Processo de integração mundial que se intensifica nas últimas
décadas, a globalização baseia-se na liberação econômica: os Estados abandonam
gradativamente as barreiras tarifárias que protegem sua produção da concorrência
estrangeira e se abrem ao fluxo internacional de bens, serviços e capitais.
A recente evolução nas tecnologias da informação contribui de forma
decisiva para essa abertura. Além de concorrer para uma crescente homogeneização
cultural, a evolução e a popularização das tecnologias de informação (computador,
telefone e televisor) são fundamentais para agilizar o comércio, o fluxo de
investimentos e a atuação das transnacionais, por permitir uma integração sem
precedentes de pontos distantes do planeta. Em 1960, um cabo de telefone intercontinental
conseguia transmitir 138 conversas ao mesmo tempo. Atualmente, os cabos de fibra ótica
possuem capacidade para enviar 1,5 milhão. Uma ligação telefônica internacional de
três minutos, que custava 244 dólares em 1930, é feita por 3 dólares no início dos
anos 90. A Organização Mundial do Comércio (OMC) prevê para 2000 a existência de 300
milhões de usuários da internet e transações comerciais de mais de 300 bilhões de
dólares.
Contrastes da globalização - O debate em torno dos efeitos
colaterais da globalização e das estratégias para evitá-los aprofunda-se em 1999. Uma
das consequências desse processo é a concentração da riqueza. A maior parte do
dinheiro circula nos países industrializados - apenas 25% dos investimentos -, e o
número de pessoas que vivem com menos de 1 dólar por dia sobe de 1,2 bilhão, em 1987,
para 1,5 bilhão, em 1999. O crescimento dos países emergentes em 1999 fica em torno de
1,5%, o pior desempenho em 17 anos. As exceções, China e Índia, são justamente as
nações que dão ritmo mais lento à liberação comercial e à integração ao sistema
financeiro internacional.
Com a crise mundial, o preço das matérias-primas, produzidas em
grande parte pelos Estados mais pobres, cai mais de 20%, trazendo perdas de 10 bilhões de
dólares para a América Latina. Os países ricos, no mesmo ano, lucram 60 bilhões de
dólares somente com a queda do custo do petróleo. A participação das nações
emergentes no comércio internacional é de pouco mais de 30%. Algumas regiões estão à
margem da globalização, como a Ásia Central, que representa apenas 0,2% das trocas, e o
norte da África (0,7%).
O Banco Mundial (Bird) aponta como causas para o distanciamento entre
ricos e pobres o aumento das ações protecionistas promovidas pelos países ricos, a
voracidade dos investidores e a fragilidade econômica e institucional das nações
subdesenvolvidas. A receita usada para recuperar os mercados emergentes em queda - cortes
orçamentários e juros altos - contribui para aumentar ainda mais a distância.
Correção de rumos - Tais desigualdades preocupam os organismos
internacionais. A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento
(Unctad) propõe o controle de capitais e desenvolvimento sustentado em contraposição ao
Consenso de Washington, nome pelo qual ficaram conhecidos os princípios de
liberalização financeira e comercial que caracterizam o neoliberalismo. A instituição,
em conjunto com o Bird, tem um plano para abolir em 15 anos as dívidas dos 41 países
mais pobres.
Em seu relatório do Desenvolvimento Humano de 1999, o Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) fornece uma receita geral para corrigir os
rumos da globalização. As nações emergentes e organizações não governamentais devem
ter mais influência nos fóruns econômicos internacionais - Fundo Monetário
Internacional (FMI), Bird, Grupo dos Sete (G-7) -, hoje controlados pelos Estados ricos.
Sugere ainda que as decisões não considerem apenas as variáveis econômicas, mas
também suas repercussões na área social. Por fim, conclui que, embora pareça
contraditório, o sucesso da globalização exige avaliações regionalistas.
Expansão - O início da integração mundial remonta aos séculos
XV e XVI, quando a expansão ultramarina dos Estados europeus possibilita a conquista de
novos mercados. Outro salto na difusão do comércio e dos investimentos é dado pelas
duas Revoluções Industriais, nos séculos XVIII e XIX. A interdependência econômica
cresce até a quebra da Bolsa de Nova York, em 1929, e é retomada no bloco capitalista
após a II Guerra Mundial. Estimuladas pela quebra de barreiras - decorrente, em grande
parte, das políticas liberalizantes postas em prática pelo Acordo Geral de Tarifas e
Comércio (Gatt) e, atualmente, pela Organização Mundial do Comércio (OMC) -, as trocas
mundiais aumentam de forma expressiva a partir dessa época. Em 1950 totalizam 61 bilhões
de dólares, ao passo que em 1998 atingem 5,2 trilhões de dólares.
O fim da Guerra Fria, nos anos 80, inaugura um novo estágio de
globalização: as trocas mundiais incrementam-se ainda mais por causa da transição das
nações comunistas para a economia de mercado, e a expansão do comércio supera o
aumento da produção mundial. De acordo com o FMI, entre 1989 e 1998 o volume de dinheiro
movimentado em trocas internacionais se eleva em média 6,5% ao ano, enquanto a taxa anual
de crescimento da produção é de 3,4%.
Explosão dos investimentos - A expansão dos fluxos de capital tem
sido ainda maior por causa da abertura dos países ao investimento estrangeiro e da enorme
velocidade das transações. O movimento diário de capitais no mundo é estimado em 2
trilhões de dólares. A migração quase instantânea do dinheiro fortalece investimentos
estrangeiros de curto prazo. Ao menor sinal de instabilidade econômica ou política no
Estado, o investimento é resgatado, provocando uma crise que pode alastrar-se para outras
nações por causa da integração das economias.
É o que ocorre no segundo semestre de 1997, quando as principais
bolsas de valores do mundo despencam em reação à profunda crise das nações do Sudeste
Asiático. O turbilhão financeiro evolui para uma crise internacional em 1998. Os países
emergentes - sobretudo a Federação Russa - são os mais atingidos, por adotar modelos de
desenvolvimentos baseados em investimentos externos. As sucessivas crises realçam a
instabilidade de um mercado financeiro globalizado, em que o desempenho das economias
nacionais depende não só da ação dos governos, mas cada vez mais dos grandes
investidores estrangeiros.
Corporações transnacionais - A globalização é marcada ainda
pelo crescimento das corporações transnacionais, que exercem papel decisivo na economia
mundial. De acordo com o relatório do Desenvolvimento Humano de 1999, das 100 maiores
riquezas do mundo, metade pertence a Estados e metade, a megaempresas. Reportagem da
revista Fortune mostra que as dez principais corporações do mundo - General Motors
Corporation, DaimlerChrysler, Ford Motor, Wal-Mart Stores, Mitsui, Itochu, Mitsubishi,
Exxon, General Electric e Toyota Motor - ganharam juntas 1,2 trilhão de dólares em 1998,
valor 50% maior que o produto interno bruto (PIB) brasileiro. O faturamento isolado de
cada uma dessas empresas é comparado ao PIB de importantes economias mundiais, como
Dinamarca, Noruega, Polônia, África do Sul, Finlândia, Grécia e Portugal. Somente as
ações da Microsoft, a principal empresa de informática do mundo, atingem em julho de
1999 valor de mercado equivalente a mais de 500 bilhões de dólares. Além de crescer em
faturamento, as corporações tornam-se gigantescas também pelo processo de fusões,
acelerado a partir de 1998.
As transnacionais implementam mudanças significativas no processo de
produção. Auxiliadas pelas facilidades na comunicação e nos transportes, instalam suas
fábricas em qualquer lugar do mundo onde existam melhores vantagens fiscais e
mão-de-obra e matéria-prima baratas. Os produtos não têm mais nacionalidade definida.
Um carro de uma marca dos EUA pode conter peças fabricadas no Japão, Ter sido projetado
na França, montado no Brasil e ser vendido no mundo todo.
Euro - Em 1999, onze países da União Européia (UE) dão outro passo importante no
processo de globalização ao criar o euro, moeda única do bloco. Em 1º de janeiro,
Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, França, Finlândia, Irlanda, Itália, Luxemburgo,
Holanda (Países Baixos) e Portugal passam a empregá-lo nas transações entre suas
empresas. Em 1º de janeiro de 2002, o euro vai ser usado regularmente e, a partir de 1º
de julho desse ano, as moedas nacionais deixarão de existir. É a primeira vez na
história que nações abrem mão de emitir sua própria moeda.