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Legião Urbana

Música Para Acampamentos - 1992
Gravações ao vivo e especiais para rádio e televisão
(1985 - 1992)

Música Para Acampamentos - 1992

Música Para Acampamentos, de 92, é uma coletânea que também tem gravações inéditas, músicas ao vivo e sucessos como "O Teatro dos Vampiros", "Fábrica" e "Ainda é Cedo". Além de uma canção inédita: "A Canção do Senhor da Guerra".


DISCO 1

1. Fábrica
2. Daniel Na Cova Dos Leões
3. A Canção Do Senhor Da Guerra
4. O Teatro Dos Vampiros
5. Ainda É Cedo
6. Gimme Shelter
7. Baader - Meinhof Blues
8. A Montanha Mágica
9. Eu Sei
10. "Índios"

DISCO 2

1. A Dança
2. Mais Do Mesmo
3. Soldados
4. "Música Urbana 2"
5. On The Way Home
6. Mauricio
7. Há Tempos
8. Pais e Filhos
9. Faroeste Caboclo
10. Exit Music: Rhapsod In Blue - Instrumental


Fábrica

Nosso dia vai chegar, teremos nossa vez.

Não é pedir demais:

Quero justiça, quero trabalhar em paz.

Não é muito o que lhe peço –

Eu quero trabalho honesto

Em vez de escravidão.

Deve haver algum lugar

Onde o mais forte não consegue escravizar

Quem não tem chance.

De onde vem a indiferença

Temperada a ferro e fogo?

Quem guarda os portões da fábrica.

O céu já foi azul, mas agora é cinza

E o que era verde aqui já não existe mais.

Quem me dera acreditar

Que não acontece nada de tanto brincar com fogo.

Que venha o fogo então.

Esse ar deixou minha vista cansada,

Nada demais.

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Daniel Na Cova Dos Leões

Aquele gosto amargo do teu corpo

Ficou na minha boca por mais tempo:

De amargo e então salgado ficou doce,

Assim que o teu cheiro forte e lento

Fez casas no meu braço e ainda leve

E forte e cego e tenso fez saber

Que ainda era muito e muito pouco.

Faço nosso o meu segredo mais sincero

E desafio o instinto dissonante.

A insegurança não me ataca quando erro

E o teu momento passa a ser o meu instante.

E o teu medo de Ter medo de Ter medo

Não faz da minha força confusão:

Teu corpo é o meu espelho e em ti navego

E sei que a tua correnteza não tem direção.

Mas, tão certo quanto o erro de ser barco a motor

E insistir em usar os remos,

É o mal que a água faz, quando se afoga

E o salva-vidas não está lá porque não vemos.

Topo


A Canção Do Senhor Da Guerra

Existe alguém esperando por você

Que vai comprar a sua juventude

E convencê-lo a vencer

Mais uma guerra sem razão

Já são tantas as crianças com armas na mão

Mas explicam novamente que a guerra gera empregos

E aumenta a produção.

Uma guerra sempre avança a tecnologia

Mesmo sendo guerra santa

Quente, morna ou fria

Pra que exportar comida

Se as armas dão mais lucros na exportação?

Existe alguém que está contando com você

Pra mudarem o seu lugar

Já que nessa guerra não é ele quem vai morrer

E quando longe de casa

Ferido e com frio o inimigo você espera

Ele estará com outros velhos

Inventando novos jogos de guerra

Que belíssimas cenas de destruição

Não teremos mais problemas

Com a superpopulação

Veja que uniforme lindo fizemos pra você

E lembre-se sempre que Deus está do lado

De quem vai vencer

Existe alguém que está contando com você

Pra lutar em seu lugar

Já que nessa guerra não é ele quem vai morrer

E quando longe de casa

Ferido e com frio o inimigo você espera

Ele estará com outros velhos

Inventando novos jogos de guerra

Que belíssimas cenas de destruição

Não teremos mais problemas

Com a superpopulação

Veja que uniforme lindo fizemos pra você

E lembre-se sempre que Deus está do lado

De quem vai vencer

O senhor da Guerra não gosta de crianças

O senhor da Guerra não gosta de crianças...

Topo


O Teatro Dos Vampiros

Sempre precisei de um pouco de atenção

Acho que não sei quem sou

Só sei do que não gosto

E destes dias tão estranhos

Fica a poeira se escondendo pelos cantos.

Este é o nosso mundo:

O que é demais nunca é o bastante

E a primeira vez é sempre a última chance.

Ninguém vê onde chegamos:

Os assassinos estão livres, nós não estamos.

Vamos sair – mas não temos mais dinheiro

Os meus amigos todos estão procurando emprego

Voltamos a viver como há dez anos atrás

E a cada hora que passa

Envelhecemos dez semanas.

Vamos lá, tudo bem – eu só quero me divertir.

Esquecer, dessa noite ter um lugar legal pra ir

Já entregamos o alvo e a artilharia

Comparamos nossas vidas

E esperamos que um dia

Nossas vidas possam se encontrar.

Quando me vi tendo que viver comigo apenas

E com o mundo

Você me veio como um sonho bom

E me assustei

Não sou perfeito

Eu não esqueço

A riqueza que nós temos

Ninguém consegue perceber

E de pensar nisso tudo, eu, homem feito

Tive medo não consegui dormir.

...Comparamos nossas vidas

E mesmo assim, não tenho pena de ninguém.

Topo


Ainda É Cedo

Uma menina me ensinou

Quase tudo que eu sei

Era quase escravidão

Mas ela me tratava como um rei

Ela fazia muitos planos

Eu só queria estar ali

Sempre ao lado dela

Eu não tinha aonde ir

Mas, egoísta que eu sou,

Me esqueci de ajudar

A ela como ela me ajudou

E não quis me separar.

Ela também estava perdida

E por isso se agarrava a mim também

E eu me agarrava a ela

Porque eu não tinha mais ninguém

E eu dizia: - Ainda é cedo.

Sei que ela terminou

O que eu não comecei

E o que ela descobriu

Eu aprendi também, eu sei.

Ela falou: - Você tem medo.

Aí eu disse: - Quem tem medo é você.

Falamos o que não devia

Nunca ser dito por ninguém

Ela me disse:

Eu não sei mais o que eu sinto por você.

Vamos dar um tempo, um dia a gente se vê.

E eu dizia : - Ainda é cedo.

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Baader-Meinhof Blues

A violência é tão fascinante

E nossas vidas são tão normais

E você passa de noite e sempre vê

Apartamentos acesos

Tudo parece ser tão real

Mas você viu esse filme também.

Andando nas ruas

Pensei que podia ouvir

Alguém me chamando

Dizendo meu nome.

Já estou cheio de me sentir vazio

Meu corpo é quente e estou sentindo frio

Todo mundo sabe e ninguém quer mais saber

Afinal, amar o próximo é tão demodé.

Essa justiça desafinada

É tão humana e tão errada

Nós assistimos televisão também

Qual é a diferença?

Não estatize meus sentimentos

Pra seu governo,

O meu estado é independente.

Já estou cheio de me sentir vazio

Meu corpo é quente e estou sentindo frio

Todo mundo sabe e ninguém quer mais saber

Afinal, amar o próximo é tão demodé.

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A Montanha Mágica

Sou meu próprio líder: ando em círculos

Me equilibro entre dias e noites

Minha vida toda espera algo de mim

Meio-sorriso, meia-lua, toda tarde.

Minha papoula da Índia

Minha flor da Tailândia

És o que tenho de suave

E me fazes tão mal.

Ficou logo o que tinha ido embora

Estou só um pouco cansado

Não sei se isto termina logo

Meu joelho dói

E não há nada a fazer agora.

Para que servem os anjos?

A felicidade mora aqui comigo

Até segunda ordem

Um outro agora vive minha vida

Sei o que ele sonha, pensa e sente

Não é coincidência a minha indiferença

Sou uma cópia do que faço

O que temos é o que nos resta

E estamos querendo demais.

Minha papoula da Índia

Minha flor da Tailândia

És o que tenho de suave

E me fazes tão mal.

Existe um descontrole

que corrompe cresce

Pode até ser, mas estou pronto

pra mais uma

O que é que desvirtua e ensina?

O que fizemos de nossas

próprias vidas?

O mecanismo da amizade,

A matemática dos amantes –

Agora só artesanato:

O resto são escombros.

Mas é claro que não vamos lhe fazer mal

Nem é por isso que estamos aqui

Cada criança com seu próprio canivete

Cada líder com seu próprio .38

Minha papoula da Índia

Minha flor da Tailândia

Chega – vou mudar a minha vida.

Deixa o copo encher até a borda

Que eu quero um dia de sol n’ um copo d’água.

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Eu Sei

Sexo verbal não faz meu estilo

Palavras são erros e os erros são seus

Não quero lembrar que eu erro também

Um dia pretendo tentar descobrir

Porque é mais forte quem sabe mentir

Não quero lembrar que eu minto também

Eu sei

Feche a porta do seu quarto

Porque se toca o telefone pode ser alguém

Com quem você quer falar

Por horas e horas e horas

A noite acabou, talvez tenhamos que fugir sem você

Mas não, não vá agora, quero honras e promessas

Lembranças e estórias

Somos pássaro novo longe do ninho

Eu sei

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"Índios"

Quem me dera, ao menos uma vez,

Ter de volta todo ouro que entreguei

A quem conseguiu me convencer

Que era prova de amizade

Se alguém levasse embora até o que eu não tinha.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Esquecer que acreditei que era por brincadeira

Que se cortava sempre um pano-de-chão

De linho nobre e pura seda.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Explicar o que ninguém consegue entender:

Que o que aconteceu ainda está por vir

E o futuro não é mais como era antigamente.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Provar que quem tem mais do que precisa Ter

Quase sempre se convence que não tem o bastante

E fala demais, por não Ter nada a dizer.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Que o mais simples fosse visto como o mais importante,

Mas nos deram espelhos

E vimos um mundo doente.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Entender como um só Deus ao mesmo tempo é três

E esse mesmo Deus foi morto por vocês

Só maldade então, deixar um Deus tão triste.

Eu quis o perigo e até sangrei sozinho.

Entenda – assim pude trazer você de volta para mim,

Quando descobri que é sempre só você

Que me entende do início ao fim

E é só você que tem a cura para o meu vício

De insistir nessa saudade que eu sinto

De tudo que eu ainda não vi.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Acreditar por um instante em tudo que existe

E acreditar que o mundo é perfeito

E que todas as pessoas são felizes.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Fazer com que o mundo saiba que seu nome

Está em tudo e mesmo assim

Ninguém lhe diz ao menos obrigado.

Quem me dera, ao menos uma vez,

Como a mais bela tribo, dos mais belos índios,

Não ser atacado por ser inocente.

Eu quis o perigo e até sangrei sozinho.

Entenda – assim pude trazer você de volta para mim,

Quando descobri que é sempre só você

Que me entende do início ao fim

E é só você que tem a cura para o meu vício

De insistir nessa saudade que eu sinto

De tudo que eu ainda não vi.

Nos deram espelhos e vimos um mundo doente –

Tentei chorar e não consegui.

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A Dança

Não sei o que é direito

Só vejo preconceito

E a sua roupa nova

É só uma roupa nova

Você não tem idéias

Pra acompanhar a moda

Tratando as meninas

Como se fossem lixos

Ou então espécie rara

Só a você pertence

Ou então espécie rara

Que você não respeita

Ou então espécie rara

Que é só um objeto

Pra usar e jogar fora

Depois de ter prazer.

Você é tão moderno

Se acha tão moderno

Mas é igual a seus pais

É só questão de idade

Passando dessa fase

Tanto fez e tanto faz.

Você com suas drogas

E as suas teorias

E a sua rebeldia

E a sua solidão

Vive com seus excessos

Mas não tem mais dinheiro

Pra comprar outra fuga

Sair de casa então.

Então é outra festa

É outra Sexta-Feira

Que se dane o futuro

Você tem a vida inteira

Você é tão esperto

Você está tão certo

Mas você nunca dançou

Com ódio de verdade.

Você é tão esperto

Voc6e está tão certo

Que você nunca vai errar

Mas a vida deixa marcas

Tenha cuidado

Se um dia você dançar.

Nós somos tão modernos

Só não somos sinceros

Nos escondemos mais e mais

É só questão de idade

Passando dessa fase

Tanto fez e tanto faz.

Você é tão esperto

Você está tão certo

Que você nunca vai errar

Mas a vida deixa marcas

Tenha cuidado

Se um dia você dançar.

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Mais do Mesmo

Ei menino branco o que é que você faz aqui

Subindo o morro pra tentar se divertir

Mas já disse que não tem

E você ainda quer mais

Por que você não me deixa em paz?

Desses vinte anos nenhum foi feito pra mim

E agora você quer que eu fique assim igual a você

É mesmo, como vou crescer se nada cresce por aqui?

Quem vai tomar conta dos doentes?

E quando tem chacina de adolescentes

Como é que você se sente?

Em vez de luz tem tiroteio no fim do túnel.

Sempre mais do mesmo

Não era isso que você queria ouvir?

Bondade sua me explicar com tanta determinação

Exatamente o que eu sinto, como eu penso e como sou

Eu realmente não sabia que eu pensava assim

E agora você quer um retrato do país

Mas queimaram o filme

E enquanto isso, na enfermaria

Todos os doentes estão cantando sucessos populares

(e todos os índios foram mortos).

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Soldados

Nossas meninas estão longe daqui

Não temos com quem chorar e nem pra onde ir

Se lembra quando era só brincadeira

Fingir ser soldado a tarde inteira?

Mas agora a coragem que temos no coração

Parece medo da morte mas não era então.

Tenho medo de lhe dizer o que eu quero tanto

Tenho medo e eu sei porque:

Estamos esperando.

Quem é o inimigo?

Quem é você?

Nos defendemos tanto tanto sem saber

Porque lutar.

Nossas meninas estão longe daqui

E de repente eu vi você cair

Não sei armar o que eu senti

Não sei dizer que vi você ali.

Quem vai saber o que você sentiu?

Quem vai saber o que você pensou?

Quem vai dizer agora o que eu não fiz?

Como explicar pra você o que eu quis

Somos soldados

Pedindo esmola

E a gente não queria lutar.

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Música Urbana 2

Em cima dos telhados as antenas de TV tocam música urbana,

Nas ruas os mendigos com esparadrapos podres cantam música urbana,

Motocicletas querendo atenção às três da manhã –

É só música urbana.

Os PM’s armados e as tropas de choque vomitam música urbana

E nas escolas as crianças aprendem a repetir a música urbana.

Nos bares os viciados sempre tentam conseguir a música urbana.

O vento forte seco e sujo em cantos de concreto

Parece música urbana.

E nos pontos de ônibus estão todos ali: música urbana.

Os uniformes

Os cartazes

Os cinemas

E os lares

Nas favelas

Coberturas

Quase todos os lugares.

E mais uma criança nasceu.

Não há mentiras nem verdades aqui.

Só há música urbana.

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On The Way Home

Neil Young

When the dream came I held my breath with my eyes closed

I went insane, like a smoke ring day When the wind blows

Now I won't be back till later ron If I do came back at all

But you know me, and I miss you now.

In a strange game I saw my self as you knew me

When the change came, and you had a chance to see through me

Though the other side is just the same

You can tell my dream is real Because I love you can you see me now

Though we rush ahead to save our time We are only what we feel

And I love you, can you feel it now.

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Maurício

Já não sei dizer se ainda sei sentir.

O meu coração já não me pertence.

Já não quer mais me obedecer.

Parece agora estar tão cansado quanto eu.

Até pensei que era mais por não saber que ainda sou capaz de acreditar.

Me sinto tão só e dizem que a solidão até que me cai bem.

Às vezes faço planos. Às vezes quero ir

Para algum país distante e voltar a ser feliz.

Já não sei dizer o que aconteceu.

Se tudo que sonhei foi mesmo um sonho meu.

Se meu desejo então já se realizou.

O que fazer depois, pra onde é que eu vou?

Eu vi você voltar pra mim.

Topo


Há Tempos

Parece cocaína, mas é só tristeza, Talvez tua cidade.

Muitos temores nascem do cansaço e da solidão.

E o descompasso e o desperdício

herdeiros são agora da virtude que perdemos.

Há tempos tive um sonho não me lembro não me lembro.

Tua tristeza é tão exata e hoje o dia é tão bonito.

Já estamos acostumados a não termos mais nem isso.

Os sonhos vêm e os sonhos vão. O resto é imperfeito.

Disseste que se tua voz tivesse força igual

à imensa dor que sentes teu grito acordaria não só a tua casa

mas a vizinhança inteira.

E há tempos nem os santos têm ao certo a medida da maldade.

Há tempos são os jovens que adoecem.

Há tempos o encanto está ausente

e há ferrugem nos sorrisos e só o acaso estende os braços

a quem procura abrigo e proteção

Meu amor, disciplina é liberdade.

Compaixão é fortaleza. Ter bondade é Ter coragem.

E ela disse: - Lá em casa tem um poço mas a água é muito limpa.

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Pais e Filhos

Estátuas e cofres e paredes pintadas ninguém sabe o que aconteceu.

Ela se jogou da janela do quinto andar.

Nada é fácil de entender. Dorme agora: É só o vento lá fora.

Quero colo. Vou fugir de casa. Posso dormir aqui com vocês?

Estou com medo Tive um pesadelo Só vou voltar depois das três.

Meu filho vai Ter nome de santo Quero o nome mais bonito.

É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã

Porque se você parar pra pensar, Na verdade não há.

Me diz porque é que o céu é azul?

Me explica a grande fúria do mundo.

São meus filhos que tomam conta de mim.

Eu moro com a minha mãe, mas meu pai vem me visitar.

Eu moro na rua, não tenho ninguém.

Eu moro em qualquer lugar.

Já morei em tanta casa que nem me lembro mais.

Eu moro com meus pais.

É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã

Porque se você parar pra pensar, Na verdade não há.

Sou uma gota d’água. Sou um grão de areia.

Você me diz que seus pais não entendem,

Mas você não entende seus pais.

Você culpa seus pais por tudo

E isso é absurdo: São crianças como você.

O que você vai ser quando você crescer?

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Faroeste Caboclo

Não tinha medo, o tal João de Santo Cristo,

Era o que todos diziam quando ele se perdeu.

Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda

Só pra sentir no seu sangue o ódio que Jesus lhe deu.

Quando criança só pensava em ser bandido,

Ainda mais quando com um tiro de soldado o pai morreu

Era o terror da cercania onde morava

E na escola até o professor com ele aprendeu.

Ia pra igreja só pra roubar o dinheiro

Que as velhinhas colocavam na caixinha do altar.

Sentia mesmo que era mesmo diferente

E sentia que aquilo ali não era o seu lugar.

Ele queria sair para ver o mar

E as coisas que ele via na televisão

Juntou dinheiro para poder viajar

E de escolha própria escolheu a solidão.

Comia todas as menininhas da cidade

De tanto brincar de médico, aos doze era professor.

Aos quinze, foi mandado pro reformatório

Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror.

Não entendia como a vida funcionava –

Discriminação por causa da sua classe ou sua cor

Ficou cansado de tentar achar resposta

E comprou uma passagem, foi direto a Salvador

E lá chegando foi tomar um cafezinho

E encontrou um boiadeiro com quem foi falar

E o boiadeiro tinha uma passagem e ia perder a viagem

Mas João foi lhe salvar.

Dizia ele: - Estou indo pra Brasília,

Neste país lugar melhor não há.

Estou precisando visitar a minha filha

Eu fico aqui e você vai no meu lugar.

E João aceitou sua proposta e num ônibus entrou no Planalto Central

Ele ficou bestificado com a cidade

Saindo da rodoviária, viu as luzes da Natal.

Meu Deus, mas que cidade linda,

No ano-novo eu começo a trabalhar.

Cortar madeira, aprendiz de carpinteiro

Ganhava cem mil por mês em Taguatinga.

Na Sexta-feira ia pra zona da cidade

Gastar todo o seu dinheiro de rapaz trabalhador

E conhecia muita gente interessante

Até um neto bastardo do seu bisavô:

Um peruano que vivia na Bolívia

E muitas coisas trazia de lá

Seu nome era Pablo e ele dizia

Que um negócio ele ia começar.

E o Santo Cristo até a morte trabalhava

Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar

E ouvia às sete horas o noticiário

Que sempre dizia que o seu ministro ia ajudar

Mas ele não queria mais conversa e decidiu que,

Como Pablo, ele ia se virar

Elaborou mais uma vez seu plano santo

E, sem ser crucificado, a plantação foi começar.

Logo logo os malucos da cidade souberam da novidade:

Tem bagulho bom aí!

E João de Santo Cristo ficou rico

E acabou com todos os traficantes dali.

Fez amigos, frequentava a Asa Norte

E ia pra festa de rock, pra se libertar

Mas de repente

Sob uma má influência dos boyzinhos da cidade

Começou a roubar

Já no primeiro roubo ele dançou

E pro inferno ele foi pela primeira vez

Violência e estupro do seu corpo

Vocês vão ver, eu vou pegar vocês.

Agora o Santo Cristo era bandido

Destemido e temido no Distrito Federal.

Não tinha nenhum medo de polícia

Capitão ou traficante, playboy ou general.

Foi quando conheceu uma menina

E de todos os pecados ele se arrependeu.

Maria Lúcia era uma menina linda

E o coração dele

Pra ela o Santo Cristo prometeu

Ele dizia que queria se casar

E carpinteiro ele voltou a ser

Maria Lúcia pra sempre vou te amar

E um filho com você eu quero ter.

O tempo passa e um dia vem a porta um senhor de alta classe com dinheiro na mão

E ele faz uma proposta indecorosa e diz que espera uma resposta.

Uma resposta de João:

Não boto bomba em banca de jornal, nem em colégio de criança

Isso eu não faço não

E não protejo general de dez estrelas que fica atrás da mesa com o cú na mão.

E é melhor o senhor sair da minha casa

Nunca brinque com um Peixes de ascendente Escorpião.

Mas antes de sair, com um ódio no olhar, o velho disse:

Você perdeu sua vida, meu irmão.

Você perdeu a sua vida meu irmão. Você perdeu a sua vida meu irmão.

Essas palavras vão entrar no coração

E eu vou sofrer as consequências como um cão.

Não é que o Santo Cristo estava certo

E seu futuro era incerto e ele não foi trabalhar

Se embebedou e no meio da bebedeira descobriu que tinha outro trabalhando em sue lugar.

Falou com Pablo que queria um parceiro

E também tinha dinheiro e queria se armar

Pablo trazia o contrabando da Bolívia e Santo Cristo revendia em Planaltina.

Mas acontece que um tal de Jeremias, traficante de renome, apareceu por lá

Ficou sabendo dos planos de Santo Cristo

E decidiu que, com João ele ia acabar.

Mas Pablo trouxe uma Winchester-22

E Santo Cristo já sabia atirar

E decidiu usar a arma só depois que Jeremias começasse a brigar.

(O Jeremias, maconheiro sem-vergonha,

organizou a Rockonha

E fez todo mundo dançar.)

Desvirginava mocinhas inocentes

E dizia que era crente mas não sabia rezar.

E Santo Cristo há muito não ia pra casa

E a saudade começou a apertar

Eu vou embora, eu vou ver Maria Lúcia

Já está em tempo de a gente se casar.

Chegando em casa então ele chorou

E pro inferno ele foi pela segunda vez

Com Maria Lúcia, Jeremias se casou

E um filho nela ele fez.

Santo Cristo era só ódio por dentro e então o Jeremias pra um duelo ele chamou

Amanhã às duas horas na Ceilândia, em frente ao lote 14, é pra lá que eu vou

E você pode escolher as suas armas que eu acabo mesmo com você, seu porco traidor

E mato também Maria Lúcia, aquela menina falsa pra quem jurei o meu amor

Santo Cristo não sabia o que fazer

Quando viu o repórter na televisão

Que deu notícia do duelo na TV

Dizendo a hora e o local e a razão

No Sábado então, às duas horas, todo o povo

Sem demora foi lá só pra assistir

Um homem que atirava pelas costas e acertou o Santo Cristo

E começou a sorrir.

Sentindo o sangue na garganta,

João olhou pras bandeirinhas e pro povo a aplaudir

E olhou pro sorveteiro e pras câmeras e

A gente da TV que filmava tudo ali.

E se lembrou de quando era uma criança e de tudo que vivera até ali

E decidiu entrar de vez naquela dança

Se a via-crucis virou circo, estou aqui.

E nisso o sol cegou seus olhos e então Maria Lúcia ele reconheceu.

Ela trazia a Winchester-22

A arma que seu primo Pablo lhe deu.

Jeremias, eu sou homem, coisa que você não é.

E não atiro pelas costas não.

Olha pra cá filha da puta, sem-vergonha,

Dá uma olhada no meu sangue

E vem sentir o seu perdão.

E Santo Cristo com a Winchester-22

Deu cinco tiros no bandido traidor

Maria Lúcia se arrependeu depois

E morreu junto com João, seu protetor.

E o povo declarava que João Santo Cristo era santo porque sabia morrer

E a alta burguesia da cidade não acreditou na estória que eles viram na TV

E João não conseguiu o que queria quando veio pra Brasília, com o Diabo ter

Ele queria era falar pro presidente,

Pra ajudar toda essa gente

Que só faz sofrer.

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