DOENÇAS CAUSADAS POR GASES ASFIXIANTES QUIMICOS

 

René Mendes
 

I - INTRODUÇÃO

Asfixiantes químicos são gases que, penetrando no organismo, impedem a obtenção do oxigênio do ar atmosférico, ou ainda, a utilização do oxigênio pelos tecidos. Podem, portanto, causar asfixia mesmo que haja suficiente concentração de oxigênio no ar. Os asfixiantes químicos mais conhecidos são o monóxido de carbono e os cianetos.

II - MONÓXIDO DE CARBONO INTRODUÇÃO

O monóxido de carbono (CO) é um gás inodoro, incolor, insípido, mais leve que o ar (densidade 0,97), produzido onde ocorre combustão incompleta de material orgânico.

Suas propriedades tóxicas sobre o organismo já vêm sendo observadas há muitos séculos, pois antes que fosse conhecida sua composição química, gregos e romanos utilizavam-no para a execução de criminosos, bem como para provocar o suicídio (3).

Coube a PRISTLEY, no final do século 18, reconhecer sua composição química; em 1895, HAIDANE demonstrou suas importantes relações com o pigmento transportador de oxigênio, para a formação Carboxihemoglobina.

Seu limite de tolerância atualmente aceito é de 50 ppm ou 55 mg/m3 de ar  (ACGIH, 1972).

 OCORRÊNCIA

O CO é formado pela combustão incompleta de materiais orgânicos, tais como o petróleo e seus derivados, gás natural e manufaturado, explosivos, madeira, carvão e coque. No processo de combustão, um excesso de carbono favorece à formação de monóxido de carbono, enquanto que um excesso de oxigênio leva a formação de dióxido de carbono (C02).

Devido ao uso universal de combustíveis carbonáceos, o CO pode ser encontrado em concentrações perigosas tanto no ambiente doméstico quanto nas ruas, na agricultura e principalmente na indústria.

FISIOPATOLOGIA

O monóxido de carbono exerce sua ação de asfixiante químico ao reduzir a capacidade da hemoglobina, de transportar o oxigênio através de, principalmente, dois mecanismos. O primeiro mecanismo é ao fixar-se à hemoglobina com sua afinidade 210 a 300 vezes maior do que a do oxigênio, vindo a formar a Carboxihemoglobina. Esta afinidade pode ser medida pelo número de moles de oxigênio, necessário para cada mole de CO, a fim de manter igual saturação da hemoglobina.

O segundo mecanismo consiste na modificação da forma da curva de dissociação oxihemoglobina deslocando-a para a esquerda e tornando-a um hipérbole retangular, a medida que as concentrações do COHb forem crescendo, conforme o gráfico abaixo.

FIGURA 1 - Dissociação da oxihemoglobina na presença de diferentes quantidades de carboxiemoglobina: 1 = 0%, 2 = 10%, 3 = 25%, 4 = 50%, 5 = 75% (in PATTY).

Figura 1

Quando a curva de dissociação é desviada para a direita, segue-se uma dissociação mais eficiente de oxigênio ao nível dos tecidos periféricos, como em condições de reduzida tensão de oxigênio, ou seja, hipóxia hipóxica.

Exatamente o oposto ocorre com a intoxicação pelo CO, caracterizando uma anemia hipóxica. A quantidade de oxigênio disponível no sangue não só é baixa durante a exposição ao CO, como também o desvio da curva para a esquerda diminui a quantidade do oxigênio liberado nos tecidos.

Isto explica porque uma pessoa com apenas 50% de hemoglobina saturada (anemia, por exemplo) consegue realizar atividades e esforços absolutamente impossíveis para uma pessoa que também tenha apenas 50% de saturação, mas esteja impregnada pela Carboxihemoglobina. A presença desta última dificulta enormemente a disponibilidade de oxigênio para as células.

Desta forma, ambos os mecanismos contribuem para baixar efetivamente a PO2 nos tecidos, criando a situação de hipóxia tecidual.

INTOXICAÇÃO AGUDA

Os efeitos da exposição ao monóxido de carbono dependem da porcentagem de saturação de hemoglobina com CO, formando Carboxihemoglobina. Esta porcentagem depende, por sua vez, da duração da exposição, da temperatura do ambiente, do estado de higidez e da eficiência metabólica do exposto.

Os sintomas agudos podem ocorrer sem seqüelas. No entanto, se a anoxia tecidual for prolongada e grave, poderão surgir graus variáveis de degeneração das células nervosas, já que, sabidamente, elas não costumam sobreviver mais de oito minutos na ausência do oxigênio.

A sintomatologia corresponde, indiretamente, às concentrações de CO no ar, e diretamente às concentrações de Carboxihemoglobina no sangue, segundo o paralelismo abaixo:

QUADRO 1
CORRELAÇÃO ENTRE A CONCENTRAÇÃO ATMOSFÉRICA DE CO, A PORCENTAGEM DE COHb NO SANGUE E A SINTOMATOLOGIA PRINCIPAL (2).
 
 
CONCENTRAÇÃO DE
CO NO AR (ppm)
% DE COHb NO SANGUE, APÓS O EQUILÍBRIO
SINTOMALOGIA
PRINCIPAL
50
           07
- Cefaléia  discreta       
                                                                            
100
12
- Cefaléia moderada e tontura.
250
25
- Cefaléia interna, tontura, confusão
mental                                                             
500
45
- Naúsea, vômitos, choque
1.000
60
- Coma
10.000
95
- Morte em 5 minutos
 

Devem ainda ser considerados vários fatores relacionados com a maior ou menor suscetibilidade dos expostos. Assim, teriam maior probabilidade de intoxicação portadores de distúrbios circulatórios, cardiopatas, anêmicos, pulmonares crônicos, e situações que aceleram o metabolismo: atividade física, temperatura elevada, pressão atmosférica baixa, grande umidade ambiental e hipertireoidismo.

A presença destes sintomas acima relacionados em pessoa que trabalha exposta ao CO deve suspeitar da intoxicação pelo CO. No diagnóstico diferencial devem ser considerados: intoxicação medicamentosa, intoxicação alcoólica aguda, acidente vascular cerebral ou cardíaco, coma urénico, coma diabético etc. Podem existir circunstâncias em que o diagnóstico de certeza torne-se difícil e até impossível antes de detectar-se o CO no ambiente em que estava a vitima ou, então, a Carboxihemoglobina no sangue.

INTOXICAÇÃO CRÔNICA

Ao contrário do que ocorre com o quadro da intoxicação aguda, os efeitos de exposições prolongadas a baixas concentrações são ainda extremamente controversos (4,11).

Os efeitos histopatológicos destas exposições mostram-se em animais de laboratório como áreas corticais infartadas, com alterações degenerativas, presença de cistos, gliose, infiltração perivascular, destruição mielinica e amolecimento generalizado do tecido nervoso. Tais achados, segundo outros autores, seriam puro e simples artefato de técnica, uma vez que não foram encontrados em outros estudos experimentais (3).

Por outro lado, os efeitos neurofisiológicos vêm sendo estudados através de eletroencefalograma, reflexos eletrocorticais condicionados e estudo do traçado do sono(7,l1).

Para avaliar os efeitos sobre a conduta, estudam-se testes e medidas de percepção visual e auditiva, bem como a função psicomotora e a habilidade cognitiva (8,11).

A disparidade dos resultados da literatura parece dever-se a uma série de fatores, entre os quais, E falta de controle do grau de motivação envolvido nas pessoas utilizadas para as pesquisas com humanos, aos aspectos físicos e psicológicos de todos os envolvidos no estudo, aos diferentes graus de pureza do CO empregado, e a distorções provocadas por testes nem sempre suficientemente "cegos" (3).

A despeito da multiplicidade de informações na literatura, são considerados trabalhos fundamentais os seguintes:

- MacFarland (cit. 3) e Halperin (5) relativos à percepção visual;

- Horvath (6) sobre a vigilância;

- Shulte (10) relativo à função cognitiva;

- Beard (l) sobre tempo de discriminação;

- Ray e Rockwell (9) sobre a conduta dirigindo automóvel;

- Trouton & Eysenck (cit. 3) referente E coordenação limbica frente a baixos níveis de CO.

TRATAMENTO

A vítima de uma intoxicação aguda deverá ser imediatamente removida do local de inalação do gás para um outro onde exista boa ventilação, assegurando-se que tanto a vítima quanto os socorristas possam respirar sem riscos. Após a remoção verificar se ha presença ou não de movimentos respiratórios e de batimentos cardíacos para optar- se pela respiração boca-a-boca, acompanhada da massagem cardíaca externa.

Logo que possível, iniciar-se a oxigenoterapia, dando-se preferência ao oxigênio hiperbárico (2).

Alguns autores recomendam a mistura de 95% de oxigênio com 5% de CO2, como mais eficiente do que o oxigênio puro, caso essa providencia tenha sido instituída precocemente (2).

MEDIDAS DE CONTROLE

Métodos de proteção coletiva:

Métodos de proteção individual: Controle médico: III - CIANOGÊNIO, ÁCIDO HIDROCIÂNICO, CIANETOS

Principais representantes:

Efeitos Tóxicos sobre o Organismo

A penetração destes compostos pode ser por qualquer uma das três vias habituais, salientando-se sua penetração mesmo através da pele íntegra. Esta última propriedade é importante em situações que obrigam o uso de máscaras adequadas - equipamento insuficiente para impedir a penetração do tóxico.

Entre os riscos ocupacionais relacionados com estes produtos, conhecem-se várias lesões de pele (pápulas, exantema escarlatiforme, etc.) e das mucosas (irritação, ulceração da mucosa nasal e até perfuração do septo). Como efeitos crônicos são, ocasionalmente, referidos sintomas de fraqueza nas pernas e braços, cefaléias intensas e tireoidopatias.

No entanto, a principal característica deste grupo é a propriedade tóxica do íon cianeto (CN), em inibir os enzimas da cadeia respiratória.

Existem relacionadas cerca de 42 reações enzimáticas que seriam inibidas pelo cianeto.

Sua ação mais importante, no entanto, é a inibição da citocromoxidase, impedindo a utilização do oxigênio pelas células. Apesar de o oxigênio continuar sendo carreado pela hemoglobina da hemácia, não pode ocorrer sua liberação e aproveitamento a nível tecidual, seguindo-se a morte por asfixia. Saturado de oxigênio, o sangue permanece arterial mesmo após alcançar a circulação venosa, vindo a provocar o aparecimento da cor vermelho-cereja que caracteriza a vítima.

 

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