HISTÓRIAS
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Contar
histórias a uma criança pequena é uma atividade bastante corriqueira, nas mais
diversas culturas do mundo e em várias situações, tanto no âmbito familiar como
no escolar. Como se sabe, essa prática vem se reproduzindo através dos tempos
de maneira quase intuitiva. Contudo, alguns estudos já demonstraram o
importante papel que as histórias desempenham nos processos de aquisição e
desenvolvimento da linguagem humana.
As histórias
infantis são utilizadas geralmente pelos adultos interlocutores (sejam pais,
professores ou terapeutas) como forma de entretenimento ou distração; já que,
pelo senso comum, freqüentemente a criança sempre demonstra um interesse
especial por elas, seja qual for a classe social à qual
pertença.
Especificamente
em se tratando da aquisição da leitura e da escrita, essas histórias podem
oferecer muito mais do que o universo ficcional que desvelam e a importância
cultural que carregam como transmissoras de valores sociais.
Existe uma acentuada
diferença entre as histórias contadas e as histórias lidas para
uma criança, já que a linguagem se reveste de qualidade estética quando
escrita, e essa diferença já pode ser percebida por ela. Britton
(apud Kato, 1997:41) já afirmava que, "ao ouvir histórias, a criança vai
construindo seu conhecimento da linguagem escrita, que não se limita ao
conhecimento das marcas gráficas a produzir ou a interpretar, mas envolve
gênero, estrutura textual, funções, formas e recursos lingüísticos. Ouvindo
histórias, a criança aprende pela experiência a satisfação que uma história
provoca; aprende a estrutura da história, passando a ter consideração pela
unidade e seqüência do texto; associações convencionais que dirigem as nossas
expectativas ao ouvir histórias; o papel esperado de um lobo, de um leão, de
uma raposa, de um príncipe; delimitadores iniciais e finais ('era uma vez... e
viveram felizes para sempre') e estruturas lingüísticas mais elaboradas,
típicas da linguagem literária. Aprende pela experiência o som de um texto
escrito lido em voz alta".
Essa forma de
contato com a linguagem escrita, por outro lado, também oferece, ainda que
subliminarmente, informações sobre um dos papéis funcionais que ela pode
desempenhar dentro da comunicação.
Do ponto de vista
psicológico, podemos refletir sobre o impacto e a fascinação que as histórias
exercem sobre a criança, de qualquer raça, faixa etária ou inserção social,
tanto normal quanto portadora de algum distúrbio (de origem física, psíquica ou
funcional). As histórias são um denominador comum a todas as crianças.
Assim, para que
uma história realmente prenda a atenção da criança, deve entretê-la e despertar
sua curiosidade. Mas, para enriquecer sua vida, deve estimular sua imaginação,
ajudando-a em seu desenvolvimento intelectual, propiciando-lhe mais clareza em
seu universo afetivo, auxiliando-a a reconhecer, mesmo de forma inconsciente,
alguns de seus problemas e oferecendo-lhe perspectivas de soluções, mesmo
provisórias.
Muito mais do
que um adulto, a criança vive as experiências do tempo presente, e possui
apenas vagas noções do futuro, mesmo assim de caráter imediato. Portanto, suas
ansiedades frente a eventuais problemas e angústias do cotidiano são
supostamente bastante profundas, e é justamente no enriquecimento de seus
recursos internos para enfrentá-las que as histórias infantis são um benefício.
"É exatamente a mensagem que os contos de fada transmitem à criança de
forma múltipla: que uma luta contra dificuldades graves na vida é inevitável, é
parte intrínseca da existência humana ¾ mas que, se a
pessoa não se intimida mas se defronta de modo firme com as opressões
inesperadas e muitas vezes injustas, ela dominará todos os obstáculos, e ao fim
emergirá vitoriosa" (Bettelheim, 1985). Segundo
o autor, que elegeu especialmente os contos de fada e suas relações benéficas
para o desenvolvimento psíquico da criança como objeto de seus estudos, a
maioria das histórias tem seu enredo desenvolvido baseando-se na equação:
estabilidade + problema + solução = estabilidade, e trabalha assim uma série de
ansiedades da criança. Especialmente os contos de fada que tratam de assuntos
existenciais, como morte de progenitores, perigos, o mal e o bem, etc. Eles
colocam dilemas existenciais de forma simples e categórica, o que possibilita à
criança experienciar o problema de forma mais
essencial e trabalhar suas angústias com mais nitidez. Ele ainda coloca que,
"aplicando o modelo psicanalítico da personalidade humana, os contos de
fada transmitem importantes mensagens à mente consciente, à
pré-consciente e à inconsciente, em qualquer nível que esteja funcionando no
momento. Lidando com problemas humanos universais, particularmente os que
preocupam o pensamento da criança, estas histórias falam ao ego em germinação e
encorajam seu desenvolvimento, enquanto ao mesmo tempo aliviam as pressões
pré-conscientes e inconscientes. À medida que as histórias se desenrolam, dão
validade e corpo às pressões do id, mostrando caminhos para satisfazê-las que
estão de acordo com as requisições do ego e do superego" (Bettelheim, 1985).
Tratando também
dessa dimensão, segundo Winnicott (apud Postic, 1993:18), todos nós necessitamos de uma área de
ilusão paralela ao mundo real (ou das trocas sociais). Esse espaço interno é
responsável pela transição entre o consciente e o inconsciente, movimento que
garante o equilíbrio do indivíduo. Por suas atividades diárias, a criança tem
contato com o real, com os outros. Ao mesmo tempo, sua imaginação se
desenvolve, pois ela toma consciência de seus limites, vive conflitos,
experimenta emoções contraditórias e tem muitas dúvidas que não consegue
esclarecer. Para tentar resolvê-las e dominar suas angústias, impulsionada por
sua curiosidade, ela procura sonhar, imaginar. E, se conseguir canalizar esse
mundo imaginário em ações no mundo real, ela desenvolve a capacidade de
criação. Os desenhos, as narrativas, enfim, são maneiras de agir para dominar
as emoções; as explosões de sonhos e imagens são dirigidas então para a
criação. Portanto, a criança deve conseguir alimentar seu imaginário e
expressá-lo. Desenvolver a função simbólica por meio de textos, imagens e sons
é uma forma de sustentá-lo.
FONTE:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-88392000000100004&script=sci_arttext
Para ver algumas histórias infantis,
clique:
http://sitededicas.uol.com.br/piadas1.htm
http://www.contandohistoria.com.br/flash/index.html
Histórias infantis contadas com recursos de som e animação que
interagem com o leitor no decorrer dos textos. Tenta despertar a reflexão, o
debate e a curiosidade das crianças.
http://www.bibvirt.futuro.usp.br/sons/infantil/milpassaros.html
Histórias narradas por Ruth Rocha, em áudio, e músicas produzidas por Sandra Peres e Paulo Tatit,
do selo Palavra Cantada