Esperança 

Da distante Cuba, os ecos do “socialismo ou morte” nos chegam cada vez mais fracos. Me inspira uma verdade mortífera o fato desta grande ilha ter cuspido em seu minúsculo vizinho e chacoteado seu pequeno coleguinha. Enquanto os direitos humanos, tão desumanos quanto os falcões da casa branca, acertou-lhe duas ou três sentenças, culpando-lhe por mais de trinta violações, uma violência construída na base de crenças e lutas ecoou pelo mundo. A publicidade histórica teve de usar seus artifícios e fizeram homens comuns levar esperança para homens menos comuns. Nem todos são iguais. E felizmente a diferença ainda pode construir uma humanidade. A ininterrupta revolução cubana não nos conclama a participar de uma liberdade autêntica, também não nos negaceia com flores do primeiro mundo. Suas glórias, longe de ser esse “socialismo e morte” – que soa um tanto quanto um sacrifício desesperador –, são uma extravagante luta que soa como sinais de esperança. É como um vulto à meia-noite que nos trás a certeza de não estarmos sozinhos para dormir. É a fé na semente de São José e no milho de São João. Um produto que nenhuma mercadoria pode possuir. Por ser autentico de mais para essa sociedade atual, real de menos para esse racionalismo científico, e humano o suficiente para criar sonhos. O eco ainda chega a nós, não como um país socialista, mas como pessoas dispostas à mudança. Em uma dessas ondas sonoras, é nítida a sensação do poeta que chorou por Che. Deixemos de coisa e não julguemos o personalismo do herói, mas a autenticidade das lagrimas do poeta. Bem aventurados os que choram, pois neles há a percepção da dor. Bem aventurados os que riem, pois neles ainda há graça. Não nos dizem de guerrilhas ou de Marx, mas de luta e esperança.

 

Tão longe e distante, nos aparece uma certeza. É a tentativa ridícula de por humanidade no capital. Se não fosse a existência de seres humanos em meio a tal idéia, ela mereceria a repudia e o escarro de todos. Nessa mirabolante manobra de espelhos (pura ilusão de ótica) em que burgueses tentam dar ao capital a mesma característica da mercadoria, roubar a humanidade dos humanos, a única certeza válida é que o capital não é humano. Não sei se felizmente ou infelizmente, mas o fato é que como a energia, a humanidade (o sentir do humano) não se dissipa. Quando as mercadorias ganham vida humana é porque nós a perdemos. Essa energia sai de um corpo para o outro. Não há feitiço xamanistico capaz de realizar tal proeza. O capital, como conjunto das mercadorias, suas relações, espetáculo e abstrações, consegue superar o objeto mercadoria. É um cardume de mais-valia que nada como um só peixe se desviando do humano. Para tal coisa ser humana, deve deixar de existir humanos. A representação de nossos valores em meio ao capitalismo, como entendiam os defensores do Estado do bem estar social, só pode representar que toda nossa energia humana foi transferida de nossos corpos (ou alma) para a coisa chamada capital. Prefiro rezar e ter a certeza que o diagnóstico do socialismo democrata estava certo, o capital não é humano, mas o seu medicamento estava errado, dar humanidade ao capital.

 

Distante destes, os gritos juvenis em São Paulo, que diziam de ALCA e FMI, caem como notas em uma melodia infindável, até que não exista mais ALCA e FMI. Não se trata de membros do PSTU, é óbvio, de longe eles jamais possuiriam tal lírica, não pelos seus trajes, mas por suas consciências. Esses jovens conseguiram expulsar o capital de São Paulo, não do santo, nem da cidade, mas de São Paulo, de Santa Tereza, de São Ângelo, de São Xico, e todos os santos proletários moradores da metrópole que se envolveram em tal campanha. Santos não por suas crenças, mas pelo milagre de vossa sobrevivência. A realidade que choca, leva um bom choque e até a polícia de choque aprende com eles. Não olhemos vossas bandeiras, não precisamos, eles tem almas e nós conseguimos ver. A grande sensação do dia foi, certamente, ver a diferença do desalmado jornalista os chamando de baderneiros, e a iluminação dos baderneiros se chamando revolucionários. Nenhum trunfo no capital pode trazer tamanha beleza para nossa mesa. Cada foto, cada cena, não mostrava imagens, mas esperança e mudança. Dizem que alguns prédios desabaram, outros ficaram de pé só por orgulho. Em cada tiro da polícia existia uma resistência superiormente emocionante. O estrago, pelo menos para cada um que participou, foi mais que a quebra da bolsa, pois naquelas bolsas só tinha cartazes, primeiros-socorros, água e mascaras. Certamente eles não morrerão, serão plantados, e nascerão outros deles.

 

E como restos de sementes, ainda resiste o ideal de nazismo. Não o chamemos de câncer ou de aids como fazem os democratas capitalistas de hoje. Chamemo-lo de sacrifício e masoquismo. É evidente que o mundo foi pequeno demais para o excesso de padres da morte (Hitler e Stalin na mesma época foi castigo dos céus). As brincadeiras de crianças que geraram mortes e martírios criaram ainda mais mortes e martírios com os herdeiros da vitória. A aberração humana do nazismo sobreviveu como resistência a estes falsos ideais de democracia. A certeza, triste e única, que nos guia é que estes nazistas de hoje tem a ciência que essa falsidade é um saco, mas vossas posições cômodas na estrutura social dão-lhes como oportunidades de diversão, mais martírios e mais sacrifícios, não deles é óbvio. O que faz tantos odiarem estes indivíduos não são os seis milhões de judeus mortos, ou a destruição européia, quem dirá o preconceito instruído desses – haja visto que preconceitos iguais e piores refletem o cotidiano de nossa democracia –, mas a forma aberta e clara que esses indivíduos mostram suas idéias e práticas. Tenebrosas, vão alguns dizer. Sim, tenebrosas, faço coro, porém não cínicas como as práticas atuais de nossa sociedade, que faz brutalidades piores disfarçando-as de crimes hediondos, intervenções políticas e coisas do gênero. A maldade está sempre no outro. Mas o que faziam tantas pessoas defenderem o nazismo? A crença delas ou as condições vigentes. Mas o que fazem as pessoas defender o capital? O mesmo blá, blá, blá.

 (Continua...)

 Ralidjha Isabeli, 26 de março de 2006

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