"ESTOU FORA", DIZ PRESIDENTE DO IPHAN

Mônica Bergamo
Extraído da coluna da autora na Ilustrada da Folha de São Paulo
São Paulo, 11 de janeiro de 2006.

A coluna conversou com Antônio Arantes, 62, presidente do Iphan, órgão de preservação subordinado ao Ministério da Cultura (MinC), no caminho entre o aeroporto de Brasília e o gabinete do ministro Gilberto Gil, para onde o antropólogo paulista se encaminhava para entregar seu pedido de demissão:

Folha - Por que o pedido de demissão?

Antônio Arantes - Principalmente porque tenho trabalhado muito e feito pouco nos últimos seis meses. As questões do Iphan estão se tornando - e devem se tornar ainda mais nos próximos meses - político-partidárias, e não de preservação. E estou fora disso, meu partido é a cultura.

Folha - Qual a sua principal dificuldade à frente do Iphan?

Antônio Arantes - O órgão foi tão fragilizado nas últimas décadas que sobreviveu graças ao voluntarismo de alguns técnicos da casa. Isso teve um efeito positivo, mas criou um certo isolamento, um certo enclausuramento e a formação de grupos, facções. Houve escaramuças de todo tipo, até invasão do meu gabinete. Não diria que foi feita por gente interessada em minha saída, mas não é exatamente uma ação de apoio (risos). O clima é muito difícil, há oposição à modernização.

Folha - Como foi essa invasão?

Antônio Arantes - Aconteceu no feriado da virada do ano. Os invasores tinham chaves de algumas portas, plantaram algumas pistas, como arrombar portas por dentro... Nada foi levado. Ou era ladrão comum, que não encontrou nada de interesse, ou era alguém em busca de algum documento, que devia saber exatamente o que buscava, ou é intimidação. De qualquer maneira, é emblemático desse clima de oposição que existe.

Folha - O sr. acompanhou a polêmica recente envolvendo o Ministério da Cultura?

Antônio Arantes - Sim. Tem um ponto que é fundamental: a questão do autoritarismo. O MinC resolveu criar normas, regras, o que é salutar numa área que não tinha tradição nenhuma de continuidade em suas políticas, e isso interfere com interesses privados que vinham sendo negociados no varejo. Por outro lado, não podemos achar que o livre comércio é o embaço da democracia. Não é. Existe uma questão de equilíbrio entre os dois lados que é absolutamente central. Para isso acontecer, tem de haver diálogo com a sociedade civil, o que é difícil, já que o próprio Estado não tem uma tradição democrática. O desafio é construir uma democracia de fato, não no abstrato, não no discurso.

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