ANTE OS QUE PARTIRAM
EMMANUEL
Nenhum
sofrimento na Terra será talvez comparável ao daquele coração que se debruça
sobre outro coração regelado e querido que o ataúde transporta para o grande
silêncio.
Ver a
névoa da morte estampar-se, inexorável, na fisionomia dos que mais amamos e
cerrar-lhe os olhos no adeus indescritível é como despedaçar a própria alma e
prosseguir vivendo.
Digam
aqueles que já estreitaram de encontro ao peito um filhinho transfigurado em
anjo da agonia; um esposo que se despede, procurando debalde mover os lábios
mudos; uma companheira, cujas mãos consagradas à ternura pendem extintas; um
amigo que tomba desfalecente para não mais se erguer, ou um semblante materno
acostumado a abençoar, e que nada mais consegue exprimir senão a dor da extrema
separação, através da última lágrima.
Falem
aqueles que, um dia, se inclinaram, esmagados de solidão, à frente de um
túmulo; os que se rojaram em prece nas cinzas que recobrem a derradeira
recordação dos entes inesquecíveis; os que caíram, varados de saudade,
carregando no seio o esquife dos próprios sonhos; os que tatearam, gemendo, a
lousa imóvel e os que soluçaram de angústia no ádito dos próprios pensamentos,
perguntando, em vão, pela presença dos que partiram.
Todavia,
quando semelhante provação te bata à porta, reprime o desespero e dilui a
corrente da mágoa na fonte viva da oração, porque os chamados mortos são apenas
ausentes e as gotas de teu pranto lhes fustigam a alma como chuva de fel.
Também
eles pensam e lutam, sentem e choram.
Atravessam
a faixa do sepulcro como quem se desvencilha da noite, mas na madrugada do novo
dia inquietam-se pelos que ficaram... Ouvem-lhes os gritos e as súplicas, na
onda mental que rompe a barreira da grande sombra, e tremem cada vez que os
laços afetivos da retaguarda se rendem à inconformação ou se voltam para o
suicídio.
Lamentam-se
quanto aos erros praticados e trabalham com afinco na regeneração que lhes diz
respeito.
Estimulam-te
à prática do bem, partilhando-te as dores e as alegrias.
Rejubilam-se
com as tuas vitórias no mundo interior e consolam-te nas horas amargas para que
te não percas no frio do desencanto.
Tranqüiliza,
desse modo, os companheiros que demandam o Além, suportando corajosamente a
despedida temporária e honra-lhes a memória, abraçando com nobreza os deveres
que te legaram.
Recorda
que, em futuro mais próximo que imaginas, respirarás, entre eles,
comungando-lhes as necessidades e os problemas, porquanto terminarás também a
própria viagem no mar das provas redentoras.
E,
vencendo para sempre o terror da morte, não nos será lícito esquecer que Jesus,
o nosso Divino Mestre e Herói do Túmulo Vazio, nasceu em noite escura, viveu
entre os infortúnios da Terra, e expirou na cruz, em tarde pardacenta, sobre o
monte empedrado, mas ressuscitou aos cânticos da manhã, no fulgor de um jardim.
(Médium:
Francisco Cândido Xavier. In: Religião dos Espíritos, FEB.)