Editor: Wolfram da Cunha Ramos




ESTADO DA PARAÍBA
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA COMUM DE 1ª INSTÂNCIA
COMARCA DE ALAGOA GRANDE - VARA ÚNICA

 



 
 
 
 
 

SENTENÇA   CRIME HEDIONDO - ESTUPRO - VIOLÊNCIA PRESUMIDA - INOCENTIA CONSILLI - Vítima menor de 14 anos e portadora de Deficiência Mental.   Tentativa da defesa em tornar a vítima corrompida, devido ao caráter relativo de presunção, inserto na hipótese da alínea a do art. 224 do Código Penal.   Irrelevante tal fato, nas circunstâncias especiais contidas na presente ação penal, mesmo que verídica fosse tal assertiva.   Menor-vítima também na situação constante da alínea b do mesmo artigo referenciado, o que lhe retira a capacidade de consentimento e de entendimento do ato sexual a que é submetida ou levada a praticar.   Estado de alienação mental da menor, público e notório na comunidade.   Agente ativo, cônscio da ocorrência desse estado.   Comprovação inequívoca em Juízo de mantença de relação sexual do réu com a vítima.   Aplicabilidade de Causa de Aumento, inserta no art. 9º da Lei 8.072/90. Não ocorrência de "bis in idem", conforme entendimento de nossa mais alta Corte de Justiça ( STF ).

Procedência da Denúncia.
Condenação Conseqüente.

  Vistos, etc.. .
O representante do Ministério Público, promoveu ação penal contra o réu CARLOS ANDRÉ DA SILVA, já devidamente qualificado nos autos, incursionando-o nas disposições do art. 213 c/c art. 224, alíneas a e b, todos do Código Penal e agravantes da Lei n.º 8.930/94, art. 1º, inciso I.

REPRESENTAÇÃO POR PRISÃO TEMPORÁRIA, fls. 02 a 06, autos em apenso.,

REGISTRO DE NASCIMENTO, fls. 06, autos em apenso, demonstrando contar ainda na época da "notitia criminis", fls. 06 autos principais, a vítima com a idade de 13 anos e dois meses.

DEFERIMENTO, fls. 10 e 11, autos em apenso.

EXAME DE DEFLORAMENTO, fls. 13, indicando efetivação de conjunção carnal.

PRISÃO PREVENTIVA, fls. 27 e 28.

HABEAS-CORPUS, fls. 36 a 39.

DENÚNCIA, instruída com os autos do Inquérito Policial, às fls. 02 e O3.

INTERROGATÓRIO, fls. 44 e 45.

INFORMAÇÕES, fls. 47 a 49.

DEFESA PRÉVIA, fls. 51 e 52.

OITIVA DAS TESTEMUNHAS MINISTERIAS E DECLARANTES, fls. 60 a 67.

DETERMINAÇÃO DE EXAME AVALIATÓRIO DO ESTADO MENTAL DA VÍTIMA, fls. 68.

OITIVA DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS PELA DEFESA, fls. 100 a 103.

ACÓRDÃO, fls. 107 a 110, denegando o Habeas-Corpus.

EM DILIGÊNCIAS, a defesa nada solicitou, tendo entretanto, o Ministério Público propugnado pela oitiva das pessoas referidas no depoimento da testemunha Maria de Lourdes dos Santos. Deferido, porém posteriormente revogado, face as razões de fls. 114/V.

ALEGAÇÕES FINAIS, do Ministério Público, fls. 126., ratificando os termos da denúncia.

ALEGAÇÕES FINAIS, da defesa de fls. 130 e 131, limitando-se a requerer a oitiva das pessoas referenciadas no depoimento da testemunha Maria de Lourdes dos Santos, por serem imprescindíveis para a defesa do réu.

Despacho do MM. Juiz Substituto, determinando nova intimação à defesa, para apresentar suas Razões Finais, fls. 132, eis que, a ofertada anteriormente, prendeu-se apenas a um requerimento.

Nova Apresentação, fls. 133 a 136, com pedido em preliminar de chamamento à Ordem, sob alegação de Nulidade do Processo, por cerceamento de defesa e insistindo na oitiva dos menores, que teriam andado com a vítima, ressaltando a dedução, de ser ela já corrompida e "viciada ao embalo do sexo". No mérito, pede a absolvição do réu, por falta de provas.

Determinação, de requisição do Exame de Verificação do Estado Mental da vítima, fls. 137, com urgência.

Laudo Psiquiátrico, fls. 139 e 140.

ANTECEDENTES CRIMINAIS DO RÉU, fls. 143 e 144, centificando a ausência destes.

TRANSFORMAÇÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIAS, fls. 146 e 147.

OITIVA DOS MENORES, referidos no depoimento da testemunha Maria de Lourdes dos Santos, fls. 159 a 162.

RENOVAÇÃO DE PRAZO, para novo oferecimento de Alegações Finais, fls. 171.

OFERECIDAS, pelo Ministério Público, às fls. 173 a 180 e pela defesa, às fls. 188 a 190.

Vistas ao Ministério Público, para manifestação sobre o Laudo, como feito pela defesa, em suas Alegações Finais, fls. 192.

Chamamento do feito à ordem, fls. 193.

Juntada de cópia do Registro de Nascimento, fls. 194.

Determinação de juntada do original, 195.

Juntada, fls. 196.

É O RELATÓRIO. PASSO A DECIDIR.

Trata-se o presente processo de Ação Pública, por ocorrência do preceituado, nos ditames do art. 225, § 1º, inciso I, iniciada por DENÚNCIA devidamente instruída com os autos do Inquérito Policial, imputando ao réu a prática de Estupro com Violência Presumida, incursionando-o nas disposições do art. art. 213, c/c art. 224 alíneas a e b, todos do Código Penal e agravantes da Lei n.º 8.930/94, art. 1º, inciso I.

DO CRIME:

Consubstancia-se na ação do agente ativo, em constranger mulher, mediante violência ou grave ameaça, a prática de conjunção carnal.

VIOLÊNCIA FICTA OU PRESUMIDA:

Aqui, a violência por ficção jurídica, aparece na forma de presunção ( não absoluta), que mesmo não sendo real, tem-se como ocorrente nas situações das alíneas, a, b e c do art. 224 ( C.P. ). Assim, se a vítima se encontra inserta em algumas das hipóteses ali presentes, o agente ativo, responde integralmente pelo crime capitulado no art. 213 do Código Penal.

Momento Consumativo:

Advém com a realização da conjunção carnal *imposta, **concedida ou **conseguida, tanto nas figuras com violência *real ou **ficta.

Correção da peça denunciatória:

Possibilidade constante do estatuído nos ditames do art. 383 do Código de Processo Penal, que faculta ao magistrado dar ao fato, nova definição jurídica, sem que isso, implique em surpresa ou cerceamento de defesa, embora tenha que aplicar mesmo, pena mais grave. Para tanto, é necessário apenas, que as elementares estejam contidas, explícita ou implicitamente no relato da denúncia, como ocorrido.

Referência a aplicabilidade das agravantes da Lei n.º 8.930/94 ( artigo 1º, inciso I ), na peça denunciatória. Corrigenda para art. 9º da Lei 8.072/90, causa de aumento, aplicável de "per si", tendo como elemento motivador o próprio fato, nas condições do art. 224 e sua combinação com o art. 213, todos do Código Penal.

"O réu se defende da imputação do fato contido na denúncia, não da classificação do crime feita pelo Promotor de Justiça" ( STF, HC 56.874 ).

Inocorrência de dupla valoração na aplicação da pena:

ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR – Vítima menor de 14 anos – Violência presumida – Agravamento da Pena pela aplicação do art. 9º da Lei 8.072/90 – Admissibilidade – Inocorrência de "bis in idem".

A particular situação da vítima, de não ser maior de 14 anos, é utilizada tanto para aumentar a pena de metade: no primeiro caso é circunstância elementar do tipo penal codificado ( art. 214 ) e no segundo é causa de aumento da pena prevista na lei extravagante ( art. 9º da LCH ). Os crimes de estupro e atentado violento ao pudor independem da idade da vítima, que pode ser maior ou menor, sendo que os tipos penais exigem que tenha ocorrido violência presumida ou real, ao passo que o agravamento previsto no art. 9º da Lei dos Crimes Hediondos aplica-se ao caso, entre outros, em que a vítima é menor de 14 anos. Não ocorrência de "bis in idem". HC 74.780-9-RJ – 2ª T – j. 11.11.1997 – Rel. Min. Maurício Corrêa – DJU 06.02.1988 ( RT 751/530 ).

DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA:

A materialidade do crime, encontra-se bem delineada, pelo AUTO DE EXAME DE DEFLORAMENTO, fls. 13, indicando efetivação de conjunção carnal, estado anterior de virgindade, implemento de informação relativa ao fato de que a paciente-vítima apresenta idade mental menor que a cronológica e LAUDOS PSIQUIÁTRICOS, de fls. 139 e168, cientificando Déficit Mental da vítima e que essa debilidade mental lhe retira a capacidade de consentimento do ato sexual a que é submetida ou levada a praticar.

Quanto a autoria do fato, não resta qualquer dúvida de que o réu manteve relações sexuais com a vítima, as declarações desta, fls. 64 e 65, dentro de suas limitações intelectivas, são plenamente satisfatórias e harmônicas com as demais provas constantes dos autos que corroboram essa assertiva, fls.11, e V., 12, 15 e 66 e 67 ( Depoimentos da irmã menor da vítima, que presenciou a Relação Sexual ) 20 e V e 62 e 63 ( Depoimentos de testemunha, que viu no dia do fato, a saída do local, da vítima e logo em seguida do réu e que jamais viu a vítima com namorados ou agarrada com outros meninos ), 60 e 61, ( Depoimento de testemunha que afirma ter tomado conhecimento de que o réu manteve relações sexuais com a vítima, que sabe ser ela retardada e que nunca a viu com namoro, demonstrando ilibada a sua conduta ), fls. 100, ( Depoimento de testemunha da própria defesa, que afirma conhecimento de ter o réu mantido Relação Sexual com a vítima ).

Exsurge assim, induvidosa a prática do fato pelo réu.

Diante de tal estado de coisas, a defesa insistiu em ouvir depoimentos de menores, que possivelmente teriam mantido relação sexual com a vítima, buscando através desses depoimentos, desvirtuar a tipicidade do crime praticado por seu cliente. Ouvidos os ditos menores, declararam ter ocorrido as relações sexuais, com a vítima, imputando a esta, um comportamento de verdadeira rameira. Ressalto aqui, que todos esses pseudo amantes, tinham a "idade entre 13 e 15 anos", ao tempo em que declaram a prática do ato sexual.

Não obstante, as afirmativas, vê-se claramente, através dos próprios depoimentos, a fantasiosa jornada que se propuseram na "estória" contada em Juízo. A simples leitura, leva a incredibilidade, no modo, momento, lugar e experiência sexual dos menores.

Esses depoimentos estão ainda, mensuravelmente opostos a verdade dos autos, antagônicos a todas as provas produzidas e harmoniosas quanto a conduta ilibada da menor, como já referido e ao seu estado de virgindade anterior ao fato, conforme se depreende do Laudo de fls. 13 ( Exame de Defloramento), que taxativamente cientifica que a menor era virgem em resposta ao 3º quesito, comprovando materialmente e tecnicamente, esse estado.

A tentativa de tornar descaracterizada a alínea a do art. 224 do Código Penal, na imputação de que a vítima já era corrompida, diante do caráter relativo de presunção é ausente de qualquer credibilidade. Ademais, mesmo que tais fatos tivessem ocorrido e a menor fosse realmente corrompida, em nada beneficiaria o réu, e agora, até mesmo os menores, devido ao comprovado, público e notório estado de demência mental de que é portadora esta, o que comprova, sem qualquer resquício de dúvida, a ocorrência do preceituado na alínea B, do mesmo artigo referido, conforme se verifica ainda, dos depoimentos já citados e Laudos, quando os ditos menores teriam que por esse fato ( Estupro Presumido ), ao invés de por conduta equiparada a crime contra a Administração da Justiça ( menos grave ), responderem a Procedimento Especial. Determino aqui, desde logo, para apreciação do Ministério Público, o envio desta sentença, dos depoimentos das testemunhas, de fls. 60 a 63, dos menores em apreço, equidistantes da verdade processual e Laudo de Exame de Defloramento, para os fins consequentes, bem como, da testemunha MARIA DE LOURDES DOS SANTOS, cujas afirmações, desencadearam toda essa mal contada "estória" e também da testemunha ANTÔNIA SIRINO PINHEIRO, que também imputou a vítima, conduta não verdadeira.

Destaco aqui, que o estado abobalhado da vítima, salta aos olhos, sendo de conhecimento de todas as pessoas que com ela tem aproximação e de toda a comunidade, restando certo, que o déficit mental a torna, facilmente manipulável ao bel-prazer do colocutor, fato esse, consequentemente de inteiro conhecimento do réu.

A alegação da defesa em suas Razões Finais, contida no antepenúltimo parágrafo, não prospera, pois apesar do "acreditamos", se dessome afirmação técnica do estado e que o termo leva a possibilidade clara de sim, como dito, devido a pouca idade da vítima e a sua inegável deficiência mental, sendo perfeitamente esclarecedor para um juízo de admissibilidade da assertiva.

Enfim, consubstancialmente comprovada a materialidade do fato e a sua autoria pelo réu, resta-me tão somente, aplicar-lhe a sanção pertinente.

O réu é primário, e de bons antecedentes, pelo que a pena-base deve ser fixada no mínimo legal.

"Ex Positis", julgo procedente a denúncia de fls., 02, 03, para condenar o réu CARLOS ANDRÉ DA SILVA, já devidamente qualificado nos autos, nas disposições do art. 213 c/c art. 224, alíneas a e b, todos do Código Penal e 9º da Lei 8.072/90.

Tendo em vista, as diretrizes constantes dos arts., 59 e 68, do C.P., passo a dosar-lhe a pena :

Atendendo a culpabilidade do réu, aos seus antecedentes, à sua conduta social, à personalidade, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como o comportamento da vítima, FIXO a PENA-BASE, em 06 ( seis ) anos de RECLUSÃO, em face da causa de aumento contida no art. 9º da Lei 8.072/90, aumento-a da metade e diante da ausência de circunstâncias legais ou de outras de aumento ou diminuição da pena, torno-a definitiva em 09 ( nove ) anos de RECLUSÃO.

O Seu Regime de Cumprimento da pena, será o FECHADO, por encontrar-se o crime praticado, capitulado entre os hediondos.

Lance-se-lhe o nome no Rol dos Culpados, após o trânsito em julgado da sentença. Custas "ex lege". Recomende-se na prisão onde se encontra.

P.R.I.

Alagoa Grande, 07 de dezembro de 1998.

 
João Jorge de Medeiros Tejo
Juiz de Direito

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