Editor: Wolfram da Cunha Ramos




ESTADO DA PARAÍBA
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA COMUM DE 1ª INSTÂNCIA
COMARCA DE ALAGOA GRANDE - VARA ÚNICA
 
 

SENTENÇA

CRIMES CONTRA A PESSOA, PATRIMÔNIO E COSTUMES – CONCURSO MATERIAL E DE PESSOAS – LESÃO CORPORAL DE NATUREZA LEVE - ROUBO QUALIFICADO E ESTUPRO ––
Ações autônomas, subsequentes e independentes – Responsabilidade dos agentes integral por todos os atos infracionais perpetrados, nos termos do art. 29 do Código Penal – Conluio, vontade e adesão nas execuções das infrações.   Depoimentos constantes dos autos, que juntamente com a prova técnica comprovam incisivamente todos os fatos imputados.   Aplicabilidade do estatuído no art. 383 do Código de Processo Penal - Emendatio Libelli.   Conseqüente condenação.   Vistos, etc.. .
O representante do Ministério Público, promoveu ação penal contra o réus VALDOMIRO DE
CARVALHO SANTOS "Miro" e MARINALDO GONÇALVES DOS SANTOS "Miúdo", já
devidamente qualificados nos autos, colocando-os como incursos, nas disposições dos arts. 129 "caput", 157, § 2º, incisos I e II e 213 c/c art. 29, todos do Código Penal e agravantes da Lei 8.072/90.

REPRESENTAÇÃO POR PRISÃO TEMPORÁRIA, fls. 02 a 05, autos em apenso. Decretação, fls. 15 e 16 ( autos em apenso ).

EXAME DE DEFLORAMENTO, fls. 13, indicando efetivação de conjunção carnal, em resposta ao 1º Quesito.

PRISÃO PREVENTIVA, fls. 37 e 38.

DENÚNCIA, instruída com os autos do Inquérito Policial, às fls. 02, 03 e 04.

INTERROGATÓRIOS, fls. 53 a 60.

DEFESA PRÉVIA, fls. 51 e 52.

DEPOIMENTOS DOS DOIS MENORES INFRATORES QUE JUNTAMENTE COM OS RÉUS,
praticaram as infrações, fls. 64 a 66.

OITIVA DAS TESTEMUNHAS MINISTERIAS E DECLARANTES, fls. 69 a 75.

NOVA DEFESA, fls. 81

OITIVA DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS PELA DEFESA, fls. 91, 92 , 97 e 98.

EM DILIGÊNCIAS, a defesa solicitou a oitiva dos médicos signatários do Laudo. O Ministério Público, nada requereu.

OITIVA DOS PERITOS, fls. 105 a 108.

ALEGAÇÕES FINAIS, do Ministério Público, fls. 117 e 118., ratificando os termos da denúncia.

ALEGAÇÕES FINAIS, da defesa de fls. 120 e 121, ressaltando os depoimentos dos peritos e
argumentando que não ocorrera a conjunção carnal ou lesão.

DETERMINAÇÃO retirada das fls. 123 e segs. e seu apensamento aos autos.

JUNTADA DE ANTECEDENTES, fls. 123.

DETERMINAÇÃO DE NOVA OITIVA DOS PERITOS, fls. 124.

NOVA DATA, fls. 125.

REVOGAÇÃO.

É O RELATÓRIO. PASSO A DECIDIR.

Trata-se o presente processo de Ação Pública, por ocorrência do preceituado, nos ditames do art. 225, § 1º, inciso I, iniciada por DENÚNCIA devidamente instruída com os autos do Inquérito Policial, imputando aos réus as práticas de Lesão Leve, Roubo Qualificado e Estupro, com tipificação respectiva, nos ditames dos arts. 129 "caput", 157, § 2º, incisos I e II e 213 c/c art. 29, todos do Código Penal e agravantes da Lei 8.072/90.

CONCURSOS:

Material:

A sua ocorrência se apresenta, quando o agente ativo, mediante mais de uma conduta comissiva e/ou omissiva, pratica dois ou mais crimes idênticos ou não, ficando destarte, a aplicação da apenação cumulativa.

De Pessoas:

Pratica o crime, quem de qualquer modo concorre para a sua realização, respondendo por ele, na medida de sua culpabilidade.

FORMAS

Co-autoria

Consubstancia-se na execução do comportamento definido pela lei como crime, não sendo
necessário inclusive, que a conduta seja idêntica, apenas que haja cooperação no cometimento.

Participação

Tem-se em duas variáveis, MORAL ou MATERIAL:

Moral ( Partícipe )

Ocorre, quando embora não praticando o agente a conduta típica, contribui para a realização do crime, quer agindo sobre o volitivo do executor, para que nele exsurja o desejo de praticar o delito, quer estimulando uma idéia criminosa preexistente.

Material ( Cúmplice )

O agente contribui materialmente para o crime, por meio de um comportamento positivo ou negativo, fornecendo por exemplo, uma arma, ou deixando entreaberta uma porta, para que adentrem na residência e executem o furto de objetos, etc.. .

DOS CRIMES:

Lesão Leve:

Encontra-se ele capitulado nos Crimes Contra a Pessoa, tipificado consubstancialmente "in casu", no
disposto do art. l29, "caput" do Código Penal, tendo em seu âmago a título de objeto jurídico, a
integridade fisiopsíquica do agente passivo.

A conduta típica, consiste em atingir por qualquer meio a integridade corporal ou a saúde física ou mental de outrem, modificando estruturalmente o organismo humano por intermédio de equimoses, ferimentos ou mutilações.

Roubo:

Subtração com o fim de assenhoreamento de coisa alheia móvel.

A ação física consubstancia-se no verbo "subtrair", coisa móvel alheia, mediante violência a pessoa, grave ameaça, ou depois de havê-la por qualquer meio , reduzido à impossibilidade de resistência.

Qualificadoras

Crimes Duplamente Qualificados:

Entendimento inserto, tanto na jurisprudência quanto na doutrina, é de que diante da concorrência de qualificadoras, uma só delas deve incidir como causa de aumento. A outra, deve servir como agravante, desde que seja possível o seu enquadramento, em alguma das hipóteses constantes dos arts. 61 e 62 do Código Penal ( Delso Delmanto – 3ª Edição – Fls. 111 e 278 ).
 
 

Estupro:

Consubstancia-se na ação do agente ativo, em constranger mulher, mediante violência ou grave ameaça, a prática de conjunção carnal.

Momento Consumativo:

Advém com a realização da conjunção carnal imposta, independentemente de ser completo o ato sexual com o alcance do orgasmo, necessário apenas, que ocorra a "intromissio penis in vaginam.

"Se chegou a haver introdução, ainda que parcial e sem rompimento do hímen, o estupro é consumado e não apenas tentado" (STF, RE, 100.090 – RT 620/286; RT657/280).

"Ejaculação: a consumação do estupro independe da ejaculação, ou não do autor" ( TJSP, RJTJSP
120/502 ).

"Para existência do delito de estupro torna-se necessária a introdução do membro do agente na vagina da ofendida. Consuma-se com a "imissio penis in vaginam". Basta a introdução parcial e não é necessário o orgasmo ou ejaculação..." ( TJRJ – AC - Rel. Fabiano Franco – ADV 6.504 ).

Emendatio Libelli:

Correção da peça denunciatória:

Possibilidade constante do estatuído nos ditames do art. 383 do Código de Processo Penal, que faculta ao magistrado dar ao fato, nova definição jurídica, sem que isso, implique em surpresa ou cerceamento de defesa, embora tenha que aplicar mesmo, pena mais grave. Para tanto, é necessário apenas, que as elementares estejam contidas, explícita ou implicitamente no relato da denúncia, como ocorrido.

"...em dado momento surgiram os denunciados e os adolescentes infratores, armados com facas e foices, abordaram o casal, surrupiando relógio e outros objetos de valor e agrediram o namorado da vítima com um corte de faca à altura do ombro..., pegaram a menor Patrícia Pereira da Silva, arrastaram-na para um partido de cana..., ...e alternadamente, forçaram a referida menor a manter relações sexuais com todos eles..."

"O réu se defende da imputação do fato contido na denúncia, não da classificação do crime feita pelo Promotor de Justiça" ( STF, HC 56.874 ).

Corrigenda:

Inclusão de tipificação e sanção, relativa ao Concurso Material, art. 69 do Código Penal.
 
 

DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA:

1 - LESÃO CORPORAL DE NATUREZA LEVE:

A materialidade se verifica através do Laudo de fls. 23 e V., em reposta ao 1º Quesito.

Insurge-se a defesa quanto ao laudo, notadamente porque na descrição, de fls. 23, o perito afirmou que encontrava-se a lesão cicatrizada, argüindo "lato sensu", que seria impossível essa cicatrização e portanto a referida lesão, não poderia ter sido perpetrada pelos seus clientes. Não lhe assiste razão. Como se verifica, o exame foi realizado no dia 17 ( data consignada às fls. 23 "in fine" ), sete dias depois do dia 10, data do fato. Em seu depoimento de fls. 106, explicita que: "...essa lesão poderia apresentar características de cicatrização, dependendo da constituição genética do paciente...". A afirmativa da lesão em questão, encontra-se em plena harmonia com todas as demais provas: Interrogatório do réu Marinaldo, fls. 58, depoimentos de fls. 64, 65, 72, 75 ( *1 ) e o próprio Laudo de fls.23 e V.

Quanto o outro perito, fls. 107, em seu depoimento esclareceu que embora tivesse assinado o Laudo, nãoexaminou o paciente, não viu o ferimento. Portanto, não tem como emitir validamente qualquer parecer.

Remeta-se cópia de tal depoimento ao Ministério Público, para os fins específicos, ante as afirmaçõesinicias.
 
 

2 - ROUBO:

Verifica-se claramente essa ocorrência, através do interrogatório do réu Marinaldo, fls. 58, depoimentos de fls. 64, 65, 72, 73 e 75 ( *2 ).

2.1 - QUALIFICADORAS:

Emprego de Armas:

Uso inequívoco delas, interrogatório, fls. 58, depoimentos fls. 64,65, 69, 72, e 75 ( *2.1 )

2.2 - Concurso de Pessoas:

A participação de mais de 02 pessoas é inconteste, interrogatório de fls. 58, depoimentos fls. 64,65, 69, 72, e 75.

3 – ESTUPRO:

A materialidade do crime, encontra-se bem delineada, pelo AUTO DE EXAME DE DEFLORAMENTO, fls. 21 indicando efetivação de conjunção carnal, em resposta ao 1º Quesito.

No laudo em apreço, campo de observações, o perito, colocou assertiva de cunho paradoxal a resposta anterior, despontando em contradição pelo menos aparente. O que levou esse magistrado a determinar a sua oitiva, fls. 105 e 106, quando ficou devidamente esclarecido o teor do descrito, restando, certo a efetivação de conjunção carnal com a menor, em face das peculiaridades do fato.

No referido depoimento, afirmou o perito, a clara possibilidade de ocorrência da relação sexual sem deixar praticamente vestígios, o que seria diferente, se encontrado fosse o esperma. De tal afirmativa se dessome, por harmônica com todas as demais provas, a efetivação dos atos sexuais dos réus e dos menores, que os acompanhavam, com a vítima.

A vítima em seu depoimento, cientifica que tanto os dois réus, como os dois menores, que já foram
sentenciados e atualmente encontram-se cumprindo medida de internação, mediante ameaça de armas, mantiveram com ela, forçadas relações sexuais, mas embora tivessem introduzido seus membros em sua vagina, nenhum deles, chegou a ejacular dentro dela, fls. 72 a 74.

Temos ainda, para confirmação da perpetração do hediondo crime, os depoimentos dos dois menores, que contam com riqueza de detalhes, como não só eles, obrigaram a vítima à relação, como incisivamente afirmam a mesma prática pelos réus, descrevendo minuciosamente todo o ocorrido, fls. 64 a 66 e o depoimento do namorado da menor, também vítima de roubo e lesão corporal, fls. 75.

Exsurge assim, induvidosa e materialidade e autoria pelos réus de todos os crimes em concurso
imputados, devendo eles, responderem, nos termos do art. 29 do Código Penal, por responsabilidade conjunta e integral.

Enfim, consubstancialmente comprovada a materialidade dos fatos e as suas autorias pelo réus, resta-me tão somente, aplicar-lhes as sanções pertinentes.

Os réus são tecnicamente primários, e a princípio de não maus antecedentes, pelo que as penas-base
deverão ser fixadas, no mínimo legal.

"Ex Positis", julgo procedente a denúncia de fls., 02, 03 e 04, para condenar os réus VALDOMIRO DE CARVALHO SANTOS "Miro" e MARINALDO GONÇALVES DOS SANTOS "Miúdo", já
devidamente qualificados nos autos, nas disposições dos arts. 129 "caput", 157, § 2º, incisos I e II e
213 c/c art. 29, 69 e 65, inciso I todos do Código Penal.

Tendo em vista, as diretrizes constantes dos arts., 59 e 68, do C.P., passo a dosar-lhe a pena :

Atendendo a culpabilidade do réus, aos seus antecedentes, às suas condutas na sociedade, às
personalidades, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências dos crimes, bem como o comportamento das vítimas, passo a fixar-lhes suas PENAS-BASE, da seguinte forma:

Lesão Corporal de Natureza Leve:

Em 03 ( três ) meses de detenção. Deixo de diminuir a pena diante do preceituado no art. 65, inciso I,do Código Penal por já se encontrar ela com no mínimo legal e por circunstância atenuante, não ter diferentemente de causa de diminuição, o condão de reduzir essa pena abaixo do mínimo. Diante da ausência de outras circunstâncias legais ou de outras de aumento ou diminuição da pena, torno-a
definitiva em 03 ( três ) meses de detenção.

Roubo Duplamente Qualificado:

Em 04 ( quatro ) anos de reclusão, ante o preceituado nos ditames do § 2º do art. 157, inciso I,
aumento-a de 1/3 ( um terço ), deixo de aplicar a causa especial de aumento, contida no inciso II, do
mesmo artigo citado, como circunstância agravante, por não adentrar ela, em nenhuma das hipóteses dos arts. 61 e 62, face o teor do constante do art. 65, inciso I, diminuo-a de 6 ( seis ) meses. Diante da ausência de outras circunstâncias legais ou de outras de aumento ou diminuição da pena, torno-a
definitiva em 04 ( quatro ) anos e 10 ( dez ) meses de reclusão. Condeno-os ainda, ao pagamento de
l5 dias-multa, fixados unitariamente no mínimo legal.

Para a fixação do número de dias-multa, foram analisadas as Circunstâncias Judiciais do art. 59, já
discriminadas acima e o valor do dia-multa, a situação econômica do réus, a teor do explicitado no
art. 60.

Estupro:

Em 06 ( seis ) anos de reclusão. Deixo de diminuir a pena diante do preceituado no art. 65, inciso I, do Código Penal por já se encontrar ela com no mínimo legal e por circunstância atenuante, não ter
diferentemente de causa de diminuição, o condão de reduzir essa pena abaixo do mínimo. Diante da
ausência de outras circunstâncias legais ou de outras de aumento ou diminuição da pena, torno-a
definitiva em 06 ( seis ) anos de reclusão.

Por ocorrência do constante do art. 69, condeno definitivamente os réus, a cumprirem uma pena de 10 (dez ) anos e 10 meses de Reclusão, 03 ( três ) meses de Detenção e pagamento de 15 dias-multa, fixados unitariamente no mínimo legal. Todos os artigos citados, são do Código Penal.

O regime de cumprimento da pena, será o Fechado.

Lance-se-lhes o nome no Rol dos Culpados, após o trânsito em julgado da sentença. Custas "ex lege".

Recomende-se na prisão onde se encontram.

P.R.I.

Alagoa Grande, 28 de dezembro de 1998.
 
João Jorge de Medeiros Tejo
Juiz de Direito

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