Ministério Público da União
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios

13ª e 14ª Promotorias de Justiça Criminal de Brasília

 

INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DA LEI Nº 9.299/96

Nísio E. Tostes Ribeiro Fº.
Promotor de Justiça do MPDFT

1. - JUSTIFICATIVA

1.1 - No dia 07 de agosto de 1996 foi sancionada pelo Sr. Presidente da República a Lei nº 9.299, alterando o art. 9º do Código Penal Militar e o art. 82 do Código de Processo Penal Militar.

1.2 - O art. 1º da Lei nº 9.299/96, ao modificar o art. 9º do CPM, alterou a redação da alínea "c" do inciso II, suprimiu a alínea "f" do mesmo inciso e acrescentou-lhe um parágrafo único, ficando o dispositivo com a seguinte redação:
    "Art. 9º - Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:
    (...)
    Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil serão de competência da justiça comum." (grifamos)

1.3 - O art. 2º da Lei nº 9.299/96, por sua vez, modificou o caput do art. 82 do Código de Processo Penal Militar e adicionou-lhe um novo parágrafo, passando o referido artigo a ter a seguinte redação:
    "Art. 82. O foro militar é especial e, exceto nos crimes dolosos contra a vida praticados contra civil, a eles estão sujeitos, em tempo de paz:
    (...)
    § 2º Nos crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil, a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial militar à justiça comum."

1.4 - No que tange à modificação do art. 9º, II, "c", do CPM, e à revogação da alínea "f" do mesmo dispositivo legal, nada há a merecer reparo. Todavia, quando a Lei nº 9.299/96 remete para a Justiça Comum o julgamento dos crimes militares dolosos contra a vida praticados por militares contra civis, ela é completamente inconstitucional.

1.5 - Ao tratar da competência da Justiça Militar Federal, o art. 124 da Constituição Federal determina que:
    "Art. 124. À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei."

1.6 - A competência da Justiça Militar Estadual encontra-se prevista no art. 125, § 4º, da Constituição Federal, que determina que a ela cabe "processar e julgar os policiais militares e bombeiros militares nos crimes militares definidos em lei". Observe-se que a Justiça Militar Estadual não possui competência para processar e julgar civis, ao contrário do que ocorre com a Justiça Militar Federal.

1.7 - Assim, a Constituição Federal determinou que o julgamento dos crimes militares definidos em lei (arts. 9º e 10 do CPM), praticados por militares, serão da competência da Justiça Militar Federal (no caso dos integrantes das Forças Armadas) ou das Justiças Militares Estaduais (no caso dos integrantes de suas policias militares e de seus corpos de bombeiros).

1.8 - Logo, há duas maneiras de se modificar a competência da Justiça Militar: de forma direta, através de Emenda à Constituição, visando a atribuir à Justiça Comum o julgamento dos crimes militares, ou de forma indireta, por meio da legislação ordinária, alterando a definição de crime militar.

1.9 - Ocorre que o legislador resolveu atribuir à Justiça Comum o julgamento de crimes militares através de modificação na legislação ordinária. Em vez de modificar a definição de crime militar, a Lei nº 9.299/96 limitou-se a remeter os crimes militares dolosos contra a vida praticados por militares à Justiça Comum. Note-se que o parágrafo único incluído no art. 9º começa com a expressão "os crimes de que trata este artigo ...." – e estes delitos são justamente os crimes militares, como determina o caput do artigo ("Consideram-se crimes militares, em tempo de paz").

1.10 - Assim, a Lei nº 9.299/96, ao atribuir competência à Justiça Comum para julgar crimes militares, viola frontalmente o disposto nos artigos 124 e 125, § 4º, da Constituição Federal.

1.11 - Conclusão diversa poderia ser alcançada se tal lei dispussesse, por exemplo, "não se consideram militares os crimes dolosos contra a vida praticados por militar contra civil".

1.12 - A diferença entre a lei em questão e o exemplo acima é simples: neste alterou-se a definição de crime militar e naquele a competência para julgamento do crime militar.

1.13 - E, como já afirmado, a lei ordinária apenas pode alterar a definição de crime militar, jamais a competência, matéria exclusivamente constitucional.


2. - CONCLUSÃO

2.1 - Por todo o exposto, somos do entendimento de que são inconstitucionais os dispositivos da Lei nº 9.299, de 07 de agosto de 1996, que remetem para a Justiça Comum o julgamento dos crimes militares dolosos contra a vida praticados por militar contra civil, por violarem os artigos 124 e 125 da Constituição Federal, que estabelecem a competência da Justiça Militar, Federal e Estadual, para processar e julgar estes delitos.
 

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