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Preços e Teimosias
Por OCTÁVIO TEIXEIRA
Segunda-feira, 24 de Julho de 2000

Fica sempre bem a um ministro mostrar confiança e optimismo. Excepto quando essa confiança e optimismo deixam de o ser e as afirmações ministeriais passam a adquirir a natureza de puro autismo gratuito. Porque esse autismo tende a levar os governantes a não tomarem medidas que a realidade poderia justificar. E porque visa enganar, autenticamente, os cidadãos (já que é por demais duvidoso que consigam enganar os agentes económicos).

Parece ser essa a actual atitude do ministro das Finanças de Portugal. Na passada semana, por ocasião de uma reunião do Conselho de Ministros das Finanças, o ministro Pina Moura voltou a reafirmar a sua confiança em atingir, ao longo de 2000, a taxa de inflação inicialmente prevista, os dois por cento. Seria útil que o sr. ministro não se ficasse pela afirmação, antes desse uma pública explicação das razões que a sustentam.

Porque, conhecida a evolução do índice de preços no primeiro semestre do ano, as projecções "normais" para o final do ano tendem a desmentir por completo o reiterado "optimismo" do ministro. Por exemplo, admitindo que na segunda metade do ano o ritmo de variação em cadeia dos preços seja idêntico ao registado no ano transacto, é certo e seguro que a taxa de inflação média anual atingirá os 2,6 por cento! E se admitirmos, mais benevolamente, uma variação média mensal da ordem dos 0,1 por cento ao mês (que compara com os 0,33 por cento registados nos primeiros seis meses do ano e com os 0,2 por cento verificados no segundo semestre de 1999), teremos uma inflação média anual de 2,5 por cento.

Mas, repito, o que seria importante era que o sr. ministro justificasse as suas previsões. Porque, em tese, é sempre admissível que haja razões fundadas. Por hipótese, talvez o sr. ministro preveja conseguir acabar com os acordos e as práticas concertadas de empresas em violação das práticas da concorrência de que a comunicação social se tem feito eco, e, quiçá, leve as empresas de distribuição a baixar preços. Ou, ainda dentro do campo das hipóteses, consiga fazer com que a generalidade dos bancos portugueses baixem os montantes que cobram nas transferências bancárias transfronteiriças. Sendo certo que, aqui, as reduções tenham de ser substanciais, da ordem dos 62 por cento (!!), para se enquadrarem na média comunitária, de acordo com os dados recentemente divulgados pela Comissão Europeia. Ou, quem sabe, talvez o sr. ministro das Finanças queira ultrapassar o primeiro-ministro em matéria de promessas e, em vez do não aumento do preço dos combustíveis líquidos até ao final do ano (qualquer que seja a evolução do preço do petróleo), nos garanta agora que vai baixar o preço das gasolinas e do gasóleo.

De qualquer modo, ou o sr. ministro das Finanças justifica o que teima em manter quanto ao índice de preços, ou teremos de concluir que as suas afirmações não têm fundamento, não passam de propaganda política. Totalmente gratuita. Porque os grandes lesados com a falsidade da taxa de inflação prevista, a generalidade dos trabalhadores que se viram defraudados na evolução dos seus salários, sentem diariamente no bolso que estão a ser burlados. E à alegada confiança do ministro contrapõe o INE que "a subida da inflação e das taxas de juro constituem a principal explicação para a perda de confiança dos consumidores".

* deputado do PCP

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