Falso traidor
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14/04/2006
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Parte do manuscrito encontrado em
Beni Masar.
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A National Geographic pagou cerca de um milhão de dólares pela
divulgação exclusiva de uma das maiores descobertas arqueológicas do
ano: o Evangelho Segundo Judas. Trata-se de um documento histórico
de enorme importância, por ser um material capaz de sacudir as bases
da crença cristã.
O manuscrito não é de autoria do próprio Judas, já que, segundo
testes realizados com o Carbono14, o achado teria sido escrito entre
o segundo e o quarto século depois de Cristo, quando o apóstolo
acusado de tê-lo traído já havia falecido.
Escrito em linguagem copta, falada pelo povo egípcio na época, o
documento é uma cópia do original, escrito por volta de 150 d.C. É
possível que o conteúdo do Evangelho seja uma compilação de tudo que
Judas disse sobre a morte de Jesus - sua "versão" da história.
O que diz
O manuscrito afirma que Judas não entregou Jesus por trinta moedas,
mas obedeceu a uma ordem sua feita durante uma conversa privada, não
relatada no Novo Testamento da Bíblia, que apenas se refere aos atos
públicos de Cristo.
Segundo o texto, dias antes de sua morte, Jesus teria se dirigido a
Judas e afirmado: "Você tem a tarefa maior: vai sacrificar o corpo
que carrega o meu espírito". Em seguida o advertiu sobre as
conseqüências da missão: "Você cairá em desgraça por gerações, mas
um dia vai estar acima disso". Todas as páginas se referem aos dias
finais de Cristo e falam em especial de uma das passagens mais
conhecidas da Bíblia, quando Judas entrega Jesus a seus
perseguidores, no Monte das Oliveiras.
O manuscrito afirma ainda que Judas era o seu discípulo favorito e o
único conhecedor de sua verdadeira identidade. Judas não se enforcou
como conta o Novo Testamento, mas se recolheu. Um dos trechos dá
conta de que ele se retirou para o deserto em reflexão, ciente do
perdão de Jesus e do cumprimento da missão que teria libertado a
divindade de Cristo de seu corpo humano.
A descoberta
As 62 páginas de papiro foram encontradas em escavações clandestinas
em Beni Masar, no Egito, tendo supostamente sido escondidas pelos
gnósticos para evitar a destruição por parte da Igreja Católica. O
documento foi descoberto há trinta anos e vendido para um
colecionador da região, que passou anos tentando vender o texto a
universidades e museus.
Como não conseguiu, trancou-o em um depósito perto de Nova York.
Anteriormente, numa briga com a amante, havia perdido uma folha do
documento. Depois de ter se deteriorado no depósito, o manuscrito
foi comprado por uma instituição Suíça, que o restaurou e comprovou
sua autenticidade, começando a tradução.
Gnósticos
No entanto, alguns estudiosos afirmam que o documento é na verdade
uma obra dos gnósticos da seita Iscariotes, "A igreja de Judas",
derivada dos gnósticos caimitas, seguidores de Caim. Os gnósticos
rivalizavam com a Igreja Católica e tiveram seu auge por volta de
200 d.C. Escreveram diversos documentos, que em sua maioria foram
perdidos com a perseguição do catolicismo.
Tinham uma visão de Judas diferente da que conhecemos: acreditavam
que ele era uma pessoa benevolente, o mais iluminado dos Apóstolos,
que tinha colaborado com Jesus em sua missão de salvar a humanidade.
Tendo recebido a incumbência de delatá-lo, Judas na verdade teria
possibilitado que a missão se cumprisse. Seria, portanto, digno de
gratidão. Essa versão foi escrita em grego, em 150 d.C, data que
coincide com a produção do evangelho agora conhecido.
Os gnósticos acreditam que o alcance da plenitude espiritual se dá
por meio da plena consciência do bem e do mal e o que único meio
para consegui-la é através do esoterismo. O nome Judas, que em grego
significa Agradecimento, transformou-se em sinônimo de traidor em
diversas línguas, como a personificação da falta de caráter.
Evangelhos Apócrifos
Nas últimas décadas, foram divulgados o Evangelho Segundo Maria -
que fala do relacionamento de Jesus com Maria Madalena - e o
Evangelho segundo Pedro. Ambos são considerados Evangelhos
Apócrifos, ou seja, de autoria duvidosa, não reconhecida pela Igreja
Católica.
Além disso, no ano retrasado, o livro O Código Da Vinci, de Dan
Brown, foi desaconselhado pelo papa por se tratar de um romance
policial com referências à manipulação da história cristã feita pela
Igreja Católica, que teria escondido fatos da vida de Jesus com o
intuito de construir sua doutrina de dominação, o que mais tarde se
confirmou com o controle ideológico dos dominados, durante a Idade
Média.
Porém, a autoria dos evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João
também não é comprovada - embora seja aceita pela Igreja. Estudiosos
afirmam que os textos bíblicos foram reunidos com o auxílio do
Imperador Constantino, que queria adequar a visão dos católicos à
sua política. Foram descartados 30 textos, alguns deles conhecidos
na época.
O pastor João Maria de Araújo, da Igreja Batista Central do
Maranhão, afirma que o Evangelho Segundo Judas foi uma grande
descoberta para a humanidade: "Todos devem ler, conhecer e
confrontar, porque contribui para nós possamos conhecer mais da vida
de Jesus. Não considero essa descoberta algo que afronte a Bíblia,
pois ela já é aceita por todo o mundo e os fiéis já têm a sua fé
solidificada".
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