Notas da autora: O de sempre... os personagens não são meus, eu sou só uma fã, ninguém me processe que eu não tenho dinheiro, etc, etc, etc... ^_^"


A vida nos faz entender - parte 2

 

"Por que será que sempre fazem isso comigo?", pensou Yolei, resmungando lentamente. "E o pior é que o meu próprio digimon dá o maior apoio! Vê se pode! Agora o Ken vai pensar um monte de bobagens de mim... se é que já não pensa...".

Quando a garota chegou ao quarto, finalmente voltou a si, e viu que seu amigo a tinha seguido. Não tinha muito o que dizer a ele. Temia que, se falasse demais, acabaria se enrolando ou, pior ainda, descontando sua raiva no coitado.

- Olha, Ken, não liga para eles, não... eles gostam de fazer umas brincadeiras de vez em quando que...

- Não se preocupe - ele interrompeu. - Estamos quites pelo Wormmon, então?

- É, eu acho que sim.

- E você tinha dito que queria a minha ajuda, não é?

- Ah, claro! - E, indo em direção ao armário, tirou dele um computador completinho, só que todo desmontado. Colocou o gabinete, o monitor e todo o resto no chão. O garoto ficou admirado, embora não estivesse surpreso.

- Você está fazendo manutenção de computadores, Yolei?

- Mais ou menos... eu sei fazer, então, sempre tem um vizinho ou outro querendo ajuda. Só que hoje - ela continuou, olhando para ele -, sou eu quem quer ajuda.

- Mas Yolei, você sabe que eu não sei mexer com computadores como você faz!

- Não se preocupe, o serviço é meu! - ela disse, sorrindo. - Mas fique aqui comigo, eu posso precisar de alguém por perto.

Ken percebeu que esse era o melhor que ele tinha a fazer. A chuva caía forte, e suas roupas ainda estavam secando (por gentileza da senhora Inoue). Ele ainda ficaria por ali mais um tempo por causa disso. Mas, é claro, nada dizia que a companhia da garota, por si só, não era agradável.

Tranqüilamente, a garota sentou-se no chão e começou a examinar o gabinete aberto. Olhou com atenção, mexeu em um ou outro fio, mas não encontrou nada que parecesse findar sua procura. Ele a olhava, curioso, esperando qualquer chance de ser útil.

- Ken -, ela chamou, como se adivinhasse os pensamentos dele. - Pode ir até ali na minha mesa pegar as chaves de fenda, por favor?

- Achou o que está errado?

- Quase lá! - ela disse, sem deixar de se concentrar no que estava fazendo.

E ele foi fazer o que ela pediu, normalmente. Enquanto pegava as ferramentas, no entanto, viu, sobre a mesa, um porta-retrato com uma foto de toda a família Inoue reunida, sorrindo. Os pais no meio e os quatro irmãos, com seus óculos e seus sorrisos em volta. A foto parecia ser mais ou menos recente.

- Desculpe por perguntar - ele disse, tomando o porta-retrato na mão-, mas de quando é esta foto?

- Ah, essa? Não é antiga. Tiramos durante as últimas férias.

- Vocês parecem bem felizes nesta foto, sabia?

- Acha mesmo? - ela perguntou sorrindo, enquanto se levantava e ia para o lado dele. - Pois é, foi um dia muito bom. Eu sei que fico reclamando dos meus irmãos o tempo todo, mas no fundo, é só da boca para fora, porque eu adoro todos eles.

- É, eu sei como é.

Logo, Yolei percebeu que tocar no assunto "irmãos" na frente de um garoto que mal havia superado a morte do seu próprio não havia sido uma boa idéia. Ela ficou meio chateada, mas ele não parecia entender.

- O que foi?

- Falei besteira. não é?

- Besteira?

- É, eu fico aqui falando um monte dos meus irmãos, e você...

- Eu o quê?

- Você... bom, o seu irmão...

- Ah, não se preocupe, eu não fico bravo quando me lembram do Osamu. Pelo contrário, são lembranças boas...

- Você se dava bem com ele, não é?

- É como você disse... a gente gosta dos nossos irmãos, por mais que, às vezes, a gente sinta inveja, ou raiva, ou...

- Pois é...- ela concluiu, baixinho. Fez uma pausa, e por fim, completou: - No final, nossas famílias não são tão diferentes assim.

E, com isso em mente e com um leve sorriso nos lábios, Yolei voltou a se concentrar no computador. Pegou a chave de fenda e apertou alguns parafusinhos. Procurou um pouco mais e deu um pulo quando, finalmente, achou o que estava errado. Como ela previa, havia alguns fios frouxos. Sentindo-se muito satisfeita de suas suspeitas estarem corretas, em pouco tempo arrumou tudo.

- Prontinho, este aqui está pronto! Mas acho que vou deixar para testá-lo mais tarde, sabe?

Antes mesmo que Ken se desse conta, Yolei pegou o gabinete na mão para recolocá-lo na prateleira do armário. Era uma prateleira um pouco alta, até mesmo para ela. Seria um desastre se a garota deixasse cair o gabinete contendo tudo que ela tinha acabado de arrumar.

Ken estava ali para ajudar. E temia que Yolei se desequilibrasse, porque ela já estava apelando para a ponta dos pés. Por isso, sem demora, ajudou-a a conter o peso do gabinete com suas mãos.

- Deixa que eu ajudo!

Só havia um detalhe: ele, sem ter se dado conta disso, estava bem atrás de Yolei. Muito próximo.

Ao sentir aquele contato inesperado, e uma voz tão próxima do seu ouvido que a fazia sentir até a respiração do rapaz, ela sentiu os músculos perderem a força por um instante. Sentiu o coração quase pular uma batida, enquanto uma onda quente varria seu corpo. Foi tudo numa questão de instantes, mas naquele momento, ela, sem reação alguma, não conseguia sustentar mais o peso do gabinete. Ken percebeu que o computador ia cair, e colocou o máximo de sua força num impulso para enpurrá-lo para dentro. O computador ficou na prateleira, mas, por causa do impulso, o garoto caiu de costas no chão, e ela, sem muito equilíbrio, caiu logo depois, também de costas, sobre ele.

A princípio, a primeira reação do rapaz foi um pequeno protesto de dor. Mas quando ia levantar, sentiu que havia algo o fazendo esquecer de que a dor estava ali. Um aroma de lavanda. Mas não era como os aromas de perfumes. Era um aroma diferente, envolvente. Logo ele se deu conta de que aquele delicioso perfume vinha dos cabelos de Yolei.

Ele estava contra as costas dela. Por uma brecha no meio de todos aqueles cabelos, sentiu seu próprio rosto tocá-la na altura da nuca. Sentiu-se imóvel, sem saber se deveria ou não se mexer dali. Algo dizia que o melhor seria deixar o tempo passar, um belo tempo...

Yolei se recuperava daquele estranho choque, alheia a tudo que acontecera logo depois. Mal sabia que estava no chão - ou quase. O que havia sido tudo aquilo? Era compreensível que ela se sentisse um pouco sem jeito, mas aquela sensação avançava além do constrangimento. Avançava além de qualquer coisa que já sentira. E a pegou totalmente de surpresa. Aquilo a incomodava muito, mas, ao mesmo tempo, sua memória não se cansava de repetir aquele momento em sua mente, uma, duas, três vezes...

... até que um par de mãos em seus ombros a trouxe para uma realidade ainda mais inesperada.

Quando ela pensava que estava prestes a se libertar daquele círculo infindável, duas mãos quentes fizeram-na se perder ainda mais naquele vago sonho de segundos. Agora ela percebia, a partir de seus ombros, e ao longo de seu corpo, que o momento que a fizera perder o senso ainda não havia terminado. Tentou dizer algo, mas tudo que saiu dela foi um suspiro sufocado. Ela nem sabia exatamente o que diria se pudesse falar.

- Yolei, você está bem? - perguntou Ken, o dono das mãos. Se a voz dele antes era natural diante dos ouvidos dela, agora parecia ainda mais macia, mais carinhosa... o que estava havendo?

- A-a-a... e-eu... eu estou bem, tudo bem, tudo bem! - ela disse, num pulo, saindo para o lado, livrando-se daquelas mãos e daquela voz que perturbavam seus pensamentos. Ela não conseguia virar-se para ele. Sentia-se num mar de fogo invisível, que só existia dentro de suas veias. A face rubra, os músculos quase paralisados, as reações, meros reflexos.

- Desculpe por te fazer cair...

- Não, eu é que agradeço por... ter... ajudado... - ela disse, ainda de costas para ele, sem muita noção da ajuda que tinha recebido.

- Ora, o que é isso... - ele disse, sorrindo, enquanto se levantava. - Eu vou lá com a sua mãe, ver se as minhas roupas já estão secas, está bem?

- E-eu... já vou! Pode... pode ir na frente.

Ken não fez nenhuma observação em especial sobre aquela resposta, então saiu do quarto sem dizer mais nada. Yolei ficou ali, sentada no chão, a respiração ainda ofegante.

"Mas o que é que me deu? Não aconteceu nada demais. Era só... - e parou por um instante, hesitando em suas palavras, - era só o Ken..."

E o bom amigo Ichijouji não parecia mais "só o Ken". Era estranho, mas, pela primeira vez, ela parou de verdade para pensar sobre quem era o Ken. A imagem do garoto voltou aos pensamentos dela, e ela se lembrou do quanto ele era bonito. Bonito, não. Ela o achava lindo. Sempre achou. Mesmo quando descobriu que ele era o Imperador Digimon. Mesmo quando o odiou do fundo do coração, ela podia enxergar a beleza dele através daquela máscara. Agora, ele tinha um sorriso inocente, olhos serenos, hábitos incorrigíveis, mas era aquela mesma beleza que sempre mexeu com ela, de uma maneira ou de outra.

Mesmo com aquelas roupas largas e usadas do irmão dela, aquele era Ken Ichijouji.

E havia algo de especial nele.

"É melhor... eu ir atrás dele...", ela pensou, com dificuldade, enquanto se levantava. Mesmo sabendo que, quando o encontrasse, não ia saber que cara fazer.


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