O ESPETACULAR BOI DE IDALINO
O ESPETACULAR BOI DE IDALINO
O ESPETACULAR BOI DE IDALINO
Imagens da saída do Boi 2003
O ESPETACULAR BOI DE IDALINO
"Meu ano começa agora. Este o meu Reveillon."
Nelson Alves Júnior
Há alguns anos acompanhamos o Boi de Idalino, que abre o cortejo da festa da Lavagem da Esquina do Padre. Antes, morando em Salvador, perdia a festa. Recém-formado, era discreto expectador. Foi somente após ficar aos sábados com minha filha Joanna que senti-me não mais no direito, e sim no dever, de ser além de testemunha ocular, para ir atrás, dançar, sorrir, maravilhar-me com um espetáculo genuíno, único, tradicional e folclórico.
O ano de 2003 foi, porém, diferente. Estava sem Joanna. O dia 21 de fevereiro, um sábado, estava chegando, e me sentia incompleto para ir ver a saída do Boi, lá na rua Idalino Barberino da Silva, o centro da Feira Velha, Caetité, Bahia.
Esta era a XVI Lavagem da Esquina, festa capitaneada por Nelson Alves Júnior, Tairone Fernandes de Carvalho e outros que os auxiliam (ou atrapalham?). Achei o Gueguêu na praça, disfarçado como organizador do evento - era a companhia necessária para não chegar sozinho.
Era, ainda, o primeiro ano sem D. Nêga. Viúva do velho Idalino, que há alguns meses nos deixara, em seu lugar ficando o vazio que a lembrança mal pode suplantar. Chegando ao local uma brisa, suave  como ela, nos afagou o rosto - deixando a certeza de que não apenas a pequena, franzina e meiga matriarca estava ali, mas todos quanto já têm a consciência de que a cultura e a memória vivem juntas quando as gerações preservam suas tradições, seu folclore...
Meu Deus! Pensava que, sozinho, sem minha filha sobre os ombros, não saberia como me comportar... Mas, parado, observando tudo quanto ocorria, pude não só ver, mas sentir. Maquiavel dizia que ver é dado a todos, sentir a poucos - e estava certo!
Cada instante ia, assim, perpetuando-se na minha memória: o sorriso das pequenas baianas; a filarmônica enchendo o ar com seus acordes; o sujeito que, lá longe, subia no telhado para espiar; Tita, senhor da concentração, tocava triângulo; Seu Betim Ramos, sóbrio - ou melhor - sobre a sobriedade pairando...
A tarde caía devagar, esperando Dalinim, o "Dono do Boi", tomar seu banho. Nelsinho surge, finalmente, apressado (ele sempre o é...). O boi-bumbá jaz deitado, esperando que alguém venha dotar-lhe de alma - e então poder sair por aí, tangido, sambando na desenfreada loucura que a consciência cria para nosso deleite.
O Boi é este ser misterioso, que o boiadeiro controla. Dimas, momentos mais adiante, intrigado com o fato de o tratador do Boi parar a todo instante para conversar por baixo dos panos com a "alma" do bicho, pergunta-nos o que diziam, ao que respondi, para nosso riso: Boi é um bicho que precisa de muita psicologia...
O movimento de gente aumenta. Chega Tairone, o sorriso colado no rosto - pois é impossível mudar de feição: todos riem, felizes, mesmo aqueles que têm responsabilidade...
As baianas, todas a caráter, colocam-se à frente do cortejo. No meio delas um baiano - elemento que vem romper barreiras de preconceito e soltar a franga - como Tõezim, anos atrás...
_Cadê Idalino? - pergunto para saber de seu irmão que o nosso original, inigualável Dalinim, ainda está no banho.
Nelson anda daqui para acolá. Troca uma palavra conosco e logo sai para ir falar com a costureira do Boi (Boi é bicho que tem costureira) a fim de recomendar-lhe que guarde os panos depois da festa, pra não estragar. Boi de Idalino é bicho gastador de pano...
Passam mais alguns minutos. Finalmente Nelson entra na casa e traz o Dono do Boi: Dalinim está impecável. Olha em redor, verificando se todos já estão a postos. Quer ter a certeza de que apenas ele estava faltando. Sem se dar por convencido, vai mais adiante conferir. Olha feio para um bêbedo, cumprimenta a todos que, ele sabe, foram ali atrás do seu Boi. O Boi é assim: hospitaleiro, gosta de visitas... e é vaidoso!
Foto Paulo Adriano: Saída do Boi, em 2001
(ao centro: Nelson, D. Nêga, Idalininho)
Então Nelsinho, o capitão, dá aos fogueteiros improvisados pelo álcool ordem para avisar ao mundo que o Boi de Idalino vai sair. O espoucar da adrianina soa perigosamente próximo aos telhados das casas que sobem o Morro do Observatório. Neste átimo de distração, o Boi levanta-se, sem que me desse conta de como fora animado. Estava vivo o Boi, enfim!
A bandinha, as baianas, os bêbedos, os bobos e... os Mascarados. Zé Mula, que se trocara no quarto de Idalino, este ano chegou atrasado (na primeira vez que o vi disfarçado, ele me perguntou: "sabe quem sou eu?", ao que respondi: "claro, Zé." - para sua decepção não consegue disfarçar o jeito, o corpanzil...). Uma novidade, quatro Emílias do Sítio do Pica-pau Amarelo vieram acompanhar o Boi. Quem seriam? Nelson provoca-me: "Você nem imagina quem está vestida ali..." Ante a promessa de que outro dia nos contaria, o mistério persiste para legar à imaginação qual vetusto sobrenome ali se ocultava...
Belas morenas, negras, índias, raças misturadas, requebravam ao som das alegres marchinhas. Meu corpo, avesso à dança, se contagia e tremula num arremedo de samba. O Boi está saindo, lá vamos nós! Lá vamos nós!
Este um singelo relato da saída do Boi de Idalino. O Boi de Dalinim. O Boi de Nelsinho. O Boi de Todos Nós.
Fevereiro de 2003.
Fotomontagem do Autor: Boi de Idalino em 1964 sobre a bandeira de Caetité:
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Crônica de André Koehne - Academia Caetiteense de Letras - Caetité - Bahia - 2003 = Direitos do Autor
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