Muitos sabem que o
Velho Testamento foi escrito em hebraico, e o Novo,
em grego, mas poucos sabem que há uma terceira
língua na Bíblia – o aramaico.
1) Aramaico
O aramaico foi sem
dúvida, desde muito tempo, a língua popular de
Babilônia e da Assíria, cuja linguagem literária,
culta e religiosa era o sumero-acadiano. Documentos
assírios mencionam o aramaico desde 1100 A.C.
Durante o reinado de Saul e Davi, os estados
aramaicos ou sírios são mencionados na Bíblia (I
Samuel 14:47; II Samuel 8:3-9; 10:6-8).
O aramaico foi
trazido para a Palestina porque os assírios seguiam
costume de transplantar os povos das nações
subjugadas, por isso depois de terem vencido o reino
de Israel, trocaram as pessoas e as espalharam
através de todo o seu império. II Reis 17:24
menciona explicitamente que entre os povos trazidos
para Samaria a fim de repovoarem a terra devastada,
encontravam-se aramaicos de Hamate.
Esta língua dotada de
grande poder de expansão, tornou-se usual nas
relações internacionais de toda a Ásia, e na própria
Palestina propagou-se tão largamente, que venceu o
próprio hebraico.
O Comentário Bíblico
Adventista, Vol. l, páginas 29 e 30 apresenta-nos a
origem do aramaico com as seguintes palavras:
"O lar original do
aramaico foi a Mesopotâmia. Algumas tribos arameanos
viviam ao sul de Babilônia, perto de Ur, outras
tinham seus lares na alta Mesopotâmia entre o rio
Quebar (Khabúr) e a grande curva do Eufrates, tendo
Harã como centro. O fato de os patriarcas Abraão,
Isaque e Jacó terem conexões com Harã é
provavelmente responsável pelo estatuto feito por
Moisés de que Jacó era "arameano". Deut. 26:5. Deste
seu lar ao norte da Mesopotâmia o aramaico se
espalhou para o sul de toda a Assíria."
Tudo indica que o
aramaico foi preferido pelos assírios e babilônicos
por ser mais simples do que a complicada escrita
cuneiforme. A prova de sua simplicidade está
relatada em II Reis 18:26, quando Senaqueribe
invadiu Judá no fim do VIII século A.C. os oficiais
judeus que dominavam tão bem o hebraico quanto o
aramaico, pediram ao general assírio que lhes
falasse em aramaico. Esta ainda a razão por que
durante os setenta anos do cativeiro babilônico os
judeus se esqueceram muito do hebraico, adotando em
seu lugar o aramaico. Ao voltarem do cativeiro
continuaram falando o aramaico, como se depreende da
leitura de Neemias 8:1-3 e 8.
O aramaico era a
língua usada por Jesus (Mar. 5:41; 7:34; 15:34),
pela maioria das pessoas na Palestina, bem como
pelas primeiras comunidades cristãs. Segundo outros
estudiosos entre os quais se destaca
Robertson, Jesus falava
aramaico na conversação diária, mas no ensino
público e nas discussões com os fariseus a língua
usada era o grego.
Já antes da Era
Cristã suplantou totalmente o hebraico que se tornou
a língua morta e exclusivamente religiosa.
Na Ásia Ocidental, a
língua aramaica se difundiu largamente, assumindo
naquelas regiões e naquele tempo o mesmo papel que
assumem em nossos dias o francês e o inglês.
O aramaico, embora
ainda utilizado em certas regiões, vai cedendo lugar
ao árabe, e corre o perigo de desaparecer como
língua falada, pois hoje é falada somente em algumas
povoações da Síria. O aramaico desapareceu sob o
impacto cultural do grego e do latim, já que deixou
de ser conhecido pelos cristãos.
Quem conhece o
hebraico pode com facilidade ler e entender o
aramaico, dadas as suas marcantes semelhanças.
As partes do Velho
Testamento escritas em aramaico são as seguintes:
1) A expressão "Jegar-Saaduta"
de Gênesis 31:47;
2) O verso de
Jeremias 10:11;
3) Alguns trechos de
Esdras 4:8 a 6:18; 7:22-26;
4) Partes do livro de
Daniel, entre os capítulos 2:4 a 7:28;
2) Hebraico
A língua hebraica foi
a língua dos Hebreus ou israelitas desde a sua
entrada em Canaã. A sua origem é bastante
misteriosa, porque além do Velho Testamento só
possuímos escassos documentos para o seu estudo. O
mais provável é que o hebraico tenha vindo do
cananeu e foi falado pelos israelitas depois de sua
instalação na Palestina.
A atual escrita
hebraica (chamada "hebraico quadrado") é cópia do
aramaico e entrou em uso pouco antes da nossa era,
em substituição ao hebraico arcaico.
Os Targuns o
denominam de "língua sagrada" (Isa. 19:18); e no
Velho Testamento é chamado "a língua de Canaã" ou a
língua dos judeus (Isa. 36:13, II Reis 18:26-28).
Salmo 114:1 mostra a
grande diferença entre o hebraico e o egípcio.
Israel por estar cercado de povos que falavam uma
língua cognata – o aramaico – foi se esquecendo do
hebraico, até que este veio a extinguir-se como
língua falada. Era ainda a língua de Jerusalém no
tempo de Neemias (13: 24), cerca de 430 A.C., mas
muito antes do tempo de Cristo foi substituída pelo
aramaico.
O alfabeto hebraico
consta apenas de consoantes, em número de 22.
O hebraico é escrito
da direita para a esquerda como o árabe e algumas
outras 1ínguas semíticas.
Sua estrutura
fundamental é, como em todas as línguas semíticas, a
palavra raiz, composta de três consoantes. É uma
língua bastante simples, seus melhores conhecedores
sublinham sem hesitação a sua pobreza, quando
comparado com o grego ou com línguas modernas, como
o inglês e o português.
De acordo com a
Pequena Enciclopédia Bíblica o vocabulário
hebraico na Bíblia conta com apenas 7.704 vocábulos
diferentes. A Academia do Idioma Hebraico tem
registrado o uso de cerca de 30.000 palavras.
Quase não possui
adjetivos nem pronomes possessivos, porém, é rica em
advérbios. É uma língua quase indigente em termos
abstratos.
Quase sempre os
pronomes pessoais são ligados às formas verbais como
se fossem sufixos ou prefixos.
Com raras exceções
não faz uso de palavras compostas.
O alfabeto hebraico
possui letras com sons bem próprios, por isso não
apresentam nenhuma semelhança com o nosso alfabeto.
Os dois exemplos mais característicos se encontram
no "alef" e no "ayin".
Se língua é um
organismo vivo que se transforma, o hebraico quase
pode apresentar-se como exceção, como comprovam os
escritos de Moisés e de alguns profetas mil anos
depois, cujas diferenças lingüísticas são
insignificantes. Este fato tem levado a "alta
crítica" a dogmatizar que os escritos do Velho
Testamento foram produzidos num espaço de tempo bem
pequeno.
Seus processos
sintáticos são muito simples, usando pouco as
orações subordinadas, preferindo sempre as
coordenadas, quase sempre unidas pela conjunção "e"
como inegável influência do hebraico.
Os tempos do verbo, a
exemplo do grego, indicam mais o "aspecto" da ação,
conforme ela seja momentânea, prolongada ou
repetida. Como língua semítica não classifica os
fatos em passados, presentes e futuros, mas em
realizados ou de ação acabada (perfeito), e não
realizados ou de ação inacabada (imperfeito).
Uma das
peculiaridades da língua hebraica com respeito ao
sistema verbal é esta: a simples troca de um sinal
vocálico determina uma mudança nas formas verbais.
O SDABC, 1 volume,
página 26, elucida este aspecto com o exemplo do
verbo cantar que indicaria o nosso presente, passado
e futuro permutando suas vogais. O verbo escrever em
hebraico evidencia este princípio. Ele é formado
pelas consoantes: K, t, b que permanecem invariáveis
em seu flexionamento.
katab – tem escrito
ketob – escreve ou
escreva (imperativo)
koteb – escrevendo
katub – está
escrito
katob – escrever
Não possui o verbo "ter",
enquanto o verbo "ser" é ativo e significa existir
eficazmente.
Quando os judeus sentiram
que o hebraico estava em declínio como língua falada, e
que sua leitura correta ia perder-se, criaram um sistema
de vocalização. Este trabalho foi feito pelos massoretas,
por isso o texto hebraico usado hoje chama-se
massorético.
3) Grego Bíblico
Georges Auzou, em seu livro
A Palavra de Deus, afirma:
"O grego passa, com
justiça, por ser a mais bela língua do mundo. De fato é
um dos instrumentos mais aperfeiçoados, dos mais
delicados, extremamente harmonioso, ao mesmo tempo que
preciso e sutilíssimo, jamais forjado pelos homens. É ao
mesmo tempo o fruto e o instrumento do gênio grego, o
gênio da clareza, da ordem e do equilíbrio."
Estas afirmações se
referem muito mais ao grego erudito, clássico, do que ao
grego coinê do Novo Testamento.
Como é do conhecimento
geral, o Novo Testamento foi escrito na coinê, língua na
qual também foi traduzido o Velho Testamento hebraico
pelos Setenta. O termo coinê significa a língua comum do
povo entre os anos 330 A.C. e 330 A.D.
Com exceção da Epístola
aos Hebreus e da linguagem de Lucas (Evangelho e Atos)
que se encontram num coinê mais literário, os outros
escritos pertencem à 1íngua mais comum ou coinê vulgar.
O insigne erudito
Gustav Adolf Deissmann foi quem
primeiro mostrou a identidade do grego do Novo
Testamento, salientando que o grego da Bíblia era o
coinê, e não o grego erudito, nem a chamada "linguagem
do Espírito Santo" ardorosamente defendida por alguns
autores.
Características da
Linguagem do Novo Testamento
Se fosse possível
caracterizar o coinê, língua em que foi escrito o Novo
Testamento, sintetizando-a em uma palavra, a melhor
seria "simplificação". Esta conclusão é facilmente
deduzida estudando-lhe as características.
1) Substituição dos casos
pelas preposições;
2) Tendência para
simplificar a morfologia e a sintaxe;
3) Uso escasso de orações
subordinadas, tendo preferência pelas coordenadas
ligadas pela conjunção "e";
4) Eliminação do dual e
uso parcimonioso do modo optativo, aparecendo apenas 67
vezes no Novo Testamento;
5) Uso mais freqüente do
artigo;
6) Simplificação das
riquíssimas formas verbais do grego clássico;
7) Mudança de sentido de
muitas palavras do grego clássico, por influência
religiosa, tais como: batizar, justiça, graça, amor,
glória, carne, cruz, mundo, crer, espírito, cálice, dia,
etc.;
8) As formas diminutivas
se tornam mais comuns;
9) Emprego mais
generalizado de construções perifrásticas nos verbos;
10) Os adjetivos são mais
usados no grau superlativo do que no comparativo;
11) Preferência pela
ordem mais direta, pois no grego clássico predomina a
ordem inversa;
12) Emprego freqüente dos
pronomes sujeitos, em casos dispensáveis, por estarem
eles subentendidos nas desinências verbais;
13) Idêntico valor
fonético para as vogais gregas;
14) Emprego de vários
latinismos, tais como: legião, centurião, denário,
colônia e flagelo;
15) Uso freqüente do
presente histórico nas narrativas;
16) Aparecimento
generalizado da parataxe, com prejuízo da hipotaxe.
Parataxe é uma construção mais simples da frase, como as
orações coordenadas, enquanto a hipotaxe é mais
complexa, isto é, formada de orações subordinadas.
17) Uso de palavras que
são empréstimos diretos do aramaico, a exemplo de: geena,
Eli Eli, Hosana, litóstrotos (gabatá), Satã, Talita cumi,
Rabi, Maranata;
18) Freqüência de
hebraísmos, sobretudo na sintaxe, fastidioso emprego da
conjunção "e", pois esta partícula aparece muito no Novo
Testamento, em expressões como estas: "e ele falou
dizendo", "e disse", "e aconteceu que". As frases:
"Filhos da luz'; "filhos da perdição" são eminentemente
semíticas.
Quanto à linguagem dos
escritores do Novo Testamento haveria muito que dizer,
mas fiquemos somente com as seguintes observações:
Apenas Hebreus, Lucas e
alguns trechos de Paulo são escritos num estilo mais
literário.
O vocabulário mais rico
não é o de Paulo, mas sim o de Lucas, que emprega 250
palavras novas no Evangelho e, mais ou menos 500, em
Atos.
Se a linguagem mais
polida e mais erudita é a de Lucas, a mais pobre e menos
aprimorada, quanto ao estilo, é a de Marcos e a de João,
especialmente no Apocalipse.
O doutor Benedito P.
Bittencour no livro O Novo Testamento, página 67,
chama-nos a atenção para a linguagem pouco aprimorada do
Apocalipse, onde há violações flagrantes dos corretos
cânones da gramática.
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