado de artigo de Fernando Madrinha

Veja este site também em http://es.geocities.com/atoleiros

 
O adeus à esquerda

Não há lembrança na história da Europa, de umas eleições presidenciais como as francesas, em que os dois candidatos mais votados são ambos da direita: um da direita «civilizada», outro da direita «descarada».

 
Perante isto, várias vozes da esquerda vociferaram, chamando a atenção para os perigos que aí vêm. É despropositado fazê-lo. Pôr em causa os resultados das eleições é pôr em causa a democracia.
 
Também não adianta insultar Le Pen.
 
Le Pen candidatou-se, fez bem o seu trabalho, recolheu os votos necessários para bater o principal candidato da esquerda – e passou à segunda volta.
 
Que mal há nisto?
 
O que a esquerda devia já estar a fazer, em vez de olhar para os outros, era olhar melhor para si própria.
As ideias de esquerda estão gastas, perderam o fulgor e a sedução.
 
A problemática da esquerda tem hoje mais que ver com o século XIX do que com o século XXI.
 
A esquerda ignorou, por um lado, os valores tradicionais e, por outro, não conseguiu dar respostas eficazes aos problemas.
 
Mostrou-se tolerante com a droga e o aborto, permissiva em relação às ameaças à autoridade do Estado, pouco exigente em matéria de educação, proteccionista em excesso, acomplexada no que respeita à emigração.
 
O que as eleições francesas quiseram dizer é que a França deseja políticos com menos preconceitos ideológicos – e mais directos na resolução de problemas que estão à vista de todos (e só por laxismo ou ideologia não são resolvidos).
 
Há trinta anos dizia-se que o futuro pertencia à esquerda.
 
Em trinta anos a esquerda envelheceu trezentos – e já há quem diga que são da direita os dias de amanhã.
 
22 Abril 2002
 
( Condensado de artigo de opinião de José António Saraiva )
 
Comentário - É díficl explicar melhor e de forma mais consisa o apagar das ideologias da  esquerda neste começos do século XXI. A França de hoje, e no geral quási toda a Europa,  já não têm realmente nada que ver com os problemas laborais da época Victoriana, onde era regra a exploração legal dos trabalhadores. 
 
Hoje em Paris, um operário especializado a desarmar aviôes em fim de vida para serem reciclados, ganha 52 euros por hora ( Veja-se Science et Vie - Abril ). 
 
O que as pessoas desejam é governos que saibem criar postos de trabalho como estes e não de demagogias bafientas. Já estão fartas de desordens de rua, carros e lojas incendiadas e pedradas à polícia !
 

Os franceses estão loucos?

 
A passagem à segunda volta das eleições presidenciais francesas de Jacques Chirac e Jean-Marie Le Pen é sinal de um mal-estar que vai minando toda a Europa - e da falta de resposta dos partidos de esquerda a essa «malaise de vivre».
 
A Europa está gorda e velha - embora ainda rica. Continua a ser uma ilha de prosperidade que atrai os povos mais pobres à sua volta. E por isso os países de Leste e a Turquia querem aderir à União Europeia – e mesmo no Norte de África há quem avance com tal proposta.
 
Mas, ao mesmo tempo, a Europa envelhece, aburguesa-se, torna-se mais e mais conservadora – e desconfia de povos com outros hábitos, raças e religiões. Necessita deles porque a sua taxa de natalidade já não consegue repor o «stock» de capital humano – mas as diferenças metem-lhe medo. E por isso os partidos xenófobos ganham mais e mais eleitores.
 
A esquerda, por seu turno, adopta mais e mais valores da direita para tentar responder ao crescente envelhecimento dos eleitores. Mas, manifestamente, este não é o seu terreno. E algumas causas que poderiam ser abraçadas pela esquerda, ligadas por exemplo ao urbanismo, ao tráfego, ao aproveitamento dos idosos para tarefas que os façam sentir socialmente úteis, ao ambiente, à melhor utilização da água e da energia, ou estão à guarda de pequenos partidos ou pura e simplesmente não constam da cartilha dos partidos socialistas e sociais-democratas europeus – ou, por vezes, encontram mesmo resposta em partidos de direita.
 
Assim, a esquerda europeia defende o mercado – mas desconfia dele. Privatiza as empresas – mas condiciona-as a entidades reguladoras. Faz empreendimentos conjuntos com os privados – mas o risco fica todo do lado do Estado. Tenta comprar a paz social o tempo todo – e, por isso, cede a inúmeros interesses particulares. 

Defende o Pacto de Estabilidade e Crescimento – mas critica a redução dos défices orçamentais para zero por cento em 2004. Está a favor do controlo da despesa pública – mas distribui os dinheiros do Estado como se eles caíssem do céu.

 
Uma Europa rica, gorda, velha e aburguesada não precisa destes partidos socialistas e sociais-democratas. Prefere a direita conservadora, nacionalista e mesmo xenófoba. E ou a esquerda percebe esta evolução conservadora do eleitorado ou vai ter muita dificuldade em constituir uma opção séria e credível para governar na Velha Europa nos próximos anos.
 
Os franceses, ao escolherem Chirac e Le Pen para passarem à segunda volta das presidenciais, parecem estar loucos. Mas não. Elas apenas expressaram nas urnas as grandes tendências que atravessam o Velho Continente.
 
 
 
 
 
O caso português
 
Enquanto a França tenta recuperar do choque, a Europa rica e democrática avalia a força eleitoral dos seus Le Pen e verifica que eles existem um pouco por todo o lado, condicionando já os Governos de países como a Itália, a Áustria, a Dinamarca, e ganhando expressão crescente, a nível local ou regional, na Alemanha e na Holanda.
 
Para a segunda volta das presidenciais, a direita francesa esboça uma reunificação a pensar já nas próximas eleições legislativas, e a esquerda conforma-se com a inevitabilidade de apoiar um adversário para vencer um inimigo. Depois de contados os votos, o mais provável é que Le Pen perca por muitos - mesmo que ainda cresça significativamente em relação à primeira volta, o que é bastante provável.

Mas, sejam quais forem esses resultados, já teve a sua vitória. E a questão que se coloca é a de saber até que ponto ela influenciará ou não toda a extrema-direita europeia, dando um novo impulso aos partidos próximos da Frente Nacional e animando outros que não passam, por enquanto, de grupos de amigos sem audiência que os legitime como entidades políticas, nem organização que lhes permita concorrer a eleições.

 
No caso de Portugal, esses núcleos existem e mantêm alguma actividade subterrânea. Mas a «blindagem» constitucional relativa aos movimentos de natureza fascista ou aparentados, conjugada com a memória ainda recente da ditadura - passaram quase 30 anos, mas a geração que lidera os partidos do sistema ainda é, com excepção de Paulo Portas, aquela que combateu o Estado Novo - dificulta a sua organização.
 
Toda a gente sabe, no entanto, que a política tem horror ao vazio. Desde que exista «mercado», mais tarde ou mais cedo aparecerá quem pretenda conquistá-lo. E basta atentar no retrato-robot do eleitor de Le Pen feito pelo «Libération» - homem com mais de 50 anos, com salário baixo e pouca educação, ou jovens que só agora começaram a votar - para verificarmos que também em Portugal esse «mercado» eleitoral é abundante.

Se atentarmos nas bandeiras que o mobilizaram em França para o voto extremista e xenófobo - a imigração e a insegurança, a par de um nacionalismo exacerbado que se opõe à União Europeia - não custa perceber que existem também as condições objectivas para o aparecimento de um Le Pen à portuguesa.

Basta que os partidos do sistema, no poder e na oposição, continuem a enfiar a cabeça na areia, ignorando ostensivamente, por complexo ideológico ou por falta de coragem, o problema da imigração e da insegurança que, em muitos casos, lhe está associada.

 
A participação do CDS-PP no Governo - Portas foi o líder partidário que mais explicitamente assumiu a sua preocupação quanto a esses temas delicados - pode contribuir para que o poder estabelecido e a oposição mais responsável despertem e assumam o combate às causas de que se alimentam os Le Pen.

O pior cego é, como toda a gente sabe, aquele que não quer ver. E tem sido esta a atitude, não só da maioria dos políticos portugueses, como de uma certa opinião bem pensante que se tem ocupado a desvalorizar os problemas da insegurança e a recusar-se a ver que a imigração descontrolada pode tornar-se uma autêntica bomba-relógio.

 
Fingir que esses problemas não existem em Portugal é o caminho mais curto para o desastre. E para defender a liberdade e a tolerância não há como atacar, em devido tempo, os problemas que as podem pôr em causa.
 
 Condensado de artigo de Fernando Madrinha
 

 
 
 
1