Do medo
Acaso
a flor rejeita a gota de orvalho, por que poderá ser a
última?
Ou despreza o raio de sol, por que as nuvens poderão
encobrir o céu?
Devemos evitar um momento de amor, por que talvez no
futuro nos aguarde a solidão?
E, se assim fizermos, o que nos restará, sem a boa
lembrança que possa aquecer o frio das nossas noites?
Sem a recordação da gota de sentimento, que fez
florescer o botão das nossas emoções?
É no medo, que nos perdemos. É pelo temor do futuro, que
deixamos de viver o presente; é por desejarmos o que nos
falta, que não desfrutamos o que temos.
Entretanto, o colibri busca apenas o néctar da flor
recém-descoberta; e o desfruta, sem o temor de que
amanhã já não o encontre. Por isto, consegue sentir o
mel na sua plenitude.
A verdade é que nada existe, senão o momento. Porque já
sobrevivemos ao passado, e nem sabemos se chegaremos ao
futuro. Esta é a sabedoria da natureza, que se oculta na
ingenuidade da criança.
Como a formiga, buscamos amealhar para o futuro; mas
deveríamos também cantar, como faz a cigarra. Porque o certo é
que a morte encontrará a ambas; e a formiga nada levará
dos seus bens, enquanto à cigarra restará a lembrança
alegre do seu canto.
A nada devemos temer tanto, quanto ao próprio medo. A
nuvem que não teme desfazer-se em chuva volta ao céu,
depois de espalhar a vida; enquanto aquela que tentou
preservar-se, é desfeita pelo vento.
Talvez a coragem de viver um sonho nos traga apenas a
felicidade de um momento. Porém, ele viverá em nossa
lembrança.
E talvez o medo de vivê-lo nos traga uma eternidade de
solidão...