Nos
tempos de Descartes
(i)
Introdução
Abaixo uma ilustração de Vietè:
Em 1575, a Europa ocidental já tinha recuperado a maior parte das obras matemáticas existentes, da antiguidade. A álgebra árabe fora perfeitamente dominada e tinha sido aperfeiçoada, tanto pela resolução das cúbicas e quárticas quanto por um uso parcial de símbolos. A época estava quase madura para rápidos progressos, além das contribuições antigas, medievais e renascentistas – mas não completamente. Há na história da matemática um alto grau de continuidade de um período para o seguinte; a transição da Renascença para o mundo moderno se fez através de um grande número de figuras intermediárias.
Algumas delas consideraremos abaixo, sendo que a primeira será François Vietè (1540 - 1603), pois é uma figura central na transição.
(ii) François Viète.
Viète, François. Nasceu em
Fontenay-le-Comte, Poitou (agora Vendée), 1540 e morreu em Paris a 23 fevereiro
1603, aos 63 anos. Advogado ilustre gozou dos favores das cortes de Charles IX,
Henrique III, e Henrique IV.
Embora Viète tivesse muitos
clientes protestantes huguenotes, nunca renunciou sua fé católica. Porém, suas
relações com os huguenotes causaram-lhe dificuldades entre 1584 e 1589, quando
seus inimigos lograram bani-lo da corte.
O primeiro trabalho científico de Viète foi seu conjunto de aulas a Catherine Parthenay, a filha do arcebispo Jean de Parthenay, senhor de Soubise, que veio a ser mãe do Duque de Rohan, o chefe das forças protestantes nos conflitos religiosos da época de Luís XIII. Dessas aulas somente o Principes de cosmographie sobrevive. Este trabalho introduziu sua aluna nos campos da geografia e da astronomia. Seus trabalhos matemáticos estão relacionados à sua cosmologia e à trabalhos na astronomia.
Em 1571 publicou o “Canon
mathematicus, seu ad triangulacum appendicibus” que devia servir de
introdução trigonométrica a seu Harmonicon coeleste, o qual nunca foi
publicado.
Em 1573, Vietè foi apontado
conselheiro parlamentar da Britânia no Reno, e em 1580 ele tornou-se “maitre de
requetes” em Paris, um cargo ligado ao parlamento. Em 1589 ele foi banido por
Henrique III e tornou-se conselheiro do parlamento no Tours.
Durante a guerra contra a
Espanha, ele serviu a Henrique IV,
decodificando cartas interceptadas escritas em códigos.
Viète retornou a Paris em
1594 e a Fontenay-le-Conte em 1597.
A maior contribuição de
Vietè para a historia da álgebra foi “In artem analyticem Isagoge” (Tours,
1591). Seu objetivo era reviver o método explanado por Pappos nesta grande “Coleção”
e para combinar com o método de Diofante.
Abaixo uma ilustração do “In
artem analyticem Isagoge”:
Vietè foi o primeiro a usas
letras, não somente para incógnitas, mas para quantidades conhecidas. Ele usou
as consoantes para as conhecidas e as vogais para desconhecidas ou
indeterminadas.
No
capítulo 3 do “Isagoge”, Viète explanou a “Lei da homogeneidade”, de acordo com
o qual somente magnitudes do “gosto do gênio” pode ser comparado ou somado.
Assim, quando escrevemos uma equação quadrática como:
Bx2 + dx =z.
Viète escreve “B in A quadratum, plus D plano in A, aequari
Z solido”.
A saber, a
lei da homogeneidade de Viète: Se A (nosso X) e B (nosso b) são segmentos de
reta, D tem que ser uma área plana e X um volume. Ele mesmo escreve “D plano” e
"sólido”.
Esta lei
implica uma série de restrições do formalismo algébrico. Como se sabe, Omar
Khayyam tentou burlar esta restrição ao introduzir a unidade do comprimento e. Veremos que Descartes usou
o mesmo truque.
No
capítulo 4, Viète formulou a “regra canônica” do “cálculo de espécies”, que é,
do cálculo com letras, como o oposto para o cálculo com números definidos.
No
capítulo 5, Viète apresenta regras para resolução de equações. Um operador
chamado “antithesis” é o termo de transferência de um lado para outro de
equação, correspondente para o qual os algebristas árabes chamaram de al-jabr.
Outra operação é a divisão de todos os termos de uma equação por uma mesma
“espécie”, e assim segue.
Em 1593
Viète publicou o “Zeteticorum libri quinque” (cinco livros sobre achados). Neste trabalho ele explanou a solução de
vários problemas de soluções determinadas e indeterminadas. Alguns dos destes
foram tirados da “Aritmética” de Diofante. Um exemplo típico é o problema:
dividir um número, o qual é a soma de dois quadrados, em outros dois quadrados.
Em dois
tratados adicionais, ele discute a geometria da solução algébrica de equações.
No primeiro, chamado “Effectionum geometricarum canonica recensio”, ele mostra
que as soluções de equações quadráticas podem ser construídas somente usando
círculos e retas. Por instante, para resolver a equação:
A2 + AB = D2
ou A(A + B) = D2,
Viète constrói dois segmentos perpendiculares B e D, depois
ele traça um semicírculo centrado no ponto médio de B. As duas partes restantes
do diâmetro é igual a A.
No segundo
tratado de Viète “Suplementum geometriae” (1593) ele acrescenta aos postulados
de Euclides sobre construções por retas e círculos mais um postulado, a saber:
“Para traçar uma reta de ponto dado, cruzar algumas das duas retas (reta ou
reta e circulo) tal como a intersecção entre as duas retas é igual a uma
distancia dada”. Na história da matemática grega, construções baseadas sobre
estes postulados eram chamadas “neusis
constructions”.
Por meio
destes postulados, Viète primeiro resolve o problema de construir duas
proporcionais entre dois segmentos de reta dados. A solução deste problema
provém imediatamente dobrando um cubo. Depois, Viète resolve a trisecção de um
ângulo. Pelo mesmo método ele também constrói um pentágono inscrito num
circulo. Finalmente ele mostra que todo problema geométrico conduzindo a
equações cúbicas ou biquadradas pode ser resolvido por neusis constructions.
No mesmo ano de 1593, Viète
decide publicar o livro VIII deste “Variorum de rebus mathematicis
responsorum”. Nos capítulos 1 – 7 deste livro ele discute, uma vez mais, a
duplicação de um cubo, a trisecção de um ângulo, e a construção de um heptágono
regular. No capítulo 8 ele considera a quadratix, no capítulo 11 a lunules que
pode ser quadrada, e no capítulo 16 ele apresenta uma construção de uma
tangente em algum ponto de uma espiral de Arquimedes.
O mais interessante é o
capítulo 18, no qual л é representado por um produto infinito. A área de
um polígono de 2 x 2n lados inscrito num circulo de raio 1 pode ser
escrito como:
2/( C1C2C3...Cn)
C1 =
C2 =
C3 =
e assim segue. Seja n
tendendo a infinito, obtemos:
Π = 2 / ( C1C2C3...).
Em 1593 o matemático
holandês Adrianus Romanus propôs para todos os matemáticos o problema de
resolver uma certa equação de grau 45, a saber:
X45
– 45X43 + 95X41 -
... – 379X3 + 45X = K.
O embaixador da Holanda na
corte do rei da França Henri IV afirmou que ninguém seria capaz de resolver este
problema. O rei em conseqüência disso informou Viète do desafio. Viète disse
que a equação era resolvível por cordas, submetendo um arco de 8 graus em um
círculo de raio 1. Assim, a solução pode ser achada dividindo a circunferência
em 45 partes iguais. Durante a mesma audiência, ele apresentou uma raiz da
equação e no próximo dia todas 23 raízes positivas. Ele publicou esta solução
em 1595 no tratado intitulado “Ad problema, quod omnibus mathematicis totius
orbis construendum proposuit Adrianus Romanus, responsorum”.
Em 1615,
depois da morte de Viète, seu amigo escocês Alexander Anderson publicou em um
volume dois artigos intitulados “De aequationem recognitione” e “De equationem
emendatione”. No artigo, Viète discute vários métodos de transformação de
equações. Por instante, se temos uma raiz D de uma equação, podemos obter uma
equação de baixo grau. Para este, Viète apresenta vários exemplos.
Por
exemplo, seja uma equação cúbica:
(1) BA – A3 = Z
dada, e seja E satisfazendo uma condição:
(2)
E3
– Z = BE.
Para nós,
deste modo - E é uma raiz da equação original (1), mas Viète não reconhecia
raízes negativas. De (1) e (2) ele concluiu:
A3
+ E3 = B.(A + E) ou
(A + E)(A2 – AE + E2) = B.(A + E)
Agora
podemos dividir por (A + e), e obtemos uma equação quadrática para A.
No mesmo
artigo, ele trata com as soluções de equações biquadráticas. Ele apresenta uma
equação biquadrática:
(3) A4 = Z
- BA.
Se (A2E2
+ ¼ E4) é somado para ambos os lados, obtemos:
(4) (A2
+ ½ E2)2 = Z – BA + A2E2 + ¼ E4.
O lado
direito torna-se um quadrado completo, se E satisfaz a equação:
Z
+ ¼ E4 = B2/4E2.
ou
(5) E6
+ 4ZE4 = B4
a qual é uma equação cúbica para E2. O método é
essencialmente o mesmo que a de Ferrari.
No
capítulo 7 do “Emendatione” um novo método é ensinado para resolver a equação
cúbica:
(6) A3
+ 3BA = 2Z
Viète
introduziu uma nova incógnita E na equação:
(7) B =
E(A + E).
Substituindo
(7) em (6), obtemos:
A3
+ 3AE(A + E) = 2Z
e assim,
(8) (A +E)3 = 2Z + E3
De (7) podemos resolver (A +
E) e substitui em (8). Obtemos uma equação quadrática para E3:
(9) B3 = 2ZE3 + E6
o qual podemos resolver por E3 e portanto para
E:
(10) E =
Agora A pode ser formada de
(7). Em contraste, para o método explanado no Ars Magna de Cardano, extraímos
somente uma raiz cúbica. Já, o resultado final é o mesmo como no método de
Cardano, para se introduzirmos outra incógnita E’= A + E, temos:
(H) B =
E’(E’ - A)
e podemos derivar, como antes uma equação quadrática para
E’3:
(I) B3 = E’6 – 2ZE’3
do qual obtemos:
(11) E’ =
Agora A= E’ – E é uma
diferença de duas raízes cúbicas, como no Ars Magna de Cardano.
Viète
conheceu a relação entre as raízes e coeficientes de uma equação.
No
capítulo 10 do “Emendatione” ele formulou um teorema. Assim,
A3 + (- B – D –
G)A2 + (BD + BG + DG)A = BDG
então A é igual a alguma das três quantidades B, D ou G.
Outro
artigo publicado por Anderson é intitulado: “Ad regulares sectiones theoremata”
(teoremas mais gerais sobre divisões de ângulos). Neste artigo, ele considera a
trisecção de um ângulo e usa para obter uma solução trigonométrica de uma
equação cúbica no “casus irredutibilis”. Se colocarmos, com um raio arbitrário
R,
2Rcos= A
2Rcos3 = ±
B
temos a equação:
(12) A3
= 3R2A ± R2B
e cada equação cúbica tem três raízes reais pode ser
reduzida desta forma e resolvida por trigonometria.
(iii)
Simon
Stevin.
Simon Stevin nasceu em 1548
e chegou a Leyden em 1582. Aqui ele publicou vários livros de matemática e
mecânica, todos em holandês. Na sua concepção, a língua holandesa era, de todas
as línguas, a melhor expressão para idéias em geral, e idéias cientificas em
particular. Ainda hoje, várias expressões cunhadas por Stevin são usadas nas
escolas holandesas. Stevin era excelente engenheiro. Ele construiu moinhos,
eclusas, dentre outros. Ele, ao que parece, começou a vida como guarda-livros.
Mas, por conciliar grande formação teórica nas ciências exatas e um espírito
agudamente prático chamou a atenção do príncipe Maurício de Orange. Esta foi à
porta pela qual se tornou engenheiro militar e, posteriormente, comissário de
obras de seu país. Seus trabalhos sobre Estática e Hidrostática o notabilizaram
entre seus contemporâneos, dada à importância do assunto num país com as
características físico-geográficas da Holanda.
Abaixo
uma imagem de Stevin:
O livro de Stevin sobre este
objetivo, chamado “Stercktebouw”, tornou-se muito popular, influenciando um
famoso francês construtor de fortificações, Vauban.
O
mais influente livro seu foi um de 36 páginas intitulado “De thiende” (O
décimo), primeiro publicado em 1585. No mesmo ano ele produziu uma tradução
para o francês: “La Dime”.
Abaixo
uma imagem do “De thiende”:
Através deste livro, as
frações decimais se tornam populares no ocidente, já que eram usadas antes por
chineses e árabes. Também o ponto decimal se populariza.
Com este livro, ele pretendia
ensinar a todos "como efetuar, com facilidade nunca vista, todos os
cálculos necessários entre os homens por meio de inteiros sem frações". A
representação ou forma decimal, provavelmente a principal vantagem da notação
posicional, depois de oito séculos de uso dos numerais indo-arábicos,
finalmente era apresentada de maneira a poder vingar.
Gostando de engenharia,
Stevin não fez distinção entre números racionais e irracionais. Assim, com um
golpe, a restrição clássica de “número” para inteiros (Euclides) ou para
frações racionais (Diofante) foi eliminada. Esta notação geral de um número
real foi aceita, explicitamente, por todos os cientistas.
De
acordo com Descartes, Leibniz e Newton, cada raio de uma reta para outra pode
ser expresso por “número”.
Stevin
também aceitou números negativos como vários de seus predecessores. Contudo ele
não aceitou soluções imaginárias de equações, porque “eles não nos ajudam a
achar soluções reais”.
Neste
livro “Stelreghel” “= Álgebra”, Stevin introduziu várias notações algébricas
simplificadas. Assim, ele usou + e – para adição e subtração, M e D para
multiplicação e divisão, e assim segue.
(iv)
Pierre
de Fermat.
a) Breve
biografia.
Nasce a 17 de agosto de 1601, em Beaumont-de-Lomagne, França e morre a 12 de janeiro de 1665, em Castres, França.
Abaixo uma imagem de Pierre de Fermat:
O pai de Pierre Fermat era um próspero comerciante de couro e segundo cônsul de Beaumont-de-Lomagne. Fermat tinha um irmão e duas irmãs, e foi quase certamente criado em sua cidade de nascimento. Embora haja pouca evidência acerca de sua educação, é quase certo que tenha estudado no monastério Franciscano local.
Ele esteve na Universidade de Toulouse antes de se mudar para Bordeaux na segunda metade dos anos 1620. Em Bordeaux ele começou suas primeiras pesquisas matemáticas sérias e em 1629 ele deu uma cópia de sua restauração do trabalho de Apolônio - Planos - a um dos matemáticos da instituição. Certamente em Bordeaux ele esteve em contato com Beaugrand e durante este período ele produziu importantes trabalhos sobre máximos e mínimos, dados a Etienne d'Espagnet, que claramente compartilhava com Fermat o interesse pela Matemática.
De Bordeaux, Fermat foi para Orléans, onde estudou direito na Universidade. Ele formou-se advogado civil e comprou um escritório no parlamento, em Toulouse. Então, em 1631 Fermat era advogado e oficial do governo em Toulouse e por causa de seu escritório, mudou seu nome para Pierre de Fermat.
Pelo resto de sua vida ele viveu em Toulouse, mas além de trabalhar lá, também trabalhou em sua cidade natal e em Castres. Sua carreira foi meteórica, em parte por tempo de serviço e idade, em parte porque a praga levou a maioria dos mais velhos. Ele mesmo foi atingido pela doença e ficou tão mal que sua morte foi prematuramente anunciada.
Naturalmente Fermat estava preocupado com Matemática. Ele manteve sua amizade com Beaugrand mesmo depois de mudar-se para Toulouse, mas lá ele encontrou um novo amigo em Matemática, Carcavi. Fermat conheceu Carcavi por força de profissão, pois eram colegas como advogados em Toulouse. Mas também compartilhavam o amor pela Matemática e Fermat contou a Carcavi sobre suas descobertas.
Em 1636 Carcavi foi a Paris na condição de bibliotecário real e fez contato com Mersenne e seu grupo. O interesse de Mersenne foi cultivado pelas descrições de Carcavi sobre o trabalho de Fermat acerca de corpos em queda. Carcavi escreveu a Fermat, que respondeu em 26 de abril de 1636, e, além de contar a Mersenne sobre erros que ele acreditava ter encontrado nos trabalhos de Galileu sobre queda livre, ele também contou a Mersenne sobre seus trabalhos em espirais e sobre a restauração do Plano.
É irônico que este contato inicial com Fermat e a comunidade científica tenha sido através de seu estudo sobre queda livre, já que Fermat tinha pouco interesse em aplicações físicas da Matemática. Mesmo com seus resultados em queda livre ele estava muito mais interessado em provar teoremas sobre Geometria do que sua relação com o mundo real. Nesta primeira carta, contudo havia dois problemas sobre máximos que Fermat pediu a Mersenne que fossem passados aos matemáticos de Paris. Aliás, este era o estilo de Fermat: desafiar outros a obter resultados que ele já havia obtido.
Roberval e Mersenne acharam que os problemas propostos por Fermat nesta primeira (e em subseqüentes) carta eram extremamente difíceis e usualmente insolúveis usando as técnicas correntes. Eles pediram a Fermat para divulgar seus métodos e Fermat mandou seu Método para determinar Máximos e Mínimos e Tangentes a Linhas Curvas, sua restauração de Planos e sua aproximação algébrica à Geometria e Introdução aos Planos e Sólidos aos matemáticos de Paris.
Sua reputação como um dos maiores matemáticos do mundo veio rapidamente, mas tentativas de publicar seus trabalhos falhavam, principalmente porque Fermat de fato nunca fez seus trabalhos em uma forma apresentável. Contudo, alguns de seus métodos foram publicados por exemplo no trabalho de Hérigone, Cursus mathematicus, que continha um suplemento com os métodos de Fermat para encontrar máximos e mínimos.
Esta sua maneira de desafiar outros matemáticos logo contribuiu para o acúmulo de inimizades. Uma dessas controvérsias envolveu Descartes. Beaugrand enviou para Fermat o trabalho de Descartes intitulado La Dioptrique para avaliação, mas Fermat deu pouca atenção, dado que estava no meio de uma correspondência com Roberval e Pascal sobre métodos de integração e centros de massa.
Ele afirmava que Descartes não deduziu corretamente sua lei de refração, já que era inerente às suas hipóteses. Dizer que Descartes não gostou é um eufemismo. Rapidamente Descartes encontrou uma razão para ficar ainda mais furioso, ao perceber que o trabalho de Fermat sobre máximos, mínimos e tangentes poderia ofuscar aquele que considerava seu trabalho mais importante, La Geómétrie.
Abaixo uma imagem da obra sobre máximos e mínimos:
Fermat também deixou grandes contribuições em Teoria dos Números, que na época não era muito bem vista. Por causa disso, e também por sua desorganização com os escritos, suas idéias sobre Teoria de Números acabaram não sendo discutidas com outros matemáticos da época.
b) A “Introdução aos planos e
sólidos” de Fermat.
A geometria analítica era inventada quase simultaneamente e independentemente por Fermat e Descartes.
A invenção não era muito difícil, mas de fundamental importância para o desenvolvimento da geometria e álgebra. O primeiro objetivo era resolver problemas geométricos por métodos de álgebra. Por outro lado, o método pode ser usado para aplicar métodos geométricos a problemas algébricos.
A exposição do método de geometria analítica é explanada no livro: “Introdução aos planos e sólidos”. Em janeiro de 1643, enviou este tratado por correspondência a Carcavi.
Abaixo uma imagem do tratado “Introdução aos planos e sólidos”:
No tratado de Fermat uma variável I é determinado por duas coordenadas, no qual ele denota por A e E, usando a notação de Viète.
No principio, o método das coordenadas já tinha sido usado por Apolônio na “Cônica”.
Na “Cônica”, um ponto variável sobre uma seção cônica é determinado por dois segmentos de reta, chamados “abscissa” e “ordenada”. Se o ponto I varia sobre uma seção cônica, há uma relação algébrica definida entre x e y, a qual chamaremos ”symptoma” da curva.
Na cônica, o “symptoma” das três seções cônicas são:
·
Parábola:
y2 = px.
·
Hipérbole:
y2 : x ( x+a ) = p:a.
·
Elipse:
y2 : x ( x-a ) = p:a.
Na “Introdução” de Fermat, a equação da reta através da origem é:
D.A = B.E
Fermat formula este como um teorema:
“Se D.A = B.E, entre no lócus do ponto I é uma reta”.
Neste mesmo caminho a parábola é tratada. Ele mostra:
“Se Aq (que é o quadrado de A) igual a D.E, o ponto I fica sobre uma parábola”.
A equação do circulo é escrita como:
(13) Bq. – Aq. = Eq.
e Fermat prova que todas as equações contém Aq e A e E multiplica com dada quantidade pode ser reduzida para esta equação, provido o ângulo NZI é correto e o coeficiente de Aq é igual ao que de Eq.
No fim deste tratado, Fermat explana um método geral para reduzir alguma equação quadrática em x e y para uma forma especial:
(B) ax = by (segmento de reta)
xy = b (hipérbole)
x2 ± xy = ay2 (par de linhas)
x2 = ay (parábola)
b2 – x2 = y2 (círculo)
b2 – x2 =
ay2 (elipse)
b2 + x2 = ay2 (hipérbole)
Assim, cada equação quadrática em x e y representa uma reta ou uma seção cônica. O mesmo resultado era provado por um diferente método, por Descartes.
(v)
René Descartes
a)
Breve biografia e
histórico da obra.
Ele nasceu a 31 de março de 1596, em La Haye (hoje Descartes), Touraine, França e faleceu a 11 de fevereiro de 1650, em Estocolmo, Suécia.
Abaixo uma imagem de Descartes:
René Descartes foi um filósofo cuja obra, La
Géometre, inclui a aplicação da álgebra à geometria, o que originou a
Geometria Cartesiana.
Descartes foi
educado no colégio Jesuíta de La Flèche, em Anjou, que freqüentou dos oito aos
dezesseis anos. Lá ele aprendeu lógica, filosofia aristotélica tradicional e
matemática. Um fato curioso que teve início nesta época foi que, devido à sua
saúde frágil, era permitido ao jovem Descartes permanecer na cama até onze
horas da manhã. E ele manteve este hábito até o dia de sua morte.
Ainda na escola,
René lançou as bases do trabalho de sua vida. Ele percebeu como eram pequenos
os seus conhecimentos e que a matemática era a única matéria que o atraía. Essa
idéia foi o fundamento do seu modo de pensar.
Terminados os
estudos no colégio, Descartes foi para a universidade de Poitiers, onde se
formou em direito (1616). Depois disso, alistou-se na escola militar de Breda.
Em 1618, começou a estudar matemática sob a tutela do cientista holandês Isaac
Beeckman, e a procurar por uma ciência natural única.
Em 1619,
juntou-se ao exército da Bavária, e começou a viajar pela Europa. Numa dessas
viagens, conheceu Mersenne, que o manteve em contato com o mundo científico por
muitos anos. Em 1628, cansado das viagens e depois de muito ponderar, Descartes
decidiu fixar residência na Holanda, que ele pensava se adequar à sua natureza.
Logo que chegou
a Holanda, começou a trabalhar em seu maior tratado em física: Le Monde, ou Traité de la Lumière.
Quando estava quase terminando, a notícia da condenação de Galileu a prisão
domiciliar chegou aos seus ouvidos, e Descartes achou melhor não publicar sua
obra (e de fato, ela só foi publicada, parcialmente, após a sua morte).
Descartes foi
pressionado por vários de seus colegas cientistas (como Mydorge, Hortensius,
Huygens e Frans van Schooten), a publicar Le Monde.
Ele resistiu, mas escreveu um outro tratado científico intitulado Discours de la méthod pour bien conduire sa raison et chercher la
vérité dans les sciences. Três apêndices a esse trabalho foram La Dioptrique, Les Météores, e La Géometrie. O tratado foi publicado em 1637, em Leiden.
La Géométrie é claramente a parte mais importante da produção
científica de Descartes. A importância desse trabalho é resumida em quatro
pontos:
1. Ela
dá o primeiro passo em direção à teoria das invariâncias, que mais tarde acabou
por desrelativizar o sistema de referência e remover arbitrariedades.
2.
A Álgebra possibilita o reconhecimento de problemas típicos em geometria e o
estabelecimento de relações entre problemas aparentemente desconexos quando
tratados em caráter geométrico.
3. A Álgebra traz para a geometria
princípios naturais de divisão e de hierarquia de métodos.
4. Não somente a álgebra possibilita
a resolução de várias questões em geometria, como fornece múltiplas opções para
isso. Permite que se decidam por métodos mais elegantes, mais rápidos ou mais
completos.
b) O tratado “La Géométrie”.
Abaixo uma
página do tratado La Géométrie:
Nossa notação algébrica é
principalmente devido a René Descartes. Ele introduziu esta notação correta no
inicio deste tratado, o qual os princípios da “geometria analítica” são
explanados.
Descartes inicia dizendo
que “alguns problemas em geometria podem ser reduzidos para tal termo que um
conhecimento de uma certa reta é suficiente para a construção”.
Na geometria, podemos
definir as operações sobre retas correspondendo a operações aritméticas, como a
que no tratado, retas podem ser somadas e subtraídas e somadas.
Na geometria grega, o
produto de dois segmentos de retas é uma reta: não pode ser somado a outro
segmento de reta.
Por outro lado, de acordo
com Descartes, o produto de segmentos de reta é outro segmento de reta. Mesmo
assim, o quociente de dois segmentos de reta é um segmento de reta.
Descartes agora denota o
segmento de reta por a, b,... e escreve:
a + b, a- b, ab,
Ele também escreve,
para a raiz quadrada de a2 + b2.
Assim, todas as notações essenciais da nossa álgebra foram estabelecidas por
Descartes.
Em
contraste com Stevin, Descartes não introduz a notação “número real”. Para ele
mesmo, o quociente de dois segmentos é um segmento. Assim, ele evitaria todas
as dificuldades.
Descartes
a seguir mostra como a equação:
z2 = az +
b2
y2
= -ay + b2
z2 = az – b2
pode ser resolvida geometricamente.
Depois,
Descartes tornou-se o rei dos problemas que foram discutidos por Euclides e
Apolônio, a saber o “problema das três ou quatro retas”. Se três ou quatro
retas estão numa posição, e se segmentos de retas estão num ponto variável em
dados ângulos para estas três ou quatro retas, e se o retângulo sobre dois
destes segmentos é numa dada proporção para o retângulo sobre duas retas
restantes, então é requerida para provar que os pontos situam-se sobre uma dada
seção cônica.
De
acordo com Pappos, Apolônio disse no terceiro livro deste tratado sobre o
“local de três ou quatro retas”, que Euclides não tinha resolvido este
problema, e que ele mesmo também não tinha sido capaz de resolvê-lo
completamente, e que ninguém tinha. “Estes”, disse Descartes, “leva-me a tentar
achar a saída, se pelo meu método próprio, eu posso ir até eles saírem”.
Descartes
depois estabelece que no caso de três ou quatro retas, os requeridos pontos
estão todos sobre as seções cônicas, ou até mesmo em alguns casos sobre um
círculo ou uma reta. Ele agora procede para provar este por seu próprio método
de coordenadas.
É
muito estranho que coordenadas ortogonais são chamadas, depois de latinizado o
nome de Descartes, “coordenadas cartesianas”.
No segundo livro desta
geometria, Descartes procede para investigar a natureza das curvas assim
obtidas. Ele mostra, usando alguns teoremas do primeiro livro de cônicas de
Apolônio, que uma curva é uma seção cônica ou uma reta.
O método de Descartes
pode ser aplicado a alguma determinada curva por uma equação quadrática. O
resultado final é a mesma como que a obtida por Fermat: Cada equação quadrática
em x e y determina uma seção cônica, ou em casos excepcionais uma reta.