A ARTE DE CONSCIÊNCIA E LUTA DE MAURÍCIO PESTANA
Interessante notar que,em um país como o nosso,onde a presença negra é tão grande,
tenhamos pouquíssimos representantes desta etnia em nosso ramo de cartuns e quadrinhos.Me lembro do roteirista e escritor Júlio Emílio Braz,de Maurício Pestana,e de quem mais?Se tem mais alguém,não estou sabendo.
Conheci á pouco tempo o trabalho de Maurício Pestana,fiquei espantado por não conhecê-lo.Tomei contato com sua obra
através de 2 trabalhos:A coletânea,em formatinho de "Racista eu?De jeito nenhum",126pgs,editora Escala; e o álbum "Violência Histórica" 50pgs-Ópera Gráfica.
Pestana iniciou seu trabalho à mais de 20 anos,no Pasquim.Seu olhar crítico e consciente sempre esteve atento aos problemas dos brasileiros,especialmente na questão do racismo.Em "Racista eu!?De jeito nenhum",ele reúne vários cartuns,(a maioria deles coloridos)que publicou em sua carreira sobre a temática do racismo.
Combatente,instigante,ácido,impactante(se bem que algumas vezes ingênuo e panfletário demais),Pestana dá conta do recado muito bem.Assuntos como violência policial,falta de perspectiva,a dura vida dos afro-brasileiros são uma constante em seus trabalhos .
Pestana é muito mais militante que humorista.Não dá para tratar com muito humor um tema tão delicado como esse.
O cartunista conseguiu realizar um ótimo trabalho com esta coletânea que é uma espécie de equivalente visual à luta do movimento rap nacional.
Já em "Violência Histórica",ele fala sobre o drama de uma família negra,desde a retirada forçada da África,passando todo o terror da escravidão,e vindo desembarcar nos dias atuais,onde a luta dos afrodecendentes continua maisforte do que nunca!
O desenho deste,se podemos cháma-lo assim,álbum de quadrinhos,não ajuda muito.Está certo que a intenção de Pestana não foi mostrar desenhos virtuosos,nem é este seu estilo,mas a parte visual deixa mesmo a desejar.
O estilo de Pestana não caiu bem com esta história.Outro fator que também prejudicou foi a falta de cores.
E o texto,apesar de ser legal,algumas vezes beira a ingênuidade.Por exemplo,é do conhecimento de todos que sabem da história da escravidão,que havia guerras entre as tribos africanas,e as tribos vencedoras costumavam vender muito dos derrotados(prisioneiros) para os mercadores brancos.
Sim,eram vendidos como escravos!Pestana tenta aliviar este fato,dizendo que as tribos vencedoras só vendiam seus prisioneiros para os brancos porque estes prometiam dar uma vida melhor para os guerreiros derrotados.Ora,dá um tempo! Quem seria tão ingênuo a ponto de acreditar nisso?É muito maniqueísmo,a velha história;todo branco era mau e todo africano era bonzinho.
Em relação aos brancos,está certo.Naquela época todos,ou quase todos os brancos foram mesmo terríveis demônios para o povo negro.Mas e quanto aos africanos?Será que eram todos santinhos,dotados apenas de maravilhosas qualidades,sem nenhum defeito?Será que não havia entre eles rivalidade tribal,ganância,sentimento de vingança,ódio etc?
Quem em sã consciência poderia imaginar que,ao vender ou trocar por presentes seres humanos,afastando-os de sua terra natal e enviando-os à um lugar distante,totalmente desconhecido,eles teriam vida melhor?Essa é difícil de engolir!Será que eles não foram negociados simplesmente por ódio ou sentimento de vingança?Ou mesmo ganância?
De qualquer forma este álbum é muito bom.Traça um indispensável panorama da saga dos afro-descendentes em nosso país.Dois ótimos e importantes trabalhos de Maurício Pestana.Tenho algumas sugestões para este nosso querido cartunista:Que tal contar,também em forma de álbum de quadrinhos, a experiência que ele viveu nos Estados Unidos,ao conhecer as comunidades negras de lá?
Falando em States,uma abordagem sobre a perigosa e crescente "Klu Klux Klan"também seria interessante.No mais é isso aí! Continue firme Pestana,pois todo cidadão negro deste país(e de outros países)sabe o que é andar de madrugada,e de repente,dar de cara com um camburão!O sangue gela,né mano?
Abaixo toda forma de discriminação,e que venham mais trabalhos como esse.
Ademir de Paula