Editor: Wolfram da Cunha Ramos

ESTADO DA PARAÍBA
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA COMUM DE 1ª INSTÂNCIA
COMARCA DE BELÉM
 
 
SENTENÇA
   
Vistos, etc...
 O representante  do Ministério Público, promoveu ação penal contra o réu FRANCISCO DE ASSIS FÉLIX DA SILVA, já devidamente qualificado nos autos, incursionando-o nas disposições do art. 158, c/c art. 307, todos Código Penal.
 DENÚNCIA, instruída com os autos do Inquérito Policial, às fls. 02,  e 03.
 
 AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE, fls. 07, 08 e 09.
 AUTO DE APRESENTAÇÃO E APREENSÃO,  de uma Carteira de Polícia e outros objetos, fls. 14.
 INTERROGATÓRIO DO RÉU, às fls. 27, 28 e 29.
 DEFESA  PRÉVIA, sem Rol de Testemunhas, às fls.  35.
 PEDIDOS DE LIBERDADE PROVISÓRIA, fls. 2, 3 e 4 ( apenso ) e 39, 40 e 41 - Negados, fls. 26 e 27 ( apenso ) e 46.
 OITIVA DAS TESTEMUNHAS ARROLADAS, pelo Ministério Público, de fls. 49 a 52/V.
 
 EM DILIGÊNCIAS AS PARTES, nada requereram, fls. 53/V.
 ANTECEDENTES CRIMINAIS DOS RÉUS, às fls. 61., cientificando, prática de crimes tipificados nos arts. 157, § 2º, inciso I e 155, todos do Código Penal.
 ALEGAÇÕES FINAIS, do Ministério Público. às fls. 54., ratificando os termos da denúncia.
 
 ALEGAÇÕES FINAIS, da defesa de fls. 55 a 59, confessando a prática por parte do réu no delito constante do art. 307 do Código Penal e propugnando pelo não reconhecimento da Extorsão.
 É O RELATÓRIO.
 PASSO A DECIDIR.
 Trata-se o presente processo de Ação Pública Incondicionada, iniciada por DENÚNCIA devidamente instruída com os autos do Inquérito Policial, imputando ao acusado a prática de Extorsão e Falsa Identidade, incursionando-o nas disposições do art. do art. 158, c/c art. 307, todos Código Penal.
 DA EXTORSÃO:
 
 Compreende-se na ação do agente ativo, em constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, que pode ser real ou moral, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa, com o fim de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica.
 Protege a lei o patrimônio, porém sendo crime complexo, igualmente protege a liberdade e a incolumidade da pessoa.
 Ação física, é representada pelo verbo constranger, integrando o tipo, a vantagem indevida, que é elemento normativo, sob o aspecto econômico. A percepção dessa vantagem, entretanto, traduz-se em exaurimento.
 Na doutrina e jurisprudência, prevalece o entendimento de ser o crime em referência Formal e a sua consumação advém com o ato de constranger a vítima a fazer, tolerar que se faça, ou deixar de fazer alguma coisa.
 Mesmo sendo Formal, a vítima, embora constrangida, pode não se comportar positiva ou negativamente, como desejado pelo agente, o que torna possível a tentativa.
"O crime de extorsão é, efetivamente, formal ou de consumação antecipada, integrando-se com a ação, tolerância ou omissão imposta coativamente à vítima. Não se exige, pois, que o agente tenha conseguido o proveito que pretendia. Basta a intenção de obter a indevida vantagem econômica" ( STF - RT 612/437 );
 
"A extorsão atinge a consumação com a conduta típica imediatamente anterior à produção do resultado visado pelo sujeito; consuma-se com o comportamento positivo ou negativo da vítima, no instante em que ela faz, deixa de fazer ou tolerar que se faça alguma coisa" ( JUTACRIM - SP 85/539 ).
"A figura da tentativa ocorre quando o sujeito passivo, não obstante constrangimento pelo autor por intermédio da violência física ou moral, não pratica a conduta positiva ou negativa pretendida" ( JUTACRIM - SP 85/539 );
"O enquadramento da extorsão entre os crimes formais não impede que se reconheça  a possibilidade da tentativa. A extorsão é delito plurissubsistente, isto é, que se preenche com a realização de vários atos. Destarte, a atividade criminosa é perfeitamente cindível; tem um "iter criminis" e portanto, pode sofrer interrupção"  ( JUTACRIM - SP - RT 429/460 ).
  Não obstante, todo o até aqui exposto, há divergência na  doutrina e jurisprudência pátria, no que concerne a ser formal ou material o crime de extorsão, porém "in casu", essa discussão não traz qualquer sentido prático, pois ambas classificações, são convergentes no sentido de que, material ou formal, admitem a sua forma tentada ( Delmanto - 3ª Edição - Fls. 281 ).
 Tentativa:
 Quando por circunstâncias alheias a vontade do agente, iniciada a execução não se consuma o crime.
 APLICABILIDADE DA PENA:
 Deve-se levar em conta as circunstâncias da própria tentativa, se obstada a prática do crime no início, a redução deve ser a maior permitida, se percorrido longo caminho  na tentativa, a menor.
 Modo de Ocorrência:
 A extorsão pode ainda apresentar-se com o uso de fraude, conjugação de coação e o engano (falsa afirmação de perigo ), com o fim de obtenção de indevida vantagem.
"Quando se conjugam, na ação do infrator da lei penal, a coação e o engano para obtenção de vantagem, o crime a reconhecer é o de extorsão. Impõe-se a solução, por isso que, no caso, o constrangimento exercido sobre a vítima constitui preponderante da atividade criminosa, ´máxime quando se transforma na causa eficiente do resultado obtido’ " ( JUTACRIM - 27/129 ).
FALSA IDENTIDADE:
 O comportamento incriminado é a atribuição a si mesmo ou a terceira pessoa, de falsa identidade. Podendo o comportamento punível penalmente, verificar-se verbalmente ou por escrito. A ação do sujeito ativo, deve ter em vista, a obtenção de vantagem, em próprio proveito ou alheio, ou resultado compreendido em causar dano a outrem ( dolo específico ).
 Consuma-se quando da realização do núcleo do tipo, independente de obtenção do fim pretendido.
 É crime formal, unissubsistente, sendo portanto, inadmissível a tentativa.
 É crime de caráter subsidiário, só subsistindo o delito, se o fato não constituir elemento de crime mais grave.
 Consunção - Princípio dirimente de conflito aparente de normas.
 
Traduz-se na norma incriminadora de fato  que é meio necessário de preparação ou execução ou conduta anterior ou posterior de outro crime, ficando excluída pela norma deste.
 Correção da peça denunciatória:
 Possibilidade constante do estatuído nos ditames do art. 383 do Código de Processo Penal, que faculta ao magistrado dar ao fato, nova definição jurídica, sem que isso, implique em surpresa ou cerceamento de defesa, embora tenha que aplicar mesmo, pena mais  grave. Para tanto, é necessário apenas, que as elementares estejam contidas, explícita ou implicitamente no relato da denúncia, como ocorrido.
 "O réu se defende da imputação do fato contido na denúncia, não da classificação do crime feita pelo Promotor de Justiça" ( STF, HC 56.874 ).
 DA PRÁTICA DELITUOSA E DA  AUTORIA:
 Dessome-se dos autos de forma clara e precisa, através das provas dele constantes, que o agente ativo, o Sr. Francisco de Assis Félix da Silva, "habitué" das sendas criminosas, implicado em vários outros delitos, tomou conhecimento no Estado do Rio grande do Norte - RN, de que o esposo da vítima, lá encontrava-se preso, por crime de homicídio.
 Certo de aproveitar-se daquela situação, vendo que poderia ganhar dinheiro fácil, maquinou com um tal de LULA ( fls. 52 e V. ), o plano, posto em prática, para extorquir a pobre vítima, agora desamparada, sem o companheiro que a protegesse, certamente.
 Deslocou-se até essa Comarca e de imediato procurou a vítima e após identificar-se falsamente, como policial, apresentando inclusive uma carteira, que foi apreendida ( fls.14 ), começou a expor a sua cruzada psicológica, como meio idôneo para impor terror, advindo inicialmente, na afirmação que o marido desta, corria sério risco de vida e que se não fosse retirado de lá até o final do ano, poderia morrer, para em seguida, preparado o caminho, afirmar que ele juntamente com o referido LULA, poderiam transferi-lo para a Paraíba, elemento este, que posteriormente chegou a telefonar procurando dar veracidade a trama ( fls. 15, 49 52 e V. ),.
 Não satisfeito o indivíduo com aquela única imposição de terror psicológico, ainda afirmou, encontrar-se acompanhado e que a qualquer momento, seus comparsas poderiam cercar a casa e que a vítima a também em qualquer momento, poderia ter uma arma apontada para ela ( fls. 49 e 52/V. ).
 Ocorre porém, que mesmo constrangida, resolveu a vítima procurar a polícia, que prendeu o meliante.
"Em tema de extorsão, diz-se idôneo a priori o meio executivo do delito quando seja capaz de intimidar o homo medius, o homem comum" ( JUTACRIM 50/231 ).
"A ameaça tendente  a criar no espírito da vítima fundado receio de iminente e grave mal, físico ou moral, injusto ou não a sua pessoa ou a pessoa que lhe seja cara ( grifo meu ), configura o crime previsto no art. 158 do CP. A virtual eficácia da ameaça deve ser aferida tendo-se em conta a psicologia média dos indivíduos da mesma condição do sujeito passivo, não importando que no caso particular a vítima tenha levado o caso ao conhecimento da polícia, ensejando a prisão dos criminosos" ( JUTACRIM 16/58 ).
 Fora de qualquer dúvida, que o intuito do agente, era a percepção de uma quantia, que almejava receber da vítima,  através do estado criado por ele, onde certamente, esta, temerosa e constrangida, veria-se na premente necessidade de transferir o seu marido, que corria sério risco de vida e entregar-lhe-ia o dinheiro necessário.
 O intuito do réu de obter vantagem  econômica indevida, extrai-se ainda, do depoimento de fls. 15, onde a testemunha afirma, que ele dizia depender do interesse da família, a facilitação da transferência e que durante essa conversa, inclusive referenciada, nas razões finais, fls. 57, este pedia vantagens.
 DA ADEQUAÇÃO DA TIPOLOGIA DO DELITO A SER APLICADA:
 
 A não adesão da vítima, a prática do comportamento querido pelo extorsionário, consubstanciado em fazer alguma coisa, "in casu", entregar-lhe vantagem econômica ( dinheiro ), traduz-se em inequívoca tentativa de extorsão, por ser esse delito, formal, de cunho plurissubsistente, cindível e de consumação quando da ocorrência do procedimento querido, fazer, tolerar que se faça, ou deixar de fazer alguma coisa, não prevalecendo ainda, a afirmação de que o fato da referida vítima ter procurado a polícia, não encontrava-se intimidada.
"O fato de a vítima de extorsão ter se socorrido da polícia para a prisão do réu não significa que não se tenha sentido intimidada com as sua ameaças, de modo a afastar a tentativa do delito em apreço" ( RT 486/300 ).
 Quanto a Falsa Identidade, foi empregada no contexto, como elemento no "iter criminis", restando absorvida, por ser crime subsidiário, só tendo autonomia, quando não usado como meio de prática de delito de mais grave.
 DA APENAÇÃO:
 
 O réu é tecnicamente primário,  entretanto de péssimos antecedentes, respondendo a um outro processo por delito tipificado no art. 157, § 2º, inciso I e a Inquérito Policial, por furto, fls. 61 e 25 dos autos em apenso, de personalidade periculosa e vida desregrada, agindo como agiu na prática do crime com intenso dolo, pelo que deve a pena ser aplicada acima do mínimo legal, para assegurar a reprovabilidade, repreensão e reprovação do crime perpetrado.
  "Ex Positis", julgo procedente em parte a denúncia de fls., 02, 03, para condenar o réu FRANCISCO DE ASSIS FÉLIX DA SILVA, já devidamente qualificado nos autos, nas disposições do art. 158, c/c art. 14, todos do Código Penal.
 Tendo em vista, as diretrizes constantes dos arts., 59 e 68, do C.P., passo a dosar-lhe a pena :
 Atendendo a culpabilidade intensa do réu, aos seus péssimos antecedentes, à sua conduta social desregrada, à personalidade periculosa, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, FIXO a PENA-BASE, em 05 ( cinco ) anos  de RECLUSÃO,  devido ao contido no teor do art. 14, CP, reduzo-a no máximo de 2/3 ( dois terços ),  diante da ausência de circunstâncias legais ou de outras de aumento ou diminuição da pena,  torno-a definitiva em 01 ( um ) ano e 08 ( oito ) meses de RECLUSÃO. Condeno-o ainda, ao pagamento de 40 dias-multa, fixados unitariamente no mínimo legal.
 Para a fixação do número de dias-multa, foram analisadas as Circunstâncias Judiciais do art. 59, já discriminadas acima e o valor do dia-multa, a situação econômica do réu, a teor do explicitado no art. 60, todos do Código Penal.
 O Seu Regime de Cumprimento Inicial da PENA, será o SEMI-ABERTO, que se apresenta como o mais adequado, levando-se em consideração a propensão criminosa do agente, seu "modus vivendi" e a sua personalidade.
 A pena aplicada, é inferior a dois anos, deixo entretanto, de conceder ao réu a Suspensão Condicional da Execução da Pena, por não preenchimento por parte deste, do constante no art. 77, incisos I e II, do Código de Penal.
 
Lance-se-lhe o nome no Rol dos Culpados, após o trânsito em julgado da sentença.
Custas  pelo condenado.
Publique-se. Registre-se. Intime-se.
Recomende-se na prisão onde se encontra.
Belém, 30 de abril  96.

 
 
 
João Jorge de Medeiros Tejo
Juiz de Direito
            

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