Arminianos são Cristãos, Mais ou Menos

Texto

Na introdução ao seu livro. "Desejando crer: a controvérsia sobre livre arbítrio", R.C. Sproul, quando perguntado se ele acha que arminianos são cristãos, responde: "'Sim, mais ou menos'. Eles são cristãos pelo que chamamos de uma infeliz inconsistência" 1. Ele concorda com J.I. Packer e O.R. Johnston, que insistem que os arminianos, pelo fato de rejeitarem a (sem provas e eminentemente filosófica) teoria de que regeneração precede a fé, eles "portanto negam o completo desespero em pecado, e afirmam que uma forma de semipelagianismo é verdadeira, afinal" 2. Esta é a razão, tal qual os autores estão convencidos, que "a teologia reformada condenou o arminianismo como sendo em princípio um retorno a Roma (porque em efeito torna a fé em um trabalho meritório) e uma traição à Reforma (porque nega a soberania de Deus em salvar pecadores…) 3.

Calvinistas corretamente creem que todos os pecadores inerentemente não têm nenhuma habilidade de conhecer ou entender "as profundezas de Deus" (1Co 2:10), ou a habilidade natural de "receber os dons do Espírito de Deus", ou "entendê-los, porque eles se discernem espiritualmente" (1Co 2:14). O não-regenerado não "se submete à lei de Deus - de fato não pode" (Rm 8:7). Porém, para o calvinista, a única solução para a desesperadora condição do pecador é a regeneração monergística estrita - a doutrina, isto é, de que a fé que recebe Cristo para justificação é em si mesma um dom gratuito de um Deus soberano, dado pela regeneração espiritual no ato da chamada eficaz" 4. Se um cristão não concorda com esta teoria, então ele é acusado de advogar uma "auto-confiança e auto-esforço" 5.

Colocando tais assertivas, calvinistas se qualificam em seu próprio nicho conveniente, declarando todos os outros não-ortodoxos, heterodoxos, ou como Packer, Johnston e Sproul fazem, "não-cristãos ou anticristãos" 6. Ou alguém adere ao monergismo estrito (regeneração precede fé) ou adere a uma heresia.

Primeiro, fé evangélica, no arminianismo, é defendida como um dom de Deus, e não pode de forma alguma ser uma "obra" da própria pessoa. Por definição, porém, fé não pode ser encarada como obra, pois o apóstolo Paulo argumenta que "não trabalha, mas crê naquele que justifica ao perverso, sua fé lhe é considerada por justiça" (Rm 4:5). Fé não é uma obra. Portanto, monergismo estrito (regeneração precede a fé) é uma teoria supérflua no mínimo. Arminius fala explicitamente: "Fé e um presente gracioso e gratuito de Deus, doado de acordo com uma administração dos meios necessários para conduzir ao fim; isto é, de acordo com tal administração como a justiça de Deus requer ou no sentido da misericórdia ou no sentido da severidade" 7. O que calvinistas não podem tolerar é a assertiva seguinte: "É um dom que não é doado de acordo com uma vontade absoluta de salvar alguns homens em particular: É condição requerida no objeto a ser salvo, e é de fato a condição antes de ser o meio para obter a salvação" 8. Para o calvinista, Deus não pode meramente habilitar um indivíduo a crer, mas deve causar um pecador a crer mediante a regeneração. Então uma pessoa é na realidade salva (regenerada) para fé, não pela fé, o que é contrário ao ensino bíblico (Ef 2:8).

Segundo, arminianismo advoga um monergismo inicial. O Santo Espírito é enviado por Cristo Jesus para "reprovar o mundo sobre o pecado, a justiça e o juízo" (Jo 16:8). Ninguém pergunta para ser convencido pelo Espírito de Deus. Esta obra é monergística. A graça e poder proativos de Deus têm por destino conduzir o pecador ao arrependimento (Romanos 2:4). Mesmo assim, em lugar algum da Escritura somos ensinados que a intenção ou propósito de Deus é regenerar monergisticamente Seus incondicionalmente eleitos, tal que eles possam então crer em Cristo Jesus. Mais ao ponto, a Escritura ensina justamente o oposto, fazendo um monergismo estrito uma doutrina de homens, a qual contorce a Escritura e desonra Deus.

A Escritura ensina que todos aqueles que primeiro recebem Cristo Jesus como Senhor e Salvador recebem então o direito de serem filhos de Deus (Jo 1:12). Fé, então, precede regeneração, dado que os filhos são "nascidos… da vontade de Deus" (Jo 1:13) apenas após receber ou crer em Jesus Cristo inicialmente. Entendemos da Escritura que a "regeneração" é o ato de Deus que "nos salva" (Tt 3:5): {} Salvação e regeneração são interconectadas; uma não pode ser sem a outra.

Além disso, a Escritura confirma também que um indivíduo é "salvo" pela fé no Senhor Jesus Cristo (Rm 3:22,25-28; 4:1-5,16; 5:1; Gl 2:16,20; 3:11; Ef 2:8). Se alguém é "salvo" (pela graça) mediante a fé, então alguém é "regenerado" por Deus quando crê em Cristo, o que significa que a fé precede a regeneração. (Não nos é permitido definir a palavra graça como regeneração.) O apóstolo Paulo explicitamente estabelece informando os crentes colossenses que Deus os regenerou ("os fez vivos") quando eles foram perdoados de seus pecados e justificados pela fé em Cristo (Rm 5:1). Portanto, novamente, fé precede regeneração. Ainda que um indivíduo deva ser habilitado (Jo 6:44) e a ele concedido (Jo 6:65; Fp 1:29) o poder para crer, o real crer é feito pelo indivíduo (Mt 9.22, 29; 15.28; Mc 4.40; Lc 8.25; At 14.9; Rm 1.8; 4.5; 1Co 2.5; 15.14; 2Co 1.24; Ef 1.15; Fp 2.17; Cl 1.4; 2.5; 1Ts 3.2, 5, 6, 7, 10; Fm 1:6; Hb 10.23; 12.2; Tg 1.3; 2.18; 1Pe 1.7, 9, 21; 2Pe 1.5; 1Jo 5.4; Jd 1:20), não por Deus. Deus não crê por nós, nem "implanta" fé em nossas mentes via regeneração. A Escritura não nos concede garantia para tal crença.

Em última análise, o que calvinistas como Sproul e Packer têm feito é fazer o ensino reformado de Lutero e Calvino doutrina infalível, portanto excluindo todas as outras (a vasta maioria) que discordam com certos aspectos de suas doutrinas, de qualquer relação com a Reforma, declarando-os "não cristãos" ou "anticristãos" 9. O comentário de Sproul, de que arminianos são cristãos, "mais ou menos", além disso tudo, divide o corpo de Cristo. Arminianos e semipelagianos, ainda que redimidos pelo mesmo Salvador (e pela própria doutrina dos calvinistas, incondicionalmente eleitos pelo mesmo Deus), são relegados a alguma deformidade do corpo de Cristo - uma mancha ou mácula que desgraça a Cabeça.

Mesmo no meu maior desdém pelos calvinistas, eu não recordo a cada afirmação que o calvinismo ou é não cristão ou anticristão. Historicamente, o calvinismo é heterodoxo, dado que a Igreja antes de Santo Agostinho não ensinava nada remotamente relacionado às teorias da eleição incondicional, expiação limitada, graça irresistível ou o determinismo exaustivo de Deus. As concepções novas do calvinismo causaram (e ainda causam) algumas das maiores controvérsias que temos experimentado no corpo de Cristo. Mas eu jamais cogitei o calvinismo como não-cristão. Os modos e escrúpulos pelos quais alguns calvinistas trilharão a fim de propagar o calvinismo são terminantemente terríveis.

Um dos aspectos nos quais o desprezo dos calvinistas acerca do arminianismo é máximo é Deus conceder ao pecador uma graça para crer em Cristo que pode ser resistida. Sproul critica: "Então por que digo que o arminianismo 'em efeito' faz da fé uma obra meritória? Porque a boa resposta que as pessoas dão ao evangelho se torna o fator determinante último na salvação." 10 A queixa de Sproul é essencialmente contra a Escritura, e a maneira com a qual Deus declarou que trabalha na terra com a humanidade, e não com a teologia arminiana propriamente.

Desde que a fé em Cristo não é, biblicamente falando, uma "obra" (Rm 4:4-5), então nem mesmo na teologia arminiana ela pode ser vista como obra: crer em Cristo não é obra para salvação. Paulo estabeleceu este assunto na sua missiva aos romanos. O "fator determinante último na salvação", como Sproul afirma, sendo o instrumento da fé de alguém em Cristo, não pode ainda assim ser vista como obra, estritamente falando, ou um "retorno a Roma", desde que confiar em Cristo não é considerado obra pela salvação (Rm 4:4-5). Se Deus estabeleceu uma condição para salvar uma pessoa, e Ele o fez - mediante a fé em Jesus Cristo - então mesmo o "fator determinante último na salvação" ainda é Deus, já que Ele apenas é quem salva; fé em Cristo não salva ou causa a regeneração de alguém. Fé é um meio instrumental para salvação, mas não a salvação ou regeneração por si só. Que tais calvinistas intelectuais como Sproul e Packer (e mais uma porção deles) não têm cogitado isso é vergonhoso.

Arminianos não são "mais ou menos" salvos, mesmo por uma feliz inconsistência. Arminianos, pela graça mediante a fé em Jesus Cristo, são cristãos salvos "até o fim" (Hebreus 7:25 King James)

META

Notas de Rodapé:

1

R. C. Sproul, Willing to Believe: The Controversy over Free Will (Grand Rapids: Baker Books, 1997), 25.

2

Ibid., 24.

3

Ibid.

4

Ibid., 22-23.

5

Ibid., 23.

6

Ibid., 24.

7

James Arminius, "Certain Articles to be Diligently Examined and Weighed: XIX. On Faith," The Works of Arminius, three volumes, the London Edition, trans. James and William Nichols (Grand Rapids: Baker Book House, 1996), 2:723.

8

Ibid., 2:723-24.

9

Sproul, 24.

10

Ibid., 26.

Data: 2020-01-01

Criado em: 2022-04-08 Fri 22:19

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