A Historia das Locomotivas English Electric da EFSJ no Brasil

Foto da English Electric nrº 1015 - Coleção Alberto del Bianco

A eletrificação da SPRy

Antes de se falar na história das locomotivas "English Electric' s" no Brasil, é importante fazer um resumo do contexto onde essas locomotivas atuaram em nossas ferrovias, destacando que, apesar de mais de uma ferrovia nacional haver contado com os serviços de locomotivas fornecidas pela Cia. Inglesa English Electric, ao se mencionar essas máquinas imediatamente pensamos nas "pimentinhas" da Estrada de Ferro Santos a Jundiaí.

Corria a década de 40 e os racionamentos diversos provocados pela querra na Europa levaram nossas estradas de ferro a procurarem sucedâneos para o carvão como principal combustível utilizado pelas locomotivas a vapor, pois acreditava-se que se a guerra se prolongasse por muitos anos ainda, certamente além do carvão importado da Inglaterra --extremamente racionado na época--, poderia haver falta de madeira (natural ou de reflorestamentos) para acionar as máquinas da ferrovia, com evidentes prejuízos ao Estado de São Paulo, pois as linhas da São Paulo Railway, que administrava a ligação ferroviária entre Santos e Jundiaí, representavam uma artéria importantíssima para a economia de São Paulo, por significar a ligação do interior do estado com o Porto de Santos e região

Datam dessa época (1944) os primeiros estudos para a eletrificação de suas linhas, pois, embora o óleo já fosse uma opção para o funcionamento das locomotivas a vapor e algumas locomotivas diesel-elétricas movidas com esse combustível rodassem na estrada desde 1947 (as Alco RS-1 e RSC-1 principalmente), eram em pouca quantidade para a demanda exigida pelas operações da estrada e havia muita dificuldade para a importação de novas máquinas desse tipo, além do fato de que o fornecimento de óleo também estava racionado.

Esses fatores mais o fato de que o uso da eletricidade enquanto "combustível limpo" estava muito em moda na época no mundo e o Brasil ---São Paulo principalmente--- possuía vasto potencial para o fornecimento dessa energia devido aos seus recursos hídricos, levaram a empresa a decidir-se pela eletrificação de suas linhas, onde pouco antes da sua encampação a SPR assinou contrato (12.09.1946) com a English Electric Export e Trading Co, da Inglaterra para o fornecimento de "know-how" e materiais para essa eletrificação. Claro está que uma das principais razões para que esse contrato tenha sido firmado com a Inglaterra deve-se ao fato da SPR ser uma empresa construída pelos ingleses e operada por esses durante muitos anos.

Com a chegada da Inglaterra dos primeiros lotes de material o governo do estado, que já havia encampado a ferrovia, instou junto a Cia Paulista de Estradas de Ferro para que esta, que já operava linhas eletrificadas desde o início da década de 20 e possuía portanto forte "know-how" no assunto, colaborasse com a EFSJ para que a eletrificação desta formasse uma estrutura harmônica que levaria o Porto de Santos diretamente ao coração do estado, através da interligação das linhas da EFSJ com as linhas da Paulista.

Essa colaboração foi concretizada através da cessão, pela CP, do Eng. Pedro Carvalho para chefiar a Comissão de Eletrificação na EFSJ, sendo norma, após o término dos serviços de eletrificação (1952), a formação de composições da CP tracionadas por máquinas da EFSJ e vice-versa, com grande economia de tempo e recursos nas operações. Assim como era bastante comum ver-se o imponente "trem azul" da CP sair da estação da luz tracionado por uma English Electric, também era normal ver-se locomotivas V-8 junto as estações da Santos a Jundiaí, como Paranapiacaba, ou mesmo locos da EFSJ tracionando composições inteiras da Cia Paulista na direção do Porto de Santos.

Foi assim que, como parte do processo de eletrificação da estrada foram compradas, também junto à cia. Inglesa, 15 locomotivas elétricas do tipo bifrontal (última moda na época), de rodagem CC, com 3.000 HP de potência e pesando cerca de 127 toneladas cada uma (peso aderente). Algum tempo mais tarde, após o recebimento de um grande lote de peças os ferroviários da estrada utilizaram-se de equipamentos e conjuntos motores sobressalentes para montar uma 16a. máquina, havendo sido importada apenas uma nova "carcaça".

As English Electric's foram construídas de 1949 a 1955, sendo de bitola 1,60 m. Segundo as informações coletadas, originalmente as máquinas foram entregues com rodas raiadas (tipicamente inglesas), além de topes (batedores ou amortecedores) e sistema de engates por gancho e correntes, sendo a iluminação proporcionada por um único farol frontal situado no "nariz" da máquina.

Modificações ocorridas no protótipo

Aos poucos, com as freqüentes modernizações no material rodante, algumas características dessas máquinas foram sendo alteradas. As rodas raiadas foram substituídas por rodeiros-padrão utilizados nas demais máquinas da RFFSA e o sistema de engates foi alterado para o engate automático americano, hoje padrão em todas as ferrovias e que é reproduzido com fidelidade pelo nosso conhecido engate "Kadee" . O farol único foi também substituído por dois faróis "sealed bean" .


Foto cedida por Paulo Cesar Bonaldo - autoria desconhecida

Externamente seu aspecto não mudou muito, porém a buzina de uma corneta que originalmente ficava acima da cabina, entre os dois pára-brisas, foi deslocada para logo acima do "nariz" , aproveitando-se o espaço criado com a substituição do modelo do farol.

Outras modificações menos significativas porém importantes para quem desejar modelar uma máquina dessas em HO, foi a alteração na posição do apoio (para o pessoal de manobra/desengates), existente na parte inferior do "nariz" da máquina , sendo colocado um "degrau" um pouco acima da posição original e a troca do modelo das janelas laterais, com a inclusão de uma "Veneziana" de metal para protegê-las, uma vez que infelizmente é muito comum, assim como em outras ferrovias do Brasil, que pessoas na beira da linha atirem pedras e outros objetos nas máquinas quando estas passam, sendo as mesmas alvo, às vezes, até de tiros.


Foto da coleção de Cid José Beraldo

Esquemas de pintura.

Originalmente as máquinas foram fornecidas pela fábrica na pintura MARROM-CAFÉ (ou marrom-avermelhado), com uma faixa estreita ou friso prateado, que percorria todo o corpo da máquina de forma singela (faixa única) e terminava em "V" no nariz. Essa pintura não apresentava o logotipo da ferrovia.

Esse padrão, característico dos anos 50, foi substituído na década de 60 por aquele que até hoje é considerada pelos saudosistas como um dos mais belos padrões de pintura da ferrovia, que era a cor vermelho escuro para o corpo, com uma faixa grossa (singela ainda) amarela percorrendo o corpo da máquina, também com acabamento em "V" no nariz. Essa faixa grossa era delimitada em ambas as laterais por um friso preto. Nos pára-choques frontais e rebaixo lateral (entre os truques) também haviam listras em formato diagonal, sendo //////////\\\\\\\\\\ para os pará-choques e \\\\\\\\\\\///////////// nas laterais. O logotipo EFSJ, em formato de "balão" ficava bem no centro do corpo longo.

Esses padrões de pintura " vermelho forte" e o próprio perfil aerodinâmico das English Electric's foram motivo para que em pouco tempo essas magníficas máquinas ganhassem o apelido de "pimentinha", que permanece até hoje, apesar de não fazer mais muito sentido devido as mudanças nas suas pinturas.

A partir da Formação da RFFSA, esta procurou adotar um padrão único para todas as máquinas da nova estatal, sendo escolhido como referência um modelo baseado no padrão então existente na EFSJ, até mesmo porque o primeiro presidente da RFFSA veio a ser o Sr. Eng. Renato de Azevedo Feio, o qual, de 1948 a 1957 esteve a frente da administração da EFSJ, tendo conduzido com sucesso todo o seu programa de eletrificação e modernização de frota de máquinas e material rodante.

Dessa forma, durante um longo período (década de 70 até 1994), o padrão da pintura das máquinas permaneceu praticamente o mesmo, constituindo-se de pintura vermelho-RFFSA com faixa amarela singela ao redor do corpo e dupla na terminação em "V" no nariz, sendo a faixa interrompida no centro do corpo lateral para a colocação do logotipo da RFFSA, sendo registradas pequenas alterações na disposição e dizeres destes ao longo desse período (vide esquemas).

Em 1994, pouco antes do início dos processos de privatização que retirariam do controle do governo a gestão da RFFSA a RFFSA mudou mais uma vez seu padrão de pintura e desta vez para um padrão totalmente diferente dos anteriores, sendo o mesmo nas cores amarelo e cinza. Segundo informações documentadas na época, o padrão escolhido nem foi o vencedor do concurso organizado pela RFFSA para definir o novo padrão de pintura das máquinas, porém foi o escolhido.


Foto de João P. M. Camargo no Informativo Centro Oeste

Foi uma alteração mais "cosmética", não havendo investimentos significativos na recuperação de máquinas e logo em seguida o processo de privatização transferiu para as mãos da MRS LOGÍSTICA a gestão desse trecho da malha ferroviária.

Temos registros de que pelo menos uma das English Electric's foi pintada nas novas cores da RFFSA (vide foto), tendo recebido o nome de Jundiaí em homenagem ao 128o aniversário da chegada dos trilhos ferroviários a essa cidade. Hoje, conforme as últimas informações disponíveis e reportado no volume 12 da revista Trens e Modelismo, as English Electric's estariam todas desativadas ou em processo de desativação e sucateamento por parte da MRS LOGÍSTICA, após mais de 40 anos de serviços inestimáveis a SPRy/EFSJ/RFFSA, o que infelizmente pode ser confirmado pelas fotos abaixo:

Fotos distribuidas na EFBrasil por Antônio Gorni, a pedido do autor

Entretanto, como nesse País tudo é possível na busca do lucro imediato, como comprovado recentemente pela importação, de locomotivas usadas da Africa (Namíbia), em detrimento à utilização da Indústria Nacional --perfeitamente apta a produzir locomotivcas de excelente qualidade--, pode ser que a Operadora acabe por canibalizar algumas das English Electric's (prática comum no Brasil) para obter algumas máquinas em plenas condições de uso (além de um bom estoque de peças sobressalentes) e que com certeza darão conta de qualquer recado, como sempre o fizeram ao longo desses 40 anos de serviços ininterruptos. Caso isso não ocorra, esperamos que pelo menos a ABPF consiga uma ou duas dessas máquinas para fins de preservação.


Voltar

 

 

Hosted by www.Geocities.ws

1