DEUS É SURDO...
Estávamos em 1994. Da sala de jantar ouvi os dois irmãos falando de algo que me pareceu muito distante para duas crianças de 3 e 6 anos: o mais velho "ensinava" à menorzinha que, em suas palavras, "Deus é surdo"...
   Como a pequerrucha lhe duvidasse da afirmação, ele a conduziu até o arco da varanda que dava para o quintal e, decidido, desafiou:
_
Vou lhe mostrar, quer ver?
_
Quero! - respondeu a garotinha.
   Naquele interregno já me concentrava numa oração, pedindo inspiração para que aquele momento não fosse a causa de uma permanente perda de fé - ou mesmo uma demorada descrença, tal como ocorrera, há muitos anos, a outra criança que, vítima de desonesto religioso, passara toda a adolescência duvidando mesmo da existência do Ser Supremo...
Foi como se uma energia diferente nos invadisse o cérebro. Tomado por uma segurança, fomos até onde os garotos estavam, a tempo ainda de ouvir o menino gritar, a plenos pulmões:
_Deus! Deus! Deeeeuuss!! - e então categórico falar à irmã - Tá vendo? Deus é surdo mesmo, ele não respondeu...
   Não se assustaram quando cheguei, falando: "Você está errado, preste atenção... Deus está respondendo, sim."
_
Onde, tio? - quis saber o jovem cético.
   Então, numa linguagem própria para o entendimento deles, expliquei que Deus estava permanentemente nos respondendo, mas que na verdade nós é que estávamos surdos para ouvi-lO, pois os "ouvidos de escutar Deus" passavam antes pelo coração e que, se olhássemos bem, escutaríamos a "voz" divina nos pássaros, naquele céu maravilhosamente azul pintado de nuvens, enfim, em toda a Natureza, na infinitude do Universo.
   Eles sorriram, a menina falou para o irmão: _
Não te disse? Deus não é surdo!
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   Me contaram alhures uma historinha, que transcrevo agora: um pai, questionado pelo filho, viu-se diante de dilema semelhante: como explicar a razão pela qual não víamos a Deus. O pai, então, chamou o pequeno cão do garoto.
   Atendendo de pronto, o animal veio até onde estavam, balançando o rabo, alegre, receber o carinho que se lhe oferecia. O pai então explicou: "Veja, filho, o Totó não sabe falar, não entende uma só palavra do que você diz. Mas sabe que você o ama, e vem feliz quando chamamos. Sabe que você lhe dá a comida, a água, que é enfim o senhor de sua vida e até de sua morte. Assim também somos nós diante de nosso Criador: não O compreendemos, não sabemos de suas vontades para com nossos destinos, e até mesmo sequer o percebemos em nosso dia a dia. Mas Ele está sempre cuidando  de nós, nos amando. Veja o Totó, quando lhe fazemos carinho: responde com a cauda, satisfeito, feliz. Também com Deus temos um elo a nos unir: pelo Amor sentimos Deus em nós, ouvimo-Lhe e sentimo-Lhe a presença."
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   Estas duas histórias, num mundo tão carente de amor, parecem pueris, e são. Talvez pela simplicidade extrema, o Amor seja tão desconhecido. Talvez pela perda da fé, em homens que, mesmo sob o manto da religião, igoram o verbo AMAR - é que vivemos tantas desgraças individuais e coletivas. Crescemos acreditando ser Deus um surdo, que não nos ouve, enquanto cerramos nossa audição para seu Verbo maravilhoso.

Abandonamos os mais simples gestos de afeto, e descobrimos... um inferno na vida.
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