F O L H A S . Um velho senta num banco da pra�a, estende os bra�os no respaldo, estica as pernas, relaxa, v� folhas amareladas ca�das debaixo de arvores...ser�o recolhidas, incineradas? lixo, como eu, varridas da vida...acabara de assistir a um enterro, o terceiro este ano, o passado indo para debaixo da terra...a exist�ncia um mosaico, quebra - cabe�a, peda�os as vezes encaixados com cuidado, a maioria por acaso, agora alguns vazios, buracos, cada morte arrasta pe�as...figuras remotas, quase ausentes em sua mente, pai... quase esquecido, m�e...sem lembran�a, filhos...rela��o convencional, netos...nem isso, ainda esperava que o mundo viesse a ele, mais cedo ou mais tarde algu�m apareceria, um amigo, uma ex - namorada...mem�ria..."o homem de boa mem�ria n�o se lembra de nada"...Becket sobre Proust...o velho odiava ter lido tanto...cultura in�til? n�o, apenas mem�ria volunt�ria, involunt�ria? ressurrei��o do passado...tem motivo por ele estar nessa pra�a, algo anseia dentro dele...saborear o caos da incerteza? louco? queria s� - lo, mas a loucura n�o pode ser fingida...especula��o tediosa...estou vagando pelos c�rculos do inferno...uso �culos, nunca sei onde est�o, me olho no espelho e n�o me reconhe�o...crian�as correm, tenta imagin� - las adultas, muda de posi��o no banco, velhos nas mesinhas, jogam damas...como eram quando crian�as?...minha vida n�o transcorre mais no presente...pancadas, pe�as batem nos tabuleiros, ritmadas, sinfonia de Mendelsohn...allegro, andante, moderato...Bart�k... dissonante, agudo...fecha os olhos...plac, plac, plac, placplac, plaac, plaaac, plaplaplac, laplaplacpla...risada, jovem, abre os olhos, uma mulher, pulos de alegria, tapas nas costas do parceiro, fixa a vis�o nela, encontro de olhares, sorrisos, promessas?...ser�? n�o, com certeza n�o, engano do desejo...t�nue movimento entre as pernas...esquecido?...impercept�vel calor desce aos p�s...ressuscitado?...movimenta a cabe�a em dire��o oposta, n�o resiste, olha de novo...como ser� quando velha? queixo duplo, olheiras, rugas em torno dos l�bios, bu�o, obesa, esquel�tica?...mais risadas, ela se despede dos parceiros, um aceno...sou eu?... se levanta, no sinal luminoso encosta...� acompanho?...� sim !...atravessam, alguns passos, entram no hotel ( s� para cavalheiros ), o atendente levanta a cabe�a, ela sinaliza, sobem, a mulher destranca a porta...

...maravilha, por que me parece t�o absurdo desejar tanto essa mulher, p�r em pr�tica toda minha experi�ncia?...sinto que me destruir�, no entanto quando olho para ela me lembro de todas, faz tanto tempo...o velho se aproxima, ela o abra�a, ele quer falar, a voz mal consegue produzir som, ela coloca um dedo sobre seus l�bios, ajuda se despir, ele olha fascinado as curvas do corpo � sua frente, envergonha - se do seu, se deitam, ele rememora movimentos, recantos escondidos da anatomia feminina, fica atento � respira��o dela, aos gemidos inaud�veis , �s contra��es, aos tremores, se esmera, procura os olhos dela, esgazeados, a m�o dela conduz, calor �mido, l�bios grudados, prazer quase sem fim...a cabe�a do velho lateja, a vista escurece, fecha os olhos, suspiro...

Ela o empurra com cuidado, carinho? se veste com calma, cada fio de cabelo no lugar certo, batom, alisa o vestido, olha no espelho, sorri...coloca a m�o no bolso da cal�a do homem, retira uma carteira, contas as notas, trinta reais, examina a identidade, move os l�bios sem emitir som, coloca tudo em cima da mesinha, abre a bolsa, retira um caderninho, uma caneta, escreve uma data, um nome, folheia, outras datas, nomes, n�meros...� doze!...sorri de novo, guarda tudo, sai...

...coloca as notas em cima do balc�o, o atendente levanta a cabe�a...� chamo o rabec�o?...ela mostra o polegar para cima...

Hosted by www.Geocities.ws

1